De 8 a 15 de maio, Bento XVI visitou a Terra Santa, onde se encontram as raízes da nossa fé. Entre feridas ainda abertas e problemas de convivência, foi a viagem mais delicada deste pontificado, mas que trouxe “uma rajada de esperança
O pastor foi ao encontro do pequeno rebanho. Estendeu-lhe a mão, reconfortou-o, levou-lhe o abraço da Igreja universal – tão importante para quem vive a síndrome de minoria sitiada –, e lançou-lhe o desafio-missão de permanecer fiel ao acontecimento que o gerou. Ao mesmo tempo, estendeu a mão amiga a judeus e muçulmanos, que com os cristãos compartilham a vida quotidiana numa terra que todos consideram santa.
Um balanço da viagem realizada por Bento XVI, de 8 a 15 de maio, à Jordânia, Israel e Territórios governados pela Autoridade Nacional Palestina – a mais difícil de seu pontificado –, só pode tomar como ponto de partida o objetivo principal que o sucessor de Pedro se propôs: confirmar na fé o seu povo e levar uma mensagem de paz e de esperança a uma terra flagelada por divisões, onde a perspectiva de mudança verdadeira parece tão distante.
À comunidade cristã – hoje reduzida a menos de 2% da população e na qual cresce a tentação de migrar para sítios mais seguros – o Papa relançou o apelo ao reconhecimento da unidade como dom de Cristo e o convite a permanecer, para que os lugares onde se manifestou o acontecimento que mudou a história do mundo não se transformem em um museu em que as pedras vivas cedem espaço a restos arqueológicos.
“Não tenhais medo – disse ele em Belém, na Praça da Manjedoura –. Podeis contar com as preces e a solidariedade da Igreja universal, e fazei a vossa parte com iniciativa concretas para consolidar a vossa presença e para oferecer novas possibilidades aos que sintam a tentação de partir. Sede uma ponte de diálogo e de colaboração construtiva na edificação de uma cultura de paz que supere o atual estado de medo, de agressão e de frustração. Edificai as vossas Igrejas locais fazendo delas laboratórios de diálogo, de tolerância e de esperança, bem como de solidariedade e de caridade prática”.
As raízes comuns com os irmãos mais velhos. No dia de sua chegada a Israel, ao plantar uma árvore de oliva no jardim do palácio presidencial de Tel Aviv, o Papa reafirmou os vínculos que a história fez nascer entre e a Igreja e o povo judeu. “Tiramos o nosso alimento das mesmas raízes espirituais. Nos encontramos como irmãos, irmãos que em certos momentos da história comum mantiveram um relacionamento tenso, mas estão, hoje, firmemente empenhados na construção de pontos de duradoura amizade”. E ao visitar o memorial do Holocausto, prestou homenagem, como já havia feito em passado recente, ao sacrifício de milhões de judeus que foram constrangidos a escrever um dos capítulos mais sangrentos da história recente. Um capítulo – admoestou no discurso pronunciado no final da viagem, respondendo implicitamente às críticas dos que, nos dias anteriores, haviam censurado uma possível subvalorização da Shoah – “que jamais deve ser esquecido ou negado”. E que se torna, ao invés, ocasião para se construir uma nova concórdia. “Essas escuras lembranças devem reforçar a nossa determinação de nos aproximarmos mais ainda uns dos outros, como ramos da mesma oliveira, nutridos pelas mesmas raízes e unidos pelo amor fraterno”.
Islã, elogio da razão. Nos sete dias de permanência na Terra Santa, o Papa entrou duas vezes numa mesquita. E como havia feito em Regensburg, em 2006 – em meio a incompreensões e interessados mal-entendidos dos que não haviam prestado atenção à lógica estrita das suas palavras –, repropôs a razão como o terreno privilegiado para um encontro com o mundo islâmico. Uma razão – como confirmou no encontro com os líderes muçulmanos na mesquita Rei Hussein, em Amã – “que se eleva ao plano mais alto quando iluminada pela luz da verdade do único Deus”. Razão que deve caminhar junto com a liberdade. “Aqueles que adoram o único Deus – disse por ocasião da visita à mesquita de Omar (cúpula da Rocha), em Jerusalém – creem que Ele considerará os seres humanos responsáveis por suas ações. Os cristãos afirmam que os dons divinos da razão e da liberdade estão na base dessa responsabilidade. A razão abre a mente para se compreender a natureza compartilhada e o destino comum da família humana, enquanto que a liberdade impulsiona o coração a aceitar o outro e a servi-lo na caridade. O indivisível amor pelo único Deus e a caridade para com o próximo tornam-se, assim, o fulcro em torno do qual gira tudo o mais”.
O muro de cimento e nos corações. A peregrinação da fé e do diálogo religioso e cultural não podia deixar de abordar os obstáculos da política, que naquelas bandas afloram diariamente no mar de uma difícil convivência. O recife mais evidente é o muro construído por Israel para se defender dos ataques terroristas e que tornou complicada e muitas vezes impossível a vida quotidiana de milhares de palestinos na West Bank. “Uma tragédia”, definiu-o o Papa, fazendo votos de que ele possa ser removido, mas lembrando que “antes de tudo é necessário remover os muros que construímos em volta dos nossos corações”. “Foi uma das visões mais tristes durante a minha visita a esta terra – recordou em seu discurso final – . Enquanto passava por ele, rezei por um futuro em que os povos da Terra Santa possam viver juntos em paz e harmonia, sem a necessidade de tais instrumentos de segurança e de separação, mas no respeito e na confiança mútua, na renúncia a qualquer forma de violência e de agressão”.
A solução “Dois Estados para dois povos”, que a Santa Sé (junto com amplo estrato da comunidade internacional) propõe, concretiza-se no direito de os palestinos terem uma pátria independente e soberana e no dos israelenses viveram dentro de fronteiras seguras e reconhecidas internacionalmente. Tem-se que percorrer, ainda, uma longa estrada até se chegar a essa meta, prelúdio de uma paz estável e duradoura. Há necessidade do concurso de todas as partes envolvidas: israelenses, palestinos, o mundo árabe, Estados Unidos, ONU e União Européia. Mas há necessidade, sobretudo, daquele pequeno rebanho que o Papa foi visitar e que, naquela tormentosa realidade, continua a testemunhar a escandalosa verdade que ele mesmo recordou diante do Santo Sepulcro: “Como cristãos, sabemos que a paz desejada por esta terra dilacerada por conflitos tem um nome: Jesus Cristo”.
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