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Passos N.180, Maio 2016

MAGISTÉRIO

“Deus Pai, acordai-nos do sono da indiferença”

por Papa Francisco

Visita a Lesvos (Grécia). Encontro com as autoridades e a população. Memória das vítimas das migrações. Sábado, 16 de abril de 2016

Senhor Chefe do Governo, Distintas Autoridades, Queridos irmãos e irmãs! Desde que Lesbos se tornou uma meta para tantos migrantes à procura de paz e dignidade, senti o desejo de vir aqui. Agradeço a Deus que me concedeu fazê-lo hoje. E agradeço ao Senhor Presidente Paulopoulos por ter me convidado, juntamente com o Patriarca Bartolomeu e o Arcebispo Hieronymos.
Quero expressar a minha admiração ao povo grego, que, apesar das graves dificuldades que enfrenta, soube manter abertos os corações e as portas. Muitas pessoas simples puseram à disposição o pouco que tinham, partilhando-o com quem estava privado de tudo. Deus recompensará esta generosidade, tal como a doutras nações vizinhas que, desde os primeiros momentos, receberam com grande disponibilidade inúmeros migrantes forçados.
E abençoada é também a presença generosa de tantos voluntários e numerosas associações que, juntamente com as várias instituições públicas, prestaram a sua ajuda, e continuam a fazê-lo, expressando de modo concreto uma proximidade fraterna.

Quero hoje, perante uma situação tão dramática, lançar de novo um veemente apelo à responsabilidade e à solidariedade. Muitos refugiados, que se encontram nesta ilha e em várias partes da Grécia, estão a viver em condições críticas, num clima de ansiedade, medo e por vezes de desespero, devido às limitações materiais e à incerteza do futuro.
As preocupações das instituições e da população, aqui na Grécia como em outros países da Europa, são compreensíveis e legítimas. Mas nunca devemos esquecer que, antes de ser números, os migrantes são pessoas, são rostos, nomes, casos. A Europa é a pátria dos direitos humanos, e toda a pessoa que ponha o pé em terra europeia deverá poder experimentá-lo; assim se tornará mais consciente de dever, por sua vez, respeitá-los e defendê-los. Infelizmente alguns, incluindo muitas crianças, nem sequer conseguiram chegar: perderam a vida no mar, vítimas de viagens desumanas e sujeitos às tiranias de ignóbeis algozes.
Vós, habitantes de Lesbos, dais provas de que nestas terras, berço de civilização, ainda pulsa o coração de uma humanidade que sabe reconhecer, antes de tudo, o irmão e a irmã, uma humanidade que quer construir pontes e evita a ilusão de levantar cercas para se sentir mais segura. Na verdade, em vez de ajudar o verdadeiro progresso dos povos, as barreiras criam divisões e, mais cedo ou mais tarde, as divisões provocam confrontos.
Para sermos verdadeiramente solidários com quem é forçado a fugir da sua própria terra, é preciso trabalhar para remover as causas desta dramática realidade: não basta limitar-se a resolver a emergência do momento, é preciso desenvolver políticas de amplo respiro, não unilaterais. Em primeiro lugar, é necessário construir a paz nos lugares aonde a guerra levou destruição e morte e impedir que este câncer se espalhe para outros lugares. Para isso, é preciso opor-se firmemente à proliferação e ao tráfico das armas e às suas teias muitas vezes ocultas; há que privar de todo e qualquer apoio quantos perseguem projetos de ódio e violência. Por outro lado, promova-se incansavelmente a colaboração entre os países, as Organizações Internacionais e as instituições humanitárias, não isolando mas sustentando quem enfrenta a emergência. Nesta perspectiva, renovo os meus votos de bom sucesso à I Cimeira Humanitária Mundial que terá lugar, em Istambul, no próximo mês.

Tudo isso só se pode fazer em conjunto: juntos, podemos e devemos procurar soluções dignas do homem para a complexa questão dos refugiados. E, nisto, é indispensável também a contribuição das Igrejas e das Comunidades Religiosas. A minha presença aqui, juntamente com o Patriarca Bartolomeu e o Arcebispo Hieronymos, é testemunho da nossa vontade de continuar a cooperar para que este desafio epocal se torne ocasião, não de confronto, mas de crescimento da civilização do amor.
Queridos irmãos e irmãs, perante as tragédias que se abatem sobre a humanidade, Deus não permanece indiferente, não está longe. É o nosso Pai, que nos sustenta na construção do bem e rejeição do mal. E não só nos sustenta, mas em Jesus mostrou-nos o caminho da paz: face ao mal do mundo, fez-Se nosso servo e, com o seu serviço de amor, salvou o mundo. Este é o verdadeiro poder que gera a paz, só quem serve com amor, constrói a paz. O serviço faz cada um sair de si mesmo para cuidar dos outros: não deixa que as pessoas e as coisas caiam em ruína, mas sabe guardá-las, superando o espesso manto da indiferença que ofusca as mentes e os corações.
A vós, eu digo obrigado, porque sois guardiões da humanidade, porque cuidais ternamente da carne de Cristo, que sofre no menor dos irmãos, faminto e forasteiro, que acolhestes (cf. Mt 25, 35).


ORAÇÃO

A prece do Santo Padre Francisco em memória das vítimas das migrações

Deus de misericórdia,
pedimo-Vos por todos os homens, mulheres e crianças,
que morreram depois de ter deixado as suas terras
à procura duma vida melhor.

Embora muitos dos seus túmulos não tenham nome,
cada um é conhecido, amado e querido por Vós.
Que nunca sejam esquecidos por nós, mas possamos honrar
o seu sacrifício mais com as obras do que com as palavras.

Confiamo-Vos todos aqueles que realizaram esta viagem,
suportando medos, incertezas e humilhações,
para chegar a um lugar seguro e esperançoso.

Como Vós não abandonastes o vosso Filho
quando foi levado para um lugar seguro por Maria e José,
assim agora mantende-Vos perto destes vossos filhos e filhas
através da nossa ternura e proteção.

Fazei que, cuidando deles, possamos promover um mundo
onde ninguém seja forçado a deixar a sua casa
e onde todos possam viver em liberdade, dignidade e paz.

Deus de misericórdia e Pai de todos,
acordai-nos do sono da indiferença,
abri os nossos olhos às suas tribulações
e libertai-nos da insensibilidade,
fruto do bem-estar mundano e do confinamento em nós mesmos.

Dai inspiração a todos nós, nações, comunidades e indivíduos,
para reconhecer que, quantos atingem as nossas costas,
são nossos irmãos e irmãs.

Ajudai-nos a partilhar com eles as bênçãos
que recebemos das vossas mãos
e a reconhecer que juntos, como uma única família humana,
somos todos migrantes, viajantes de esperança rumo a Vós,
que sois a nossa verdadeira casa,
onde todas as lágrimas serão enxugadas,
onde estaremos na paz, seguros no vosso abraço.



 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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