No mês de março, na Colômbia, se reuniram pela primeira vez 32 Bispos e 122 delegados de 45 movimentos, em um congresso com o título “Discípulos e missionários de Cristo hoje”. O tema foi o serviço dos carismas à igreja. Entre os relatores estava padre Julián Carrón
O Pontifício Conselho para os Leigos e o Conselho Episcopal Latino-americano (CELAM) realizaram em Bogotá, na Colômbia, de 9 a 12 de março, o primeiro congresso de movimentos eclesiais e novas comunidades da América Latina, com o tema “Discípulos e missionários de Cristo hoje”. O encontro reuniu a direção do CELAM, uma representação do Conselho para os Leigos, 32 Bispos – entre os quais dom Filippo Santoro, Bispo de Petrópolis – e 122 responsáveis de 45 movimentos e novas comunidades provenientes de 23 países da América Latina.
A mensagem do Papa
O Papa Bento XVI expressou sua paternidade por meio de uma mensagem enviada pelo Cardeal Sodano, na qual destacou a importância do encontro e caracterizou a missão do discípulo como realização da própria pessoa. Indicou ainda dois aspectos essenciais para o caminho da Igreja “entre as perseguições deste mundo e a consolação de Deus”. De um lado, “ser discípulo de Cristo não é uma situação transitória que termina em um determinado momento, mas que requer estar sempre à escuta, aprendendo e seguindo o único Mestre, sem pretender chegar a ser ele mesmo mestre algum dia. Por isso, os discípulos hão que se considerar entre eles como irmãos. Por outro lado, o discípulo de Cristo não se limita a receber seus ensinamentos como vindos de fora. Começa a sê-lo por um encontro pessoal fascinante e perenemente atual com Ele, que provoca uma inefável relação de comunhão e leva a seguir seus passos, a imitar sua forma de viver. E isto, com a entrega e convicção de ter encontrado o verdadeiro tesouro da própria vida, diante do qual nenhuma outra alternativa ou insinuação tem maior interesse.”. Daqui nasce a decisão de ir a fundo no próprio carisma como dom do Espírito à Igreja: “O missionário não deixa de ser discípulo, não dá mais do que ele mesmo recebeu e segue recebendo, sem antepor suas próprias idéias ou pretender o proveito próprio, pois sabe que é só um pobre servo” que, com generosidade e competência contribui para uma renovada arrancada evangelizadora “em todos os campos nos quais se desenvolve a vida dos homens de hoje”.
Uma nova e verdadeira evangelização
A América Latina é o continente com a mais alta concentração de católicos no mundo: quatrocentos milhões de pessoas se reconhecem como tal. Entre as estatísticas favoráveis e as tendências atuais se evidenciam problemas graves e crescentes. “Nos últimos dez anos – sublinhou o Cardeal Francisco Javier Errázuris, presidente do CELAM – o número de católicos em muitos países do continente caiu fortemente. Em alguns países, esta queda chegou a 10%. Isto nunca aconteceu em nossa história. E a falta de fé vem crescendo, sobretudo entre os jovens”.
Dom Stanislaw Rylko, presidente do Pontifício Conselho para os Leigos, sublinhou que o ponto central dos trabalhos do Congresso estava na questão educativa. Referindo-se a um recente discurso de Bento XVI aos Bispos alemães, evidenciou como também hoje a questão é realizar uma verdadeira evangelização, e não somente uma nova evangelização. Mais que isso, freqüentemente se trata de uma autêntica primeira evangelização, pois existe um novo paganismo hegemônico. Em nossos dias, a cultura dominante, que se impõe como ditadura do relativismo, produz indivíduos fragmentados, débeis e mentalmente incoerentes. Isto, juntamente com o dualismo, torna as pessoas escravas de uma fé sentimental, que reproduz um “cristianismo cansado” (Bento XVI) e confuso, que se avizinha ao moralismo mundano ao enfatizar certos valores considerados de tempos em tempos como relevantes.
Com palavras que foram reproduzidas também no documento final, coordenado pelo professor Guzmán Carriquiry – no qual se sublinha a necessidade de educar o eu na experiência do acontecimento cristão como a primeira entre as prioridades reconhecidas pelos movimentos – Dom Rylko adverte como “está em crise a capacidade de uma geração de adultos de educar seus próprios filhos, porque se considera a liberdade como ausência de vínculos e de história, porque se vive como se a verdade não existisse, como se o desejo de felicidade do qual é feito o coração do homem fosse destinado a permanecer sem resposta”.
O que fazer, então, se não recorrer à força ineliminável dos fatos, em vez dos projetos pastorais pensados nas escrivaninhas e que permanecem no papel? Na vida das pessoas que participam dos movimentos eclesiais, com seu modo radical de ser cristãos no mundo – prossegue Dom Rylko –, existe sempre um “antes” e um “depois”. O segredo é o encontro totalizante da pessoa com Jesus Cristo vivo, graças ao carisma e à sua extraordinária força educativa. Em sua maioria são pessoas que “vieram de longe” e que no movimento reviveram a experiência dos primeiros discípulos: “vinde e vede”.
Um acontecimento que fascina
Os organizadores do encontro confiaram a Comunhão e Libertação, na figura de seu responsável último, padre Julián Carrón, a conferência-base do evento: “Cristão, ou seja, discípulo de Cristo”. Os pontos chave da grande tarefa que reúne e responsabiliza todas as expressões deste multiforme sujeito eclesial e social foram expostos por Carrón em três passos fundamentais: “O despertar do eu”, “Um acontecimento imprevisível e excepcional” e “A vitória de Cristo é o povo cristão”.
Carrón salientou que não é suficiente falar de nova evangelização sem perguntar-se qual será o sujeito que deverá levá-la a bom termo. Observou que na América Latina existem muitos que acreditam saber o que é o cristianismo e não têm a mínima curiosidade de conhecê-lo verdadeiramente. Para atraí-los à fé não é suficiente uma estratégia de comunicação, nem uma formação superior ou uma vida interior mais profunda, mas sim tomar como ponto de partida recriar o interesse por Jesus Cristo e pelo seu Evangelho. Somente um Acontecimento como este atrai o eu na sua totalidade e estimula o mais profundo de sua capacidade crítica. O relativismo e o niilismo são conseqüências do esquecimento de si, do próprio eu e da volatilização do real. Por isso, a primeira e constante tarefa na evangelização da pessoa, segundo Carrón, consiste em educar o senso religioso, plena realização da natureza racional, livre e afetiva do homem.
Esta dimensão de verificação, freqüentemente vivida de forma confusa, implica na conquista de um aliado no qual possamos confiar: “Todas as dificuldades que o homem de hoje experimenta não conseguem arrancar do coração a esperança da plenitude humana. É a própria natureza do coração que o coloca a esperar, ainda que freqüentemente a dificuldade em encontrar respostas o faça duvidar de um destino positivo”. Ao lado deste desejo de conhecimento deve estar a liberdade diante de um encontro humano verdadeiramente excepcional, no qual se envolve o próprio destino. “É como quando alguém anseia por ver revelado o rosto da pessoa amada. Até o momento em que este lhe é desconhecido, a pessoa se comporta como quer. Só quando a pessoa amada surge o homem passa a ter a clareza e a energia afetiva necessária para uma adesão que implica todo o seu eu e que lhe permitirá ‘ser’ verdadeiramente com todo o seu ser”. (Veja na p.38 trechos da colocação de padre Carrón durante o Conselho).
Disponibilidade de coração
De fronte à dramática pergunta “o que fazer?”, as palavras conclusivas do presidente do Pontifício Conselho para os Leigos, indicam que tipo de disponibilidade de coração nos é pedida: Sermos fiéis a nós mesmos, ao caminho que nos foi dado. Viver a comunhão entre nós e com a Igreja, indo até o fundo no próprio carisma, pois foi o próprio Espírito Santo que o deu como dom para toda a Igreja no seu caminho rumo ao homem. Apoiarmo-nos no Papa, porque precisamos dele assim como ele precisa de nós.
A urgência do momento que a Igreja está vivendo na América Latina, não pode deixar de levar ao desejo – segundo as palavras de Carrón – que muitos homens, sobretudo os jovens, encontrem pessoas que com a sua vida testemunham que o cristianismo não é um ajuntamento de noções tradicionais sem uma referência na vida real, mas – pelo contrário – é o encontro com alguém para quem Cristo é um fato presente, a comovente verdade que gera uma experiência real. A mesma experiência expressa no início da história da evangelização por Mario Vittorino: “Quando encontrei Cristo, me descobri homem”.
Credits /
© Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón