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Passos N.139, Julho 2012

CULTURA - Literatura

Ariano Suassana: Um escritor das “questões de vida ou de morte”

por Fabíula Martins

Um dos mais importantes escritores brasileiros acaba de completar 85 anos. Tendo em vista, a riqueza de sua carreira literária, percorremos sucintamente a sua trajetória pessoal e artística para mostrar um homem ferido pela alegria e dramaticidade de viver.

Ariano Suasssuna completou 85 anos de vida no último dia 16 de junho, recebendo como presente a indicação ao Prêmio Nobel. Nascido na Paraíba, mas radicado em Recife desde 1942, o escritor criou uma obra marcada pelas manifestações populares nordestinas, como o folheto de cordel, o repente, o teatro de mamulengos, o bumba-meu-boi e as histórias, mitos e personagens que estão no imaginário do povo sertanejo.
Ariano decidiu seguir a carreira literária devido ao assassinato de seu pai, João Suassuna, por motivos políticos ligados a Revolução de 1930. Ele tinha apenas três anos de idade quando se viu “Sem lei nem Rei, [...] arremessado,/bem menino, a um Planalto pedregoso.” (Suassuna, 2007, p.171). A ausência precoce da figura paterna, que será uma ferida permanente aberta, influenciou profundamente a sua adesão à literatura, as suas escolhas pessoais, políticas e artísticas ao longo da vida.
Esse escritor, acima de tudo nordestino, começou a trilhar o seu caminho de trabalho com as palavras a partir do olhar sensível de um professor de Geografia que percebeu naquele jovem estudante um talento nato para as belas-letras. Foi esse professor que publicou, em 1945, o primeiro poema de Ariano intitulado Noturno.
A poesia é a nascente da obra literária suassuniana, inclusive o teatro que revelará Ariano para o Brasil e o mundo através da peça Auto da Compadecida. “Eu acho que o teatro é uma forma de você realizar a poesia. Tem muita gente boa que diz isso e eu estou de acordo. Eu considero a minha poesia, que é praticamente desconhecida, eu considero a fonte profunda de tudo que eu escrevo”, afirmou o autor em entrevista cedida em 10 de agosto de 2010, em sua casa.
Ariano começou a escrever texto dramático por causa da amizade com o escritor Hermilo Borba Filho (1917-1976) na Faculdade de Direito em 1946. Hermilo tornou-se um mestre para Suassuna, e para muitos artistas da mesma geração, sabendo reconhecer nele o anseio de realizar uma arte que representasse a sua visão de mundo e a cultura popular nordestina. Esse dois amigos fundaram juntos o Teatro do Estudante do Pernambuco – TEP (1946), o Teatro Popular do Nordeste – TPN (1970).
O TEP e o TPN foram verdadeiros laboratórios artísticos que definiram a posição de Ariano na arte: defesa, divulgação e fomento da cultura popular nordestina. Além de terem contribuído para a criação do Movimento Armorial (1970), idealizado por Suassuna, que tem como objetivo de criar uma arte erudita brasileira baseada no Romanceiro Popular do Nordeste.
Na amizade com Hermilo, Suassuna conheceu dramaturgos universais, entre eles encontrava-se o espanhol Frederíco Garcia Lorca. Ao ler provavelmente Bodas de Sangue, Ariano descobriu a possibilidade de realizar um trabalho literário partindo da sua região, permeada de figuras proféticas, míticas, cômicas, trágicas, que dialogasse com o universal. Pois, o coração de todo homem constitui-se do que Ariano denomina “questões de vida ou de morte”, ou seja, daquelas perguntas existenciais feitas por todo ser humano: Quem eu sou? Por que existo? De onde vim e para onde vou? Por que morremos? Por que sofremos? Qual o sentido da vida? Deus existe?
Apesar das perguntas serem universais, cada cultura e cada pessoa encontrará uma maneira própria de respondê-las. Ariano encontrou na literatura um caminho para responder a esses enigmas fundamentais da vida, criando personagens que representam à simplicidade, a fé, a alegria, a sofrimento, a luta, principalmente, a religiosidade do povo sertanejo. A “visão religiosa do mundo” está presente tanto na vida de Ariano, como na sua na obra, de forma latente. Em entrevista no dia 10 de agosto de 2010, afirmou: “Eu sou uma pessoa religiosa, eu sou um homem que tenho uma visão religiosa do mundo, não estou dizendo com isso que sou um católico exemplar não, mas tenho uma visão religiosa do mundo e do homem, então, isso naturalmente aparece no meu teatro, no meu romance e na minha poesia. É a maneira que eu tenho de encarar o mundo. Eu recebi uma influência muito grande do escritor russo Dostoievski. E ele tem uma frase que a mim me tocou profundamente. Ele disse: “Se Deus não existe, tudo é permitido. Então, quando eu li essa frase pela primeira aí cheguei a conclusão. Eu disse o seguinte: Ele tem razão se Deus não existe tudo é permitido e como eu vejo que nem tudo permitido, então eu acho que Deus existe”.

RETRATO DA VIDA. Dessa constatação, Ariano revelará, nas suas poesias, peças e romances, um escritor consciente da condição humana dramática, paradoxal, peregrina, aparentemente absurda, que procura na fé o sentido para viver os desafios impostos pela vida, como podemos observar na fala do personagem Cheiroso, em A pena e a lei, para Joaquim, Cabo Rosinha, Vicentão Borrote, Benedito, João Benício e Padre Antônio: “Estão vocês dispostos a aceitar o mundo, sabendo que o centro deles é essa Cruz, que a vida importa em contradição e sofrimentos, suportados na esperança?” (Suassuna, 2007, p.146).
Na obra literária suassuniana é evidente que sem Deus, portanto, sem Aquele que cria toda realidade, a existência torna-se superficial, desesperada, uma luta vã. Suassuna utiliza a literatura para ser mais fiel a vida segundo as suas concepções que nascem da parte do mundo que lhe foi dada: uma região de sol e poeira, de chão pedregoso, de cabras, de cangaceiros, santos, profetas, assassinos, prostitutas, palhaços, avarentos, juízes, portanto, homens e mulheres viventes e sobreviventes do vasto mundo chamado sertão onde dor e alegria, morte e vida, fome e fatura, amor e ódio, virtude e pecado, fé e esperança não são fragmentações, mas a mesma face do rosto humano.
Escritor multifacetado, homem de fé, amante da simplicidade, fiel aos amigos, consciente da finitude da vida e do desejo de infinito do homem, Ariano cria uma obra que transforma a palavra em poesia, teatro, romance que mostra o ser nordestino, o ser brasileiro, o ser humano como caminhante esperançoso de um dia realizar-se plenamente.


PRINCIPAIS OBRAS
Teatro

- Uma mulher vestida de Sol
- Auto da Compadecida
- O casamento suspeitoso
- O santo e a porca
- A pena e a lei
- Farsa da boa preguiça
- Ariano Suassuna - Seleta em Prosa e Verso

Romance
- A História de amor de Fernando e Isaura
- O Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta


 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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