Na Origem da Pretensão Cristã,
Nova Fronteira, Rio de Janeiro 2003, pp. 47-48
Imaginemos que o mundo seja uma imensa planície, na qual inúmeros grupos humanos, sob a direção de seus engenheiros e arquitetos, se esforcem, com os mais disparatados projetos, para construir pontes de milhares de arcos para ligar a terra ao céu, o lugar efêmero de sua morada à "estrela" do destino.A planície está repleta de um número incontável de canteiros de obras nos quais se desenvolve um trabalho febril. Num determinado momento, chega um homem que abraça com o olhar todo aquele intenso trabalho de construção e, a certa altura, diz: "Parem!" Aos poucos, todos, a começar pelos mais próximos, começam a suspender o trabalho e a olhar para o homem. Ele diz: "Vocês são grandes e nobres, o esforço de vocês é sublime, mas também triste, porque não é possível que vocês consigam construir a estrada que une a terra ao mistério último. Abandonem os seus projetos, deixem as suas ferramentas: o destino teve compaixão de vocês; sigam-me, eu construirei a ponte: eu, na verdade, sou o destino”.
Tentemos imaginar a reação daquela gente diante dessas afirmações. Os arquitetos, os mestres de obra e os artesãos começariam instintivamente a dizer aos operários: "Não interrompam o trabalho! Coragem, mãos à obra. Vocês não estão vendo que esse homem é um louco?" As pessoas começariam a dizer: "Sim, é louco.Vê-se que é mesmo maluco", e vol¬tariam ao trabalho, seguindo as ordens dos chefes. Somente alguns não tirariam o olhar dele; profundamente impressionados, não obedeceriam a seus chefes como a massa; aproximando-se do homem, seguiriam-no.
Pois bem, descrito de uma forma fantasiosa, foi isso que aconte¬ceu na história, e acontece ainda.
Nessa altura não nos encontramos mais diante de um problema de ordem teórica (filosófica ou moral), mas diante de um problema histórico. A primeira pergunta que devemos fazer não é: "É racional e justo o que diz o anúncio cristão?", mas: "É verdade que aconteceu, ou não?", "É verdade que Deus interveio?".
Gostaria de apontar a diferença de método que a abordagem da "nova" pergunta requer, ainda que essa diferença já estivesse implícita no que dissemos até agora. Poderíamos enunciá-la da seguinte maneira: enquanto a descoberta da existência de um quid misterioso, do Deus, pode e deve ser obtida pelo homem através de uma percepção analítica da sua experiência do real (e vimos como a história demonstra am¬plamente que ela pode ser obtida assim normalmente), o problema do qual agora falamos, sendo um fato histórico, não pode ser verificado com uma reflexão analítica sobre a estrutura da relação do homem com o real. É um dado de fato acontecido no tempo ou não; existe ou não existe, acon¬teceu ou não aconteceu. Em outras palavras: ou é efetivamente um acontecimento que se deu na existência do homem dentro da história, e por isso requer a constatação de um fato, ou não passa de uma idéia. Diante dessa hipótese, o método é o registro histórico de um fato objetivo.
Então a pergunta "É verdade que Deus interveio na história?" deve se referir àquela pretensão sem precedentes que representa o conteúdo de uma mensagem bem precisa; é obrigada a se transformar numa outra pergunta: "Quem é Jesus?" O cristianismo surge como resposta a essa pergunta.
A pergunta "É verdade que Deus interveio na história?" deve se referir àquela pretensão sem precedentes que representa o conteúdo de uma mensagem bem precisa; é obrigada a se transformar numa outra pergunta: "Quem é Jesus?"
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