Trechos do Discurso do Santo Padre no Encontro com os jovens da Missão Diocesana no Santuário de Nossa Senhora da Guarda. Visita Pastoral a Gênova, 27 de maio de 2017
Para mim é uma alegria me encontrar com vocês. É um encontro que sempre desejo: encontrar os jovens. O que pensam, o que buscam, o que desejam, quais são seus desafios. E vocês não querem respostas prontas, querem respostas concretas, mas pessoais. Quando vocês saem para fazer missão, significa deixar-se transformar pelo Senhor? Nós, normalmente, quando vivemos essas atividades, nos alegramos quando as coisas dão certo. E isso é bom. Mas existe também outra transformação, que muitas vezes não se vê, fica escondida e nasce na vida de cada um de nós. A missão, o ser missionários, nos faz aprender a olhar. Aprender a olhar com novos olhos, porque com a missão os olhos são renovados. Aprendemos a olhar para a cidade, a nossa vida, a nossa família, tudo o que está ao nosso redor.
A experiência missionária nos abre os olhos e o coração: aprendemos a olhar também com o coração. E assim, deixamos de ser – permitam-me a palavra – turistas da vida, para nos tornarmos homens e mulheres, jovens que amam com empenho na vida. “Turistas da vida” são estes que tiram fotos de tudo, quando vêm por turismo, e não olham nada. Eles não sabem como olhar... e depois olham para as fotos em casa! Mas uma coisa é olhar para a realidade, e outra bem diferente é olhar para a fotografia. E se a nossa vida é de turistas, vamos apenas olhar para as fotos ou para as coisas que pensamos da realidade. É uma tentação para os jovens a de ser turistas. Eu não estou dizendo de não passear aqui e ali, não, isso é bonito! Quero dizer olhar para a vida com os olhos de turistas, que é superficial, e tirar fotos para visualizá-las mais tarde. Isso significa que eu não toco a realidade, não olho para as coisas que acontecem. Não olho as coisas como são.
A primeira coisa que eu diria, sobre a transformação, é deixar essa postura de turistas para tornarem-se jovens com um compromisso sério com a vida. O tempo da missão (...) pode nos ensinar a olhar com novos olhos, ela nos aproxima do coração de muitas pessoas, e essa é uma coisa muito bonita. E destrói a hipocrisia. Encontrar adultos hipócritas é feio, mas são grandes, gente que faz de suas vidas o que quer, sabe o que faz... Mas encontrar um jovem, um jovem que começa a vida com uma atitude de hipocrisia, este é suicida. É não deixar o caminho de turista da vida, é passar o tempo fingindo, e não olhar para o coração das pessoas para falar com autenticidade, com transparência.
E depois, há outra coisa: quando eu saio em missão, não é só a minha decisão que me faz ir. Há um outro que me envia. E você não pode fazer a missão sem ser enviado por Jesus. É o próprio Jesus que empurra você para a missão e ele está lá ao seu lado: é justamente Jesus que trabalha em seu coração, muda o seu olhar e faz você olhar para a vida com novos olhos; não com os olhos de turista. (...) E vou até as pessoas, vou até os outros para falar sobre a minha vida, sobre Jesus e sobre muitas coisas, mas com uma transformação da minha personalidade que me faz olhar de outra maneira.
A missão também ajuda a nos olharmos entre nós, nos olhos, e reconhecer que somos irmãos entre nós, (...) nos purifica de pensar que há uma Igreja dos puros e uma dos impuros. (...) Todos somos pecadores e todos nós temos o Espírito Santo dentro que tem a capacidade de nos fazer santos.
Você me perguntou como ser missionários com nossos coetâneos, especialmente aqueles que vivem em situações difíceis, que são vítimas das drogas, do álcool, da violência, do engano do maligno. Creio que a primeira coisa é amá-los. (...) Amar é ter a capacidade de apertar as mãos sujas e de olhar para os olhos daqueles que estão em uma situação de decadência e dizer: “Para mim, você é Jesus”. E este é o início de cada missão. E por que tenho que amar essas pessoas? Por trás de todas essas situações, há uma certeza que não podemos esquecer, uma certeza que nos torna “teimosos” na esperança. (...) Em cada uma dessas pessoas que são vítimas de situações difíceis, há uma imagem de Deus que, por várias razões foi maltratada, pisoteada. Há uma história de dor, feridas que não podemos ignorar. E esta é a loucura da fé.
Na Argentina eu costumava visitar as prisões e em uma ocasião eu cumprimentei um homem que tinha cometido mais de 50 homicídios. E eu fiquei pensando: “Mas você é Jesus”, porque Ele disse que se você for encontrá-Lo na prisão, Ele está lá, naquele homem. Para ser missionários é preciso essa loucura da cruz, essa loucura do anúncio do Evangelho: que Jesus faz milagres, que Jesus não é um curandeiro. Jesus está em cada um de nós. E talvez alguns de vocês neste momento estejam em um estado de pecado mortal, estejam distantes de Jesus, talvez... Mas Jesus está lá, esperando. Está ali com você. Ele nunca nos deixa. Se eu for com amor, não como turista, e isso me transforma, vou teimoso na esperança e vou sabendo que eu toco, vejo, ouço Jesus que trabalha no coração de cada um que encontro na missão.
Somos todos sujos. E se Ele me salvou, eu digo: muito obrigado Senhor, porque eu também posso ser aquela pessoa... Se o Senhor tivesse me deixado, eu também, todos [onde teríamos acabado?]. E esse é o amor, a graça, que devemos anunciar: Jesus está naquelas pessoas. Por favor, não coloquem adjetivos nas pessoas: “Este é bêbado, este é drogado...”. (...) Nunca façam isso. Colocar adjetivo nas pessoas é só Deus que pode, somente o juízo de Deus. E ele fará: no Juízo Final, definitivamente, sobre cada um de vocês: “Vinde, benditos de meu Pai, ide embora malditos...”. (...) Se eu saio em missão devo estar disposto a este amar todos. Existem tantos dos nossos irmãos com a aparência desfigurada por uma sociedade que só defende a exclusão, isolando as pessoas, ignorando. Se queremos ser missionários e levar o Evangelho e ter essa alegria, nunca podemos excluir, isolar ninguém, ignorar.
Para ser um discípulo é necessário o mesmo coração de um navegador; horizonte e coragem. (...) Vocês têm a oportunidade de conhecer todas as novas técnicas, mas estas técnicas de informação nos fazem cair em uma armadilha muitas vezes; porque ao invés de nos informar nos saturam, e quando você está saturado o horizonte se aproxima, se aproxima, e você tem diante de si um muro, você perde a capacidade do horizonte. Fiquem atentos àquilo que vendem a vocês! A contemplação, a capacidade de contemplar o horizonte, de dar um juízo próprio, sem engolir aquilo que servem. Isso é um desafio: é um desafio que acredito que deve nos levar à oração, e dizer ao Senhor: “Senhor, peço um favor: por favor, não deixe de me desafiar”. (...) Eu gosto muito deste Jesus que perturba, que incomoda; porque Jesus está vivo, e move algo dentro de você com o Espírito Santo. (...) Uma vida espiritual sã gera jovens espertos, que na frente de algumas coisas que hoje nos oferece essa cultura, se perguntam: “Isso é normal ou isso não é normal?”. (...) A coragem de procurar a verdade. É normal que a cada dia cresça o sentimento de indiferença? Não me importa o que acontece com os outros; a indiferença com os amigos, os vizinhos, no bairro, no trabalho, na escola (...). É normal que diante da dor dos outros a nossa atitude seja fechar as portas? Se não é normal, envolvam-se. E se não tiverem a coragem de se envolver, fiquem em silêncio e abaixem a cabeça e humilhados diante do Senhor, peçam coragem. Desafiar o presente é ter a coragem de dizer: “Existem coisas que parecem normais, mas não são normais”. E sobre isso devem pensar: não são coisas desejadas por Deus e não devem ser desejadas por nós! Este é Jesus: intempestivo, que quebra os nossos sistemas, os nossos projetos. É Jesus que semeia em nossos corações a inquietação de nos colocar esta questão. E isso é bonito: isso é muito bonito!
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón