Em meio à confusa situação educacional que caracteriza as escolas brasileiras e a elaboração de uma nova lei, algumas notícias parecem mostrar que o quadro negro da educação no Brasil não é tão escuro assim: a qualidade de ensino depende, em grande parte, da qualidade dos relacionamentos humanos. Na mesma linha, propomos a retomada de alguns trechos da palestra que o educador italiano Fabrizio Foschi, proferiu no Encontro Nacional de Educadores de 2006, tendo por base o livro Educar é um risco, de Luigi Giussani
A pessoa e o sentido do trabalho
As implicações de Educar é um risco estão no nível da unidade da pessoa. Estão no nível destas perguntas: onde eu estou quando faço o que faço? Onde está o meu verdadeiro eu quando tenho que lidar com meus alunos, minhas crenças, minhas crianças, meus filhos, minhas necessidades? [...] O trabalho a que todos os homens são chamados [...] consiste em modelar a realidade à luz de um objetivo, à luz de um significado. O trabalho do professor tem a mesma raiz. Todavia, o trabalho do professor tem uma responsabilidade a mais porque a realidade à qual ele se dirige não é inerte, é uma realidade viva, é o próprio homem, é o jovem que precisa ser educado [...] A primeira implicação [...] de Educar é um risco é um juízo sobre o trabalho. [...] A realidade inteira pede para ser reconhecida: os meninos, as suas histórias, os pais, as disciplinas que eu ensino, as leis que constituem a ordem da educação. Mas toda esta realidade não é reconhecida seu eu não afirmar um significado, se eu não viver um significado, [...] que é dado em uma companhia. A primeira implicação é esta indicação a viver a companhia como o lugar do significado.
(Fabrizio Foschi, A educação do humano, Revista Passos nº 75)
A educação tem sucesso onde há um Mestre empenhado
“A partir de outros relatórios tínhamos mesmo esse indicativo de que o gasto não influenciava diretamente o desempenho [dos alunos]. O que esse cruzamento [de dados] faz agora é reforçar o conceito de que um dos grandes problemas da educação é a falta de gestão”, diz a secretária da Educação do Distrito Federal, Maria Helena Guimarães de Castro. [...] “As melhores escolas que encontramos aqui foram as que o diretor estava empenhado. [...] Todas recebem o mesmo valor, mas o desempenho do aluno varia até 30% entre elas. E algumas das melhores estavam em bairros periféricos.”, afirma. As variantes percebidas pela secretária como diferenciais são: diretor estável, que independe da iniciativa da secretaria, controla faltas de professores e monitora o cumprimento das aulas.”
(Boa gestão e não orçamento maior determina boas notas, O Estado de S.Paulo, 25.mar.2007, p. A26)
Uma hipótese unitária
O trabalho do professor consiste no ensino. Em que consiste o ensino? [...] Pensemos no que significa a brincadeira para as crianças pequenas: significa ajudá-las a colocar ordem na sua realidade, que normalmente é feita de sinais ou de percepções desordenadas. Depois, há outros sinais na realidade, como os sinais lingüísticos, matemáticos ou físicos: significa ajudar os jovens a viver a realidade mediante um sentido unitário dos sinais. Esta é a raiz mais interessante do ensino, a mais profunda e a que mais entusiasma, [...] mas o que normalmente acontece entre nós, professores, é reduzir o ensino à gestão da atividade ou à discussão sobre leis gerais do sistema educativo. O professor faz o trabalho de ensinar, ou seja, de decodificar sinais que revelam um desígnio unitário, através de atividades mais especializadas e analíticas, conforme crescem os níveis de instrução. Na escola, seria preciso ensinar uma hipótese unitária que una todas as disciplinas. [...] De fato, a heterogeneidade excessiva dos programas impede a compreensão do sentido da escola. [...] Seria interessante que os docentes começassem a dialogar, pois mesmo se não se reconhecem na mesma idéia, juntos poderiam entender que o aluno não amadurece se não verificar o que lhe propõem. E a verificação do lhe propõem [...] só é possível quando há uma hipótese unitária que precede todas as atividades.
(Fabrizio Foschi, A educação do humano, Revista Passos nº 75)
Um uso adequado do tempo
“Um outro lugar comum que o cruzamento feito a partir dos dados do Saeb e na Prova Brasil questiona é a necessidade de turmas menores para um melhor aprendizado. Ao separar os fatores que interferem na nota dos alunos, o professor Naércio Menezes Filho descobriu que, mais do que o número de alunos em sala de aula, é o tempo que eles ficam na escola que faz a diferença. “Vemos claramente que os melhores alunos não estão nas menores classes, mas sim nas escolas onde há mais horas de aula”. A diferença está nas escolas com até cinco horas diárias e nas que ofereciam mais de cinco horas.”
(Melhores alunos ficam mais tempo na escola, O Estado de S.Paulo, 25.mar.2007, p. A26)
A qualidade dos professores e dos relacionamentos
O cenário, desolador do ponto de vista educacional, não impediu que a Escola Municipal Primeiro de Maio [localizada num beco da comunidade da Baixa do Petróleo, na periferia de Salvador, região que responde por 20% dos homicídios da cidade], de ser a única na capital baiana a ter destaque no estudo “Aprova Brasil, o direito de Aprender” do Ministério da Educação com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). [Os alunos da 4ª. série obtiveram notas de português e matemática acima da média nacional] “Nosso segredo é o engajamento, o compromisso e a capacidade dos professores”, afirma a diretora Simone Barbosa de Jesus, de 32 anos. “Não há outra explicação: não temos recursos para atividades extras, para investir em material didático diferenciado, para abrir a escola no fim de semana.” Simone conta que apenas dois professores não moram na comunidade, o que permite maior proximidade com os moradores. “Quando um aluno não vem à aula, o professor vai até a casa dele para saber o que está acontecendo”, diz ela, que mora a 200 metros da escola. [...] Os pais também contribuem com a instituição. A mãe de um aluno ensaia estudantes para o coral. Um outro pai, ex-aluno da unidade, ensina artes. [...] “O investimento [recebido em 2006] foi pequeno perto do que esses professores conseguiram”, reconhece o secretário municipal de Educação, Ney Campello.
(Onde havia tudo para dar errado, um bom exemplo, O Estado de S.Paulo, 25.mar.2007, p. A27)
Um movimento de professores
Na escola, é realmente necessário um movimento de professores consciente do que faz, consciente do significado do trabalho que desenvolve. Um movimento de pessoas livres também ajudará os alunos a viverem mais a sua liberdade.
(Fabrizio Foschi, A educação do humano, Revista Passos nº 75)
A liberdade de educação
O risco da educação nos recorda a dignidade pública da nossa obra, da nossa atividade. A maior batalha cultural que nos toca, como professores, é a batalha pela liberdade de educação. Liberdade de educação tem dois significados fundamentais. Primeiro, significa que ... é necessário que a paridade entre as escolas públicas e as escolas privadas seja reconhecida. [...] Outro aspecto do problema é a liberdade de ensino que toca o docente: [...] significa reconhecer ao docente a liberdade de se envolver com os próprios alunos, a liberdade de desenvolver uma hipótese educativa que chegue até seu plano de estudos. (Fabrizio Foschi, A educação do humano, Revista Passos nº 75)
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