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Passos N.174, Outubro 2015

DESTAQUE - A viagem de Papa Francisco a Cuba e aos EUA

“O bom vem agora”

por Manuel Marrero Ávila

Um cubano relata a visita de Francisco. A sua humanidade, o entusiasmo genuíno dos fiéis, a gratidão. E as questões que ficam depois da partida dele: “Como podemos transformar em carne e realidade o que vimos nele?”


O Papa Francisco visitou Cuba de 19 a 22 de setembro, traçando um caminho de Misericórdia que comoveu Havana, Holguín e Santiago de Cuba, cidade onde vive praticamente a metade dos cubanos, mas que incluiu toda a nação, dentro e fora da ilha, reunindo os católicos, os crentes das diversas confissões, os não crentes, os homens e as mulheres de todas as classes e origens.
Francisco chegou a Cuba visivelmente cansado, depois de uma viagem de quase doze horas entre Roma e Havana, mas prosseguiu de maneira entusiasta sua viagem rumo aos Estados Unidos, não sem antes dizer, na Catedral de Cuba, com sorriso simpático, que nestes dias se sentiu em casa (penso em como deve fazer bem a esse argentino puro sangue poder falar e rir, brincar, com quem fala a sua língua materna).
Ele alcançou milhares de famílias cubanas. A marca que deixou, quando passava pelas ruas – parando mais de uma vez o carro com vista panorâmica (feito em Cuba) para saudar uma criança, um ancião ou uma família que o esperava – ou durante os encontros e as celebrações oficiais, fez muito bem a todos aqueles que o viram e ouviram. A mídia do país fez um esforço enorme para cobrir todos os detalhes da visita, e ainda mais para compreender e transmitir em chave despolitizada a mensagem desse missionário.
Em cada um dos seus discursos esteve presente a evocação de uma cultura do encontro, do diálogo, para derrubar os muros e construir pontes, gerando uma “revolução (palavra muito delicada em Cuba) da ternura e do afeto”; para se sair dos fechamentos, dos “conventículos” em que vivemos, para alongar o passo e ir atrás dos outros (sobretudo dos mais pobres e dos mais próximos), para encontrá-los e servi-los; para não deixar de sonhar; para preservar a memória desses anos vividos; para gerar em Cuba uma amizade social, como disse o herói cubano José Martí, acima do “sistema, morto para sempre, de dinastia e de grupo”.
O Papa presidiu três missas, em Havana, em Holguín e em El Cobre (Santiago de Cuba). Encontrou-se com os consagrados, os jovens, as Casas de Missão, as famílias e os Bispos. Manteve diálogos com as mais altas figuras políticas do país, saudou milhares de pessoas que se estenderam ao longo das ruas com as bandeiras cubana e vaticana, viveu outros encontros não programados, com os seus confrades jesuítas em Havana ou com outros grupos. Mas a coisa mais significativa foi a sua proximidade com as crianças, os anciãos e os doentes que encontrou pelas ruas e com os quais se relacionou de maneira muito espontânea.
Foi muito bonito e importante ver tantas pessoas, não habituadas ao modo às vezes formal e distante com que são saudados os altos prelados, beijá-lo no rosto, recostar no seu peito e abraçá-lo, apertando-o como se faz com um amigo que a gente não vê há tempo... E ele se deixou abraçar, gostou de ser amado, sorriu, talvez tenha ficado um pouco corado, mas demonstrou estar muito feliz.
Durante esses dias únicos, todos sorrimos para o Papa enquanto ele passava, nós o vimos e ouvimos, passamos horas e horas seguindo-o ao longo dessa via de Misericórdia que ele traçou, em nome d’Aquele que o enviou para nos visitar. Ficamos emocionados e nos esforçamos para fixar cada detalhe, fotografando com o celular, gravando as imagens da TV ou ouvindo-o com toda a atenção.
Compartilhamos os sentimentos de bondade que Francisco suscitou em nós, nos sentimos irmãos e entrevimos em suas palavras, nestes três dias, uma grande esperança em relação a nós e a Cuba... Mas, como se costuma dizer aqui, o bom vem agora: na vida de cada dia, quando a TV não transmite mais os programas especiais, quando a rotina, o cansaço, a monotonia voltam a pesar em nossos olhos, quando cai a cortina e se acendem as luzes.
Como podemos agora, com a ajuda de Deus, transformar em carne e realidade, em nossas vidas e em nossa pátria, tudo o que vimos e ouvimos? Como podemos começar de novo, de cabeça erguida e os pés no chão, a viver uma realidade que parece absurda, imóvel, às vezes hostil e quase sempre medíocre? Como podemos ser cristãos e autênticos cidadãos? Como podemos entender com o coração e tocar com as mãos esse Cristo presente, vivíssimo, que não foi embora para os Estados Unidos, como Francisco, mas que permanece entre nós, ficou por aqui, nesta terra abençoada, e através da visita desse Pedro argentino tornou maior o seu dinamismo, a sua misericórdia por nós e o seu desejo de ser anunciado, adorado e servido nos mais simples, que cada dia aumentam mais e ficam mais pobres.
Obrigado, Francisco, por ter vindo nos encontrar. Obrigado pela tua bênção, rezes conosco, sejas o guia claro, seguro, da Igreja que amamos e pelos dias que passaste na “Casa Cuba”. Agora, com a Graça de Deus, sem a qual a visita do Papa ficará sendo só um evento histórico, cabe a nós viver a fidelidade ao Evangelho e construir, a partir do pequeno, do anônimo, devagarzinho, o Reino que deverá germinar em Cuba.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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