Ao contrário do que muitos dizem, o objeto do Ensino Religioso não é o Ecumenismo ou o Diálogo Inter-religioso. Nem mesmo a Ética e os Valores. Também não se trata da História das Religiões, isso a História, a Filosofia ou a Sociologia podem fazer melhor do que qualquer professor de Religião. Também faz-se necessário reafirmar que não existe neutralidade, imparcialidade em Educação. Qualquer que seja a disciplina, o professor é uma pessoa marcada culturalmente, forjada pelo tempo e por seu contexto histórico-social. Portanto, o professor ensina não apenas segundo o conhecimento que carrega sobre o assunto em questão, mas também a partir de uma visão de mundo, de uma postura crítica, ou seja, o professor carrega consigo um juízo sobre a realidade. A grande questão é como se forma esse juízo.
A experiência religiosa, certamente, influencia a visão de mundo. Um católico não estabelece um juízo sobre as circunstâncias partindo dos mesmos critérios que um protestante ou um umbandista, por exemplo. Aqui não entra o valor do juízo, se melhor ou pior, mas os princípios que o regem. Nesse sentido, pessoas com uma identidade religiosa clara, porém diferente, podem, por exemplo, num debate sobre aborto ou casamento de homossexuais, se posicionar de maneira, inclusive, contraditória, ou podem defender a mesma posição, mas fundamentadas numa compreensão diferente sobre a liberdade e o direito de decidir.
Por outro lado, conceber as aulas de Religião como uma aproximação ao Fenômeno Religioso não é suficiente. Qualquer aula de Religião deve partir da compreensão do fenômeno, mas isso não basta. É preciso, sim, que a pessoa seja ajudada a se perguntar “E eu, quem sou?”. “Qual o sentido da vida?” Porém é fácil perceber que o homem não basta a si mesmo.
Jean Guitton, em seu livro Deus e a Ciência, afirma que “existimos através de ‘alguma coisa’ cuja natureza e espantosas propriedades temos bastante dificuldades de apreender, mas que se aproxima mais do espírito que da matéria tradicional”. Então, o Ensino Religioso precisa ajudar os educandos a dirigirem o olhar para o mistério, que, segundo Guitton, é a própria realidade. Segundo ele, a teoria quântica não prova a existência de Deus, pois Deus não é da ordem da demonstração, “mas é um ponto de apoio científico às concepções propostas pela religião”.
É dessa relação entre religiosidade e realidade que surge a epistemologia do Ensino Religioso, onde cada religião tem seu objeto de conhecimento, seu método e sua teoria.
Nesse sentido, o Ecumenismo e o Diálogo Inter-Religioso são métodos para se desenvolver o relacionamento com esses conteúdos específicos.
Existe, em todos os campos do saber humano, material mais que suficiente para o professor de Ensino Religioso construir as suas aulas. Num curso de Ensino Religioso pode ser proposto, por exemplo, um aprofundamento por meio da obra de grandes autores, como Chopin, Carlos Drummond de Andrade, Beethoven, Van Gogh, Adélia Prado, Luigi Giussani, T.S. Eliot e Rembrant. Por meio dessas obras, verifica-se os desejos do coração do homem, a identificação desse coração como sendo maior do que a realidade contingente seja capaz de satisfazer, como essa percepção pode acarretar na ilusão de autonomia e de maneira a comunidade resgata o homem dessa ilusão, a necessidade de companhia e a experiência da saudade, a contemplação como grito ao infinito, o mistério da encarnação como resposta definitiva aos desejos do coração do homem e, finalmente, o abraço misericordioso do Pai, na parábola do Filho Pródigo.
* Coordenadora de Educação Religiosa da Secretaria de Estado da Educação do Rio de Janeiro
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