A crise política atual não é obra apenas de um partido ou uma coalizão de partidos. Todo o sistema político e todos os partidos, estejam com o governo ou na oposição, se ressentem da mesma incapacidade de dialogar com a população insatisfeita, de indicar novos caminhos para superar os obstáculos do momento. É normal que exista uma tensão, e até um relativo antagonismo, entre o Poder Executivo e o Legislativo, mas nos últimos meses este conflito chegou a paralisar o governo federal. A “base aliada” se comporta como uma oposição imprevista, a oposição formal não sabe para onde ir e o País parece patinar prisioneiro do corporativismo e do fisiologismo dos políticos.
A proposta de impeachment da presidente Dilma ou as muitas propostas de reforma política em debate no País, não garantem um caminho alternativo. Este caminho não implica apenas em mudanças partidárias ou institucionais, mas sim num modo diferente de fazer política, que deve ser construído – e esta é a grande tarefa política do momento. Nenhuma boa alternativa pode vir de uma política onde interesses pessoais e conveniências de momento estão acima da construção do bem comum e da afirmação da verdade. Um processo político reduzido a luta do “nós contra eles”, a confronto entre interesses particulares antagônicos, não conseguirá construir o bem comum.
Este caminho implica tanto numa postura ética de compromisso com o bem comum como numa busca sincera para compreender todos os fatores da realidade, estar aberto a todas as soluções, mesmo que não venham de nossos grupos políticos. Como disse o Papa Francisco, aos dirigentes brasileiros: “É nossa responsabilidade, embora sempre limitada, esta compreensão global da realidade, observando, medindo, avaliando, para tomar decisões na hora presente, mas estendendo o olhar para o futuro, refletindo sobre as consequências de tais decisões. Quem atua responsavelmente, submete a própria ação aos direitos dos outros e ao juízo de Deus. Este sentido ético aparece, nos nossos dias, como um desafio histórico sem precedentes; devemos procurá-lo, devemos inseri-lo na própria sociedade. Além da racionalidade científica e técnica, na atual situação, impõe-se o vínculo moral com uma responsabilidade social e profundamente solidária” (Encontro com a classe dirigente do Brasil, 27/06/2013).
Dom Giussani escreveu que “uma política que não está preocupada com uma posição ideal, mas em ‘vencer’ por intermédio do poder conquistado, é uma política perversa. [...] Uma política que esteja preocupada com uma posição ideal estabelece uma onda educativa e abre espaço a um respiro maior de liberdade e, portanto, a uma criatividade, a uma imaginação” (O eu, o poder, as obras, Cidade Nova, 2001). Esta postura voltada para um ideal não é um romantismo ineficiente, mas a origem de uma racionalidade política capaz de orientar-se rumo ao bem comum e não à tomada do poder.
Esta posição implica, como lembra o Papa Francisco, numa responsabilidade social: “Somos responsáveis pela formação de novas gerações, por ajudá-las a ser hábeis na economia e na política, e firmes nos valores éticos. O futuro exige hoje o trabalho de reabilitar a política; reabilitar a política, que é uma das formas mais altas da caridade. O futuro exige também uma visão humanista da economia e uma política que realize cada vez mais e melhor a participação das pessoas, evitando elitismos e erradicando a pobreza. Que ninguém fique privado do necessário, e que a todos sejam asseguradas dignidade, fraternidade e solidariedade: esta é a estrada proposta” (Idem).
O Papa lembra ainda a importância do diálogo construtivo: “Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo. O diálogo entre as gerações, o diálogo no povo, porque todos somos povo, a capacidade de dar e receber, permanecendo abertos à verdade. Um país cresce, quando dialogam de modo construtivo as suas diversas riquezas culturais: a cultura popular, a cultura universitária, a cultura juvenil, a cultura artística e a cultura tecnológica, a cultura econômica e a cultura da família, e a cultura da mídia. [...] Considero também fundamental neste diálogo a contribuição das grandes tradições religiosas, que desempenham um papel fecundo de fermento da vida social e de animação da democracia. Favorável à pacífica convivência entre religiões diversas é a laicidade do Estado que, sem assumir como própria qualquer posição confessional, respeita e valoriza a presença da dimensão religiosa na sociedade, favorecendo as suas expressões mais concretas” (Idem).
É o diálogo e o encontro entre aqueles que perseguem o ideal do bem comum que constrói uma nova sociedade, não a raiva e a frustração de alguns, nem o poder e as manipulações de outros. Reconhecer os próprios erros, buscar o diálogo e respeitar as diferenças são elementos essenciais neste momento a serem exigidos em quem gerencia o poder do Estado. Para construir a confiança na política e reafirmar seu dever de servir a população e respeitar a ética, não basta a reação de protesto, mas é necessária a construção de possibilidades reais e positivas que se façam visíveis no cenário nacional.
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