O bem que muda a história
Padre Julián Carrón, presidente da Fraternidade de CL, parte de si para “reagir” à provocação do tema do Meeting 2016 – “Tu és um bem para mim” – realizado em Rímini, na Itália, de 19 a 25 de agosto
O que lhe diz este título? O que é este “tu”? E o que é este bem?
Este título, para mim, é realmente a definição do que é a vida em relação com o outro. Eu percebi na minha experiência quando, tendo que encontrar outras pessoas, às vezes com opiniões diferentes, diferentes visões sobre a vida, diferentes interesses, percebi que me despertaram perguntas que me levavam a percorrer uma estrada e que se tornava um bem para mim aceitar este desafio. Descobri que o outro não era apenas um obstáculo, mas era algo que me escancarava a entender mais, a me perguntar mais sobre as coisas, a descobrir novos horizontes que eu não tinha imaginado antes. Então eu percebi que a realidade é amiga, que o outro é um amigo independente de qual seja a sua posição. Porque faz você se tornar mais si mesmo.
O Papa, em sua mensagem, indicou no diálogo e no encontro o coração do “testemunho pessoal criativo”. Do que ele está falando?
No encontro com o outro ainda não temos uma definição de resposta. É um diálogo no qual nos identificamos com o outro para responder de forma criativa ao ponto onde o outro está. Para deixá-lo saber o que queremos compartilhar com ele. Como um inclinar-se, como o Mistério faz conosco, para oferecer-lhe a riqueza que nós descobrimos na vida. E esta é uma criatividade, não é algo que podemos dizer a todos da mesma forma, não é uma repetição do que fizemos na vez anterior. É um “tu” que você tem na sua frente. E se você não se identificar com ele, não conseguirá nem mesmo dizer certas coisas que são comuns, de modo a atingir o coração da pessoa.
O Papa também disse que muitas vezes cedemos “à tentação de nos fecharmos no horizonte limitado de nossos próprios interesses” e que “isso não é conforme à nossa natureza: desde criança descobrimos a beleza do laço entre os seres humanos”. Como isso se realiza?
Exatamente olhando, como diz o Papa, para as evidências mais elementares. A criança é mais ela mesma quando sua mãe aparece enquanto ela chora. Em uma ligação percebe imediatamente o bem que a presença da mãe é para ela. Assim que acorda, a procura chorando. Esta experiência elementar, que todos temos, está na origem. Dizem todos os grandes pensadores como Balthasar, que nós entendemos realmente a nossa natureza do “eu” em relação com um “tu”. Isto ocorre desde o início da vida. Portanto, que o outro seja um bem está na origem do nosso ser pessoa. Depois, este início o vivemos em muitos momentos da nossa vida. Aquilo que o Papa, com a sua originalidade, coloca diante de nós é algo que todos podemos reconhecer na experiência elementar que fazemos do viver. Este é o ponto de partida para entender que aquilo que dizemos no título do nosso Meeting não é algo abstrato. Quando o outro está à nossa frente e se torna um “tu” significativo, todos reconhecemos que é uma graça, um dom. Um bem para nós.
No entanto, muitas vezes, continua Francisco, a tendência é fechar-se. Pensa-se que é possível salvar-se sozinhos. É a presunção do homem moderno...
Sim. Do homem de qualquer tempo. Porque, mesmo no início da história, o homem pensou em salvar-se por si mesmo. O pecado original está no início. O homem moderno o amplificou. É uma tentação que todos temos. Pensamos que ficaremos melhor nos isolando, afirmando o nosso individualismo, fugindo dos relacionamentos porque eles tornam a vida muito dramática. Mas cada um deve fazer experiência disso: ninguém o convencerá de que não é assim. Não se resolve apenas com um raciocínio, mas com uma experiência na qual o outro é realmente percebido por aquilo que é: um bem que enriquece. E que não é um limite para minha liberdade, mas uma possibilidade de realização da minha verdade.
No Meeting se fala de conflitos, de grandes temas. Mas as dificuldades de que falava estão no cotidiano de cada um de nós...
Justamente por esta razão que eu disse que isso eu descobri na minha experiência. A dificuldade de encontrar um outro com uma mentalidade diferente, com uma objeção, que tem uma posição diferente sobre a vida, é o desafio que põe você em movimento: é verdade, não é, qual é a minha experiência, qual é a experiência do outro... É a alavanca que abre você, que o coloca em movimento. Caso contrário – vemos isso quando nos isolamos –, tudo se torna plano. É o tédio. Perdemos a vida vivendo.
Mas no que parece ser um tempo de falta de desafios, há esperança para nós?
Com certeza. Há esperança de que aceitemos este desafio da realidade, do encontro, do diálogo. O desafio de que algo fora de nós nos coloque em movimento, nos atraia o suficiente para que valha a pena colocar-se em jogo. Sem isto, quem vai obrigá-lo a fazer? Só quando encontramos algo que nos desafia, nos abre, nos atrai ... Então a vida é vida. Caso contrário, pára.
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