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Passos N.98, Outubro 2008

EXPERIÊNCIA - PERU | ANDREA AZIANI

Uma vida de doação total

por Biaggio*

Carta de um amigo

Algumas semanas antes da minha partida para Lima, no Peru, para trabalhar na universidade católica “Sedes Sapientiae”, pedi a Carlo Wolfsgruber que me ajudasse a formular uma frase, um ponto ou uma oração para viver seriamente o trabalho ultramarino. “Olha o que há de santo em Andrea”, foi a sua resposta surpreendente. Eu nuca havia visto Andrea Aziani, nem conversado com ele. A “santidade” de Andrea já atravessava os confins, mais pelas “estranhezas” que se contavam deles que outra coisa. Quando cheguei ao aeroporto de Lima, junto com Tina e Dado, esperava-me um fulano que sacudia um chapeuzinho gritando o meu nome, em meio a uma centena de pessoas. Foi assim que conheci Andrea pessoalmente. A experiência de sete anos de vida comum na Casa é, certamente, inesquecível. A paternidade a mim demonstrada por Andrea é a graça mais comovente que o Senhor me deu durante aquele período. Vêm-me à mente muitos episódios alegres, divertidos, junto a momentos do mais agudo testemunho. Todos os domingos, ao meio-dia, voltando da missa e antes do almoço, Andrea gostava de colocar a música a todo volume. A escolha era bem variada: se passava da música napolitana a Beethoven, do jazz aos cantos populares dos Inti Illimani (adorava a figura de Che Guevara!). Não evitava nada. Tudo era abraçado por aquele olhar amante do destino do outro. Uma noite, ao jantar, tínhamos muitos hóspedes, entre os quais os sacerdotes italianos da Universidade. Um deles gostava muito de cerveja. Discretamente, avisei Andrea de que a bebida tinha acabado. Também discretamente, Andrea levantou-se da mesa, subiu a escada apressadamente, foi ao supermercado correndo, sem dúvida, e voltou depois de uns dez minutos, com uma enorme caixa de cerveja gelada. Voltou esgotado, mas sorridente.
O que sempre me questionava sobre Andrea era o seu modo de viver a realidade. Quando reencontrei Carlo Wolfsgruber, um ano depois, à sua pergunta de qual era a experiência que mais significativamente estava sinalizando a minha vida em Lima, respondi: “Andrea. Estou aprendendo com ele o que Dom Giussani quer dizer ao falar de caridade”. O episódio da cerveja é um exemplo de uma caridade vivida silenciosamente e na generosidade absoluta. Mas, uma caridade jamais reduzida a sentimento passageiro. Era uma caridade com um juízo. Mesmo severo, se fosse necessário. Este aspecto da caridade, absolutamente concreto, e desejoso de que Cristo, Dom Giussani, que a experiência de paternidade da Igreja fossem reconhecidos, vividos e amados, animava os seus instantes, mesmo à noite, quando dormia – como muitos sabiam, como uma “lenda” – pouquíssimas horas. Uma caridade humana, não pegajosa. Uma caridade “ambulante” que podia também se cansar e enraivecer-se. Mas, neste caso, pedia ajuda, timidamente: “por favorzinho”, dizia, imitando a cadência peruana de quem mendiga. A caridade de Andrea o obrigava a olhar a realidade com suprema atenção: a Bósnia, o furacão na Flórida, os conflitos do Oriente Médio, a tragédia do tsunami, a situação de extrema pobreza de zonas andinas como Huancavelica. Tudo era digno de ser pedido ao Mistério. E a caridade se transformava em cultura. Andrea organizava momentos de estudo e reflexão, como o cinema do sábado e as conferências sobre problemas preocupantes na Universidade. A caridade era, de verdade, um Acontecimento que rompia as engrenagens com as quais se vive a rotina cotidiana da vida. Em uma reunião da Casa, Andrea tinha dito: “É de pensar que tudo é Acontecimento. Mas nem tudo é Acontecimento do mesmo modo. É verdadeiro que o que se apresenta continuamente não é nunca adequadamente excepcional. Que estranha contradição! Mas se alguém não está na posição de espera, de pedido, não acontece nunca, não pode mais acontecer nada de novo, nem mesmo nas coisas menores ou banais. A vida da Casa me ajuda a levar mais a sério os meus pedidos, as minhas exigências” (8 de julho de 2001). E em outro momento: “Há momentos em que alguém não deseja nada. E há vezes nas quais, nas coisas de sempre se descobrem detalhes. São pepitas de ouro no lodo. Uma descoberta nova de tudo. Esta é a dinâmica de como o desejo na vida cresce sempre mais. E o verdadeiro desejo é a santidade. Uma pessoa quase nunca se coloca o desejo da santidade. Se a liberdade é a satisfação do meu desejo mais profundo, então os votos de castidade, pobreza e obediência são a verdadeira forma, absoluta, de viver a liberdade” (17 de julho de 2001). “Cada instante é relação com o Infinito. E, por isso, nada se perde. Devemos olhar a nós mesmos com gratidão. A recusa da fé ou a confusão entre senso religioso e fé tem origem no fato de que se recusa, na verdade, o método de Deus. Embora partindo do senso religioso, a cultura moderna continua atacando a fé. O encontro com Cristo, ao contrário, é um fluxo contínuo de novidade. Este fluxo é assegurado pela eternidade. O encontro na vida cotidiana, nas coisas de todo dia, aprendendo a estimar o outro, na proximidade, porque existe. A proposta de dom Giussani é decisiva para toda a História do mundo, daqueles com quem vivemos no trabalho, dos vizinhos da casa, etc.” (22 de julho de 2001).
Com sua vida, Andrea testemunha qual é a responsabilidade pessoal de cada um de nós. Uma iniciativa pessoal frente à vida, ao trabalho, à Casa, a partir do fluxo do carisma de Dom Giussani e do Movimento.

Biaggio

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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