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Passos N.86, Setembro 2007

DESTAQUE - Emergência Educativa

“Só Educa Quem se Deixa Educar”

por Dom Filippo Santoro

Palestra proferida por Dom Filippo Santoro, Bispo Diocesano de Petrópolis, no V Encontro Nacional de Educadores, ocorrido em 14 e 15 de julho de 2007, na Universidade Católica de Petrópolis, promovido Movimento Comunhão e Libertação.


O tema do nosso encontro de hoje é a formação do educador. O canto “Trilhares”, apresentado minutos atrás, referia-se à areia da praia e às estrelas do céu que podem simbolizar a promessa feita por Deus a Abraão de ter uma descendência mais numerosa que as estrelas do céu e que a areia do mar. A promessa feita a cada educador, é uma promessa de fecundidade muito grande naquele céu que é o nosso coração e naquela areia que é a vida dos nossos educandos. O que nos dá esperança é poder testemunhar que, mesmo em meio às muitas dificuldades e às emergências do nosso tempo, a promessa se realiza.

Abordaremos hoje a figura do educador. No início, apresentarei sinteticamente a temática “Só educa quem se deixa educar” e, em seguida, o nosso amigo Fabrizio Foschi aprofundará em termos mais analíticos a formação do educador.
Enquanto no Rio de Janeiro acontecem os jogos do Pan, celebramos o nosso Pan da Educação; não ganharemos medalhas, mas experimentaremos a beleza de uma promessa que, no tempo, se realiza.


O desejo da verdade
O educador é alguém que deseja a verdade para a sua própria vida. Não se educa se o ponto de partida da minha ação não for o desejo de aderir àquilo que é verdadeiro e que constitui a luz que ilumina a minha vida. Parece que estamos falando de uma língua desconhecida no mundo cultural de hoje, pois ninguém fala da verdade; cada um fala da sua verdade e tudo é fragmentado no maior relativismo. O coração, porém, percebe que existe algo definitivo no meio das mil contradições e fragmentações da experiência. No fragmento desejamos algo estável e firme. É isso que nos dá respiro: a intuição de algo que seja definitivo e para sempre. O educador é aquele que deseja a verdade para si e ajuda os educandos a buscá-la. Somos chamados a ser companheiros dos nossos educandos sejam eles crianças, adolescentes ou adultos. Ser companheiro significa ajudar quem está comigo a aderir àquilo que é verdadeiro e a não ser cúmplice e vítima da mentira, da falta de sentido, do instinto imediato e do lucro como supremos critérios do nosso agir; todos elementos que observamos na atual sociedade e que se encontram nos supremos poderes que governam o nosso País. Os desastres morais nascem da eliminação do ponto de referência comum que é a verdade. O educador é aquele que busca a verdade e ajuda os outros a dar um passo para encontrá-la e abraçá-la. Desse modo, o educador ajuda a si mesmo. A ajuda que posso dar à minha vida é quando eu busco a verdade e convido os outros a aderir a ela. Quando os meus alunos e os meus amigos aderem à verdade, realizam-se a minha pessoa e a minha vocação de educador.

Na busca da verdade é necessário derrubar um grande muro de indiferença que muitas vezes nos separa dos nossos alunos. Temos todos presente o que acontece na nossa experiência: começamos as aulas e os meninos parecem distantes. Depois da primeira resistência, quando se fala do eu, da verdade, da felicidade, daquilo que dá significado e valor à nossa vida, eles começam a se entusiasmar. Na aula da semana seguinte, esta capa de indiferença se manifesta novamente. Precisa recomeçar a batalha para ver o que é mais forte – o que está dentro de nós ou a indiferença Parece que falar da verdade seja algo que está nas nuvens e que não tenha nada a ver com a vida. Pelo contrário, a verdade como afirma Santo Agostinho - é aquilo que mais o coração deseja. Esta é uma batalha cotidiana e, aos poucos, dia após dia se derruba este muro de indiferença. É necessário sempre recomeçar, porque a batalha da verdade é sempre nova e vale a pena. Embora os inimigos sejam muitos, possuímos muitos aliados e o primeiro é o coração do homem que se pacifica na experiência do verdadeiro e encontra alento para recomeçar a luta.


O valor da nossa humanidade
Para educar é necessário ser uma pessoa viva. A educação não é transmissão de uma teoria ou de uma técnica, ou de noções que não têm nada a ver com a minha vida. É necessária uma pessoa viva, que usa sua consciência, sua sensibilidade e toda a própria humanidade. O recurso maior na educação é a nossa humanidade, a vida de cada um de nós, com seus problemas, suas dificuldades e com aquela paixão pela verdade, pela sua realização que torna o seu encontro com os alunos um acontecimento, ou seja, um encontro humano. Toda a nossa sensibilidade, toda a nossa humanidade é provocada no relacionamento educativo. Somos despertados, provocados pelas respostas dos alunos, como também somos questionados pela sua primeira reação de apatia ou de indiferença. Tudo nos provoca, seja no seu aspecto positivo, como negativo. Na ação educativa, a batalha está perdida não quando os alunos não respondem como queríamos, mas quando está ausente, resignada ou apática a nossa humanidade. Mas para isso é preciso algo que nos desperte continuamente e que invista em primeiro lugar a nossa pessoa. É preciso um mestre que nos abra ao horizonte do destino; assim a barreira da indiferença se supera e cresce a paixão nos nossos relacionamentos educativos.


A realidade
O primeiro fator que educa é a realidade. Esta é uma grande intuição do Mons. Luigi Giussani, fundador do Movimento Comunhão e Libertação. Não são os discursos que nos colocam em movimento. O que educa é a realidade, é a circunstância com a qual você dá se depara, se embate, especificamente aquela realidade misteriosa que é a humanidade dos jovens. A realidade é aquele grande elemento que nos desperta, que nos provoca, que nos educa, que nos faz viver, que nos faz responder a esta exigência de vivacidade e de verdade. A realidade não é uma condenação, mas uma promessa, uma provocação. Da mesma forma acontece quando despertamos e abrimos os olhos de manhã. Estamos fechados ou abertos diante da realidade. Alguns dias atrás, na data do meu aniversário, pensava nos anos que vão passando... e depois de ter ficado um pouco assustado, abri a janela e vi a realidade que me provocava; vi os dons recebidos durante todos estes anos, um belíssimo e grande pinheiro na minha atual residência, os rostos dos meus amigos e o crucifixo pendurado no meu escritório. A realidade me provocava não me deixando apenas correr atrás dos meus pensamentos. Na própria realidade existe o critério que vem ao meu encontro e que me remete ao significado; toda a ação educativa é a arte que me ajuda a descobri-lo. A realidade é a nossa grande mestra que educa o coração e não o deixa perdido.


A ideologia
Uma grande inimiga de todas estas coisas é a ideologia que reveste como uma capa de chumbo a busca da verdade. “Deixa para lá este negócio da verdade, do amor, da adesão ao significado; não vale a pena! Isso não vai durar!”. A ideologia nos leva a entrar na realidade e nos relacionamentos cheios de ceticismo; céticos diante de tudo, tendo como único critério o interesse mutante do momento, que no momento seguinte já não vale mais. O ceticismo é esta doença que ameaça qualquer relacionamento e nos afunda no mar da banalidade. Anos atrás, ouvi Dom Giussani fazer este exemplo para entender o que é a liberdade: ser livre é desejar ser como uma planta bem grande, plenamente desenvolvida em todas as suas potencialidades. O grande pinheiro da minha casa. O contrário da liberdade é cortar o crescimento daquela planta, condenando-a a ficar encolhida e mesquinha. A liberdade é a plenitude do nosso ser. A ideologia é o cortar as minhas potencialidades, eliminando da minha vida aquilo que é o respiro, o significado e a abertura do presente: o Infinito. Assim, o ceticismo me afasta da realidade e da possibilidade de me realizar plenamente. E este quadro se complica por causa dos sofisticados instrumentos da propaganda e dos mass media, da televisão, que muitas vezes de propósito, ignoram, quando não combatem, esta busca da verdade, da certeza e da nossa dignidade plena.


A “emergência educativa”
A V Conferência de Aparecida aprofunda este tema ao tratar da emergência da educação: “este ceticismo destrói as tradições culturais de um povo”. No nº 39 está algo muito importante: “As nossas tradições culturais não se transmitem de uma geração a outra com a mesma fluidez que no passado”.

No passado, uma cultura se transmitia com fluidez – os pais aos filhos, os educadores aos educandos. Era uma comunicação de um acervo de valores e de significados. Agora não se transmite esta riqueza cultural de uma geração a outra. Isso afeta, inclusive, o núcleo mais profundo de cada cultura constituída pela experiência religiosa. Não se transmite a experiência religiosa, o senso religioso do homem que é relação com a verdade, que é relação com o mistério.

Estamos diante de uma emergência educativa; não estamos em tempos de paz: a cultura não se transmite mais com fluidez; as novas gerações não assimilam o valor e nem tem entusiasmo, às vezes, por causa aquele ceticismo, e da eliminação do valor do passado. Por que Aparecida fala de emergência educativa na América Latina e no Caribe? O Documento Final responde: “Por causa de reformas educacionais centradas prevalentemente na aquisição de conhecimentos e habilidades e denotam um claro reducionismo antropológico, já que concebem a educação preponderantemente em vistas da produção, da competitividade e do mercado” (328). A estas reduções podemos acrescentar mais uma outra palavra mágica, que é apresentada como a solução de todos os problemas: a educação à cidadania. De fato, não aborda o problema fundamental, porque ignora toda a questão antropológica do significado da vida, do seu destino, do valor da solidariedade e da paz.

A Conferência de Aparecida também afirma que nas propostas educativas dos nossos países se introduzem freqüentemente fatores contrários à vida e à sua dignidade desde o nascimento da pessoa até o seu fim natural. Vejam a problemática do aborto considerado apenas como problema de saúde pública, quando é a manifestação mais típica daquele reducionismo antropológico, que tem seu fundamento no ceticismo e na distância da verdade. Outra problemática é a da educação sexual, que, muitas vezes, é de fato apresentada como incentivo a uma sexualidade precoce, desvinculada de qualquer compromisso, separada do significado da própria vida e, menos ainda, do dom de si. Sobretudo nestes programas estatais não se educa a razão a descobrir todas as suas potencialidades, inclusive a sua abertura ao Infinito e o seu encontro concreto com o Mistério, que tem um nome e um rosto precisos. Muitas vezes, se propõe um Ensino Religioso puramente antropológico que não educa a descobrir o valor do Mistério e a segui-Lo com toda a liberdade. Igualmente este reducionismo antropológico não ajuda a superar a violência que tanto atormenta as nossas grandes cidades e que pode ser superada aprofundando o valor da dignidade de cada ser humano e é necessária a experiência da solidariedade. Igualmente, não se formam pessoas a terem atitudes e virtudes. Tudo é muito instintivo e fragmentário, sem uma continuidade na experiência do bem.

Estes são alguns temas que a Conferência de Aparecida nos oferece sobre a educação. Mas ela insiste, sobretudo, na necessidade de favorecer um processo de formação integral, que abraça todas as dimensões da pessoa - conhecimentos, atitudes, relação com a verdade, relação com o significado, relação com o mistério, relação com os outros, solidariedade -, mediante uma assimilação sistemática da cultura que faz parte do patrimônio de um povo. A cultura é algo que nos é dado, que nós recebemos, mas é também algo que temos que desenvolver enxertando o patrimônio do passado, com seus valores, no contexto atual. Desse modo, a cultura se faz educativa. Trata-se de um processo que comporta a valorização do passado, o impacto com o presente e a formação de um juízo crítico diante da provocação da realidade.


A experiência do “risco”
Nos encontros nacionais anteriores, analisamos a obra “Educar é um Risco”, de Mons. Giussani (cf. Passos, Agosto 2006, pp. 10-19). Essa obra é fundamental também na formação dos educadores, porque no relacionamento educativo, o fator essencial é a liberdade, e isso comporta sempre o risco ligado à decisão do outro e da sua adesão à verdade. De outro lado, sem esta dimensão do risco estaríamos diante de um processo mecânico e não diante de uma experiência humana. É necessário um grande respeito para a liberdade, sem se substituir à pessoa dos alunos e sem deixá-los à mercê de suas vontades imediatas. A liberdade com a qual o educador adere à verdade e a intensidade humana que ele experimenta constituem o incentivo para que o educando se desenvolva, e corra o risco da liberdade. E também a forma gratuita com a qual o educador se relaciona com tudo é o grande incentivo que atrai o educando a viver de uma forma livre e gratuita. O próprio Deus corre o risco quando nos cria livres e nos ama deixando a nós a liberdade de aderir ao seu amor imenso e gratuito. A grandeza do mestre se demonstra toda neste amor pela liberdade do discípulo, que, por sua vez, vive um vínculo de gratidão, de devoção e de afeição pelo seu mestre.

O diálogo educativo é um diálogo de liberdades onde o educador mostra como se escuta a voz da razão e como se procura resposta à questão do Destino que está presente no impacto com todas as circunstâncias da realidade. O educador mostra também como encontrou uma resposta e que ela muda toda a perspectiva com que aborda a trama da vida. E como a encontrou, sabe por experiência que o destino não nos deixou, caminha conosco e manifesta os sinais da sua presença.

O educador que se deixa educar na obediência a um caminho preciso pode propor aquilo ao qual está aderindo nas pequenas e nas grandes coisas. O educador educa quando segue o que dá resposta a sua sede ardente de felicidade e de verdade, quando atinge esta fonte que o sacia.


Educação como amizade
A educação culmina na experiência da amizade na qual o educador é companheiro na aventura da existência e na estrada ao destino. Não é verdadeiro amigo quem deixa fazer tudo o que o outro quer, abandonando-o à mercê das suas vontades imediatas. Educa quem indica o caminho rumo à realização plena de si. Também não é amigo quem liga as pessoas a si mesmo, como se ele fosse o significado pleno da vida. Somos amigos quando indicamos a fonte que satisfaz a nossa sede, e ensinamos a atingir a esta fonte inesgotável. Eu me educo atingindo constantemente esta fonte e sou muito mais feliz quando comunico ao outro o caminho que satisfaz esta imensa sede da nossa vida. A amizade culmina na experiência de comunhão, educa o mestre e o discípulo e, por isso, é uma graça inestimável.

Concretamente a amizade cresce quando seguimos. O educador verdadeiro é quem se joga neste seguir, aderindo pessoalmente ao significado sobre o qual se apóia a sua vida. Posso comunicar aquilo que eu vivo mostrando-lhe algo que eu mesmo sigo. Esta é a lógica do seguimento e da comunicação de si ao outro, que é contrária do mundo comercial onde estamos mergulhados, pois, quando conheço bem alguma coisa, a aproveito exclusivamente para mim, para a minha carreira e para o meu sucesso, sem deixar que os outros conheçam o meu segredo. Numa verdadeira experiência educativa, pelo contrário, ao descobrir algo grande, fico muito mais feliz quando comunico a riqueza encontrada para os outros. É um amor sem cálculos, sem condições e sem pretensões. Esta é a lógica da amizade, que tem sua raiz na reciprocidade do dom de si: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá sua vida por seus amigos” (Jo 15,31).

O caminho educativo é uma comunhão de destino, é um encontro de humanidades, segundo a totalidade de aspirações e exigências. Isso é possível porque o destino não ficou escondido, mas se tornou visível e amigo. O seu rosto permanece vivo na comunhão daqueles que o seguem e que formam o seu corpo. Este é o sujeito novo que torna visível uma educação integral diante de todos os aspectos da realidade, porque comunga o sentido do mundo. Nasce, portanto, uma comunhão de educadores que arriscam uma presença educativa no complexo mundo da educação.

Uma amizade assim nos educa constantemente e nos faz educadores.

 


Síntese final

Uma educação permanente
para prosseguir um trabalho comum


Indicações conclusivas do V Encontro Nacional de Educadores apresentadas por Dom Filippo Santoro no dia 15 de julho de 2007


O centro da nossa reflexão foi a figura do educador: perguntamos: O que nos permite ser permanentemente educados? O que permite uma educação permanente? Indico três coisas:

Em primeiro lugar, a natureza do nosso coração, que em si mesmo não se conforma com as coisas mesquinhas e sufocantes; quer sempre crescer. Nos educamos se realmente prestamos atenção ao nosso coração, se não o deixamos sepultado. Se nós, como fala o Papa Bento XVI, acolhemos o desafio de dilatar a razão sem ceder a todos os reducionismos que a querem sufocar no âmbito restrito do conhecimento sensível, considerando o método científico como o único que explica a realidade toda. Sabemos que as dimensões do coração são mais amplas que as dimensões matemáticas e científicas. Por isso, somos educados quando escutamos a grandeza do nosso coração e o ímpeto verdadeiro da nossa razão.

O outro elemento que nos educa constantemente é a presença entre nós de um fato cheio de verdadeira autoridade. A presença entre nós de uma autoridade “auctoritas” que permite o crescimento das dimensões da nossa vida. Algo que se insere no nosso caminho como a oferta de um abraço total que nos acolhe como somos e nos abre à perspectiva de um crescimento contínuo. É o encontro com um mestre verdadeiro que pode ser uma pessoa ou uma comunidade educativa. Assim era a presença de Cristo para os seus amigos; os apóstolos e os discípulos. Ele acolhia a totalidade da pessoa, inclusive o limite e o pecado, e o que é o mais extraordinário, a própria morte. Um abraço total ao presente e ao destino.

Tanto para os educadores como para os alunos é importante responder à pergunta “quem sou eu”, mas é muito mais decisivo responder a uma pergunta parecida: “Quem sou eu para você?” Esta é a pergunta secreta de todos, particularmente dos jovens: quem sou eu para você? Quem sou eu para você, pai? Quem sou eu para você, mãe? Quem sou eu para você, educador?... Quem sou eu para você? E qual era a resposta que o Senhor dava? “Eu sou tudo para você”. O educador é o eco deste tudo, a presença deste tudo, a presença de algo que não é fragmentado, parcial ou dividido. Nos educa o permanecer desta autoridade e deste abraço, mesmo no meio de todas as contradições e das mais diversas circunstâncias.


Uma amizade verdadeira

Segundo ponto: Como este fato que nos educa permanece entre nós? Como a beleza de um encontro bonito não se apaga e não some – “o que era doce acabou” –, como a banda que dá a todo mundo um momento de alegria, e depois passa? O permanecer é possível por meio de uma amizade que contenha algo maior que a minha boa vontade, o meu desejo, o meu interesse e o meu entusiasmo; algo que não termina, que carrega uma presença maior.

Uma amizade que carrega em si um significado amigo da minha vida, um significado grande como o destino. Uma amizade na qual está presente o sinal do destino. Esta amizade se torna o método, porque nela alguém me indica a fonte de algo novo, que me ilumina não só nas questões últimas, mas nos aspectos cotidianos. Uma nova abordagem de tudo, um novo coração pronto para viver a realidade, desde o significado das coisas até a técnica, desde as coisas mais profundas até as mais simples, de como preparar uma sala de aula, de como preparar uma boa acolhida. Algo parecido ao que aconteceu neste encontro nacional onde experimentamos uma forma bonita de estarmos juntos – com os cantos, com a liturgia, com o almoço, com a festa –, tudo com um significado que nos acompanha e que não termina com o encerramento do encontro, porque carrega entre nós uma presença maior.

Nesta perspectiva, indico dois aspectos. Isso é possível, seja na experiência dos educadores do Movimento Comunhão e Libertação, seja nos encontros que se realizam nas várias dioceses como acontece, por exemplo, aqui em Petrópolis e em outras cidades, onde vários educadores começam a se reunir dando vida à Pastoral da Educação. É uma amizade não restrita a um pequeno grupinho, mas aberta às várias experiências, a todos, porque é católica. Não queremos fazer grupinhos, mas desejamos viver um horizonte grande a partir da beleza do encontro feito nestes dias.


A nossa responsabilidade pública

No terceiro ponto dizemos que a nossa responsabilidade pública começa tendo clara a consciência daquilo que somos, a nossa identidade. O que comunicamos nestes dias tem uma dignidade cultural que pode ser proposta a todos, diante do mundo da educação e dos seus vários problemas. O horizonte do nosso trabalho é a sociedade, é aberta a todos, porque fala das exigências de todos os educadores e desenvolve a questão da razão, do coração do relacionamento educativo; do pleno desenvolvimento de professores e alunos. A nossa experiência tem uma dignidade cultural e comunica uma proposta cheia de esperança para todos. Trata-se de uma visão total, que nos habilita a dialogar com todos – com relativistas, construtivistas e indiferentes. Diante da confusão e da falta de pontos de referência, prevalece o desejo de nos relacionarmos com todos a partir de uma identidade clara e precisa, com a clareza daquilo que somos e daquilo que nós queremos comunicar. Assim, fortalecendo a nossa amizade, será possível intervir nas leis, pedindo melhores condições para os professores, e, sobretudo, ajudando a definir uma proposta educativa integral. Progressivamente, será possível entrar nos detalhes das leis, das problemáticas e das provocações que a realidade da educação nos oferece.

Nesta perspectiva, o aspecto mais importante é a experiência de unidade que forma um juízo novo. Isso torna possível, por exemplo, diante de uma batalha pública entrar com um juízo original sem se deixar determinar pela lógica dos sindicatos ou dos partidos das reivindicações (pois quando se trata de um aliado do governo há uma atitude, quando se trata da oposição, há uma outra), mas tendo um critério novo que parte da nossa experiência. Ou também diante de uma greve, qual atitude tomamos? Quais critérios seguir? O que privilegiar? Somos chamados a viver a nossa fé de forma original e não reativa.

Na Diocese de Petrópolis encontrei uma experiência interessante: uma rede de escolas diocesanas conveniadas com a prefeitura. Trata-se de um conjunto de obras que realizam o princípio da subsidiariedade. Estamos diante de uma maneira original de viver a identidade cristã, arriscando atividades educativas (creches e escolas) nas regiões mais necessitadas da cidade. Cito, também, o exemplo da implantação do Ensino Religioso confessional e plural no Estado do Rio de Janeiro. Sabemos que no Brasil existe um ensino religioso antropológico que no fim não dá em nada. Em São Paulo, os professores que ministram o Ensino Religioso são formados em História, em Filosofia, e em Psicologia, na sua grande maioria, e não devem ter muita simpatia pelo fenômeno religioso. No estado do Rio de Janeiro, conseguimos por meio de um trabalho cultural e depois político, a aprovação da referida lei. Depois, nasceu a idéia de oferecer os textos a partir da nossa experiência. Com um grupo de educadores preparamos a confecção de livros do Ensino Religioso de primeira a quarta séries. Os textos são um primor, seja pelas ilustrações do cartunista Ziraldo, seja pelo conteúdo, fruto de uma larga experiência educativa. Os dois primeiros volumes, As Obras de Deus e O Fato Cristão, já estão prontos, publicados pela Editora Vozes.

Este é nosso caminho: uma educação permanente que nos faz crescer numa amizade que permanece, e que cria obras originais no mundo da educação e na sociedade.

 

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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