Por mais um ano se renova a proposta de uma convivência, em Minas, durante o carnaval. Veteranos e novatos acampam e se aventuram por três dias. Dentro das dificuldades, algo correspondente. O que viveram ali?
Já desde o início, na apresentação, o Acampamento surpreendeu! Havia pessoas de vários estados brasileiros, de lugares bem distantes dali: Morro do Pilar/MG. Os aventureiros chegaram do Distrito Federal, Paraná, Rio Grande do Sul, Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo. Por que razão essas 170 pessoas se movem de suas casas e topam um programa tão diferente para o feriado de carnaval? Certamente, não é por falta de opção, diante da explosão de blocos de carnaval nas ruas das cidades brasileiras.
“Nós ainda acreditamos no fascínio que pode exercer a beleza desarmada da fé?” Essa foi a provocação lançada para esses quatro dias de convivência, cantoria, caminhada, banho de rio e comida muito boa! Há algo capaz de fascinar, mover, responder ao coração de cada um de nós, pessoas marcadas pelas dificuldades concretas pela situação econômica pela qual passa o Brasil atualmente? É possível experimentar hoje, diante de uma mentalidade superficial e niilista, a beleza desarmada da fé?
Esta pergunta estava escrita numa faixa dependurada numa grande tenda montada de forma a nos deixar diante da imponência exuberante das montanhas de Minas, que nos cercava por todos os lados. Percebia-se em cada escolha ou detalhe um cuidado, nada era feito por acaso. A beleza da música e do canto, marca registrada da comunidade mineira, tornava atraente e irresistível a participação de cada um no coro.
O capricho no preparo das refeições muito saborosas convidava a repetir o prato. O acompanhamento cuidadoso no exigente percurso de 10 quilômetros até a maravilhosa cachoeira das andorinhas, que encantou cada um que pode topar esse desafio. A caminhada especial para as crianças liderada pelo capitão Barbicha e assistente Peninha que fez cada criança vibrar e, a exemplo do que fez Luis, de 8 anos, na assembleia perguntar para a mãe: o ano que vem a gente volta?
O que havia ali, em cada uma desses gestos, que enchia o coração de gratidão e fazia o corpo superar seus limites? O que acontecia para que o desconforto de um Acampamento “selvagem” parecesse menor do que a alegria e a gratidão, do que o desejo do coração que se ampliava a cada dia? Neste ano, um grupo de novatos eram jovens de Salvador, que com esforço próprio e a ajuda de amigos que aderiram à campanha “Adote um baiano”, tiveram a ocasião de participar pela primeira vez desta convivência. Os testemunhos que se seguem relatam como alguns deles identificaram respostas às questões levantadas naqueles dias em sua própria experiência.
“Faz 3 anos que participo do Movimento, e durante minha caminhada os gestos propostos me ajudaram a entender que Cristo tem a ver com tudo e com todos os momentos de minha vida. O Acampamento para mim foi uma oportunidade para perceber o essencial da vida e descobrir mais de mim: tínhamos que dormir em barracas, tomar banho no rio... Encarei aquela realidade, porque diante de tamanha beleza e das companhias que tinham lá, essas limitações eram praticamente nada, e a vida é muito mais do que o conforto. Entendi que Cristo coloca situações em nossa vida para que busquemos o outro, a companhia, e isso ajuda a não querer ser autossuficientes.
Lá também vivi uma tristeza, uma angústia, porque eu estava preocupada com minha família. Naquela área o celular não pega, então fiquei 4 dias sem ter noticias. Então, diante desta angústia, fui conversar com Amanda, e ela me disse que essa tristeza era verdadeira, e que essa situação era para que eu percebesse que não podemos ter o controle de tudo, que temos que confiar em Deus, colocar nas mãos d’Ele nossa vida e a vida das pessoas que amamos. É uma certeza de que não estamos sós, de que tem um outro que cuida de nós e nos sustenta.
Outro momento bem enriquecedor para mim foi o sarau com declamação de poesias e cantos. Cada poesia e cada música tinha um sentido, e eles tiveram todo o cuidado de preparar aquele momento. É tão maravilhoso quando algo corresponde o nosso coração, parece que ganhamos novamente um sopro de vida.
Pelo caminho que faço, posso dizer com toda certeza que sim! Eu acredito no fascínio que existe na beleza desarmada da fé. Basta que eu abra bem meus olhos e o coração, que eu permita ser surpreendida por Cristo não só em momentos como esses que o Movimento propõe, mas também cada dia de minha vida.”
Urânia
“O Acampamento pra mim foi mais uma provocação de sair de mim e ir ao encontro do outro. Pois era um lugar novo, pessoas que não conhecia, fazia coisas que não estava acostumada a fazer, como dormir em barraca. Era um lugar muito bonito, uma companhia que encantava, as músicas eram muito bonitas e significativas. Via que todos trabalhavam, ajudavam uns aos outros com muita dedicação e amor. O que mais marcou em mim foi o momento da trilha. Uma experiência muito difícil. Sentia muito medo, medo de cair, medo de não conseguir responder a essa experiência, a minha vontade era de chorar. No entanto, não sentia nenhuma vontade de desistir. Carregava uma certeza de que em algum lugar alguém iria zelar por mim, que quando eu passasse em um lugar difícil iria ter um alguém que ia me ajudar, ia me dar a mão, ia me orientar em qual caminho andar e isso me devolvia à calma.
A certeza era de que eu não estava sozinha, e que eu podia pedir uma ajuda no momento que pude ver que não iria conseguir andar sobre as pedras do rio, sozinho. Sei ainda mais que sozinho não chegamos a lugar nenhum. A companhia pra mim é uma beleza, a beleza que me encanta e me atrai. Nesse Acampamento passei a amar mais meus amigos de Salvador que conviveram ali comigo.”
Verônica
“Pensar no Acampamento é lembrar do lugar que me modificou, motivou, alegrou, conscientizou, armou e preparou para os desafios da vida. Acho que quando a realidade estiver perto vou saber encarar de uma forma diferente, porque mesmo sendo uma coisa ruim, vou conseguir enxergar uma bondade. Que lugar maravilhoso, lindo, ar puro, tranquilidade e conectividade com a natureza. Acordar pela manhã com aqueles sorrisos das pessoas, amizades novas e fiéis, não tem preço! A beleza não nos deixa passar despercebido, nos deixa alerta, nos deixa com uma grande sede, sede de busca, e é através da comunidade que eu consigo viver a beleza.
Voltei para a minha realidade, com um olhar concreto diante da realidade, descobri que sou forte, que tenho dons maravilhosos e que posso ajudar a quem precisa. Consegui enxergar que na vida as pessoas só dão valor a você quando você tem, mas não é assim. Você pode pensar diferente, a esperança de um menino está sempre ligado ao seu sonho, quando o sonho é roubado, modificado ou distorcido, ele corre para o lado mais fraco, que é o seu medo. Está ai um sentimento que nos acompanha desde a infância. Apenas confie em seu potencial, mergulhe fundo, e encontre o sentido. Permita-se ir além, mas permita-se voltar. Obrigado, Acampamento!”
Hamilton
“Fiquei muito feliz por sentir que a beleza me despertou para os mais sinceros desejos da minha vida. passei de um pensamento perdido em meu nada a uma vontade de fazer expandir a luz que está guardada dentro de mim, me senti perdoada e meu olhar mudou totalmente naquele Acampamento. Já não penso mais em desistir, encontrei a certeza de que tenho que persistir para que me torne grande como os corações que encontrei, pois a resposta está dentro do meu coração e sentir forte a presença de Deus a deixa mais clara, me deixa confiante.”
Carolaine
“Quando se aproximou a data do Acampamento, recebi muitos convites de amigos para pular o carnaval, e confesso que fiquei em dúvida muitas vezes. Chegando a Belo Horizonte, logo na espera do ônibus para o Morro do Pilar, eu recebi um puxão de orelha, e aquilo me deixou furiosa. O clima para mim ficou estranho. Passando o primeiro dia, cada um do nosso grupo foi se espalhando, e eu muitas vezes me senti sozinha e triste. Cheguei a me perguntar o que eu fui fazer ali. No momento de fazer a trilha eu continuava com o coração apertado. Queria chegar logo, então comecei a adiantar os passos, consegui ficar lá na frente, e quando faltava pouco para chegar à cachoeira conheci o João Victor e a Paola. Começamos a conversar e eu me abri com eles, falei que estava meio triste, e, do jeito deles, eu me senti acolhida e me desarmei. Conversamos, brincamos, eu me senti mais leve!
Voltando para o Acampamento, eu não estava mais com um olhar triste e crítico. Eu fiquei muito próxima da Paola e do João, e a companhia deles me fez refletir. Percebi que eu tinha sido imatura e quando me deparei com a pessoa que eu machuquei, pude me desculpar com ela. Para mim, a experiência do Acampamento me fez conseguir me enxergar, pontuar várias coisas a meu respeito. Saí de lá com o desejo de sempre poder vivenciar essa beleza desarmada, seja ela na Escola de Comunidade, na faculdade, no âmbito familiar. Enfim, eu quero que esse desejo permaneça, sei que é uma caminhada diária, mas espero continuar!”
Lúcia
“Minha experiência no Acampamento teve início antes mesmo do meu sim. Sabia que não tinha condições financeiras para ir, mas quando percebi a movimentação dos meus amigos, algo nasceu em mim: era o desejo de ir, de sentir a mesma vibração que eles estavam sentindo. Quando soube que pessoas de São Paulo estavam se movendo para nos ajudar, isso fez nascer uma chama em mim e vários questionamentos surgiram: Por que esse povo que nem me conhece se movimenta dessa forma? Dentro do meu coração havia a resposta de que o autor dessa ação era Cristo.
Quando cheguei a Belo Horizonte fiquei comovida pelo modo como todos nos acolheram e toparam, de bom grado, nos acolher em suas casas. No caminho até o Morro do Pilar, cantamos, brincamos e compartilhamos uma única alegria. Os dias que passamos no Acampamento foram uma grande experiência, aonde pude compartilhar a vida, e acolher as propostas como os passeios e assembleias. Durante a caminhada fomos dividindo um com o outro o resto de água, ajudando a passar pelo caminho complicado, informando se tinha algo errado na frente, amparando quem parava porque estava cansado. E não posso deixar de citar a alegria, os sorrisos e as histórias que ouvi no caminho. Acredito que cada obstáculo foi substituído pelo desejo de chegar ao final e encontrar algo muito mais belo que valia todo o percurso.
A certeza de que faço um caminho que leva a Cristo me dá forças para continuar, e essa força vem em forma de pessoas que, com garra, lutaram para que o Acampamento acontecesse. Obrigada!”
Reijane
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón