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Passos N.58, Fevereiro 2005

MAREMOTO / SUDESTE ASIÁTICO

A escolha de irmã Ângela
Uma companhia na dor

por padre Mauro Bazzi

Um missionário de Bancoc, na Tailândia, contou o dramático testemunho de uma irmã saveriana que socorreu os sobreviventes do maremoto. A dor e a espera de quem perdeu tudo: alguém que lhe dê novamente uma razão para viver

Não é possível imaginar o que significa a força assustadora de centenas de bombas atômicas transferidas para as ondas do mar, lançando-as a uma velocidade de centenas de quilômetros por hora e fazendo-as se elevar a 10-15 metros de altura! Isso quer dizer que a água adquiriu uma força capaz de varrer o que encontrou no seu caminho jogando tudo a 3 km da praia. É assim que irmã Ângela Bertelli, de Carpi (Itália), da congregação das saverianas, missionária na Tailândia há três anos, tenta explicar o que aconteceu e que tem diante dos olhos. Mas as pessoas que irmã Ângela visita todos os dias nos inúmeros acampamentos de desabrigados preparados pelo exército tailandês, ainda têm o coração muito perturbado por causa das cidades varridas pelo tsunami ocorrido no dia 26 de dezembro último. Como Giampen, uma moça de 26 anos que perdeu seus dois filhos. Ela e seu marido salvaram-se porque, naquela manhã, tinham saído de casa por um momento. Estavam longe o suficiente para se salvar, mas perto o bastante para ver a casa e seus filhos sendo varridos pelo mar. Giampen está inconsolável. Irmã Ângela tenta ampará-la, ouvi-la e fazê-la desabafar como pode porque uma mãe que perde seus dois filhos tem uma ferida que é impossível cicatrizar.

Giampen e os outros
Irmã Ângela divide seu tempo entre Giampen e outras pessoas que, como ela, perderam alguém ou até mesmo toda a família. Como os seus vizinhos dos quais salvou-se apenas o pai e uma das crianças. Ou, como uma outra mãe que, na hora do tsunami, apertou seus dois filhos contra o corpo, mas a força do mar lhe arrancou o menor e ela não o encontrou mais. Também há histórias que terminaram bem como aquela do pai que estava no barco, como todos os dias, pescando. Naquele domingo, levou consigo seus dois filhinhos. Estavam a 3 km da margem e viram a primeira onda chegar ameaçadora a uma velocidade louca. Intuindo o perigo, o pai colocou o colete salva-vidas em si e nos filhos. Lançados pela fúria da onda, em poucos segundos viram-se agarrados a uma palmeira alta da margem, apavorados e feridos, mas vivos.
Assim como essas pessoas há também muitas outras que, mesmo tendo perdido a casa e o que possuíam, agora só precisam de uma coisa: de alguém que se ocupe do seu desespero, da sua dor e que dê a elas, em suma, uma esperança e um motivo para seguir em frente e recomeçar tudo de novo. São budistas e para eles, se Deus existe, é alguém que não se interessa por suas vidas. Irmã Ângela chegou há poucos dias em Takuap Pa, um vilarejo próximo a Kao Lak, a região mais atingida, mais ainda que Puket. Kao Lak, famosa pelos inúmeros hotéis novíssimos é, hoje, ainda mais famosa por causa do hotel Sofitel que se transformou na sepultura para centenas de turistas escandinavos.

Apelo às congregações
O bispo de Suratthani, a diocese do sul da qual dependem todos os 5.000 católicos espalhados por um território de 900 km, pediu ajuda a todas as congregações presentes na Tailândia. Irmã Ângela, que trabalhava habitualmente em uma favela de Bancoc, explicou às crianças e aos adultos a quem ajudava há mais de um ano que precisava partir porque havia pessoas que precisavam mais dela. Assim que chegou na cidade de Takuap Pa, logo percebeu que a organização era ótima: o rei da Tailândia tomou todos os órfãos sob sua proteção e cuidado, os soldados usaram todos os meios que tinham à disposição para montar em tempo recorde acampamentos perto de cada pequeno hospital ou escola. As organizações humanitárias do mundo enviaram remédios e enfermeiros para cuidar dos feridos, uma multidão de voluntários se ocupam em limpar tudo da lama, da água e dos destroços. Os mortos já foram todos recolhidos há dias, porém, de tempo em tempo, o mar devolve alguns dos corpos das pessoas que enchem as listas de desaparecidos. Mas, nos centros operativos de socorro, ninguém pensou que muitos dos sobreviventes não precisam só do alimento diário mas, sobretudo, da companhia de alguém que os escute, com quem possam desabafar. Porque, como é possível recomeçar depois do que aconteceu se não se tem mais uma razão para viver? Então, antes de qualquer coisa, irmã Ângela tenta ser essa companhia e pacientemente vai de acampamento em acampamento para encontrar estas pessoas. Se ainda estão muito chocadas para falar, ela senta-se ao lado deles e espera. Giampen, o nome da jovem mãe, em tailandês significa “necessária”. É assim que irmã Ângela tenta explicar o motivo pelo qual é possível seguir em frente: essa mãe, mesmo tendo perdido os dois filhos, ainda é importante, é necessária para ajudar aquele pai de família que perdeu a esposa e que, agora, não pode acudir o filho porque precisa começar a pensar em reconstruir a sua casa.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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