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Passos N.154, Dezembro 2013

MOVIMENTO / MILÃO

Por um dia, um presídio se tornou “a filial do Duomo”

por Elena Fabrizi

Uma professora, na prisão, falando de catedrais, eis o que aconteceu a Mariella Carlotti, dia 19 de outubro, no presídio San Vittore, em Milão. Uma das idealizadoras da exposição Ad Usum Fabricae, realizada no Meeting de Rímini de 2012, apresentou a mostra sobre a construção do Duomo, a Catedral de Milão, a detentos das diversas alas. O título em latim remonta à inscrição que era usada enquanto se transportavam materiais para a construção das catedrais: para uso na fábrica.
A iniciativa era um desejo de Encontro e Presença, uma associação de voluntários ativa em algumas prisões de Milão. Tudo nasceu do diálogo entre alguns voluntários e um jovem detento a quem contaram sobre a exposição. Ali se despertou interesse, curiosidade, mas sobretudo uma esperança: sempre é possível recomeçar e construir.
A exposição contava sobre pessoas às quais, vivendo o ordinário, aconteceu o extraordinário. Não “santinhos”, mas prostitutas e bandidos. Pessoas que deram do pouco que tinham materialmente para a construção do Duomo.
Um detento não pode sair para ver uma exposição, mas a exposição pode ir até ele, pensaram os voluntários de Encontro e Presença. Com uma novidade: os próprios detentos poderiam ser os guias para seus companheiros de cela. Isto aconteceu entre 26 de outubro e 1º de novembro.

Barriga cheia e coração vazio. Mariella conduziu encontros nas diversas alas da prisão para os detentos que seriam os guias. Muitas perguntas e muita comoção ao ouvir as histórias grandes e humildes que se escondem por trás dos mármores do Duomo: “Havia pouco dinheiro naquela época, mas muita vontade de promover conhecimento e arte. O que mudou desde então? Quem poderia hoje construir catedrais?”, perguntou um detento. Mariella citou um dos painéis: “Hoje não construímos catedrais porque temos a barriga cheia e o coração vazio. Naquele tempo era o contrário porque, com o coração cheio, se constrói a vida”. Outro detento descobriu que hoje existe uma moderna fábrica: a Sagrada Família de Barcelona. É um canteiro ainda aberto, e por isso propôs uma coleta para sustento das obras. As perguntas sobre a Catedral prosseguiram: quem é o arquiteto? É uma das sete maravilhas do mundo? De onde vem o mármore para as estátuas?

As toalhas do altar. Uma jovem polonesa aprendeu que cada novo santo ocupa um lugar especial nas paredes da fachada. “Onde será colocada a estátua de João Paulo II depois da canonização?”, perguntou. Mariella lhe disse: “Não sei, mas esteja certa que contarei quando souber”. Outros detentos propuseram decorar a sala que hospedaria a exposição com toalhas de altar. “Mas, padre, hoje somos a filial do Duomo!” justificou-se com o capelão, surpreso pelo pedido.
Um dos voluntários de Encontro e Presença escreveu uma carta ao Papa Francisco contando a experiência da exposição e recebeu resposta: o Papa agradeceu, “exortando a testemunhar com coragem e vivo desejo a fé em Cristo Jesus, único Salvador que, apesar de todo limite humano, torna verdadeiramente livre e repleto de gratidão o coração do homem”, concedendo “uma especial Bênção Apostólica, estendendo-a, com boa vontade, aos detentos de San Vittore e às pessoas queridas”.

Alargar as grades. Ali aconteceu um movimento que parece alargar as grades uniformes da cela de uma prisão, onde o coração pode com facilidade se encolher. Um movimento que começou em primeiro lugar na própria curadora da exposição: “Não consigo tirar da cabeça e do coração as horas que passei em San Vittore. Com exceção de certos momentos da minha vida, não me lembro de ter vivido um dia tão doloroso e tão bonito, tão misteriosamente dramático. Sou grata a Cristo que me fez participar desta amizade que começa em San Vittore, assim como chegou na nossa vida”.
Já no primeiro diálogo com o jovem detento parece vislumbrar-se um indício da saudação do Papa Francisco no encontro nacional dos capelães das prisões italianas. “O Senhor não fica fora das celas, não fica fora das prisões, mas dentro, está ali. (...) Nenhuma cela é tão isolada a ponto de excluir o Senhor, nenhuma; Ele está ali, chora com eles, trabalha com eles, espera com eles”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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