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Passos N.56, Novembro 2004

50 anos de CL/ Do carisma

Studium Christi
Padres por imitação

por Alberto Savorana

Em 1992, um grupo de sacerdotes de Milão começou a se encontrar com padre Giussani. Queriam se ajudar a viver a vocação à santidade, própria do Batismo. A casa e a regra: silêncio, partilha, pontualidade. Entrevista com padre Giorgio Pontiggia

No início dos anos 90, alguns sacerdotes milaneses participantes da Fraternidade de CL pensaram em se ajudar mais decididamente a viver a vocação à santidade, própria do Batismo, incluindo também e particularmente, a sua vocação ao sacerdócio diocesano. Padre Giorgio Pontiggia nos fala sobre a circunstância da qual nasceu o grupo que recebeu o nome de Studium Christi.
Era o ano de 1992. Tudo nasceu a partir de uma constatação negativa: naquela época, os padres de CL encontravam-se periodicamente com padre Giussani. Ora, aconteceu que por um certo período ele não pôde estar conosco e nós paramos de nos encontrar. Mas alguns percebiam, mais do que a falta de padre Giussani, também o equívoco da nossa atitude. Entendemos que a comunhão entre nós não era para a vida. Voltamos a nos encontrar e, quando foi novamente possível, convidamos padre Giussani. Lembro que ele nos fez três observações: “Vocês são muitos, mas não são incidentes; não são incidentes porque não são unidos; não são unidos porque não seguem uma regra”. E nos desafiou.

Como vocês acolheram o desafio?
Começamos a pensar abstratamente em uma regra. Quando fomos falar com ele a respeito, sequer nos deixou terminar de falar e exclamou: “A regra é o Movimento, o que não significa, antes de tudo, ‘fazer’ coisas pelo Movimento, mas imitar a minha experiência”. E começou a detalhar: “Por exemplo, rezar as Horas como eu rezo, recitar o Angelus como eu o faço; entender porque eu digo que a síntese de tudo é o Veni Sancte Spiritus Veni per Mariam...”.
A coisa que nos provocou foi a idéia de “imitação”. Depois daquela vez, discutimos com alguns e achamos que o que mais nos ajudaria seria a regra dos Memores Domini. Nós a assumimos a ponto de pensar em fazer uma “casa” em Milão, a primeira do Studium Christi. Padre Giussani comentou que era justo “porque se um valor não se encarna em uma experiência concreta, se perde; mesmo que a experiência concreta não consiga exaurir o seu valor”.
Fizemos a proposta a uns 30 amigos padres. Dez disseram sim. Durante três anos, de 1992 até 1994, nos encontramos quinzenalmente com padre Giussani. Para ele, essa fidelidade era reconhecer uma coisa nova que estava acontecendo e da qual nós não tínhamos nenhuma consciência.

Porque vocês escolheram esse nome?
A nossa intenção era a mesma que movera padre Giussani a começar o Studium Christi nos anos de seminário junto com o futuro arcebispo de Bolonha, Enrico Manfredini. Ele não fez nenhuma objeção, talvez vislumbrasse nessa nossa escolha a realização daquele primeiro Studium Christi.
Como manifesto dos nossos grupos, escolhemos uma frase que João Paulo II nos disse quando recebeu os padres de CL em Castelgandolfo, em 1985: “Renovem continuamente a descoberta do carisma que os fascinou, e ele os guiará mais potentemente a tornarem-se servidores da única potestade que é Cristo Senhor!”.

Qual é o fator de novidade de um grupo de padres como o de vocês no panorama da vida da Igreja?
Padre Giussani insinuou isso durante uma reunião, quando falou desse nosso estranho grupo como se fosse o início de uma “revolução” que pode levar uma novidade para a vida da Igreja: a unidade entre padres não tinha derivado do papel que nos cabe, mas de uma experiência, a experiência do carisma que tornava diferente esse papel. Falou da casa do Studium Christi como “residência” e da paróquia como lugar de missão.

Quais são os aspectos da regra que vocês têm mais presentes?
Em primeiro lugar, o silêncio. Padre Giussani nos disse muitas vezes: “O fato de que os padres façam o silêncio pessoalmente e juntos, isso já é uma revolução da consciência”. Em segundo lugar, a partilha “até a morte”, isto é, a caridade durante toda a vida. Em terceiro lugar, padre Giussani sempre nos recomendou a pontualidade “como expressão do próprio estar diante do Mistério, para o qual o silêncio é o aprofundamento da consciência do Mistério, e a caridade é a sua manifestação”. Sinteticamente, a característica fundamental da experiência do Studium Christi é o seguimento total ao Movimento. Não queremos criar uma coisa nova, mas simplesmente nos ajudarmos a viver a tarefa que a Igreja nos dá segundo o carisma pelo qual Cristo veio ao nosso encontro.

Como as paróquias e os bispos reagiram diante dessa novidade de vida entre sacerdotes diocesanos?
Logo depois do início dos primeiros grupos, encontrava pessoas que me agradeciam porque encontravam os padres do Studium Christi na paróquia, mudados. Um paroquiano me disse: “Vemos como o padre muda depois de estar com vocês e estamos contentes de fazer o sacrifício de não tê-lo sempre conosco”. Isso faz entender que o contraste carisma-função não existe e, no que nos diz respeito, só existe quando o carisma não é vivido segundo a sua natureza. A experiência do Movimento cria condições melhores para viver o papel ordenado pela Igreja.
Um bispo acompanhou um padre do Studium Christi no seu ingresso a uma paróquia bem distante e abandonada. Quando voltou, me disse: “Não pensei que estivesse tão desolada, mas me conforta ver a amizade entre vocês”. Quando padre Giussani soube disso, nos obrigou a organizar nossa agenda de forma que aquele padre nunca fosse deixado sozinho. E, encontrando-me pouco tempo depois, queixou-se por eu ainda não ter fixado um dia para ele ir ajudar aquele amigo sacerdote!

Padres do Studium Christi vivem também no exterior, nas estepes do Cazaquistão e nas populosas cidades dos Estados Unidos. Que peso tem a missão na experiência sacerdotal de vocês?
Todos os padres do Studium Christi deram a disponibilidade para partir em missão e, assim, no tempo, nasceram “casas” no Cazaquistão, Argentina, Paraguai, Venezuela, Peru e Porto Rico, que estão ligadas ao Studium Christi de Milão. Outros grupos nasceram nos Estados Unidos e em outros lugares. Atualmente, são cerca de 250 padres do Studium Christi no mundo. Na Itália, também existem casas em Como e Rímini. E, ainda, um de nós, dom Vecerrica, tornou-se bispo, mas continua a participar do pequeno grupo do Studium Christi na região de Marche.

De que modo vocês são ligados à realidade da Fraternidade de CL?
Não somos uma “superfraternidade clerical”, mas um grupo da única Fraternidade de CL. Pela responsabilidade pessoal dentro do próprio grupo, cada um vive a imanência à única Fraternidade. Sempre quisemos viver a experiência do carisma dentro da função que nos foi dada pela Igreja. O carisma é a vida da pessoa, embora hoje, infelizmente, o padre seja cada vez mais reduzido à função. Mas, somente se se faz uma experiência, a função é incisiva.

Durante um encontro de seminaristas, muitos anos atrás, a uma pessoa que perguntou a padre Giussani o que seria recomendado a alguém que estava se preparando para se tornar padre, ele respondeu secamente: “que seja homem”. O que isso significa para você?
Essa indicação destaca o modo com o qual o Movimento deve ser seguido: se é por causa de uma função, mesmo a de padre, o eu nunca é colocado em jogo. Se, ao contrário, é porque a fé é uma resposta para você, às suas exigências elementares, então se torna o volante de tudo.

Em uma pregação no seminário, um padre explicou que, do jeito que as coisas caminham, nos próximos dez anos muitas paróquias terão só um padre e, algumas, nenhum. E concluiu que este fato seria providencial porque, finalmente, os leigos assumiriam sua responsabilidade. Então, o padre não é assim tão essencial...
O padre é insubstituível porque assegura os sacramentos, que são a fonte e o paradigma da vida cristã. Sem padre não haveria Igreja. A tragédia é que a decadência da vida cristã, hoje, torna o padre quase inútil. E percebo que, cada vez mais, a tendência não é perguntar-se sobre o deserto de experiência que vivemos nessa época, mas clericalizar os leigos. Recentemente, um acólito me escreveu: “Há tempos me perguntava se na experiência cristã existiam razões. Encontrando vocês, achei a resposta”. Como leigo, tinha se enquadrado em uma função, mas nunca tinha feito a experiência da razoabilidade da fé. Um leigo clericalizado é quase pior do que um padre clerical.
Todo o esforço entre nós, do Studium Christi, é para não trocarmos a experiência humana pelo papel a desempenhar. Nos nossos encontros não colocamos em discussão, em primeiro lugar, os problemas pastorais, sobre os quais também falamos, mas a experiência que vivemos, senão corremos o risco de nos tornarmos uma pequena e inútil, se não danosa, “super-cúria”. Por meio da nossa experiência humana queremos dar uma contribuição à vida da Igreja e nada mais.

 
 

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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón