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Passos N.138, Junho 2012

A HISTÓRIA

Os mercadores de Boccaccio

“É exatamente nisso que quer se envolver? Tem certeza?” Há alguns dias sua mãe lhe pergunta isso. Diretamente, com essas palavras, ou simplesmente mostrando os artigos dos jornais, sem acrescentar nada. Nestes dias, na Itália, não faltam artigos sobre as lutas políticas que envolvem CL. Todos os dias acusações, alusões, os interesses, a fé. E ela olha sua mãe e toda a urgência com a qual não deixa passar nada: quer que a filha saiba bem o que está acontecendo, que julgue e veja o que é aquela companhia com quem começou a andar.
Isabella conhece alguns amigos do Movimento há muito tempo, desde quando entrou na universidade. Ela também fazia uma imagem deles. Tinha seus juízos, e seus preconceitos. Hoje está no quarto ano e, nas idas e vindas da vida, começou a se envolver com eles só agora. E diz isso em casa. Exatamente agora. No meio desse turbilhão.
“Mãe, não quero fechar os olhos. Estou vendo o que está acontecendo. Mas eu também vi outra coisa, algo diferente.” Pensa em algumas pessoas que conheceu, e nas vezes em que teve a certeza: “Isso é verdadeiro, não é uma brincadeira. Há uma verdade. E é uma verdade para mim”. Pensa no primeiro livro de Dom Giussani que está lendo: “Ali, leio a mim mesma. Não são palavras ditas para construir algo que, na realidade, não existe”. Também diz isso à sua mãe. Conversam a respeito, discutem. Mas os artigos continuam ali.

ENTÃO, ALGO LHE VEM EM MENTE. É costume em sua família, durante o jantar, conversarem sobre o que vivem, o que veem, o que estão lendo. Um tempo atrás, a mãe estava relendo Decameron, e à mesa, Isabella a ouviu contar uma história que Boccaccio escreveu sobre Giannotto e Abraão. Dois amigos, mercadores em Paris. Um, cristão e o outro, judeu. Giannotto admira o espírito do amigo e deseja com todas as forças que ele se torne cristão. Insiste para que ele se converta. Mas Abraão está irredutível: nasceu na fé judaica e nela pretende viver e morrer. Porém, ele insiste, até que Abraão resolve: irá a Roma para conhecer os costumes da Igreja e, depois decidirá se vai se batizar ou não. Mas, em Roma, vê os homens todos pecarem desonestamente. E vê muitas outras coisas, sobre as quais é melhor se calar.Quando volta a Paris, Giannotto tem certeza de que o amigo – tendo visto isso – nunca se converterá. Porém, ele o ouve dizer: “Não deixarei de me tornar cristão por nada”. Abraão pede o Batismo. Exatamente o que viu lhe mostrou a presença do Espírito Santo. Porque, embora os homens procurem reduzir o cristianismo a nada, a fé cresce. E se torna mais clara.

ASSIM, UM DIA, ENQUANTO ESTÃO LAVANDO OS PRATOS, Isabella começa a conversar com a mãe sobre a história dos mercadores. Citando Boccaccio, explica que a bondade de Deus não olha para nossos erros, mas apoiando pacientemente os defeitos os torna argumento infalível da sua verdade. A mãe escuta tudo, em silêncio. Depois, sai sem dizer nada. Isabella fica surpresa: “Eu simplesmente respondi com aquilo que ela me deu”.
A partir daquele dia, elas continuam conversando, mas não é como antes. A mãe lembra a ela para “nunca perder seu espírito crítico: olhe tudo, leia, dê um juízo”. Porém, depois sempre acrescenta: “Tudo bem. Eu acredito em você”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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