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Passos N.169, Maio 2015

RUBRICAS

As cartas

DEPOIS DE QUARENTA ANOS, O REINÍCIO
Quarenta anos atrás, um imprevisto – o encontro com CL – mudou a minha vida. Para sempre. Em minha longa militância no Luta Contínua, eu procurava, em vão, colar a demanda religiosa inconsciente à demanda, igualmente forte, de justiça social. O resultado? Fracasso total. Eu havia deixado a Igreja e a criticava, mas, ao mesmo tempo, não conseguia dar respostas, a não ser ilusórias, aos desafios que a sociedade fazia ecoar na minha vida de colegial. Depois, no primeiro ano de faculdade, como um padre renegado, joguei fora minha batina: chega de perguntas, só estudo e barulho. Foram rostos e não um discurso ou um julgamento politicamente correto que me converteram. Por isso entrei no Movimento. Eu continuava a pensar mal da Igreja e dos padres. Continuava a pensar que se, às vezes, os membros de CL apanhavam, certamente era porque haviam procurado a briga. No entanto, aqueles rostos, nem sempre os mais belos do mundo, agarraram a minha vida, fazendo-me entrever a beleza de uma vida diferente. Foi por causa desses rostos que aceitei participar da peregrinação pelo Ano Santo a Roma, convocada pelo Papa Paulo VI, que aos meus olhos representava a quintessência da Igreja velha e que caminhava para o ocaso; depois, mudei a minha mente. Foi por causa desses rostos que, em 1976, participei, em Riccione, da famosa palestra de Giussani sobre utopia e presença. Sobre esse padre, duas coisas que ele enfatizou a respeito da vida cristã me impressionaram: liberdade e misericórdia. Outros rostos, quarenta anos depois, me fazem tocar com as mãos que a única coisa que conta é se deparar com pessoas transformadas por Cristo. Por causa desses rostos, fui à Roma para o encontro com o Papa Francisco: de mãos vazias e sem as escórias do debate que precedeu e acompanhou o evento. Neste momento, minha vida não precisa de ideologia, de saudades. Mas de um carinho que toque as coisas que não vão bem, como a injusta perda do trabalho. Em Roma, voltei a ouvir do Papa Francisco os acentos que havia ouvido, no meu início, de Dom Giussani: liberdade e misericórdia. E são válidos ainda. Tanto é verdade que, ao experimentar os dois decisivos anticorpos contra a autorreferencialidade, fui presenteado – contra qualquer expectativa minha – com um outro início. O meu essencial, hoje, é experimentar o afago da misericórdia. Peço que me acompanhe e que eu saiba reconhecê-la até o último dia da minha vida. Isso, para mim, significa seguir o carisma de Dom Giussani.
Stefano, Bolonha (Itália)

“PENSEI NELE, QUE NOS DISSE: SEJAM LIVRES!”
Caro Julián, não pude ir a Roma e acompanhei a Audiência pela televisão. Fiquei impressionada com a liberdade do Papa, a ponto de ter conseguido nos repreender com imensa ternura. Como dizia a Rose: estávamos em casa. Mas eu acrescento: não porque estivéssemos ali todos juntos, não pela coisa em si, mas pela evidente presença de uma pessoa que inflama o ânimo e faz respirar plenamente outra vez, faz-nos sentirmo-nos de novo em casa com Ele. Esta semana, no escritório, o ar estava pesado com provocações bobas e pouco proveitosas. Pensei no Papa, que nos disse: “Sejam livres”. Comecei inclusive a caminhar de modo novo porque certa de ser amada, portanto, livre. Enfrentei muito decidida também algumas situações com meus filhos e com meu ex- -marido. Então, acho que a vida vale a pena de ser vivida somente neste nível: apaixonados por Jesus.
Marcella

ALINA E AS DUAS SENHORAS RUSSAS
Hospedei duas senhoras russas, ortodoxas, que vieram a Roma para a Audiência com o Papa. Chegaram na quinta-feira à tarde. Mas quinta-feira, na minha casa, é dia de limpeza, que é feita por Alina, uma diarista. Ela é ucraniana, de família muito pobre, e, também ela, ortodoxa. Seu filho foi convocado compulsoriamente pelo exército ucraniano, foi ferido pelos russos e agora está em casa para uma breve convalescência. Minha mulher gosta muito de Alina, e temia que, quando esta se encontrasse com as duas mulheres, pudesse acontecer algo desagradável. Nós a avisamos antes. Quando chegaram, pedi a Alina que me ajudasse a organizar o quarto delas. Alina fez as camas, depois conversou amigavelmente com elas, não sei em qual dialeto russo. Quando entreguei às minhas hóspedes as passagens do ônibus, Alina explicou como elas podiam usá-las, a validade, as estações do metrô, etc. Enquanto conversavam, puxei à parte o meu filho Tomás e lhe disse: “As nossas hóspedes não sabem que o filho de Alina foi ferido pelos russos, mas Alina sabe. No entanto, não há sombra de raiva em seu tom de voz, nenhum ressentimento no seu olhar. Ela fez um serviço para os seus inimigos, isto é, ela as amou. Você se lembra do que Jesus disse: o que há de mais em amar os próprios amigos? Disso todos são capazes. Mas vocês devem amar os seus inimigos”. E Tomás: “É grandioso!”. Naquela tarde entendi de fato o que Dom Giussani pretendia dizer quando afirmava que o fato cristão, mais do que uma religião, é um acontecimento: ou seja, um lugar e um tempo em que acontecem fatos surpreendentes, de grandíssima positividade, em outras partes considerados impossíveis. O que Alina faz para ser assim? Ela é humilde. A humildade é um juízo. Se ela pudesse expressar-se bem na nossa lingua, diria: “eu sou pobre, mas isso corresponde à vontade de Deus, e é o que me basta para viver”.
Massimo, Roma (Itália)

O PAPA, ASSIM COMO MEU PAI: CORRIGE OS PASSOS EM FALSO
Na primeira vez em que li o discurso do Papa Francisco a CL, fiquei um pouco incomodada. Parecia que ele queria corrigir o Movimento e quase me irritou. Depois de ter refletido mais a fundo sobre as suas palavras, comecei a perceber, impressionada, que ele é realmente um pai, porque, como ele fez, meu pai também me corrige quando dou um passo em falso. Papa Francisco estava nos lembrando das raízes do nosso Movimento e do cristianismo: o encontro com Cristo. Fiquei tocada quando ele disse: “A moral cristã é uma resposta, é a resposta comovida a uma misericórdia surpreendente, imprevisível e, segundo os critérios humanos, até ‘injusta’, de Alguém que me conhece, conhece as minhas traições e que, no entanto, me ama, me estima, me abraça, me chama de novo, espera em mim, espera algo de mim”. Ele me acaricia com misericórdia, com uma misericórdia tão totalizante da qual me sinto indigna e que, normalmente, tenho dificuldade em aceitar. O importante não é se eu “me torno melhor”, mas se me refugio nos Seus braços misericordiosos ou não.
Margaret, colegial de Minnesota (Estados Unidos)

UM PASSO RUMO AO DESTINO
Há quase um ano, começamos a nos encontrar semanalmente para rezar o terço a Nossa Senhora pelas intenções do Papa, especialmente pelos cristãos mártires, pelo fim das guerras e do avanço do mal que tem causado tanta dor ao mundo. Esse gesto nasceu do desejo de atender ao pedido do Papa Francisco de que todos rezassem juntos pela paz nas regiões de conflitos no Oriente Médio. Através do gesto de oração, sentimo-nos caminhando ao lado daqueles que deixam as suas casas para tentar salvar as suas vidas, e principalmente preservar sua fé e sua identidade cristã. Cada Ave Maria é como um passo dado, em companhia, rumo ao destino da nossa vida: Cristo. Como resposta de Maria, temos experimentado a graça de ver salvas também as nossas vidas, através do fortalecimento da nossa fé e da amizade que cresce entre nós. No início, éramos duas famílias. Com o tempo, outros se juntaram a nós, além dos que rezam em suas casas porque não conseguem estar presentes naquele horário. A fidelidade a esse gesto ainda nos surpreende. Após uma semana cheia, cansados do dia de trabalho, misteriosamente estamos lá. Às vezes pensamos em “faltar”, mas graças à provocação e ao convite que fazemos uns aos outros, conseguimos deixar de lado o cansaço e a preguiça para dar mais um passo. Maria não nos deixa desistir, e o terço torna-se um farol que guia o caminho da nossa semana. “Para mim, tem sido uma experiência fundamental que me faz olhar, com liberdade, a realidade em casa, no trabalho e a mim mesma. Começa a se fazer carne a necessidade da oração, que me faz mais livre para me lançar nos relacionamento e mais feliz”, conta uma amiga que reza conosco. Ao longo desse caminho, vamos compartilhando a vida, nossos filhos adolescentes também rezam o terço e sabem que a última dezena é sempre deles. A amizade entre eles também se enriquece e, muitas vezes, a sexta-feira do terço abre um final de semana de convivência intensa que só termina após a missa do domingo. Tudo é muito simples e essa simplicidade também nos surpreende. Não inventamos nada, apenas recitamos cada Ave Maria como um passo no deserto. A cada Mistério, vão passando à nossa frente as dores do povo perseguido, as nossas próprias dores, a agonia dos Mártires, o desejo de liberdade, os pedidos pela saúde e pelo trabalho, a fé, a gratidão por pertencer a uma companhia guiada, a certeza do amor de Cristo e da proteção de Maria. Ler nos artigos da Passos o testemunho e a experiência dos refugiados nos alimenta e nos aproxima. Não conseguimos mais ficar indiferentes aos sequestros, aos ataques aos lugares sagrados, à certeza daqueles que esperam contra toda a esperança. Síria, Iraque, Paris, Iémen, Líbia, Rio de Janeiro, São Paulo unem- -se no mesmo pedido para que o Senhor venha e para que o mundo O reconheça, para que nós O reconheçamos. “A nossa fé hoje é muito mais forte do que antes. Não temos medo de nada porque estamos convencidos de que Deus está conosco”\,escreveu ao Papa Francisco um dos cristãos que precisou deixar a sua casa para fugir das perseguições na Síria. Que o Senhor permita que, caminhando juntos sob a proteção de Maria, possamos também nós alcançar essa mesma certeza.
Patrícia e o Grupo do Terço, São Paulo (SP)

NUMA SURPRESA, A ÚNICA COISA NECESSÁRIA
Devido ao meu trabalho, acompanho um projeto que acontece em várias cidades e, por isso, fiz uma viagem para o Espírito Santo no mês de março. Graças ao testemunho de um amigo, eu me hospedei numa pousada aos pés do Santuário de Nossa Senhora da Penha, padroeira do Estado, de onde se tem uma vista belíssima. Enviei uma mensagem a uma amiga dizendo que estava em sua cidade natal, e descobri, com grande surpresa, que haviam duas pessoas do Movimento morando por lá e peguei o contato deles; consegui me encontrar com Gabriel em Vi tória, e com Maria do Carmo, em Vila Velha, na missa de São José. Com o Gabriel, que é de Milão e está fazendo um intercâmbio, me impressionou ouvir dele que em Vitória, onde só existe ele do Movimento, “a experiência é mais difícil, porém é mais verdadeira”, porque é uma grande ocasião de verificação. Com a Maria do Carmo, a coisa que mais me impressionou foi a sua fidelidade à experiência do Movimento, depois de tantos anos. Ela encontrou o Movimento no Rio, aonde foi para fazer um doutorado dez anos atrás, e depois voltou à Vila Velha, onde reside. De certa forma, vi semelhança com a experiência que eu faço, pois como ela é geneticista, enfrenta muitas pessoas e situações ideológicas no seu trabalho cotidiano. Porém, a coisa que mais me impressionou destes encontros foi perceber o que nós temos de fato em comum: aquilo que nos aconteceu, que é o rosto de Cristo por meio da vida do Movimento, e como Cristo é capaz de produzir uma unidade impossível e impensável. Eu me dei conta de que era a única coisa, e no entanto, a única que é de fato necessária. Fiquei muito grato com o que me aconteceu no Espírito Santo. Identifiquei como uma grande misericórdia de Cristo e de Nossa Senhora para mim, e me nasceu o desejo de viver com os amigos que encontro no dia-a-dia a mesma consciência que tive lá no Espírito Santo sob as bênçãos de Nossa Senhora da Penha.
Dimitri, Brasília (DF)

UMA VENDA ESPECIAL DA REVISTA, POR PASSOS (E POR NÓS)
No sul da Itália, um grupo de universitários se prepara para uma venda extraordinária da revista.
Eu e os meus amigos acolhemos com extrema gratidão a proposta de venda extraordinária da revista Tracce (edição italiana de Passos) prevista para maio: pensamos em dedicar dois dias de venda pública na Ponte da Universidade, que é a principal via de acesso, para ter ocasião para encontrarmos muitas pessoas e levar a elas a novidade da beleza que nos fulminou. No ano passado, para divulgar o Dvd pelos 60 anos de CL, fizemos a venda na paróquia universitária: desta nossa simples proposta nasceu um relacionamento com os padres, e muitos de nós testemunharam uma fecundidade que nunca teríamos imaginado. Por este motivo, dou minha adesão com a consciência de que este é um gesto, antes de tudo, para me despertar, para que se torne mais consistente o meu relacionamento com o Tu ao qual Carrón nos chama a atenção. Nós somos apenas nove pessoas na comunidade, então não vamos ordenar muitas cópias da revista para a venda, mas estamos prontos a nos dedicar na divulgação e a viver este gesto com a consciência de que não serão as nossas capacidades o determinante de tudo.
Claudia, Cosenza (Itália)

ARAUTO DE DEUS
Há três anos, no dia 11 de maio, Deus chamou o padre Massimo Cenci para seu reino. Ele era muito verdadeiro: dizia “pão-pão; queijo-queijo”. Dava nome às coisas, sincero até demais, com um temperamento forte, porém, quando o momento exigia misericórdia, ele a tinha para dar, como um Pai verdadeiro. Padre Massimo transformou minha vida e de outras centenas de pessoas. Tinha o dom da palavra e a sabedoria de Deus, que tocava o coração daqueles que o encontrava. Discípulo fiel de Jesus e de Dom Giussani, nos ensinou a viver Cristo aqui e agora. Ele nos disse a nossa verdadeira identidade e a estrada que é Cristo, na qual devemos caminhar para viver o cêntuplo, aqui e agora. Era fiel ao Senhor e praticava muito o jejum, para estar sempre na presença do Senhor. Sua frase cheia de sabedoria era: “Se o desejo é verdadeiro, o milagre acontece”. Guardo com profunda gratidão seus ensinamentos e sua presença em minha vida.
Vanila, Manaus (AM)

 
 

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