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Passos N.145, Fevereiro 2013

SALVADOR - Férias

O pressentimento de algo verdadeiro

por Isabella S. Alberto

Três dias de férias que surpreenderam a todos. Uma novidade para muitos jovens que estavam ali pela primeira vez. E também uma possibilidade de reencontro para os amigos que já se conheciam

Entre os dias 15 e 17 de novembro, um grupo de 83 pessoas fizeram um momento de férias em Mar Grande, ilha próxima a Salvador, na Bahia. Eram colegiais, jovens trabalhadores, universitários e recém-formados. A proposta nasceu de Paola Cigarini, que dirige um Centro Educativo na cidade e no último ano acompanhando alguns jovens percebeu que muitos deles, após o encontro com o Movimento, quando a pessoa se torna adulta e a vida começa a exigir um maior empenho e as dificuldades aparecem, era muito fácil se perder. Por isso ela afirma: “A presença de Cristo é uma presença física entre todas as outras presenças e as férias podiam ser uma ocasião para reafirmar esta preferência física de Cristo por nós e para viver a dimensão missionária, que na realidade significa justamente a descoberta do próprio eu que se lança em ação”.
Paola convidou alguns amigos para assumirem com ela a organização das férias e contou com a ajuda de padre Emilio, Gilberto e Andrea, entre outros. Até duas semanas antes do evento havia apenas 5 inscritos pagantes, mas no final participaram 31 amigos que conheciam a experiência de CL e outros 52 novos. Entre eles estavam 2 franceses, 4 da Chapada do Rio Vermelho, 2 de Camaçari, um grupinho de 11 colegiais, jovens de Alagados e recém formados, além de 18 alunos convidados pela professora Milena.
Foi pedido a dois jovens que guiassem os gestos destes dias: Lucas, de Aracaju, e Ronald, de Salvador. “Essa decisão deu o seu belo fruto, pois os dois se jogaram do jeito que eles são, ajudando a todos e realmente aconteceu o milagre de uma impossível companhia entre pessoas que até o dia anterior eram desconhecidos”, afirma Paola. Exemplo disso é a afirmação de Silvoney, um dos alunos de Milena, ao dizer que ele nunca teria pensando que era possível se tornar amigo para sempre num dia só. Lucas conta como viveu este momento: “Alguns dias antes das férias, já em Salvador, eu recebo um email de uma amiga que contava uma série de problemas e, no final da mensagem, me diz para não me preocupar com aquilo e que fosse curtir o feriado. Naquele instante entendi uma coisa e lhe respondi: ‘Olha, eu não vim para cá para me distrair. Quando fiz minhas malas, a primeira coisa que pus ali dentro foi minha vida inteira’. E essa consciência me acompanhou a partir daquele momento. E foi assim que começamos as férias”.
Na primeira noite Otoney foi convidado para falar sobre Caetano Veloso, pois em 2012 completou 70 anos. No final daquela noite foi lançado um desafio: que eles pudessem viver aqueles dias seguindo as proposta, e que quem topasse seguir pudesse contar na assembleia do final se viveu algo grande ou não. E eles aceitaram.
Lisandra, tendo já participado de outras férias, foi escolhida para ajudar no serviço de ordem. Ao retornar destes dias, afirmou: “A frase ‘os últimos serão os primeiros’ regeu os meus três dias. Devia ser a primeira a acordar e a última a dormir; Primeira a organizar as refeições e última a comer. O segundo dia das férias foi lindo, seja pelas brincadeiras, o momento de oração e as conversas. À noite tivemos o luau, onde percebi a dispersão de algumas pessoas (novos e velhos). Esse foi um dos momentos mais difíceis, porque fui tomada por uma raiva incontrolável, comecei a julgar as ações daquelas pessoas e cheguei a desejar que elas não estivessem lá. Queria tudo belo sempre e fui dormir pensando nisso e percebi que existia algo que era muito maior que a situação ocorrida e muito maior que o meu puro julgamento. Era um desafio que estava sendo lançado diante do que eu achava ser o meu limite. Mas Cristo me fez perceber que aquelas pessoas não eram minhas, e não seria um olhar atento como eu imaginei desde o inicio se eu reduzisse tudo ao meu querer”.

Um encontro que é para todos. No sábado houve um momento de testemunhos com Francesco, um estudante italiano que há alguns meses faz intercâmbio em São Paulo, e Alessandra, uma amiga da comunidade de Salvador. Ambos contaram como encontraram Movimento – ele sendo provocado pelo jeito como a professora encarava os estudos, e ela pelos convites do então padre Guido, hoje Bispo de Paulo Afonso (BA), que sempre dizia “venham comigo, pois eu tenho a vida”. Mas para ambos era evidente essa experiência de encontrar Cristo através dessa amizade, tanto que Francesco se percebeu surpreso: “Por que somos tão amigos depois de apenas um dia de convivência? O que torna isso possível?”. Ao que Alessandra mostrou um caminho ao relembrar uma frase do Guido: “Seja fiel a essa companhia, seja fiel a esses amigos, e você vai experimentar o cêntuplo, isto é, a felicidade eterna”.
Na manhã de domingo foi realizada uma assembleia de 1h30min, cheia de testemunhos e que precisou ser encerrada por causa do tempo estourado. Alisson, de Camaçari, afirmou: “Durante um almoço, Lucas me fez uma pergunta: ‘se você quisesse subir uma montanha e você convidasse algumas pessoas que você gosta e elas dissessem não, mas logo em seguida você encontrasse outras pessoas que estão indo para essa montanha e lhe convidasse para ir junto, qual desses seriam seus amigos’? Eu vim pra cá à procura de amigos que queiram escalar essa montanha comigo, e acho que os encontrei aqui”. Outro novato, o francês Paul Louis, disse: “Há algumas semanas eu estava em casa, e hoje eu me vejo num país estranho, que fala outro idioma, junto com pessoas que nunca vi. Eu vim para o Brasil com uma ideia do que viveria aqui. Mas então a Isabella me convidou para essas férias. Num primeiro momento eu pensei que teria dificuldades, mas depois desses dias eu entendi aquela frase da bíblia que diz: ‘Aquilo que existe de louco no mundo, eis o que Deus escolheu’”.
Após as férias alguns jovens quiseram enviar a todos um agradecimento. Rositália disse: “Estava parada pensando nos três dias que passei na ilha e entendo que foi mais do que bom, porque bom seria muito pouco para falar desses dias maravilhosos que vivi. Foram muitos os momentos de alegria, de superação, de afeto, de amor e de realização, e é assim que me sinto hoje realizada, hoje eu posso dizer que eu não encontrei lá tudo que eu queria e sim tudo que eu precisava. Tudo isso só foi possível porque Deus permitiu e cada pessoa ali presente contribuiu para essa realização”. Eduardo também afirma: “Nestas férias existiram momentos marcantes e meu colega de quarto agora é meu amigo. Confesso que pensei outro tipo de atividades, que seriam completamente diferentes, mas a programação e a organização me agradaram ao máximo. Agradeço por tudo que ocorreu no local, em primeiro lugar a Deus, a educadora Milena Nunes, as cozinheiras, aos palestrantes, ao padre, e a todas as pessoas presentes”.
Gabriel define aqueles dias como “um passeio que vai ser lembrado pelo resto das nossas vidas”. Ele percebeu uma novidade no modo de estar juntos que lhe marcou: “Fiz coisas que jamais pensei em fazer, momentos que marcaram como a gincana, os grupos adversários torcendo um para o outro, a união entre pessoas que mal se conheciam e a dedicação e esforço de todos que ajudaram para que esse lindo passeio acontecesse e que mal foram reconhecidos pelo seu maravilhoso trabalho.Com esse passeio eu pude aprender que a vida nos proporciona a fazer coisas maravilhosas e que para obter a felicidade não basta só bens materiais. A vida é como uma pequena semente, se plantarmos e cultivarmos com integridade, perseverança, solidariedade, generosidade e crença na fé, ela se desenvolverá e com o decorrer do tempo lhe retribuirá com belos frutos”.
Edilza, também aluna de Milena, estava explodindo de comoção e timidez, por isso não falou na assembleia, mas entre as coisas que escreveu no dia seguinte disse: “Nada é por acaso. Hoje fiquei me perguntando a mesma coisa que muitos deveriam estar se perguntando: por que estávamos juntos, naquele local? Com qual propósito fomos àquele lugar lindo, com um belo jardim, flores e cheio de vida? Pessoas de origem diferentes e com histórias que só cada um pode contar. No começo acredito que ninguém esperava encontrar aquele lugar e esse mundo tão diferente, teve gente que resistiu e teve gente que adorou, mas cada um que se entregou por inteiro demonstrou através de pequenos gestos, principalmente comparecendo às missas, orando mesmo sem saber, cantando sem saber a letra, algo bom. Na noite do luau não participei muito, pois queria ficar sozinha, deixei todos e fui em direção ao quarto, onde orei, ato que não tinha costume de praticar. Percebi que naquele momento a melhor coisa para mim era conversar com Cristo. Pedi a Ele que abrisse a minha mente e meu coração para que pudesse aceitar tudo aquilo que ele me oferecia e pedi também para que parasse de machucar e decepcionar as pessoas que amo. No dia seguinte acordei com o coração aliviado por ter conversado com Jesus. O que agora levo de bom para a minha vida é a experiência de viver com pessoas de realidades diferentes e o aprendizado de que qualquer que seja o obstáculo devemos crer em Cristo, que é o único caminho a ser seguido sem medo. Levo também o olhar de cada um, o sorriso e a sinceridade que habitava aquele local. Acredito que nada em nossa vida acontece por acaso, e não foi por acaso que fizemos essa experiência. Gostaria de continuar tudo isso, conhecer mais sobre esse mundo tão bom e tão intenso que é o caminho de Cristo. Obrigada por tudo.”

Algo que move a pessoa. Paola conta que a semana seguinte que as férias haviam terminado, um dos alunos de Milena, Brian, foi visitá-la e passou a tarde no Centro Educativo João Paulo II – onde ela trabalha –, pois no passeio lhe havia dito que gostaria de ser professor de educação física e ela lhe convidou para conhecer o seu trabalho. Ficou durante a tarde, depois participou da Missa e à noite ficou para uma macarronada em que outros jovens que tinham estado nas férias também participaram junto com os padres Ignazio e Emilio. Ela afirma: “Vi três jovens jogando bola no pátio do Centro Educativo e me perguntei: como é possível que estejam aqui juntos um italiano que fez todo o percurso do Movimento; um baiano que com 7 anos já vendia balas no ônibus e este menino Brian que conhecemos há 4 dias? O que está acontecendo? E me lembrei daquela frase do Evangelho: ‘e O procuraram de novo no dia seguinte’. E pensei: este é o cristianismo que está acontecendo. Não são as palavras, é este movimento de alguém que O procura de novo no dia seguinte e encontra-O e permanece. Ficamos juntos até as 22h. Deixei o Brian no ponto de ônibus junto com o nosso Lucas de Salvador, ele também de volta entre nós através destas férias, que depois me mandou uma mensagem agradecendo por tudo”.
Por fim, Gabriela, de Aracaju, resume o que experimentou: “Vivi dias intensos nestas férias, momentos de diversão, educação e comunhão. E não posso negar: pelo que vivenciei neste período pude perceber (mais uma vez) que somente Cristo pode corresponder e preencher o meu coração. Eu me senti tão feliz, como uma criança que mal conseguia dormir, de tanta felicidade que mal cabia dentro do peito... Somente Ele reconhece as minhas necessidades e quanto mais próxima me sinto Dele, mais além quero estar, e mais força sinto para relacionar-me com minha família, meu namorado, meus amigos e meu trabalho”.
A alegria de todos no final destes dias de férias, com o movimento de procurar-se no dia seguinte, são sinais claros do impacto com uma experiência viva. O pressentimento de algo verdadeiro que não nos deixa tranquilos.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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