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Passos N.93, Maio 2008

EXPERIÊNCIA / OBRAS EM AÇÃO - A “ESCOLA DE CARIDADE”

Da necessidade chega-se ao infinito

por Stefano Filippi

Mil e trezentos inscritos. Assembleias sobre todos os assuntos. E, ainda, cursos, encontros, visitas guiadas... História de um percurso que nasceu há três anos para ajudar pessoas que dirigem organizações sociais a chegarem na raiz do próprio trabalho. Partindo da experiência

A Associação de Pádua (norte da Itália) é um oásis entre o asfalto e o concreto. A rodovia atrás, a via-expressa ao lado, um cárcere a 300m, casas espalhadas entre os gramados. Há dez anos, nesta extremidade da periferia de Pádua havia somente dois casebres abandonados: agora, os grupos de casas foram reestruturados com cuidado, outros edifícios se elevaram em volta de um pátio, pulsa a vida de uma “casa-família” composta por dois núcleos em torno dos quais giram um centro de acolhida para menores em dificuldade, uma escola, uma oficina, a “vila das profissões” com a oficina de sapateiro que cheira cola e a “cantina musical” com uma sala de gravação. Mais os salões, as cozinhas, a capela, onde há um vai e vem contínuo de pessoas satisfeitas.
“Eu faço votos que seja uma obra visível na cidade”, disse Dom Giussani quando veio a Pádua para conhecê-la. Hoje, se olharmos em volta vemos a grama aparada, os banheiros sem nenhuma pixação nas paredes, o entusiasmo dos jovens nos fornos, o cuidado com o qual foram recuperados os tetos e as vigas dos celeiros, a organização de uma grande estrutura onde tudo é bonito. Mario, o responsável pela Associação (uma realidade que se ramificou em toda a região do Vêneto também nos setores de formação, orientação, ajuda ao estudo) deixa logo tudo claro: “Aqui, não tínhamos projetos objetivos para alcançar, nada. Seguimos uma experiência, as ocasiões que a realidade colocava diante de nós. Um caminho de conhecimento, não a aplicação de um comportamento preciso. Sequer queríamos fazer uma obra de caridade, ela caiu em nossas mãos”.
Colocar no centro a experiência. Não é um método óbvio. Mas é o mesmo método seguido na Escola para as Obras de Caridade, promovida pela Fundação pela Subsidiariedade e pela Federação Empresa Social da Companhia das Obras (CdO), da qual Mario é diretor desde 2005. Uma escola, portanto, um trabalho, um percurso. A beleza deste desafio é que nada é pré-organizado porque, como dizia Dom Giussani, agir por puro amor é inimaginável enquanto esquema a ser aplicado”. A Escola é feita de aulas de base, cursos específicos (para áreas de intervenção e para o setor operacional) e visitas guiadas. Segue uma estrutura onde se entra no detalhe dos problemas específicos e onde quem trabalha nas obras é, ao mesmo tempo, professor e aluno.

A amplitude do desejo
Vale a pena acompanharmos o percurso dos últimos anos. Em 2005, o tema da Escola foi “A primeira caridade é a educação”. Conta Mario: “Naquele ano, tocamos num ponto central de ambigüidade, quer dizer, que se faz a obra para responder a uma necessidade. Com o tempo, começamos a entender que esta resposta é uma circunstância da qual emerge uma outra coisa. Não se faz uma obra apenas para responder a uma necessidade particular: a longo prazo não se sustenta, porque a verdadeira necessidade é infinita e não conseguimos supri-la. É o drama de muitos, que se vêem cansados, desmotivados, pressionados pela dureza da realidade cotidiana”. A vida já é cheia de problemas, porque carregar também os dos outros?
Mario responde: “Nas necessidades de quem está diante de mim: um deficiente, um idoso sem lar, um jovem sem família. Na verdade encontro uma pessoa, um “eu” que deseja ser despertado para a verdade de si. E eu mesmo redescubro toda a plenitude do meu desejo. Por isso, a educação entre nós é a primeira caridade. Desviamos o olhar da necessidade da pessoa”. Explica-se, assim, um fenômeno raro: “Frequentemente, verifica-se uma grande rotatividade de funcionários, pessoas estressadas pela pressão das coisas, desiludidas diante das grandes necessidades, ou simplesmente insensíveis às razões depois de anos de trabalho. Ao contrário, em nossas muitas obras, essa vontade de fugir não existe. Quer dizer que não somos determinamos pela quantidade de coisas a fazer. Diante de uma necessidade interminável, é preciso uma caridade interminável. É preciso Deus. A nossa, é apenas uma tentativa irônica de imitá-lo”.
No ano seguinte à fundação da Escola aprofundamos o tema: “A necessidade, passo em direção ao infinito”. Um desenvolvimento do percurso iniciado nos meses anteriores. “Fomos mais a fundo na origem das obras e no fato de que a obra é um empreendimento, vive de fatos concretos, de balanços, financiamentos, pessoas que trabalham. Aí demos um outro passo”, explica Mario, “entendemos que não existe um ponto de partida teórico enquanto os problemas se resolvem por conta própria. É uma posição ambígua, como se pensássemos que as nossas obras são belíssimas e que, como há alguém que nos salva, devemos continuá-las mesmo não tendo dinheiro. Ao contrário, a minha intervenção deve ser guiada por aquilo que posso fazer: ajudo aqueles que posso, o resto, ofereço. Este limite não é sufocante, mas é o ponto onde entendo aquilo a que sou chamado verdadeiramente. Assim, o desejo de voltar às origens tornou-se o juízo sobre todos os particulares da obra. Não haviam soluções na mesa para serem aplicadas, tudo é um horizonte sempre aberto”.

Um salto inesperado
A Escola de 2007, concluída no mês de fevereiro último com uma assembleia com padre Carrón, marca uma terceira etapa: “Caridade na raiz da necessidade do eu”. Os inscritos para formação básica foram 1.300, um salto inesperado, pois os anos anteriores oscilavam entre 700 e 800. Mario esclarece: “As razões deste aumento são duas. Primeiro, inauguramos as comunicações audiovisuais com uma série de cidades do centro e sul da Itália, coisa que consentiu a participação de muitos que não podiam vir sempre a Milão. O outro motivo é que se inscreveram muitas pessoas que não trabalham nas obras, apenas fazem caritativa”. Questões interessantes, que esclareceram um ponto importante. “Foi útil que todas essas pessoas tivessem vindo porque nos permitiu precisar que a caritativa não é o socorro a uma obra. Em contrapartida, o objetivo, que Carrón sempre retoma com vigor, é educativo: aprender a gratuidade, ser educados à partilha, não apenas “ajudar a obra”. E o lugar onde se deve fazer esta verificação é a Escola de Comunidade. Assim, decidimos que, a partir deste ano, só poderá inscrever-se na Escola para as Obras aqueles que trabalham nela, não quem faz caritativa”.
É uma riqueza de experiências formidável a que encontramos na Escola para as Obras de Caridade. Entre elas, estão as famílias da Associação Cometa, de Como, uma “cidade na cidade”, fervilhante de jovens aos quais pela primeira vez alguém disse “você tem valor”; as Irmãs de Caridade da Assunção, envolvidas com os dramas das famílias em um bairro da periferia de Milão; as cooperativas sociais do Grupo Pinocchio que dedicam-se à reinserção de presos, toxicodependentes, doentes mentais e marginalizados; e, ainda, a imponência do Banco Alimentar e mais uma centena de experiências. Um espetáculo de pessoas a partir do qual se vê que a caridade não é um pensamento, uma inspiração boa, um ímpeto generoso.
Cada realidade tem seus percursos profissionais e suas perguntas. Porque muitas obras tornam-se apenas assistência? Falhamos se não conseguimos libertar de seus males tantas pessoas que assistimos? Para que serve ajudar alguém que nunca ficará curado? E qual é o relacionamento com a política e as instituições? Muitas perguntas e muitas experiências das quais se aprende. Walter Sabattoli (Pinocchio) conta que muitas vezes o percurso profissional significa descobrir que certos males não podem ser eliminados e que é preciso aprender a conviver com eles.

Nada de instruções para uso
Irmã Gelsomina Angrisano testemunha que é a experiência das famílias em dificuldade que moldam a forma da obra. Stefano Giorgi (In-presa) explica como uma grande ideia pode ser afirmada também dentro de leis restritas. Marco Lucchini (Banco Alimentar) exemplifica que, enquanto se aceitam as regras da política, nos movemos para mudá-la para que ela seja o mais subsidiária possível.
Nenhum especialista explicando teorias, mas a reflexão sobre uma experiência. Um método que este ano, na Escola que começará no próximo dia 17 de maio (com o título “A caridade será sempre necessária”), foi levado à consequência extrema: os encontros formativos de base serão todos centrados sobre o confronto direto com algumas obras sociais. “Não testemunhos genéricos”, pontua Mario, “mas a descrição de todo o percurso da obra, da origem ao desenvolvimento, até seu âmbito jurídico, à presença caritativa e cultural ou política. Explicitaremos dificuldades, problemas, pontos fortes e fracos. Porque queremos partir do limite, da irrequieta pergunta que carregamos dentro de nós. Aqui não se oferece instruções de uso”.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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