O testemunho publicado no jornal italiano Corriere della Sera de 23 de fevereiro de 2006
Quando, ainda menino, no catecismo, me explicaram que a Igreja fazia memória da vida de um homem não pela data de nascimento, mas da morte, eu não entendi. Parecia-me apenas triste. Depois, a experiência da vida me fez entender. Com efeito, o significado da existência de um homem manifesta-se com uma plenitude cada vez maior, quanto mais a vida se realiza. É isso que penso, agora, olhando a foto de Dom Giussani sobre a mesinha ao lado da escrivaninha. É isso que me parecia evidente em fevereiro do ano passado, durante o funeral, na Catedral de Milão. O dia estava cinza, banhado por uma chuvinha fria. Havia muita tristeza, mas não desespero. Não vi nenhum desespero quando, em 40 mil (assim disseram), cantávamos Dulcis Christe enquanto o caixão, levado nos ombros, atravessava lentamente a nave central.
“A vida é triste, mas é melhor que seja triste porque, de outro modo, seria desesperada”, dizia Dom Giussani. Ensinava a não limitar o olhar sobre a vida, mas a tomá-la por inteiro, com a sua satisfação e contradição, com a sua imperfeição: de fato, é somente pela tristeza que chegamos a felicidade verdadeira... e a fecundidade. Ele demonstrou isso com o seu Movimento, que é numeroso e não é medroso, mas marcado pela “confiança ingênua”, com a qual amava definir o seu e o nosso caráter (que Deus o mantenha!). A esperança da ressurreição, do ser mais forte do que a morte é o “sentimento das coisas” que Dom Giussani deixou, não como herança que se consume, mas como acontecimento permanente de vida.
Dom Giussani era um padre católico, quer dizer, sobretudo um cristão, um seguidor de Cristo – laicíssimo! Um de seus livros intitula-se “Laico, isto é, cristão” –, um seguidor da testemunha de um Deus que para falar ao homem fez-se homem, compartilhando em tudo a sua condição, incluindo a morte. Desse modo, Dom Giussani não deu idéias, deu a vida. Revestiu as idéias de carne, as “refez”, subtraiu-as de sua possível opacidade, deu-lhes um corpo que as tornasse acessíveis, “abraçáveis”. A isso chamava “método”. A mensagem, mesmo a verbal, devia ser um “gesto”, uma “ação carregada de significado”. O “o quê” deveria coincidir com o “como”: para ele, Cristo era verdade, vida e caminho, especialmente “caminho”. Como me disse em uma de nossas últimas conversas: “não é possível amar a Deus sem amar o homem e não é possível amar o homem sem amar a Deus”.
Assim, também nós (também eu) nos tornamos cristãos. Somos unidos àquela cadeia de homens e mulheres jamais interrompida que há vinte séculos anuncia, em Cristo, a invencibilidade da vida e do seu desejo de felicidade; promessas não genéricas, mas pessoalmente experimentada em “uma amizade guiada ao destino”. Que esta consciência seja possível no aniversário de uma morte, é a esperança, digo-o com pudor, mas com “audácia ingênua”: é a esperança para todos.
Credits /
© Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón