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Passos N.143, Novembro 2012

RUBRICAS

Cartas

“CAROS COLEGAS, PEDI DEMISSÃO POIS VOU ENTRAR NO CONVENTO...”
Caro padre Julián, segunda-feira expliquei aos meus colegas a razão pela qual eu pedi demissão: eu vou entrar num convento de clausura. Nasceu um interessante diálogo que muito me surpreendeu. Além das perguntas que me fizeram e que me impressionaram pela sua seriedade e profundidade – nenhum deles frequenta muito a Igreja e alguns são declaradamente anticatólicos –, o mais surpreendente foi descobrir o que eu signifiquei para eles nesses oito anos. Eu, por temperamento, não sou da turma da “primeira linha” e no trabalho nunca me expus muito. Nunca tive conversas especiais nem jamais falei abertamente sobre o Movimento e a Igreja, embora todos soubessem do meu pertencer. Mas é verdade o que Giussani nos ensinou: não se trata de fazer discursos, mas de viver o quotidiano fazendo memória d’Aquele que dá significado à nossa vida. Uma colega me disse que sempre havia notado que havia algo diferente em mim: percebia que eu era muito boa no trabalho, fazia tudo com muito empenho e paixão, mas era claro que isso não me bastava, que não me definia totalmente, e que eu buscava outra coisa. Uma outra, para quem eu pensava não agradar muito, me disse ter ficado fascinada pelo modo como eu fazia tudo com prazer e paixão. Fiquei profundamente comovida diante de tudo porque descobri, pelos olhos dos outros, que era testemunha simplesmente pelo fato de fazer o que me cabia fazer. Nos Exercícios de 2010 você nos disse: “Veni Sancte Spiritus, veni per Mariam, e desperta em nós esse desejo de Cristo, para que possamos conhecê-Lo cada vez mais, não como palavra, mas como experiência que nunca pode faltar, pois isso torna diferente a vida, como intensidade, como presença a nós mesmos, na realidade e para as pessoas mais queridas ou até estranhas, a fim de que vivamos tudo sob a pressão dessa comoção, sob o peso dessa comoção que Tu, Espírito, comunicas a nós na caridade do Mistério! Tu és aquele amor que se espalhou pelos nossos corações, de modo que possamos viver assim: o outro mundo neste mundo!”. Desde então, todas as manhãs, rezei sempre com essas palavras. Mas só esta semana, ao deixar o trabalho, percebi que a minha prece era diariamente atendida.
Paola, Varese (Itália)

A ESCOLA: UMA AVENTURA PARA HOMENS CORAJOSOS
O meu ano letivo começou na noite do primeiro dia de escola. Eram 18 horas, chovia, e eu estava voltando da escola para casa e, parando num semáforo, vejo uma menina que corre como louca com os livros sobre a cabeça para não se molhar. Sorrio e digo a mim mesma: “É isso o que os seus alunos fazem com os livros escolares, uma proteção contra a chuva!”. Imediatamente, quase que para desmentir meu cinismo inicial, me vem à mente alguns flashes de fatos acontecidos durante aquela jornada. 1) No portão de entrada sou acolhida por alguns alunos que me entregam um folhetinho, assinado pelo grupo de colegiais de CL, que começa assim: “Esta aventura é só para homens corajosos, só para homens que decidem ser vivos, para aqueles que desejam ser livres, para quem é realmente capaz de gostar dos outros. Quem deseja menos do que isso?”. 2) Entro na classe, e na primeira carteira, o primeiro rosto que encontro é o de S., repetente. Não sabia que ia fazer a rematrícula. E estava ali, sorri para mim, e o seu sorriso me diz: “Estou aqui, estou pronto, vou recomeçar; e você, professora, está pronta?”. 3) Soa a campainha, a jornada matinal termina, no pátio encontro um colega que começou numa outra escola. Um grupinho de alunos o rodeia festivamente. Ele, um tanto comovido, os cumprimenta e diz: “Hoje eu também comecei na minha nova escola, é uma nova aventura, mas se estou tentando encarar é pelo que vi e vivi aqui, nestes anos, nesta escola, com vocês e todos os outros professores”. Os jovens lhe perguntam: “Professor, há alguém legal entre os seus alunos?”. E ele: “Todos!”. Enquanto isso, o semáforo abre, um motorista impaciente buzina, chove... e digo a mim mesma: “Que grande início! Graças a Deus os fatos são mais insistentes do que qualquer ceticismo, a mentalidade de todos não poupa ninguém, nem eu estou isenta”. Vieram à minha mente as palavras de um amigo: “Você precisa perceber que sozinha não é capaz de alargar a razão, não tem essa capacidade, então o que fazer? Nessa altura dependemos, e dependemos daquilo que existe, da realidade, porque só a realidade tem essa capacidade, só o Mistério tem essa capacidade: uma Presença que entra e amplia tudo”. Tudo muda, na carteira estou eu e na cátedra, como professora, a realidade, as circunstâncias. Os colegiais no portão, o meu aluno repetente, o colega que vai para uma escola estatal, até uma jovem que corre da chuva com os livros sobre a cabeça; tudo, pelo simples fato de existir, existe para mim, isto é, desmascara o ponto em que estou, é ocasião de amadurecimento. É o início!
Elena

AGORA ESTOU APRENDENDO A AMAR A MINHA VOCAÇÃO
Em dezembro de 2011 me casei e tive que viajar com meu marido, que está seguindo um programa de doutorado em Filosofia em outro país. Os primeiros meses foram um pouco confusos. Comecei a entender a língua, fiz a carteira de trabalho, tirei a carteira de motorista, etc. A cidade onde vivemos é pequena, mas se enche de estudantes quando começa o semestre. Tudo gira praticamente em torno do college. O início foi bem confuso. Eu me perguntava se seria possível uma amizade como aquela que experimentei em Milão. Parecia que eu estava perdendo algo. Mas não faltaram respostas a esse desejo de ser amada. Antes de tudo, a esposa do orientador de Francesco começou a me estimular a sair toda semana com ela, ajudando-me com a língua e com outras orientações. Conhecemos algumas pessoas do departamento de Filosofia que vimos no jantar, e o padre do campus, de origem irlandesa; ele é muito simpático e se afeiçoou a nós. Além disso, encontramos Christopher, católico que conhecemos na Missa. Em janeiro, eu e Francesco começamos a Escola de Comunidade na universidade. Depois se juntou a nós Marco, que é um rapaz do Movimento de Macerata. Convidamos Christopher para jantar, e queríamos perguntar-lhe se não estaria interessado em fazer conosco a Escola de Comunidade. Mas ele se antecipou, perguntando se éramos do Movimento. Três anos atrás, ele havia conhecido um professor italiano de Notre Dame que o convidou para a Escola de Comunidade. Tinha ficado muito impressionado, mas naquela época era protestante e, assim, havia preferido não seguir. Quando descobriu que éramos de CL, nos perguntou se podia participar. Não só: convidou todos os seus amigos. Agora somos quatorze. Mostramos a ele o vídeo de Vidas Extraordinárias sobre a vida de Dom Giussani e eles nos encheram de perguntas. No início eu estava exaltada, pela resposta tão abundante que tinha recebido e porque não me custara nada. Mas depois as dificuldades começaram. A Escola de Comunidade com eles não foi fácil: algumas vezes aconteciam debates sobre os máximos sistemas ou a Escola era entendida como um momento de agregação, como tantos outros oferecidos pelo centro católico. Foi a ocasião para eu me questionar por que faço a Escola de Comunidade e quem são essas pessoas para mim. Estou percebendo que as circunstâncias são importantíssimas para a minha vocação. De fato, no início eu pensava que a vocação era uma questão de forma. Sou chamada por Deus através do casamento, eu disse sim, a minha vida está organizada. Ou eu pensava estar organizada com um grupo de quinze pessoas que fazem a Escola de Comunidade comigo. Mas não. Esses meses foram totalmente o oposto. Aconteceram inúmeras coisas que me revelaram qual é o passo fundamental para mim agora: uma coisa é dizer sim à vocação; outra é amá-la.
Sara, State College (EUA)

ENVOLVENDO-SE COM A POLÍTICA
Nas últimas eleições municipais, minha mãe achava que eu deveria sair candidato a vereador, mas um primo bem próximo decidiu concorrer. Minha mãe, que não conseguiu emplacar o filho, agora trabalha para o sobrinho. Começa a panfletar os santinhos de forma sistemática. Em seguida, minha irmã Jucélia propõe à família ajudar a eleger o primo candidato e nos organizar. Até então não havia me envolvido com nada. Foi quando chegou o texto “É o tempo da pessoa” sobre a política. Fiz o texto na Escola de Comunidade junto com meus amigos. Como todos os anos, achei o texto muito bonito, mas guardei-o para mim. Porém, minha irmã continuou com a ideia de ajudar o nosso primo candidato. Marcou a primeira reunião num sábado cedo na casa da minha avó, com a família e mais alguns amigos. Nos dias que antecederam a reunião, fiquei pensando como poderia dar um sentido ao trabalho que elas estavam propondo. Veio a ideia de distribuir o texto preparado pelo Movimento para todos os que estavam na reunião. No dia do encontro as “estratégias” começaram a ser traçadas. Foi quando eu provoquei as pessoas com as seguintes perguntas: Por que nos envolvemos na política? O que nos move? Como proposta, lemos o texto. Foi muito bom este gesto, pois nos foi dado um juízo concreto. Após a leitura e discussão, marcamos panfletagem para o próximo sábado pela manhã, porém decidimos fazer uma carta para poder panfletar e não somente entregar o santinho do candidato. Nós nos dividimos e imprimimos em casa mesmo em torno de 3.000 cartas. No primeiro sábado da panfletagem, lemos o texto novamente e fomos à luta: eu e três irmãos. Panfletamos mil casas e encontramos umas 200 pessoas. Foi muito significativo porque era a região em que nasci e morei por mais de 30 anos. Encontrar pessoas, mesmo aquelas mais resistentes, que nos tratavam mal, foi muito gratificante. Fomos firmes. Entrei de cabeça. Meu carro, sala de trabalho e casa pareciam um comitê de campanha. O pessoal já não me chamava mais pelo nome e sim “lá vem o cabo eleitoral do Beto!”. Repassei o texto da política para vários padres e amigos e propus discuti-lo. Até provocava-os dizendo: “Temos que nos envolver, não podemos ficar parados. É trabalho do cristão também se envolver na política!”. Recebendo os e-mails do Olívio de São Paulo (envolvido na campanha de outro amigo), ficava cada vez mais claro para mim que a postura do meu envolvimento na política era correta e objetiva. No encontro com padre Carrón, no início de setembro em São Paulo, fui tocado pela provocação que as circunstâncias (neste caso a política) são um caminho para reconhecer Cristo. Nunca havia pensado nisso. Nunca havia pensado que ter um envolvimento sério na política era um caminho para me interessar pelo bem comum de todos os homens, inclusive os da minha cidade. Voltando do encontro, percebi que tinha que ficar mais perto do Beto, oferecendo minha amizade. Fomos juntos visitar empresas, participamos de reuniões, jantares, partidas de futebol. Como esforço de última hora redigimos e imprimimos novos textos para panfletar na saída das missas, reuniões de bairro, nos entroncamentos e sinaleiros importantes da cidade. Este último trabalho foi muito importante. Mostrava o desprendimento do Beto e a unidade do trabalho dos voluntários. O Beto, meu primo, não é político, nunca foi candidato, e foi o segundo vereador mais votado da coligação, ficando como suplente (faltaram apenas 90 votos!). Confesso que num primeiro momento me senti derrotado, mas logo em seguida fui retomando o por que fiz tudo isso e me senti feliz. Eu me sinto grato por ter encontrado uma companhia que me educa sempre e me faz me renovar, me sentir vivo!
Jaime, Londrina (PR)

JORNADA DE INÍCIO DE ANO
A Jornada de Início de Ano foi para mim extremamente marcante, renovando o encontro com Jesus. A cada palavra de Carrón, eu fazia esta experiência: “É isto”. Não preciso de mais nada! De fato, todos os cabelos da minha cabeça estão contados! Não é que estivesse ouvindo algo propriamente novo, mas pude reconhecer mais a fundo o que já está “gravado” em mim. Foi como se Deus me tivesse “cunhado” com a sua marca e a certeza Dele fosse cada vez mais minha e profunda. Tantas vezes dizemos que crescemos na dor, que os nossos limites não nos definem… Mas ver, com total clareza que esse é o Método que Deus usa para que eu tome cada vez mais consciência de Si e de mim, é algo “do Outro Mundo”. E com que transparência vertiginosa vejo o percurso da minha vida. Todas as circunstâncias me foram dadas para um amadurecimento. Cada uma, feia ou bonita, faz parte da minha vocação! E por isso termino com uma imensa Gratidão e alegria por esta companhia.
Isabel, Lisboa (Portugal)

COMPANHEIROS DE CAMINHADA
Lendo a frase “Não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim”, me lembrei de toda a minha história, de como fui acompanhada por meus amigos que levaram a sério a minha humanidade, quando eu estava muito longe para poder compreender, mas sempre levada pela curiosidade de entender como aquelas pessoas podiam ser tão diferentes. Isso me levou a seguir esse carisma. Mas na medida em que o tempo passava, tornavam-se mais claras as razões pelas quais aquelas pessoas podiam me acompanhar daquele modo, tal como hoje posso estar com a mesma clareza diante dos meus filhos, e em especial neste período em que preciso estar próxima do meu irmão e da mulher dele, sem renunciar a um juízo claro, embora sabendo que posso fazer a eles uma proposta ao falar do que eu encontrei: essa companhia que é o lugar onde aprendemos a desejar e olhar os outros como Cristo nos olha.
Miriam, Assunção (Paraguai)

“Esta revista é uma verdadeira companhia”
Assino a Passos já há alguns anos e muitas vezes passo meses sem lê-la pela correria do dia-a-dia. Recentemente tive a ocasião de começar a vir de ônibus para o trabalho e venho sempre lendo a Passos. Li a de agosto, passei para a de julho, depois junho, maio, estou chegando na de abril neste momento. Cada vez que volto a ler a Passos me dói por perceber quanto tempo passei distante desse recurso que me ajuda tão objetivamente a viver a vida de modo mais justo e intenso. A revista tem sido uma verdadeira companhia para mim, que desafia minhas medidas, me comove – não há uma vez que eu não me comova com a beleza e graça que estão testemunhadas, e que não pense "é isso que eu quero para a minha vida" – de modo que desperta a minha humanidade e me convida a renovar a esperança. Está expresso no cuidado com cada detalhe. Por tudo isso, convidei um grupo de amigos para lermos juntos a Passos toda semana, para que possamos nos ajudar também a ficar diante dessa provocação.
Emilia, Belo Horizonte (MG)

EU, DONA DE CASA, AVENTUREIRA. Caríssimo padre Julián, a vida, seguindo, torna-se cada dia mais fascinante. Cada instante em que tomo consciência de quem sou e da relação com o Senhor, o único que torna a minha pessoa sólida e feliz, torna-se a possibilidade de caminhar rumo à minha realização. Sou dona de casa, tenho três filhos; e sou uma grande aventureira. Nunca me senti esmagada pela inevitável solidão que a minha vida proporciona, nem pelo cansaço de um trabalho que não tem visibilidade (como mudar as fraldas ou preparar papinhas para as crianças), porque de fato, finalmente, dando crédito à verdade daquilo que sempre nos diz (como sempre nos dizia Dom Giussani), todas as vezes que aparece no horizonte do quotidiano alguma sensação de sufoco ou de mentira, acontece-me pensar em ti, penso no meu eu, em Quem o está fazendo naquele instante, e imediatamente descubro a relação única e grande que me constitui, e tudo volta ao lugar certo e respiro o ar fresco da minha liberdade, o ar fresco da Sua presença. Nestes anos tenho começado realmente a conhecer e a seguir Dom Giussani. E não porque passa um dia sem que eu perceba e peça que qualquer circunstância – atrevo-me a dizer também o meu mal, o meu pecado – possa ser a grande ocasião para dar o passo certo e consciente para o meu destino.
Francesca, Roma (Itália)

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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