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Passos N.161, Agosto 2014

PETRÓPOLIS/ Colegiais

A promessa é o centuplo

por Maria Inês Damasceno

Dias intensos durante as férias com jovens colegiais. A derrota no futebol, a alegria do canto e das poesias, os imprevistos agradáveis ou não. Ocasiões para levar a sério a própria vida

Após a experiência do Tríduo Pascal, em abril, junto com alguns amigos educadores, decidimos propor as férias regionais em julho, no Sítio das Irmãs Angélicas, em Teresópolis/RJ. Imediatamente, os colegiais de Petrópolis aderiram à proposta de prepararmos cada gesto das férias. A nós se juntaram um grupo do Rio, outro de São Lourenço e, também, dois colegiais de Belo Horizonte. Nos quatro dias que estivemos juntos, fomos acompanhados pelo padre Paulo Romão, responsável pela comunidade de CL da cidade do Rio de Janeiro.
Como havíamos agendado a data em abril, não atinamos para a tabela dos jogos da Copa e que teria a chance de a seleção brasileira jogar naquele dia, terça-feira, 8 de julho. Por causa dessa coincidência, nos organizamos para chegar ao sítio mais cedo e assistir ao jogo juntos. Quanta frustração naquele jogo entre Brasil e Alemanha! Durante o jogo, os educadores se perguntavam: “E agora, como serão esses dias? Os meninos ficarão desestimulados, como será?”.
Estávamos todos ali, éramos 52. Eu, em silêncio, pedia que o Senhor não me deixasse desanimar e que tivesse criatividade para não deixá-los desanimados também. Na verdade, eu me perguntava como não me deixar abater e foi então que, pensando nos Exercícios da Fraternidade, quando o Carrón diz que tudo serve para julgar e que nada é contra nós, cheguei ao juízo de que o que nos foi prometido foi o cêntuplo e não menos. A derrota por 7 a 1 era muito pouco para o desejo que tínhamos. No final do jogo, apesar da decepção e tristeza, o que nos determinava era a alegria de estarmos juntos. E era só o início das nossas férias.

Muitas aventuras. À noite, reunimo-nos com um grupinho menor para darmos um juízo sobre o dia. E Agustin responde: “O dia de hoje, foi tão intenso, que a mim parece que estou aqui com vocês há três dias. E mesmo o Brasil tendo perdido, não estou triste, tem alguma coisa a mais que me faz feliz aqui”.
Pablo complementou dizendo: “Desculpe, mas olhar com vocês para este jogo é até engraçado, porque 7 a 1 poderia me fazer chorar muito, mas com vocês me dá vontade de rir. É outra coisa”.

No dia seguinte, a proposta era o passeio ao parque da Serra dos Órgãos, que tem este nome porque os europeus, quando avistaram a serra do Rio de Janeiro, disseram que esta se parecia com um órgão de tubos das igrejas europeias. A subida foi tranquila, fizemos uma pequena trilha suspensa, jogamos, cantamos, fizemos um piquenique, uma parte da caminhada em silêncio, conversamos e conhecemos as pessoas novas. À noite, o um grupo dos universitários de CL do Rio veio para apresentar o sarau “Onde estará o Amor de minha alma?”. Foi um momento de beleza, poesia e muita participação dos colegiais que, imediatamente aderiram à proposta de declamarem os poemas. Adélia Prado, Drummond, Leopardi e muitos outros foram nossos companheiros naquela noite. A maioria dos universitários tinham feito conosco o caminho enquanto colegiais e comunicaram a alegria de poder retornar a umas férias por meio das quais vários deles tinham encontrado a experiência do Movimento. Quinta-feira, novo dia, nova aventura! A gincana das equipes. Muita diversão e garra de todos! Nem mesmo a forte chuva desanimou a garotada. Uma das meninas comentou: “É verdade que tudo concorre para o bem! A chuva veio dar mais emoção!” Após os jogos, um delicioso churrasco e muita alegria!

Assim como acontece na vida quotidiana, nem tudo é só beleza e harmonia, e nos perturbamos porque o celular de uma das colegiais desapareceu. Procuramos em todos os lugares, propomos algumas possibilidades e nada do celular. No entanto, este fato também serviu para julgarmos que, no dia a dia, o mal quer vencer e que se não julgarmos sempre, poderemos perder o melhor.
Este incidente perturbou, mas não conseguiu tirar o foco daquilo que procurávamos, pois estávamos ali “correndo para alcançá-Lo” e na vida acontece como num trecho da poesia de Eliot: “Da negatividade que o ser de cada qual continha;/ Bestiais como sempre, carnais, egoístas,/ Interesseiros e obtusos como sempre haviam sido/ E ainda assim lutando, sempre reafirmando/ E recomeçando a marcha num caminho que fora ilu¬minado pela luz;/ Tantas vezes parando, perdendo tempo, desviando-se,/ Atrasando-se e voltando, mas jamais seguindo outro caminho” (T.S. Eliot, Coros de “A Rocha”).

Este fato, que poderia cancelar a beleza vivida, ajudou-nos a entender que não precisamos “ter medo da nossa humanidade”. No final, como não apareceu o aparelho, os meninos propuseram que contribuíssemos para que a menina pudesse ter um novo celular. Padre Paulo nos ajudou a entender que, com o Senhor, tudo se renova, até mesmo a nossa forma de olhar para situações constrangedoras, pois quando nos colocamos em companhia, aquilo que pareceria o fim, transformava¬-se num novo início. Nenhuma dificuldade poderia tirar de nós o que a nós fora prometido, o cêntuplo.
Nesta noite, durante o jantar, um rapazinho veio conversar comigo. Ele me olhou bem nos olhos e me pediu: “Inês, por favor, não desista! O celular é só um particular. Como você mesma disse, é o mal que quer atrapalhar, mas não vai conseguir. Por favor, promete que não vai desistir de fazer encontros assim, pois eu preciso desta companhia, eu preciso me sentir seguro como me sinto aqui. Este lugar, estas pessoas me passam segurança. Aqui eu me sinto seguro. Promete que não vai desistir de nós”. Agradeci dizendo-lhe que não desistiria jamais, pois também eu precisava da companhia dele e da dos demais para viver.
E ele continuou: “Sabe, eu me apaixonei por uma menina que está aqui. Há alguns meses nos conhecemos e falo com ela todos os dias. Mas entendo que é um amor que não poderei viver agora porque ela mora em outra cidade, mas estou aprendendo que ser amigos salva tudo. E quero ser amigo dela. Por favor, me ajuda a não perder esta certeza que aprendo junto com vocês, que a amizade é sempre maior. E que se este amor for verdadeiro, irá durar. Ajuda-me, por favor. E se eu precisar falar destas coisas, posso lhe procurar, professora? Eu não quero ficar sozinho”. Neste diálogo, vi a ternura de Jesus que me dizia para continuar, pois a missão era essa, como havia nos dito o Papa na Jornada Mundial da Juventude.
À noite, as equipes apresentaram uma releitura da poesia de Eliot antes citada. Foi um espetáculo de criatividade e alegria.

Tocar com as mãos. Alguns alunos quando viram que teríamos missa todos os dias perguntaram se era facultativo ou obrigatória a participação e foram desafiados a chegarem a uma conclusão. Dissemos a eles que, quando experimentamos algo bom, queremos que não acabe; se o dia era cheio de novidade e deixava a todos felizes, por que não participar e ver o que significava aquele gesto também? E aceitaram! No final, três desses colegiais, perguntaram como poderiam fazer para receber a Eucaristia. Eis o cêntuplo!
Na assembleia final, era evidente que éramos os mesmos, mas todos diferentes. Agustin, mais uma vez, disse que se no primeiro dia parecia estarmos juntos há três dias no sítio, ao final, após os quatro dias, parecia estarmos ali há um mês, porque se sentia em casa, pois tudo era muito familiar e próximo.
Entendemos, mais uma vez, que o problema não são os jovens, como nos disse outra vêz padre Carrón. O problema são os adultos que, muitas vezes, não sabem o que propor. Há um ano da realização da JMJ, viver esses dias com aqueles adolescentes só veio confirmar o que falou o Papa Francisco: temos de ir a todos os lugares e testemunhar com a vida que, com Ele, o que temos é cem vezes mais. Pudemos tocar com as mãos a Presença d’Ele. E voltamos muito mais desejosos de encontrar os nossos outros alunos e lhes comunicar a beleza que experimentamos naqueles dias.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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