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Passos N.126, Maio 2011

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Acontece - Brasília

“Meus amigos viram o mesmo que João e André”

O encontro – estava avisado – era para contar de experiências vividas em meio à tragédia das chuvas na região serrana do Rio de Janeiro. Surpre-endentemente, começou com músicas que fazem referência à “bruma leve das paixões” e ao “olhar em festa” que “se fez feliz” e com uma amiga que, ao apresentar as vítimas da enchente, falou que era “dia de glória”. As palavras de Patrícia, responsável pelo Movimento Comunhão e Libertação em Brasília, e os cantos Anunciação (Alceu Valença) e Andança (Edmundo Souto/Paulinho Tapajós/Danilo Caymmi), prepararam o coração para o encontro daquela noite.
Era sexta-feira, 1º de abril de 2011. O Centro Educativo Forma-tivo (CEFE) estava lotado de gente que poderia supor ouvir, naquele encontro, relatos dramáticos do pior desastre natural já vivido no Brasil. Contudo, o que se ouviu dos amigos Inês, Vinícius e padre Rogério, de Petrópolis, em vez de tristeza, encheu de alegria.
Diante da destruição, das vidas perdidas e dos sobreviventes da comunidade do Vale do Cuiabá, que foi devastado pelas águas, padre Rogério repetiu a promessa de Jesus aos discípulos: “Eu estarei convosco até o fim dos tempos.” Ao encontrar as pessoas gritando pela rua, desesperadas e amedrontadas com a potência das águas que levavam tudo, principalmente, entes queridos, amigos e vizinhos, ele ligou para o bispo da diocese de Petropólis, dizendo: “Dom Filippo, aqui, chove muito. Muitas pessoas já perderam suas casas, seus familiares.” Do outro lado da linha ouviu o bispo responder: “Vou para aí ficar com você!”. No entanto não era possível, porque as estradas estavam bloqueadas, então, devido à impossibilidade de ir ao encontro do amigo e das famílias do Vale, Dom Filippo responde: “Vou rezar e enviar uma circular para toda a diocese pedindo orações.” Ao escutar essas palavras da voz amiga de Dom Filippo, padre Rogério pôde afirmar que a igreja tem um rosto, por isso, é possível recomeçar em meio a uma tragédia olhando para o humano e confiando na presença do Mistério que é o essencial de todas as nossas ações. Assim, começou a dizer para cada pessoa que encontrava nas ruas, nos abrigos ou que vinha procurá-lo: “Vamos recomeçar. Deus dá força. Não estamos sozinhos, a igreja está conosco.”
Vinícius, um jovem de 25 anos contou como ajudou no resgate de parentes, amigos e vizinhos e como frente à impotência de salvar a vida da própria mãe, rezou confiante no desígnio misterioso de Deus. Ele não a ouvia mais, concluiu que ela estava morta e, nesse único momento, chorou como uma criança. Mas não parou na dor, no desespero, partindo imediatamente na direção de outros pedidos de socorro, para tentar salvar outras pessoas que se encontravam debaixo dos escombros. Vinícius é um homem simples, aberto à realidade, com um coração sedento da presença de Cristo diante de tudo e de todos. Para as pessoas alojadas nos abrigos, se tornou uma referência para todos os assuntos, problemas e soluções. Certo dia chegou ao abrigo uma mãe procurando a sua filha que estava desaparecida e como, ali, havia uma menina com as características descritas pela mulher pensaram que aquela criança podia ser a filha dela. Infelizmente, não era e ela começou a chorar. Sem saberem o que fazer diante pranto desesperado, chamaram Vinícius para conversar com a mulher e passados alguns minutos já se encontrava calma e com um rosto sereno. Ao olharmos para Vinícius contando essas histórias, impossível não dizer: “És Tu, ó Cristo!”
Inês, educadora, que trabalhou em um centro educativo localizado no Vale do Cuiabá, entendeu entre os diversos fatos vivenciados por causa da tragédia que esses acontecimentos dolorosos são para sua própria conversão: “É para olhar de novo Cristo.” “A vida foi feita para ser dada sem poupar nada”, pois “Cristo é o que vale na vida” resumiu ela.
Ao término do encontro, todos procuraram com fascínio e curiosidade Inês, Vinícius e padre Rogério para conversar, fazer perguntas e conhecê-los um pouco mais. Assim, nasceu em uma das mães do grupo de colegiais o desejo de participar da Escola de Comunidade. Bonitos testemunhos foram relatados e num grupo de amigos surgiu o desejo de ir a Petropólis visitar os três, o que fez Inês afirmar: “Agora, nós pertencemos a Brasília e Brasília pertence à Petropólis.”
A semana seguinte àquele encontro foi cheia da presença daqueles três amigos e quem esteve com eles não conseguia deixar de falar aos outros o que tinham visto. Era sexta-feira, 1º de abril de 2011, e meus amigos, assim como eu, viram o mesmo que João e André viram dois mil anos atrás: naquelas três testemunhas e personagens de uma tragédia, Cristo presente, por meio de sinais concretos que despertam e alargam a humanidade.
(Fabíula Martins e Liziane Rodrigues)

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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