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Passos N.121, Novembro 2010

APROFUNDAMENTOS

Eleições 2010. Doutrina Social, integralidade e juízo político

por Francisco Borba Ribeiro Neto

A doutrina social da Igreja nasce de uma reflexão sobre a revelação cristã. Propõe, por exemplo, a solida-riedade a partir da caridade, do amor cristão, que é diferente da solidariedade apresentada na sociologia, que nasce da união dos “iguais” contra os “diferentes” (como acontece entre torcidas) ou do interesse que um diferente tem sobre o outro (a cooperação entre produtor e vendedor na comercialização de um produ-to). Mas também nasce da experiência dos cristãos ao longo da história. A subsidiariedade, por exemplo, é um princípio que diz que o Estado deve estar a serviço do cidadão, incentivando a capacidade que as pessoas têm de organizar-se e resolver seus problemas do modo que consideram melhor, não se impondo a elas. Este princípio seria incompreensível sem a observação da riqueza das obras sociais da Igreja e dos limites tanto do liberalismo (onde o Estado é fraco na defesa do bem comum) quanto do comunismo (onde o Estado sufoca a liberdade pessoal).
Mesmo sem ser um “programa político-partidário”, a doutrina social nos permite julgar um momento político e a posição dos partidos. Este juízo, enquanto aplicação subjetiva dos princípios da Igreja e que depende da análise que cada um faz da conjuntura, sempre será sujeita a erros e acertos – porém é uma tarefa inevitável para cada cristão que deseja que o encontro com Cristo seja realmente ilumine sua vida pessoal e social. Isto poderia gerar, em alguns contextos, uma dificuldade de relacionamento, pois poderia parecer que ninguém é suficientemente bom para estar junto com os cristãos. Uns seriam egoístas, outros autoritários, uns corruptos, outros não comprometidos, etc. Mas o juízo cristão não é isso. Não se trata em condenar ninguém, mas sim de procurar uma verdade e um bem que interessam a todos e com os quais todos, cristãos e não cristãos, devem se confrontar.
Quando se compara o pensamento social católico com as grandes correntes político-ideológicas modernas, pode-se observar que ele se aproxima do pensamento conservador por considerar que o comportamento ético e os valores morais das pessoas estão na base de uma sociedade justa – nenhuma engenharia social pode nos livrar do compromisso pessoal na construção do bem comum. Também se aproxima do liberalismo ao afirmar a primazia da pessoa humana, das liberdades individuais e dos direitos humanos. Por fim, se aproxima dos ideais do socialismo ao defender a justiça e a inclusão social, condenando as grandes desigualdades sociais e o uso individualista da propriedade e do capital.
Não é que a Igreja tente ficar no meio, jogando um pouco em todos os times ou coisa parecida. O que acontece é que a doutrina social católica persegue um ideal de desenvolvimento integral, que nas palavras de Paulo VI na encíclica Populorum progressio (1967), deve atingir “todos os homens e o homem todo”. A integralidade do ser humano é, portanto, o horizonte dentro do qual o pensamento católico deveria jul-gar toda a realidade e todas as propostas político-ideológicas.
Os cristãos, tentando ser fiéis a sua experiência de fé e à busca do bem comum, tendem a se aproximar mais de uma ou outra corrente político-ideológica em função do contexto em que vivem. Diante da ameaça do autoritarismo, cresce na comunidade cristã a valorização da liberdade. Num contexto de desi-gualdades sociais extremas, a comunidade valorizará a justiça social. Quando o individualismo e a chamada “cultura da morte” ameaça a dignidade pessoal, os direitos dos mais desamparados e a família, tende-se à valorização da ética e á defesa dos valores morais.
O desenvolvimento integral, que atinge a todos os homens e ao homem todo, é um ideal, uma concepção que está na origem e no objetivo das nossas ações, mesmo que saibamos que nunca conseguiremos atingi-la totalmente. Não é um sonho utópico, isto é, um objetivo que acreditamos alcançar plenamente no futuro e em nome do qual nos sentimos no direito de sacrificar pessoas e situações no presente. Neste sentido se diferencia radicalmente tanto das utopias igualitárias do comunismo, que acreditavam que todos os problemas seriam resolvidos num futuro pós-revolucionário, quanto das utopias desenvolvimentistas e cientificistas, que acreditam que o progresso econômico e científico – por si só – bastaria para resolver todos os problemas humanos. A “civilização do amor e da paz”, invocada por Paulo VI e citada em nume-rosos documentos da Igreja, não é outra, que virá depois desta – mas sim uma civilização que já está no mundo, em meio a esta nossa atual, e que vai se realizando à medida que nos entregamos à construção do bem comum.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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