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Passos N.78, Dezembro 2006

EXPERIÊNCIA - BRASIL | ASSEMBLÉIA DE RESPONSÁVEIS

Recomeçar daquela brasa

por Julián Carrón

A seguir notas da síntese final de padre Julián Carrón na Assembléia Nacional de Responsáveis de Comunhão e Libertação. Rio de Janeiro, 5 de novembro de 2006

O que vêem os meus olhos? Eu não encontro aquilo para o qual eles foram feitos. É impossível que tudo aquilo que eu encontro não seja adequado para os meus olhos, para o meu coração”1. A vida teria sempre uma tristeza última. Só de pensar, isso aperta o nosso coração. O pensamento de que o nosso coração possa não encontrar o objeto do seu desejo. É impossível pensar nisso por um momento e não ser invadido por uma tristeza infinita. Como é fácil reduzir o drama da vida! Teríamos que deixar fora de nós a cabeça e o coração, e nos distrairmos continuamente para não sentir esse aperto. Nós estamos juntos, amigos, porque sentimos essa urgência dentro de nós, do nosso coração e dos nossos olhos. Eles buscam algo que parece ser impossível; que, porém, nós não podemos arrancar de nós. Se ninguém nos prometeu nada, por que esperamos? Por que sentimos essa urgência dentro de nós? Antes de mais nada, nós estamos juntos para reconhecer essa urgência. Esse é o primeiro passo de um novo início. É a primeira vitória sobre o formalismo, sobre esse viver de forma achatada, sem uma urgência, sem uma paixão, como uma apatia louca, que é a forma com que o niilismo, que invade tudo, toma conta de nós. Estamos juntos, amigos, por essa ternura para conosco, que não cede a esse niilismo que temos ao redor. Somos mais ou menos conscientes, mais ou menos desejosos dessa urgência.
O fato de estarmos aqui significa que não venceu totalmente o lixar-se de nós mesmos, esse niilismo. O primeiro passo para vencer o niilismo é levar a sério o que resta. Tinha uma fogueira e resta só uma brasa. É dessa brasa que ainda sobra no nosso íntimo, é dela que nós podemos recomeçar. Como disse sempre a Igreja: o pecado original nos feriu, mas não nos destruiu. O fogo se apagou, mas permanece a brasa. Sobrou algo que nenhum mal, nenhum niilismo pode eliminar. E isso pede de nós que reconheçamos essa brasa que permanece ali, viva, no centro do nosso eu, que resiste a ser destruída, mesmo que por nós mesmos. Precisamos tomar consciência de que continua acesa. O início é este: tomar consciência de que não fomos vencidos, de que ainda sobrou essa brasa. Por isso falávamos de início, ou melhor, de novo início.
O que significa novo início? Como vencemos o formalismo, como podemos recomeçar dessa brasa que continua ali, que está no centro do eu? Como movimentar o centro do eu? Pois podemos fazer muitas atividades, podemos fazer milhões de coisas, mas o centro do nosso eu pode continuar parado. Podemos encher o nosso dia com coisas a serem feitas, até com coisas do Movimento, com muitas reuniões, muitas atividades, e estarmos parados lá no centro do nosso eu, no nosso coração, naquilo que é a fonte do nosso eu. É esse centro do eu que é movimentado pelo acontecimento cristão. O acontecimento cristão acende de novo essa brasa que sobrou neste modo um pouco formal de viver, como uma pessoa moribunda que está pra morrer e não tem mais vontade de nada, só sobrevive. O objetivo da vinda de Cristo é regenerar a pessoa nessa situação.
O objetivo não é fazer com que a gente faça mais coisas, mas é regenerar o nosso eu; é um acontecimento. E nós percebemos que participamos de um acontecimento agora, pelo fato de que o centro do eu é movimentado, não porque fazemos mais atividades. Vamos pensar em quando a gente se apaixona. A primeira coisa que acontece não é fazer mais coisas, mas começa uma vida dentro do coração. É alguém que se instalou dentro de nós e começou a vibrar o nosso coração. Faço um exemplo: ontem à noite, no jantar, conversava com a Cleuza, esposa do Marcos Zerbini, e a um certo momento ela, tocada, surpreendida por aquelas coisas que a gente conversava – falávamos do método de Deus, como o método de Deus é a eleição, a escolha –, ela, a um certo momento, tomou consciência disso, de ter sido escolhida. Para explicar isso, eu usava uma imagem gráfica que me impressiona muito, que é o quadro A vocação de São Mateus, de Caravaggio. Mateus está ali sentado à mesa, recolhendo impostos, e Jesus o chama. E ele, com toda a consciência de que era um ladrão, um pecador, desprezado por todos, se sente chamado por Jesus. Caravaggio colheu aquela impressão: “Eu? Você me chama? Você sabe quem eu sou?”. A Cleuza chorava de comoção por aquele fato. Não porque ela tinha que fazer alguma coisa, mas porque acontecia alguma coisa. Algo que chegava até o centro do eu. Isso é o acontecimento cristão.
Fiquei muito tocado, na última vez em que vim à América Latina, quando fui a Santiago, no Chile. A primeira leitura da Missa era um trecho da carta de São Paulo aos Gálatas, no qual São Paulo dizia que Deus tinha mandado seu Filho. E eu ouvia isso e dizia a mim mesmo: É verdade. Como uma afirmação que se reconhece verdadeira. Mas, logo depois, eu me dei conta de como a gente pode reduzir isso. Em seguida, tinha a leitura do Evangelho sobre a visitação de Nossa Senhora a sua prima Isabel. E o Evangelho diz que, logo que Isabel ouviu a saudação de Nossa Senhora, a criança que estava no ventre de Isabel, que era João Batista, saltou de alegria. Isso é o cristianismo. O cristianismo não é ouvir uma frase verdadeira, mesmo que a frase seja verdadeira, mas é algo que acontece, algo que faz exultar de alegria, que exulta o coração. Não sei como acontece, mas acontece. Como acontecia ontem no jantar. Não precisa estar em nenhuma condição especial. Basta que esse acontecimento aconteça. É suficiente que a pessoa entre na órbita da Presença de Cristoe, imediatamente, o coração exulta de alegria. É isso o novo início, o novo início que acontece agora. Para nós, o cristianismo é o acontecimento permanente desse novo início. Por isso, aquilo que Cristo faz não é achatar, mas despertar em nós o drama, desperta o nosso eu, o nosso coração, a nossa brasa, aquilo que estava meio morto volta a queimar com toda a força dentro de nós. E vemos toda a plenitude do nosso coração, dos nossos desejos. O que acontece quando esse nosso desejo, quando esse nosso coração é despertado? Possibilita que façamos experiência das coisas.

A experiência
Por isso queria me deter um momento para falar da experiência, porque a experiência para mim e para Dom Giussani, conforme descreve no primeiro capítulo de "O Senso Religioso"2, é o método, o instrumento do caminho, da estrada. Entender isso foi decisivo para que eu fizesse aquele caminho humano que ontem eu contei a vocês, e é decisivo para nós, para que façamos Escola de Comunidade (EdC), para aprendermos a fazer EdC não a partir de comentários ou discursos, porque isso nos cansa e, com o passar do tempo, deixa de nos interessar, não toma a gente, não deixa que a gente faça um caminho humano. Ao contrário, quando o coração é despertado, a pessoa pode fazer uma experiência. Jesus, despertando o nosso coração, reacendendo a nossa brasa, nos diz: compare-me com tudo. Ele nos lança nessa comparação com tudo. É um ponto sem retorno. A pessoa não consegue mais deixar de comparar tudo aquilo que lhe acontece com aquilo que encontrou. É por isso que a experiência não é simplesmente provar algo. E por que não é só provar? Porque simplesmente provando, eu não aprendo nada.
Quando eu dava aula de religião fazia esse exemplo aos meus alunos: se vocês estão aprendendo um exercício de matemática que ainda não dominam bem, se o professor disser “tentem resolver esse exercício” e você tenta, ao final você sabe se resolveu bem ou não? Não. Se você tentou cinco vezes, você sabe se a quinta vez ficou melhor do que as outras? Não. E se tentasse 200 mil vezes, saberia se a vez número 200 mil estaria melhor do que as outras? Não. Você fez 200 mil vezes um exercício de matemática, e não aprendeu nada. Você não sabe se a primeira vez ficou melhor do que a última. Por isso Dom Giussani dizia que a experiência não é simplesmente provar, porque provar simplesmente uma coisa não ensina nada. A experiência é aprender a dar um juízo sobre algo que vivi. Se por um minuto a gente voltasse para escola na época em que éramos crianças, como é que sabíamos se tínhamos resolvido bem o problema, se estava certa a nossa forma de resolver o exercício? Comparávamos com aquilo que o professor dizia. Ao comparar aquilo que eu tinha feito com aquilo que o professor tinha escrito na lousa, aí eu podia dar um juízo, e aprendia, e mesmo quando eu errava, eu aprendia porque aprendia que tinha errado. Isso é estupendo porque demonstra que a questão da vida não é não errar, mas aprender. Quantas coisas são nossas e ficaram marcadas dentro de nós graças a um erro que cometemos. E essa é a paixão da vida que a gente aprendeu a viver. E tudo serve, e tudo é útil para o caminho da vida, mesmo os nossos erros. Nenhuma outra forma de vida pode se comparar à nossa porque para a nossa vida tudo serve, tudo é ocasião de crescimento. Então, a experiência é provar, é viver algo, e depois dar um juízo sobre aquilo que se viveu.
Assim, quem guia a EdC, não pode permitir que alguém conte algo vivido sem que chegue, no final, a um juízo, porque, sem isso, a gente não aprende nada. É como se fôssemos à escola e não comparássemos a resolução dos nossos exercícios com aquilo que o professor falou, e por isso não serve para nada. Imaginem como mudaria a EdC se pelo menos uma pessoa falasse da sua experiência e a julgasse. Atenção nisso. Não temos um instrumento mais cotidiano e regular do que a EdC. Então temos que aprender a fazê-la bem, porque sem aprender a fazer bem a EdC, nós não aprendemos o carisma, e, depois, a gente se lamenta que a promessa do encontro não se realiza. Isso é falso, porque me realiza sim, mas precisamos estar disponíveis para aprender o método que Dom Giussani nos ensinou. Não é suficiente que a pessoa fale aquilo que lhe dê na telha, porque isso é sinal de que ela não está seguindo ninguém. Como eu dizia aos universitários: todos nós queríamos ser Beethoven, mas a gente não quer começar solfejando. A gente precisa começar a aprender a solfejar.
Sabem o que salvou a minha vida? Eu era padre, já tinha feito um doutorado em Teologia, não era o último chegado, mas aquilo que me salvou foi aceitar aprender aquilo que eu achava já saber. Vai acontecer um novo início no Brasil se aceitarmos aprender aquilo que pensamos já saber. Porque todas essas coisas que estão no primeiro capítulo de "O Senso Religioso" ainda não são familiares para nós. É o ABC do método.

Critério de juízo
Para podermos julgar, precisamos de um critério de juízo. No problema de matemática, o critério nos é dado pelo professor. Mas existe algum professor que pode se tornar o critério da vida? Não. Se alguém pretende ser, ele é falso. Porque somos todos homens. Estamos todos dentro do Mistério da vida. O critério, nos ensina Dom Giussani naquele 1º capítulo de "O Senso Religioso", o critério está dentro de nós. E é isso que é afirmar o outro, ou seja, afirmar a dignidade do outro, a dignidade de pessoa. Porque, na sociedade de hoje, se permite tudo, menos que a gente pense no nosso eu, menos no fato de que a gente tem um critério objetivo para julgar tudo. Esse critério tem que estar dentro de nós, do contrário seríamos alienados.
Faço dois exemplos que eu fazia sempre na escola aos meninos. Imaginemos que uma amiga caia e quebre a perna. Precisam engessar a perna dela. Depois de dois dias, ela tem uma dor terrível. É como se o gesso não estivesse bem colocado. E ela vai até o médico que a engessou e diz “está doendo”. E o doutor lhe responde: “é impossível que a machuque porque eu sou o Prêmio Nobel dos gessos”. E é verdade, ele é especialista em gesso. Mas ela responde: “olhe, doutor, eu posso ser boba, mas até aqui posso enxergar: está doendo”. Quem tem razão: ela ou o médico? Onde está o critério? Está dentro de mim ou fora de mim? Está dentro de mim ou está nas mãos dos grandes especialistas? O critério de juízo está dentro de mim. O outro exemplo parece um pouco menos concreto, é sobre a liberdade: alguém lhe diz, “acabei de chegar de um Congresso onde os maiores especialistas do mundo falaram sobre a liberdade. E eu aprendi que a forma como você pode ser livre é ficar por toda a sua vida na prisão”. E você responde: “Vai você para a prisão, porque eu não me sinto livre dessa forma”. Imediatamente algo se rebela dentro de nós. Por quê? Porque temos dentro de nós o critério. Ele pode ser o maior especialista em liberdade, mas não é ele que pode me dizer quando eu me sinto livre. Como também não é o médico que pode me dizer quando a perna dói ou quando não dói.
Mas então, se todo mundo tem o seu critério, então todo mundo pode decidir? Não, porque o critério está dentro de nós, mas não somos nós que decidimos, a gente se depara com ele. Por isso eu fazia o exemplo que, depois, ficou famoso, que é o exemplo do sapato. Vamos comprar sapatos e há uma liquidação. Vemos que economizaríamos dinheiro se pudéssemos escolher o número. Um sapato dois números menor que o seu custa a metade. Por que vocês não compram? Porque vocês não podem decidir nem o quanto vocês calçam. O número verdadeiro dos seus sapatos é aquele que corresponde aos seus pés. E não é você que decide o tamanho do seu pé. Você se depara com o número dele. Portanto, o critério está dentro de nós, mas não somos nós que decidimos. E Dom Giussani diz que o critério é o que chamamos coração, aquele conjunto de exigências de verdade, beleza, justiça e felicidade que encontramos dentro de nós. Ao colocar dentro de nós isso, Ele nos mandou ao mundo tendo dentro um detector de verdade. É como a dor, quando o médico me diz uma coisa, a presença da dor me possibilita ver se é verdade ou não aquilo que o médico está me falando. Ou quando a vendedora quer me enganar, mas o sapato não serve. A pessoa se depara com algo objetivo.
Nós também nos deparamos com algo objetivo. E por isso, citando Dom Giussani, eu disse que esse critério é objetivo e infalível. Atenção, como eu expliquei nos Exercícios da Fraternidade, é objetivo e infalível enquanto critério, mas eu posso aplicá-lo mal, mas como critério é infalível. Porque pode ter alguém que diz: “eu preferi comprar o sapato um número menor porque tinha esperança de que ele fosse amaciar um pouco e, depois, ia caber”. É bom que ele perca dinheiro porque assim vai ter que comprar um outro sapato. É a penitência por ter sido trouxa. Por isso é que, na vida, é bom para nós aprendermos, nos convém. Portanto, o critério da verdade chama-se correspondência. O Mistério nos fez tão bem que a gente não precisa ir para a faculdade para entender essas coisas. Porque o critério está dentro de nós, e a gente entende quando uma pessoa nos quer bem e quando nos trata mal, quando uma pessoa está tirando sarro da gente ou quando está se aproveitando da gente. A questão é que o centro do eu esteja em movimento. Portanto, a questão é que a gente ”trabalhe”, que a gente comece a trabalhar comparando tudo o que a gente encontra com aquele conjunto de exigências de beleza, verdade e justiça que se encontram dentro de nós. Porque é assim que a gente entende, de fato, quais são as exigências que temos.
Muitas vezes nós fazemos uma grande confusão ao falar da correspondência porque confundimos a correspondência com uma imagem que temos, se gostamos ou não, se sentimos ou não, mas a correspondência é muito mais do que isso. É o que corresponde totalmente às nossas exigências de verdade, beleza e justiça. A gente tem que se ajudar nessas coisas aqui. Porque a maioria das vezes a gente usa a palavra correspondência como o acontecer aquilo de que eu gosto. Mas sejamos leais: muitas vezes acontece aquilo que a gente quer, aquilo que a gente gosta, mas nós continuamos decepcionados. É como os sapatos, não somos nós que decidimos. Nós podemos ter um desejo, e ele pode até se realizar. A vida não nos tratou tão mal ao ponto de a gente nunca alcançar um desejo. Mas o verdadeiro drama da vida começa quando um desejo nosso se realiza e a gente se dá conta de que isso não nos basta. A vida nos responde com um Sim, com S maiúsculo, um Sim grande. E isso não é suficiente. Quid animus satis? O que é capaz de satisfazer a alma, essas exigências que eu tenho no coração? É por isso que nós não podemos reduzir o coração a uma coisa sentimental.
O coração, na verdade, é essa desproporção estrutural que temos dentro de nós. E a experiência humana mais evidente onde isso acontece, onde fica mais claro isso, é na experiência do amor. Nada consegue tomar totalmente a gente como a pessoa amada. Nada nos fascina mais do que a pessoa amada. E ao mesmo tempo ninguém é capaz de realizar aquela promessa que a paixão suscitou. Sobre isso, sugiro que vocês leiam, na revista Passos, o que eu falei em Valência sobre a família3. Porque é uma das coisas que menos se entende e gera um monte de confusão. E isso vale para todos, não só para os casados. Porque no relacionamento de amor emerge a estrutura do eu e isso me faz entender o que é o meu eu, que é esse desejo de infinito que emerge dessa experiência amorosa. Então, movimentar o centro do nosso eu é nos acostumarmos a fazer essa comparação, a julgar. Ou seja, ver se as coisas que vivemos correspondem ou não correspondem com aquele desejo de verdade que temos dentro de nós. E se não fizermos isso, não adianta nos lamentarmos pelo fato de termos ficado escravos do poder. O poder tem uma influência em nós, fazendo com que o centro do eu fique parado, porque a pessoa deixa de fazer a comparação com as exigências elementares que tem dentro. E se eu não aprender isso, acabo vivendo na dependência do que os outros me dizem. E quem são os outros? A televisão. Porque aquilo que você pensa, pensa você e o seu amigo, mas aquilo que a televisão pensa chega a milhões de pessoas, portanto acaba influenciando também a nós. Mas se nos influencia, é simplesmente porque somos coniventes, é porque ficamos parados.

Simplicidade
Mas, para aprendermos, precisamos de uma última condição. Quando fazemos essa comparação com tudo aquilo que acontece na nossa vida, coisas bonitas ou coisas ruins, é preciso que sejamos leais, que a gente tenha uma simplicidade de coração. Ou seja, reconhecer aquilo que claramente emerge da experiência. Como nós ouvimos naquele trecho de Lewis, “Aquilo que eu gosto da experiência é que se trata de uma coisa tão honesta que podemos errar um montão de vezes, mas se permanecermos com os olhos abertos, não vamos conseguir ir muito longe antes que apareça a placa correta”4. Mas se a pessoa vir a placa correta e não a seguir, se não for leal com aquilo que ele vê na experiência, não será possível entender aquilo que emerge da experiência. “Vocês podem enganar a vocês mesmos, mas a experiência não está querendo enganar vocês. O universo mostra a verdade quando vocês o interrogam de forma honesta”5. Precisamos levar a sério esse instrumento que Dom Giussani nos indicou como o instrumento do caminho, ou seja, a experiência, tanto que ele colocou como título do livro "O Caminho para a Verdade é uma Experiência"6, e essa vai ser a EdC que começaremos no ano que vem. Exatamente porque esse é o método. A gente caminha em direção a verdade, quanto mais a gente torna habitual fazer experiência. E a EdC deve ser o ponto de comparação com a experiência. E, por isso, devemos nos ajudar para que os nossos encontros de EdC não sejam comentários sobre comentários que não servem para nada. Mas sejam relatos de experiências que terminem com um juízo. Atenção, não é para que cada um conte a última coisa vivida na semana sem um juízo. Porque isso é sinal de que a pessoa não está fazendo um trabalho. Eu não leio a EdC, nem ligo para aquilo que temos que aprender, mas quando vou à reunião, acabo contando uma coisa que me aconteceu na semana. Porém, se a pessoa não julgar as coisas que acontecem, ela não aprende. O texto da próxima EdC é praticamente o primeiro texto da experiência do Movimento, o texto com o qual Dom Giussani começou. Nós escolhemos esse texto para seguir aquilo que Dom Giussani escreveu ao Papa da última vez, que não queremos identificar algum detalhe específico nosso. Aquilo que tentamos identificar foram os fatores essenciais da experiência cristã7. Neste texto temos, de forma sintética, a proposta da experiência, a proposta que se comunica de forma elementar. Então, não precisa complicar. É clara e sintética. Foi com essa simplicidade que Dom Giussani começou a fazer o Movimento. Este novo início, então, é começarmos a aprender aquelas coisas que nós achávamos que já sabíamos.
Junto com o grande gesto da EdC, o outro grande gesto educativo que Dom Giussani sempre propôs é a caritativa. O gesto pelo qual podemos aprender a gratuidade. Esse gesto é para todos, para os jovens e para os mais velhos. Pode ter formas diferentes, conforme as circunstâncias, a idade ou a posição da pessoa, mas todos nós temos que aprender – é conveniente para nós aprendermos – uma forma gratuita de se relacionar com a realidade. Por isso eu peço a vocês: façam a caritativa. Isso não vai fazer vocês perderem tempo. É uma educação para entrarmos na realidade de forma verdadeira.


Notas:
[1] Cf. Impossible. Canção popular argentina, autoria de Carlos Franco Páez e A. Chazarreta.
[2] Giussani, L. O Senso Religioso, Nova Fronteira, Rio de Janeiro 2000.
[3] Carrón, J, “Mulher, ao meu pensar se deparou qual raio divino a tua beleza”, In: Passos Litterae Communionis nº 77, novembro de 2006, pp. 39-42.
[4] Cf. Lewis, C.S., In: Surpreendido pela Alegria, Ed. Mundo Cristão, São Paulo 1998.
[5] Id., ibid..
[6] Giussani, L. Editora Companhia Ilimitada, São Paulo 2006.
[7] “Eu não apenas nunca pretendi ‘fundar’ nada, como considero que a genialidade do movimento que vi nascer é ter sentido a urgência de proclamar a necessidade de um retorno aos aspectos elementares do cristianismo”, trecho da Carta de Giussani a João Paulo II pelos 50 anos de Comunhão e Libertação. In: Passos Litterae Communionis nº49, abril de 2004, pp. 01-03.

 
 

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