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Passos N.59, Março 2005

O MARAVILHAMENTO DE UM ENCONTRO

Cristo, a companhia de Deus ao homem

por Luigi Giussani

Do texto do primeiro cartaz de Páscoa de CL, 1982

Cristo é um homem que se disse Deus. À pergunta de Felipe, “monstra-nos o Pai”, intérprete da interrogação dos apóstolos, que, mesmo seguindo Jesus há alguns anos, não compreendiam bem (como nós não compreendemos bem quando ouvimos a palavra Deus ou a palavra mistério), Jesus responde: “Quem vê a mim vê o Pai”.
Cristo é o único homem na história que se identificou com Deus, o único que ousou dizer: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Nós, distraídos pelas coisas cotidianas e pela superficialidade do nosso viver, não percorremos a ilimitada desproporção, a distância infinita que separa o homem de Deus. Mas um espírito profundamente religioso, um gênio religioso é aquele que sente enorme esta desproporção e a ensina a todos os outros: que só Deus é Deus.
Assim fizeram todos os grandes nomes da história das religiões, até Buda, até Maomé. Moisés tinha um tal sentido da própria pequenez diante de Deus que chegou a suplicar-lhe que investisse da sua missão um outro em seu lugar.
Único entre todos, único caso no mundo, este homem que é Cristo se diz Deus.
Como é bonito percorrer o Evangelho e surpreender como os primeiros homens, homens como nós, que seguiram Jesus, chegaram não a se dar conta de que aquele homem era Deus, mas a dizer, repetir certas afirmações que Ele fazia sobre si. Esta é a sua profissão de fé.
Porque os apóstolos não descobriram que Jesus era Deus, mas, ficando com Ele, tiveram uma impressão grande disto, a ponto de “ter” de dizer: se não devemos acreditar neste homem, não devemos acreditar nem nos nossos olhos. É por esta evidência que, mesmo sem compreender bem, repetiram as suas palavras, aquelas palavras que depois investiram a história e o nosso coração (...).
É este o grande caminho da evidência, da razão: é o caminho da vida, da relação contínua, da experiência cotidiana compartilhada. Por isto podiam dizer: se não acreditamos neste homem não podemos ter confiança nem nos nossos olhos. A multidão, ao contrário, seguia Jesus quando tinha interesse ou curiosidade. E ficava tocada porque a palavra era verdadeira e a verdade traz consigo a própra evidência. Mas a dissipação era imediata; a multidão o seguia também por paixão de ouvi-lo, mas sem empenhar o fundo do próprio ânimo, sem envolvimento vital.
No sexto capítulo de João, Jesus, comovido porque o seu povo o segue, tem a intuição mais fascinante da sua vida: “Vós me seguis porque matei a vossa fome com um pouco de pão. Mas eu vos darei a minha carne para comer, vos darei o meu sangue para beber”. A desproporção do divino aparece, se faz evidente e justamente ali se instaura a resistência de quem não quer compreender, de quem está escandalizado porque os critérios e as modalidades daquele homem quebram a sua maneira de pensar.
“É louco, quem pode dar de comer a sua carne e de beber o seu sangue?”. As insinuações tornam-se rumor, tornam-se o murmurar inteiro da multidão que abandona a sinagoga. Cristo fica sozinho com os seus, no silêncio da noite. E rompe aquele silêncio com uma outra pergunta: “Vós também quereis ir embora?”. “Mestre – grita de repente, grita impetuoso, ainda, Pedro –, nós também não compreendemos aquilo que tu dizes, mas se te deixarmos, para onde iremos? Somente tu tens palavras que dão sentido à vida”.
Esta é a resposta de quem tem a humildade, a fidelidade, a humanidade de seguir Jesus atraído pela evidência da verdade das suas palavras.
Mas quem não sabe segui-lo, quem não ousa o esforço de uma familiaridade, de uma prática de vida não chega a evidenciar a verdade e não encontrará resposta verdadeira, pessoal e madura para a questão fundamental, definitiva que Jesus lhe dirige: e tu, quem dizes que eu seja?
Como podemos responder a esta pergunta nós que não estivemos nas núpcias de Caná, que não vimos o paralítico sarar, que não assistimos o funeral de Naim, que não O seguimos durante três duas na estepe, esquecendo até a comida?
A familiaridade com Ele, da qual nasce a evidência da Sua palavra como única que dê sentido à vida, como podemos vivê-la?
O modo existe: a companhia que de Cristo nasceu e investiu a história: é a Igreja, o Seu corpo, isto é, modalidade da Sua presença hoje. É portanto uma familiaridade cotidiana de empenho no mistério da Sua presença dentro do sinal da Igreja. Daqui pode nascer a evidência racional, plenamente razoável, que nos faz repetir com certeza aquilo que Ele, único na história da humanidade, disse de si: “Eu sou o Caminho, a Verdade, a Vida”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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