Propomos como editorial o panfleto escrito pela Companhia das Obras (CdO) em preparação às eleições de outubro.
Mais um governo está terminando o seu mandato e carrega consigo uma longa e polêmica lista de promessas não realizadas, de fatos que não deveriam ter acontecido, de resultados positivos de caráter apenas imediato.
Por um lado, há um progresso nos indicadores sociais e econômicos; por outro, há uma percepção real de que as dificuldades da vida cotidiana estão se tornando mais pesadas. A crescente violência, o desemprego, a educação precária dos filhos, atingem a um número cada vez maior de pessoas e famílias. Além disso, estamos diante de um desastre ético e da decomposição da vida política, protagonizados por aqueles que tinham se apresentado como esperança de mudança.
Cresceu uma visão centralizadora do Estado, ao mesmo tempo em que ocorreu recusa de parcerias reais com entes da sociedade civil que poderiam trazer soluções baratas, efetivas e com maior controle social. Isso levou o governo a distanciar-se daquelas instituições e pessoas da sociedade civil que vinham buscando construir alternativas à situação atual.
Saúde e educação são exemplos claros. A situação não mudou significativamente; pelo contrário, piorou, devido a freqüentes substituições de ministros e desvios de recursos, que levaram a mudanças drásticas nas políticas e nas estratégias e à perda de foco nos programas e nas ações. Desse modo, os recursos aplicados nas políticas públicas incorreram numa incapacidade de gestão que tem inviabilizado a qualidade esperada. Parece faltar uma perspectiva quanto ao caminho a ser percorrido. Vê-se aumentar um relativismo dos valores e fuga das responsabi-lidades para com a sociedade, pelas autoridades do Estado.
O verdadeiro progresso social e econômico só pode ocorrer com o apoio àquelas entidades, movimentos e organizações que já estão construindo uma sociedade mais humana.
Na realidade, existem grupos de pessoas, empresários, organizações sociais, movimentos que têm enfrentado muitas dessas questões, buscando viver a sua missão como um serviço para a sociedade. Assumem a aventura, de natureza econômica, cultural e social, de incrementar o que lhes é caro: o bem-estar das pessoas, da própria família e da sociedade. São inúmeros exemplos, tais como: centros de acolhida para pessoas em situações críticas, centros de recuperação nutricional para crianças desnutridas, creches, centros de reforço escolar, centros de formação profissional, escolas, hospitais filantrópicos, cooperativas de microcrédito, cooperativas de trabalho, empresas, atividades de assistência a idosos, centros comunitários, centros para distribuição de alimentos e bens de primeira necessidade. São presenças capilares no tecido da nossa sociedade.
A maioria dessas realidades sociais tem uma preocupação educativa com as pessoas encontradas e, por isto, torna-se ponto de referência na sociedade. Ao responder às necessidades específicas, sua ação é voltada para a pessoa em sua totalidade, realizando uma formação humanizadora diante da crescente decadência individual, familiar e social. Essa riqueza não depende, exclusivamente, da ação de quem “faz política”, mas daquelas realidades sociais que vivem uma estima sincera para com o outro, em qualquer situação este se encontre, uma estima que o torna mais livre e responsável diante das próprias circunstâncias da vida. São experiências de solidariedade e gratuidade, necessárias para a realização de cada pessoa e para a construção do verdadeiro tecido social.
Os problemas de desenvolvimento do Brasil estão diretamente vinculados à possibilidade das pessoas se associarem e efetivarem experiências concretas para enfrentar toda ordem de problemas da vida e de necessidades cotidianas. Um governo que pretende definir as necessidades do indivíduo e da sociedade acaba substituindo a iniciativa destes pela ação de aparatos burocráticos, ineficientes e dispendiosos. Torna-se, assim, inimigo da educação a uma verdadeira liberdade e criatividade – únicas possibilidades para a responsabilidade pessoal e coletiva.
Uma verdadeira postura educativa
reconhece as realidades vivas da sociedade,
alimenta-as e é por elas alimentada.
A situação da educação no nosso país se tornou, nestes últimos anos, uma preocupação de todos, mas as diversas propostas apresentadas parecem não colocar em evidência a natureza do problema.
A questão educativa, de fato, não se resume ao âmbito escolar e não pode ser delegada simplesmente às instituições de ensino, mas solicita a cada um de nós. O relacionamento com as pes-soas, inclusive no trabalho, na ação social, na gestão de uma atividade econômica, ou é educativo – ou seja, ajuda a viver a realidade toda – ou é deseducativo: desestrutura a pessoa.
A riqueza que está presente nos sujeitos vivos da nossa sociedade é fruto de uma educação ao sentido da vida, capaz de gerar criatividade, solidariedade e gratuidade, testemunhando e transmitindo um ideal de homem que se torna fator para a construção do bem comum.
É preciso apoiar os espaços educativos
em nossa sociedade.
Uma educação à liberdade implica o apoio aos sujeitos presentes na sociedade, começando pela família. O reconhecimento do seu papel fundamental na formação dos jovens e da sociedade leva ao cuidado com ela por parte do Estado.
As condições mínimas e necessárias para o
real desenvolvimento do país dependem de uma legislação e ação do governo que defendam e valorizem a família como centro vital da sociedade, sustentem sua constituição fundamentada no matrimônio entre homem e mulher,
protejam a vida desde a sua concepção até
o seu término natural com a morte e
apóiem os grupos sociais que têm a
responsabilidade pelo cuidado e pela educação das crianças e dos jovens.
Uma educação à liberdade implica também a valorização, em todos os sentidos, da função do educador, desde o seu reconhecimento dentro da sociedade até a melhoria das suas condições de trabalho (aumento do salário, formação continuada).
Por fim, uma educação à liberdade supõe o apoio integral, inclusive no campo financeiro, a todas as propostas educativas que se propõem a serem eficientes e públicas. Creches, escolas, centros de formação, universidades, criadas pelas próprias comunidades ou por organizações religiosas e leigas, que atendam a estes dois pré-requisitos devem receber apoio e incentivo. A sociedade e o Estado devem reconhecer a enorme contribuição destas instituições não-governamentais à educação brasileira, fiscalizando suas atividades, mas também dando-lhes condições de realizarem sua missão.
O Estado deve estar verdadeiramente
a serviço das EXPERIÊNCIAS que
já vivem em nosso meio.
Uma afirmação recente de Bento XVI lembra que: “Não precisamos de um Estado que regule e domine tudo, mas de um Estado que, generosamente, reconheça e apóie, segundo o princípio da subsidiariedade, as iniciativas que nascem das diversas forças sociais e conjugam espontaneidade e proximidade aos homens carecidos de ajuda” (encíclica Deus caritas est, n. 28).
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