Vai para os conteúdos

Passos N.115, Maio 2010

IGREJA - EDUCAÇÃO

Só grandes homens educam

por Giorgio Paolucci

Registro de um encontro que teve como tema a aventura da educação: “Uma emergência e uma missão diária”. Testemunhos de um professor, de um estudante e do presidente dos Bancos de Solidariedade, introduzidos por Julián Carrón. E a conferência do cardeal Angelo Bagnasco, o qual enfatizou que o eu “só se realiza dentro de um relacionamento”

“Só grandes homens podem formar outros grandes homens”. O cardeal Angelo Bagnasco cita as palavras de Antonio Rosmini ao concluir sua palestra para as dez mil pessoas que lotam o Palasharp de Milão, no encontro promovido por CL sobre a “aventura da educação”. E o pensamento dos presentes corre logo para um “grande homem”, Dom Giussani, que ajudou tanta gente a se tornar grande na fé. Foi denso em palavras e em experiências esse encontro que terminou dia 18 de março e que o Movimento promoveu como contribuição para a década pastoral convocada pela Conferência Episcopal Italiana (CEI) sobre Educação.
O presidente dos bispos italianos escolheu a obra do grande filósofo e teólogo do século XIX como fio condutor de seu discurso. Revisitando a obra dele, enfatizou que aquilo que, hoje, é denunciado (por todos) como “emergência” é, na verdade, uma missão diária. Missão que parte do reconhecimento da irredutibilidade da pessoa e do fato de que cada um de nós só realiza o próprio “eu” no seio de um relacionamento. “A educação não cria a pessoa, mas a encontra e a reconhece, ao estabelecer uma relação de autêntico serviço ao homem e à mulher a que se destina. Mas isso só será possível se aqueles que são chamados a educar possuírem o senso profundo da própria irredutibilidade e a capacidade de se relacionar, sabendo captar também na experiência de educadores outras possibilidades de crescimento e de amadurecimento para si próprios”.
Uma dinâmica educativa completa não pode deixar de se defrontar com as urgências da polis e se torna, então, um fator precioso de construção do bem comum. Fala Bagnasco: “O apelo à participação e ao envolvimento, mercadorias tão raras em nosso atual contexto, se não for apenas retórico exige energias e recursos importantes a serem destinados à educação das jovens gerações, as quais, embora tenham recebido a democracia já estabelecida, com muita frequência não parecem capazes de habitá-la e vivê-la tendo como referência os valores fundamentais da justiça, da liberdade e da paz”. É uma árdua tarefa encarnar e transmitir valores fortes e permanentes dentro de uma sociedade que sobrevive sob a marca da fragmentação e da desorientação, onde o relativismo se transforma numa falsa bússola. E onde, hoje em dia, muitos se questionam se vale a pena colocar-se a pergunta sobre o sentido da vida.
E, no entanto, o homem negaria a sua autêntica natureza se desistisse de buscar respostas às grandes interrogações sobre a existência, como lembra Bagnasco citando a Fides et ratio: “A Revelação cristã é a verdadeira estrela-guia para o homem, que avança em meio aos condicionamentos da mentalidade imanentista e às pressões de uma lógica tecnocrática. Ao homem desejoso de conhecer a verdade – se ainda for capaz de olhar para dentro de si mesmo e alçar os olhos para além dos próprios projetos – é dada a possibilidade de recuperar a genuína relação com a sua vida, seguindo o caminho da verdade”.

A tradição não basta. Mas como seguir o caminho da verdade? A quais energias apelar num tempo em que os elementos do coração são aniquilados por aquela “síndrome de Chernobyl” de que Giussani falava já em 1987 e que transforma os homens em seres estranhos a si mesmos e afetivamente incapacitados?
“Não basta apegar-se à tradição”, disse Julián Carrón, tomando a palavra depois da saudação de Dom Mario Delpini, bispo auxiliar da diocese de Milão; tradição que é desconhecida por muitos ou que está gravemente fragmentada naqueles que ainda conservam alguns traços dela. O único apoio que temos é aquele que nenhum poder é capaz de destruir: a experiência elementar do homem, o seu coração, que contém as exigências constitutivas de verdade, beleza e justiça”. É nesse nível – no nível de uma crise que não é, principalmente, de natureza moral e sim uma verdadeira crise do humano – que o cristianismo pode mostrar a sua verdade e dar uma contribuição decisiva, justamente lá onde todos os outros estão fracassando. “Essa contribuição só será possível se a atual circunstância histórica – tão difícil – for enfrentada como uma grande aventura, como uma oportunidade para uma nova autoconsciência da natureza do cristianismo”.
E qual é a natureza do cristianismo? A modernidade o reduziu a uma receita ética ou a mero consolo espiritualista, muitas vezes com a culposa aquiescência dos próprios crentes. É preciso voltar a vivê-lo tal como ele é: um fato histórico que se documenta na diversidade humana de pessoas que o experimentam como resposta fascinante ao alcance de todos.

“Oi, Deus”. O encanto dessa resposta ecoa nas palavras de uma estudante de quinze anos, de família ateia, que jamais entrou numa igreja, e que ao participar de um período de férias junto com os colegiais entrevê uma Presença que jamais havia percebido em sua vida. Gostaria de poder falar com esse Deus que desconhece, mas só consegue lhe dizer: “Oi, Deus”. “Quem poderá ensinar a essa menina como falar com Deus?”, pergunta-se o professor Franco Nembrini, em meio ao silêncio comovido dos presentes: “Só adultos que saibam dar testemunho da própria fé, do Bem que suas vidas alcançaram, da paixão pelo real que este encontro despertou neles”.
É a mesma paixão pelo real que penetrou nas veias de Andrea Franchi desde os tempos de faculdade e que, depois do casamento, o levou a carregar o “pacote” do Banco de Solidariedade a uma família pobre que se acomodava num paiol abandonado na periferia de Milão. Hoje ele é o presidente da Federação Nacional dos Bancos de Solidariedade e continua a levar o tal pacote: “É o mínimo que eu posso fazer. Tenho necessidade de um gesto que me eduque a olhar o que, de fato, eu sou: um pobrezinho com um grande desejo de felicidade no coração, que foi abraçado gratuitamente pelo único homem que pode responder a esse desejo sem enganá-lo: Cristo”.

Paixão contagiosa. É a mesma paixão pelo real que anima Stefano Facchini, estudante do quarto ano de Física; como ele, também os universitários da Universidade Estatal de Milão organizam a leitura integral da Divina Comédia, convidando professores do mundo todo para proferir palestras na universidade. Paixão contagiosa, como reconheceu Robert Hollander, professor em Princeton e um dos maiores peritos mundiais em Dante, que depois de ter conhecido esses estranhos jovens disse a respeito deles: “O prazer com que vocês estudam é uma coisa que sempre busquei e que ainda hoje me falta. Invejo a amizade de vocês, porque ela não se limita ao estudo, mas envolve toda a vida”.
Ao final de uma sessão densa de palavras e de experiências, num momento de confusão e de desorientação como esse vivido pela Itália, destaca-se ainda mais a verdade da frase de Charles Péguy reproduzida pelo folheto feito para a ocasião: “No tempo dos Romanos também ocorriam maldades. Mas Jesus veio. Ele não perdeu tempo lamentando e criticando a maldade da época. Ele foi à raiz, de um modo muito simples: fazendo o cristianismo”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

Volta ao início da página