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Passos N.147, Abril 2013

CULTURA - Cinema

Indomável Sonhadora

por Simone Fortunato

Uma pequena comunidade da Louisiana, entre pântanos e às margens da civilização moderna acontece o drama da pequena Hushpuppy que tem um pai alcoólatra e doente

Pequeno acaso do ano, candidato a 4 Oscar (melhor filme, direção, roteiro adaptado e melhor atriz), dois prêmios prestigiosos levados para casa (o Camera D’Or como melhor filme em Cannes e o Grande Prêmio do Júri como melhor filme dramático no Festival de Sundance), Indomável Sonhadora é realmente uma obra surpreendente e fora dos esquemas. A trama, tirada da obra teatral Juicy and Delicious, de Lucy Alibar (que colabora com o diretor no roteiro), é absolutamente minimalista. Em uma comunidade minúscula no extremo sul da Lousiana, entre pântanos e florestas virgens, lugares perigosos para a saúde inclusive por causa de possíveis inundações, e por isso proibida há anos à população, vive a pequena Hushpuppy (Quvenzhané Wallis, nascida em 2003).

A vida é dura e particularmente fastidiosa para essa pobre gente que se arruma como pode, debaixo de palafitas e em casas de papelão. Há muita pobreza e miséria física, econômica e também moral. A pequena, de repente, encontra-se diante da morte do pai do pai, alcoólatra, grosseiro e mal humorado. Sairá, então, em viagem para a civilização moderna para encontrar a mãe que não vê há anos. Com uma fotografia extraordinária, mais do que da história simples e da alusão aos contos de fadas, o filme tira toda a sua força de uma ambientação incrível, suspensa entre o passado remoto e o presente, entre modernidade e pré-história. E o estilo de Zeitlin, que passa do documentário livre (os atores são todos amadores), ao fantástico puro (até demais, com inserções metafóricas de interpretação não imediata), ao fabuloso. Uma obra sugestiva e rica de muitas evocações e outras tantas referências: não se entende, por exemplo, onde e sobretudo quando a história é ambientada mas, especialmente depois da inundação do mar, que provoca morte e destruição, sem dúvida lembramos do terrível flagelo do furacão Katrina que, deixou cicatrizes profundas exatamente naquela região.

Obra sólida, hipnótica, marcada pela morte, pelas tantas feridas que a Natureza provoca, Indomável Sonhadora também é, no entanto, um filme de olhares, pessoas e rostos. De modo particular, a tenacidade dessa criança, primeiramente lidando com um pai difícil e depois em busca da mãe, toca, comove e infunde muita esperança em um mundo que parece à beira do abismo. E a cena principal, depois de tanto sofrimento, muitas derrotas e revoltas, tem como centro o olhar amoroso da menina correspondido pelo pai. Essa talvez seja a síntese perfeita do coração do filme: o amor incondicional, mas também difícil, às vezes raivoso, às vezes entristecido, que uma menina tem por seu pai, apesar de seus erros, sua dureza e sua ambiguidade. Um pouco como uma natureza ferida pelas rejeições e abandonada pelo homem com quem, porém, vive e cresce, embora com dificuldade, agarrada à sujeira, flutuando sobre pântanos imundos e esperando com medo a última onda, a definitiva. Assim, a menina ama, ama e ama sem possuir nada: não tem uma escola, não tem uma família e nem amigos. Porém, ama, como se fosse feita apenas para isso.

(Texto extraído do site www.ilsentieredelcinema.it)

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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