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Passos N.155, Fevereiro 2014

MAGISTÉRIO

O Evangelho anuncia-se com doçura

por Papa Francisco

Homilia pela Festa do Santíssimo Nome de Jesus e em ação de graças por São Pedro Fabro.
Igreja de Jesus, Roma, 3 de janeiro de 2014


Ouvimos São Paulo nos dizer: “Tende em vós os mesmos sentimentos de Cristo Jesus: Ele tinha a condição divina, e não considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente. Mas despojou-se a si mesmo, e assumiu a condição de servo” (Fl 2, 5-7). Nós, jesuítas, queremos ser distinguidos com o nome de Jesus, militar sob a insígnia da sua Cruz, e isto significa: ter os mesmos sentimentos de Cristo. Significa pensar como Ele. Significa fazer o que ele fez e com os seus mesmos sentimentos, com os sentimentos do seu Coração.
O coração de Cristo é o coração de um Deus que, por amor, se “despojou”. Cada um de nós, jesuítas, que segue Jesus, deveria estar disposto a despojar-se de si mesmo. Somos chamados a este abaixamento: ser “despojados”. Ser homens que não devem viver concentrados em si mesmos porque o centro da Companhia é Cristo e a sua Igreja. E Deus é o Deus sempre maior, o Deus que nos surpreende sempre. E se o Deus das surpresas não estiver no centro, a Companhia desorienta-se. Por isso, ser jesuíta significa ser uma pessoa com pensamento incompleto, com pensamento aberto: porque pensa sempre olhando para o horizonte que é a glória sempre maior, que nos surpreende continuamente. E esta é a inquietude da nossa voragem. Esta santa e bela inquietude!
Mas, porque somos pecadores, podemos questionar-nos se o nosso coração conservou a inquietude da busca ou se ao contrário se atrofiou; se o nosso coração está sempre em tensão: um coração que não se relaxa, que não se fecha em si mesmo, mas que bate no ritmo de um caminho a cumprir juntamente com todo o povo fiel de Deus. É preciso procurar Deus para encontrá-lo, e encontrá-lo para procurá-lo ainda e sempre. Só esta inquietude dá paz ao coração de um jesuíta, uma inquietude também apostólica, que impede que nos cansemos de anunciar o kerygma, de evangelizar com coragem. É a inquietude que nos prepara para receber o dom da fecundidade apostólica. Sem inquietude somos estéreis.

Era esta inquietude que tinha Pedro Fabro, homem de grandes desejos, um outro Daniel. Fabro era um “homem modesto, sensível, de profunda vida interior e dotado do dom de estabelecer relações de amizade com pessoas de todas as categorias” (Bento XVI, Discurso aos jesuítas, 22 de abril de 2006). Contudo, era também um espírito inquieto, hesitante, nunca satisfeito. Sob a guia de Santo Inácio aprendeu a unir a sua sensibilidade irrequieta mas também dócil, diria requintada, com a capacidade de tomar decisões. Era um homem de grandes desejos: assumiu os seus desejos, reconheceu-os. Aliás, para Fabro, é precisamente quando se apresentam situações difíceis que se manifesta o verdadeiro espírito que move a ação (cf. Memorial, 301). Uma fé autêntica exige sempre um desejo profundo de mudar o mundo. Eis a pergunta que devemos nos fazer: nós também temos grandes visões e estímulos? Nós também somos audazes? O nosso sonho voa alto? O zelo nos devora (cf. Sl 69, 10)? Ou somos medíocres e nos satisfazemos com as nossas programações apostólicas de laboratório? Recordemo-nos sempre disto: a força da Igreja não habita em si mesma nem na sua capacidade organizativa, mas se esconde nas águas profundas de Deus. E estas águas agitam os nossos desejos e os desejos alargam o coração. É o que diz Santo Agostinho: rezar para desejar e desejar para alargar o coração. Precisamente nos desejos Fabro podia discernir a voz de Deus. Sem desejos nada se conclui e é por isso que se devem oferecer ao Senhor os próprios desejos. Nas Constituições diz-se que “se ajuda o próximo com os desejos apresentados a Deus nosso Senhor” (Constituições, 638).

Fabro sentia o desejo verdadeiro e profundo de “ser dilatado por Deus”: estava completamente centrado em Deus, e por isso, em espírito de obediência, muitas vezes também podia ir a pé, por todas as partes da Europa, para dialogar com todos com doçura e anunciar o Evangelho. Mas pode-se pensar na tentação, que talvez nós possamos ter e que tantos sentem, de relacionar o anúncio do Evangelho com golpes inquisitórios, de condenação. Não, o Evangelho anuncia-se com doçura, com fraternidade, com amor. A sua familiaridade com Deus o levava a compreender que a experiência interior e a vida apostólica caminham sempre juntas. Escreve no seu Memorial que o primeiro movimento do coração deve ser o de “desejar o que é essencial e originário, ou seja, que o primeiro lugar seja deixado à solicitude perfeita de encontrar Deus nosso Senhor” (Memorial, 63). Fabro sente o desejo de “deixar que Cristo ocupe o centro do coração” (Memorial, 68). Só estando centrados em Deus é possível orientar-se rumo às periferias do mundo! E Fabro também viajou ininterruptamente nas fronteiras geográficas a ponto que dele se dizia: “parece que nasceu para não se deter em parte alguma” (MI, Epistolae I, 362). Fabro sentia-se arder pelo desejo intenso de comunicar o Senhor. Se nós não tivermos o seu mesmo desejo, então precisamos nos deter em oração e, com fervor silencioso, pedir ao Senhor, por intercessão do nosso irmão Pedro, que nos fascine de novo: aquele fascínio do Senhor que levava Pedro a todas estas “loucuras” apostólicas.

Nós somos homens em tensão, somos também homens contraditórios e incoerentes, pecadores, todos. Mas homens que querem caminhar sob o olhar de Jesus. Nós somos pequenos, somos pecadores, mas queremos militar sob a insígnia da Cruz na Companhia que se distingue com o nome de Jesus. Nós que somos egoístas, queremos, contudo, viver uma vida agitada por grandes desejos. Renovemos então a nossa oblação ao Eterno Senhor do universo para que com a ajuda da sua Mãe gloriosa possamos querer, desejar e viver os sentimentos de Cristo que se despojou a si mesmo. Como escrevia São Pedro Fabro: “Nunca procuremos nesta vida um nome que não se relacione com o de Jesus” (Memorial, 205). E peçamos a Nossa Senhora para podermos estar com o seu Filho.

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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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