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Passos N.128, Julho 2011

Educação - Birmânia

Na trilha de Clemente

por Maria Acqua Simi

No coração da Ásia, a AVSI acompanha centenas de crianças, dando continuidade à obra do Padre Vismara, missionário do PIME que se tornou beato no dia 26 de junho. Assim, vai abrindo caminho a “paixão pelo homem”, que vem de longe...

Às vezes encontramos histórias que estão ligadas, no tempo, por um fio invisível. Como a do Padre Clemente Vismara, missionário do PIME que foi beatificado no dia 26 de junho, e a presença, hoje, de um nutrido grupo de educadores e colaboradores locais da Fundação AVSI no coração do sudeste asiático.
Myanmar é mais conhecida como Birmânia. Uma terra dura, rica de cadeias montanhosas e com uma civilização milenar. Hoje é um país sob embargo internacional e colocado na lista negra dos organismos mundiais por causa da junta militar que, desde 1962, governa o país. É a pátria dos monges budistas e da Prêmio Nobel Aung San Suu Kyi, encarcerada por longo tempo porque símbolo da não-violência. Na década de 1960 o país mudou de fisionomia. Quem conduziu a mudança foi o general Bo Ne Win, que em pouco tempo instaurou a via budista para o socialismo: nacionalizou os bancos, as escolas, os negócios e aboliu as escolas particulares. Uma transformação dolorosa, à qual o Padre Vismara – que lá chegara em 1935 – assistiu sem poder fazer nada.
Padre, médico, farmacêutico, dentista, carpinteiro, ele se entregou totalmente ao serviço desse povo. Sabia o quanto era importante que todos conhecessem a beleza de um ofício, o quanto isso dava força e vontade de viver. Escreveu em seus diários: “evangelizar, isto é, ensinar a trabalhar”, e depois acrescentou: “o cristianismo é a única religião que tem como fundador alguém que foi um trabalhador, um carpinteiro”. Via o assassinato de vários coirmãos, sofria com a ocupação japonesa e compartilhava todos os sofrimentos dos órfãos, das mulheres, dos sobreviventes das guerras tribais. Diversas etnias convivem nessa terra, mas com muita frequência entram em conflito.
Sempre hostilizado pelo regime, Padre Clemente morreu no dia 15 de junho de 1988, em MongPing. Nesse ano, outro regime militar, de cunho comunista, assumiu o poder. A presença cristã no país, com toda a sua energia criativa, se fez presente. Embora em meio a numerosas dificuldades.

Flores na floresta. Quem conta é Alberto Piatti, secretário-geral da Fundação AVSI, que recentemente esteve em visita a Myanmar para se encontrar com o atual secretário do partido majoritário e o ministro da Agricultura, que havia conhecido em Roma um ano atrás. “Dia 20 de maio passado, participamos de um curso de formação da AVSI na diocese de Taunggyi, com cerca de cinquenta educadores. Dei-me conta, com grande surpresa, que os participantes tinham sobre a carteira folhas mimeografadas com a tradução do livro Educar é um Risco, de Dom Giussani.” Nas paredes, três fotos dele, de cujo carisma nasceu a AVSI. “Foi impressionante ver como Dom Giussani chegou até lá, através do seu pensamento e das suas obras”, explica.
Antes de começar, alguns educadores entoam um canto, composto por eles, para os amigos da AVSI. Intitula-se Thank you e no texto transparece toda a gratidão por uma história que não podem mais abandonar, por uma amizade que chegou até eles quando, “como as flores na floresta, procuravam o sol”. A referência é ao encontro com Padre John do PIME, com Liza Thet Oo (responsável local do apoio à distância da AVSI) e outros amigos conhecidos nos últimos anos. Uma coisa impensável antes, tal como esse curso de formação. “A viagem foi preparada nos mínimos detalhes, várias vezes adiada, dada a sua delicadeza. Tivemos encontros também com alguns representantes do governo: a notícia foi dada pelo telejornal e publicada na primeira página do diário nacional.” Um fato importante, se considerarmos a pouca abertura do regime para realidades diferentes daquela imposta pelo governo. Mas este encontro vale mais do que qualquer reconhecimento.
A AVSI trabalha no país há quase seis anos, graças ao empenho do seu representante local, Luciano Valla. Uma presença que se concretiza em relacionamentos, projetos agrícolas e, sobretudo, com o apoio à distância. São 490 crianças ajudadas nas dioceses de Pekhon, Myaungmya e de Taunggyi, na zona rural e montanhosa do Shan State. A maioria deles vive em albergues.
Essas construções, que originalmente eram orfanatos, agora são locais que facilitam a sua formação, porque sem um lugar onde possam ficar não seria possível garantir a sua formação escolar. “As crianças passam ali os dias e as noites. A AVSI garante assistência e formação e isso vale também para os professores e educadores”, explica Anna Difonzo, secretária de área da AVSI para o sudeste asiático. “Recebem uma educação para a convivência. Por isso é fundamental educar para o relacionamento educativo com os jovens.” Parece um jogo de palavras, mas o desafio está todo aí.
Sabia-o Padre Vismara e sabem também os operadores da AVSI. Duas realidades distantes no tempo, mas sustentadas por uma mesma visão: a paixão pelo homem como modo de dar glória a Deus. Conclui Piatti: “Pensando nisso, tive a impressão de estar participando de uma coisa incomensuravelmente grande, consideradas as nossas forças e capacidades: manter acesa aquela chamazinha fumegante de uma comunidade fundada por um santo. Num país onde é evidente a emergência do humano, numa sociedade pré-cristã (e não propriamente pós-cristã que teria esquecido suas origens), ela é só uma presença diferente que atrai as pessoas e leva-as a fazer perguntas importantes. E, assim, a buscar respostas. Respostas que plenificam o eu e que vamos propondo através de todas as atividades concretas que fazemos mundo afora”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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