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Passos N.89, Dezembro 2007

EXPERIÊNCIA - Educação / Giussani, Morin e Macintyre

Quem não tem medo dos mestres

por Carlo M. Fedeli

Enquanto na Espanha a reforma da Educação promove uma escola impessoal e estadista, em Turim (Itália), um Congresso discute a obra de três grandes autores que diante do problema “educação” ainda são atuais e originais


Organizado pelo Departamento de Ciências da Educação e da Formação da Universidade Estadual de Turim, aconteceu, na metade de outubro, o Congresso: “Giussani, Morin, MacIntyre. Três ícones da educação do futuro”.

O Congresso teve a participação de um público atento e qualificado. Pela manhã, o foco das palestras era sobre a peculiar relevância pedagógica da obra dos autores. À tarde, aconteciam debates, presididos por estudiosos de várias disciplinas e diferentes posições ideológicas. A análise da proposta educativa de Giussani foi feita pela espanhola Concepción Naval, da Universidade de Navarra e pelo reitor da Universidade de Macerata, Roberto Sani. A reflexão de Edgar Morin sobre o futuro do saber na era da comunicação global foi apresentada por Mauro Ceruti, diretor do departamento de Ciências da Educação da Universidade de Bergamo e por Luciano Gallino, um dos mestres da sociologia italiana. Por fim, as pesquisas de Alasdair MacIntyre sobre ética, comunidade e tradição foram ilustradas por Enrico Berti, um dos maiores especialistas mundiais em Aristóteles, e por Carla Xodo, da Universidade de Pádua.



A educação hoje: um verdadeiro “problema”

Uma evidência foi apresentada de várias maneiras em todas as sessões: a educação voltou a ser um “problema”, no sentido próprio do termo, algo do qual é preciso redescobrir a fisionomia autêntica, avaliando criticamente a maneira habitual de entendê-la e praticá-la. Se, de fato, no passado, ela poderia ser considerada um processo quase “natural” de transmissão de conhecimento ou de valores, hoje não é mais assim. Como experiência humana elementar, ela se mostra corrompida por uma crise radical que investe seus fatores constitutivos e torna incerto seu acontecimento.

Os três autores ajudam magistralmente a compreender o encaminhamento da crise. Giussani aponta o núcleo da dificuldade moderna do homem em fazer experiência da realidade: é aqui que a educação encontra a sua razão de ser como introdução ao real (e ao seu significado último) e como acontecimento de liberdade. Morin, criticando o especialismo e o fechamento setorial da cultura moderna, assinala a necessidade de promover uma “reforma do pensamento”, mediante a qual o conhecer volte a ser capaz de instituir nexos amplos e significativos entre os dados, as informações, as diversas articulações do saber e a realidade. MacIntyre evidencia a importância determinante dos fenômenos da comunidade e da tradição como origem, condição de possibilidade e base da educação. É por meio desses fenômenos que uma geração se comunica e compartilha conhecimento, saberes e valores com as outras.



Atualidade da concepção de Giussani

Na abertura da primeira palestra, Naval afirmou que “ler Giussani pode nos ajudar a entender mais profundamente a educação” como acontecimento que coloca em jogo a liberdade do homem e que, daqui, recebe a sua configuração mais verdadeira – seja como relação entre o ser humano e as coisas, seja como relacionamento entre quem educa e quem é educado. A reflexão de Giussani sobre esse núcleo essencial e nascente da educação foi, por isso, relacionada e comparada com a de numerosos outros pedagogos e estudiosos contemporâneos, entre os quais – para citar os mais conhecidos – Philippe Meirieu e Hannah Arendt.

Já Sani, contextualizou a obra do autor no debate cultural da segunda metade do século XX, sublinhando os elementos de consonância da sua leitura do problema educativo com a tradição pedagógica de inspiração personalista, que Giussani reelabora e reinterpreta “com resultados bastante originais, especificamente à luz dos desafios, em grande parte novos, que caracterizam o nosso presente”.

No debate vespertino foi observado que o livro Educar é um risco (Companhia Ilimitada, São Paulo, 2004; nde), mesmo sendo a exposição mais sistemática da reflexão de Giussani, não a exaure. Este faz referência a circunstâncias e eventos característicos dos anos sessenta, que ainda hoje são, sem dúvida, atuais – dos quais Giussani foi o primeiro a tomar consciência, como lembrou Onorato Grassi, professor de filosofia, em Roma. Aqui, fica o convite para estudar também historicamente o desenvolvimento de sua concepção, dando atenção às passagens que o levaram a um amadurecimento e que estão assinaladas nas introduções redigidas para cada nova edição do pensador.

Em relação ao método, a originalidade da reflexão de Giussani está toda, como observou ainda Sani, na sua gênese de “uma longa e complexa experiência amadurecida através do encontro com muitos jovens”. Quanto ao conteúdo, este parece consistir na feliz síntese entre a tensão consciente ao destino, que qualifica a existência humana, e a intensa paixão pela razoabilidade e pela liberdade que transparece em cada palavra dita ou escrita por Giussani sobre a educação, como, por exemplo, a comovida vibração, também autocrítica, com a qual ele respondia à pergunta “O senhor se considera um educador?”, citada por Naval na conclusão: “Bem consciente de que a intenção pode ser facilmente traída quando se tenta explicá-la completamente – respondia Dom Giussani –, se quero ser educador devo continuamente recobrar a sensibilidade e a atenção em relação a todo incômodo suscitado ou em relação a toda crítica, mesmo que apenas acenada, diante daquilo que digo ou faço”.

Nessa originalidade de método e conteúdo está a razão mais profunda do interesse por Giussani, despertado há alguns anos não só no âmbito da pedagogia e das teorias da educação, mas também em outros campos da pesquisa acadêmica.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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