O filme “Uma mulher contra Hitler” mostra os últimos seis dias da vida de Sophie Scholl, integrante da Rosa Branca, um grupo de jovens que ousaram desafiar Hitler e em nove meses escreveram e distribuíram seis panfletos contra o regime. Uma história que, antes de ser um episódio de resistência heróica, é uma fascinante aventura humana
O que não é inferno em meio ao inferno? perguntava-se o escritor italiano Ítalo Calvino. Talvez ele não conhecesse a história da Rosa Branca, grupo de resistência ao nazismo, formado entre 1942 e 1943 por estudantes cuja vida representaria uma resposta imediata à pergunta de Calvino. A beleza da amizade entre Hans e Sophie Scholl, Cristoph Probst, Willi Graf e Alexander Schmorell, para citar somente os nomes dos que formavam o “coração” da resistência, já seria bela se fosse apenas imaginária. Sabê-la real – amplamente documentada por cartas e testemunhos, além dos registros oficiais – é redescobrir uma intensidade humana que às vezes pode parecer inatingível. Mas não é.
Talvez se pudesse pensar que os estudantes que iniciaram a Rosa Branca fossem excepcionais e que tivessem especial pendor para o sacrifício, sendo os únicos a resistirem contra o regime. Também não. Eram jovens comuns, que seguiam diferentes denominações cristãs (alguns eram protestantes, outros católicos, outros ortodoxos); tampouco eram o único grupo de resistência: havia grupos anarquistas, comunistas, outros grupos cristãos que denunciavam as atrocidades cometidas pelos nazistas. O que chama a atenção na experiência deste grupo, que se tornou um símbolo na Alemanha, embora hoje a história não seja tão conhecida, é justamente a sua simplicidade, sua incrível força em pessoas tão comuns e tão frágeis.
O contraste com outro tipo de experiência humana fica evidente para quem conhece outros filmes sobre a época. Quem vê, por exemplo, A queda – os últimos dias de Hitler, assiste à chocante e contínua degradação do humano, a uma experiência sempre maior de desespero, vazio, absurdo, que culminará no suicídio de Hitler e de seus companheiros mais próximos. Ao invés, cada passo dos estudantes da Rosa Branca vai rumo a certeza e plenitude cada vez maiores.
Como é possível a diferença entre as experiências humanas de uns e outros, se o contexto histórico-social era o mesmo? Por que alguns fazem a dilacerante experiência de abraçar o mal e outros vivem a satisfação de afirmar o desejo de bem até as últimas conseqüências? O contraste entre os dois filmes evidencia o drama: trata-se de uma questão de liberdade.
No entanto, a fidelidade ao próprio coração também não é um ato heróico. Como o filme bem mostra, a adesão total de Sophie à vida não acontece de uma hora para outra: passa pelo fascínio pelos amigos e, em especial, pela profunda afinidade com o irmão; por dar espaço a um ideal que, dia a dia, cresce em seu coração; por comparar de tudo com suas exigências profundas, o que se traduz em uma busca intensa de beleza e liberdade e, enfim, por aceitar o risco que as ações de resistência traziam. O desejo de liberdade de Sophie não encontra obstáculos: nos interrogatórios, ela olha o pouco de luz que entra na sala; em sua cela, parece esquecer a aridez do local e dos acontecimentos para buscar sempre a janela; nunca se preocupa com seu próprio destino e, nos documentos de sua condenação, escreve: liberdade.
Não é por outro motivo que Mohr, o investigador nazista que a interroga por vários dias, não pode deixar de se afeiçoar à menina. Ele não mudará de posição, a história não terá um final feliz – mas a impressão que Sophie deixará em Mohr será indelével e parece surgir de uma pergunta: de onde ela tira forças para afirmar o real, o seu desejo, a verdade? A resposta está em uma carta que Sophie escreve em 10 de outubro de 1942:
“Estou maravilhada pela inaudita beleza de tudo que não foi criado pelo homem. [...] Na minha simples alegria diante de tudo aquilo que é belo se introduziu com força alguma coisa grande e desconhecida, isto é, o pressentimento do Criador, que é louvado pela beleza das criaturas inocentes. Por isso, na realidade, só o homem pode ser feio, porque com o livre arbítrio pode decidir separar-se deste canto de louvor. Nestes dias, poder-se-ia pensar com freqüência que o homem seja capaz de sufocar este canto com o ribombar de canhões, com maldições e blasfêmias. No entanto, na primavera passada, uma coisa se tornou clara para mim: ele não vai conseguir fazê-lo e eu quero tentar me colocar ao lado dos vencedores.”
A Rosa Branca não foi somente um movimento de resistência ao nazismo: foi a ausência de resistência ao Criador.
Uma Mulher contra Hitler
(Sophie Scholl - Die letzten Tage, 2005)
Direção: Marc Rothemund
Roteiro: Fred Breinersdorfer
Gênero: Drama/ Guerra
Origem: Alemanha
Duração: 117 minutos
Credits /
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