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Passos N.192, Junho 2017

SOCIEDADE | COLÔMBIA

Construir dentro da história

por Alessandra Stoppa

O Movimento Comunhão e Libertação está presente na América Latina há mais de 50 anos. Nesse período, foi fundamental para a vida de uma infinidade de pessoas nas universidades, nas periferias pobres e nos lugares mais remotos de vários países. Em recente assembleia, o testemunho de como é possível, hoje, enfrentar as dificuldades à luz do carisma de Dom Giussani

Juan Sebastián Vargas, de Bogotá, fala sobre a Colômbia

Um conflito de mais de cinquenta anos. Com 265 mil mortos e 8 milhões de vítimas (transferências forçadas, mutilações, homicídios, sequestros, recrutamento de crianças, expropriação de terras, agressões sexuais, atentados). A guerra civil colombiana tem as suas raízes em 1948: o assassinato do líder político Jorge Eliécer Gaitán leva os dois partidos então no poder a armar-se um contra o outro. O conflito explode em 1964, quando nascem as forças da guerrilha de extrema esquerda, entre as quais as Farc, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. “Anos e anos de violências, tornadas mais sangrentas a partir do nascimento do narcotráfico, o grande financiador do conflito”, diz Juan Sebastián Vargas.
No ano de 2012 começam as negociações de paz com as Farcs, promovidas pelo atual presidente Juan Manuel Santos, “segundo o qual as tentativas de diálogo jamais funcionaram por três razões: a fraqueza das forças militares; a insuficiência do apoio internacional; a posição dos chefes da guerrilha, não convictos de que viver em paz era melhor”. Quando as forças militares se tornaram mais fortes, quando cresceu o apoio internacional – em particular da Venezuela –, e foram assassinados muitos chefes da guerrilha, então as Farcs se convenceram de que precisavam dialogar.
A história “pública” do diálogo começa no dia 24 de agosto de 2016: foram publicadas as 297 páginas do acordo e foi fixado o referendo popular de 2 de outubro, para aprová-lo. A escolha entre o “sim” e o “não” era uma dificuldade para todos: “O primeiro fator de confusão era a dificuldade técnica do texto, que gerou muitas análises. E as análises, por sua vez, geraram divisão”, relata Vargas. Divide-se a opinião pública, o mundo eclesiástico, as famílias. “Havia um clima de desconfiança em relação ao Governo”, conta Vargas, “além da preocupação com alguns conteúdos e as possíveis consequências dos acordos. Para a nossa comunidade, o fato decisivo foi a visita do Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado vaticano, que falou do referendo como uma oportunidade que não se podia perder para começar um novo modo de relacionamento. Assim, muitos de nós decidimos votar sim”. E, para o desapontamento de todos, venceu o “não”.

Depois do voto. Escreve, após o resultado, o jesuíta Francisco de Roux, um dos participantes das negociações: “Esse resultado pode ser o caminho que nos leva a superar o mais profundo dos nossos problemas, que somos nós mesmos: divididos, incapazes de nos unirmos em torno das questões importantes, conscientes de que a nossa animosidade e agressividade, que se expressam na política, na mídia, nas famílias, têm consequências letais. (...) Devemos aceitar mudar, com realismo e humildade. Somos parte do problema e a crise de hoje aumenta a nossa responsabilidade de ser parte da solução”. Partindo dessas palavras, Vargas relata ter percebido que, discutindo sobre o voto, ele próprio levantava o muro: “Eu por primeiro tenho necessidade de aprender a dialogar. E gostaria de entender como se identifica o verdadeiro diálogo”.
Pe. Carrón evidencia uma primeira coisa: “Nós acreditamos que recuperamos a certeza quando, com toda a nossa força, agarramos quase que instintivamente uma verdade monolítica. Mas isso leva a uma incapacidade de entrar em relação com posições diferentes das nossas e de poder ver aqueles aspectos da realidade que permitem construir ao longo da história”.
O diálogo pode ser tão falho quanto se queira, mas “a urgência é ter uma abertura. Tanto na vida cotidiana quanto na política. Bento XVI lembrava que a política é o lugar de compromisso, um acordo para salvar, nesse momento, o melhor possível”. Mas quem está na condição de estabelecer o diálogo? “Quanto mais você estiver incerto, inseguro, tanto mais você se tornará rígido, incapaz de compreender, conhecer, encontrar um caminho. Pensamos que a coisa mais eficaz é sermos rígidos, mas é o contrário! Quem tem a maior certeza tem mais segurança, é mais aberto. A certeza não é imposta”. A reinserção social de milhares de combatentes será difícil: “Que certeza é preciso ter para aceitar o risco deste processo! Mas se ele não for aceito, o conflito permanecerá”. É essencial aquilo que disse De Roux: “O problema somos nós mesmos”, continua Pe. Carrón: “É preciso um sujeito disposto a mudar, porque, se o homem não muda, os conflitos se reproduzem”. Assim, o desafio é: “Quem na sociedade colombiana pode gerar pessoas capazes de superar o conflito?”. Hoje que os conflitos se multiplicam, “a experiência daqueles que dão passos em direção ao outro é uma riqueza para todos. A Igreja, determinada apenas pelo encontro com Cristo, pode ser a verdadeira educadora para a paz”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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