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Passos N.124, Março 2011

APROFUNDAMENTOS

Existe um homem que quer a vida
e deseja dias felizes?

por padre Mauro Lepori

O título do Meeting 2003 nasceu de uma meditação sobre a Regra de São Bento. A todo aspirante a monge que se apresenta pela primeira vez em um mosteiro, o abade dirige a pergunta contida no Salmo 33: “Existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”. Se responder “Eu”, o candidato será introduzido ao resto da Regra. Padre Mauro Lepori, abade do mosteiro cisterciense de Hauterive, na Suíça, perto de Friburgo, foi o “mentor” do título do Meeting - tema muito atual, como demonstrou também o grande número de encontros e de personalidades que participaram daquela semana em Rímini (Itália). Foi, então, natural convidá-lo para a conferência,ou melhor, o testemunho sobre o título, que constituiu um dos encontros centrais do Meeting. Passos propõe agora o texto integral da palestra de padre Mauro como sinal de gratidão por haver aceitado “infringir” o silêncio da clausura para lançar-se no burburinho de Rímini. Agradecemos, sobretudo, pelas suas palavras.

“Existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?” (cf. Salmo 33,13). A idéia do tema desta edição do Meeting foi provocada pelo tema de dois anos atrás: “Toda a vida pede a eternidade”, que ressoou em mim - diria - como a expressão de uma ânsia, de uma preocupação, de uma apreensão diante do homem de hoje. “Toda a vida pede a eternidade”: a vida humana é grandiosa, é um mistério imenso, é chamada a uma plenitude sem fim. Mas quando se observa o homem, o homem assim como se encontra na rua, no trem, no local de trabalho, na escola, nas férias, nas famílias; quando se observa os jovens, quando se observa o rosto das pessoas... nós nos perguntamos: mas, “existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”. Onde está, quem é o homem que hoje quer viver com plenitude, que deseja a felicidade, a felicidade verdadeira, aquela que não tem fim? Será que a cultura moderna conseguiu plasmar e difundir um tipo de homem que não vive a própria vida, um homem satisfeito com a desilusão, contente com a tristeza; um homem que nenhuma alegria pode mais surpreender, que nenhuma alegria, possuída ou esperada, mobiliza? Será que não se deseja mais a felicidade?

Um Deus que deseja o nosso desejo
“Existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”. Este versículo do Salmo 33 me levou, depois, a uma passagem da introdução da Regra de São Bento, sugerida como questionamento a ser feito a qualquer um que se apresente ao mosteiro para abraçar a vida monástica. Leio para vocês todo o trecho porque aprofunda a compreensão do nosso tema.
São Bento escreve: “O Senhor, procurando entre a multidão (...) o seu operário, diz: “Existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”. Se ao ouvires isto, responderes: “Eu”, Deus te dirá: “Se queres ter a vida verdadeira e eterna, afasta a tua língua do mal e os teus lábios não profiram mentiras; foge do mal e faze o bem, procura a paz e a siga. Se te comportares deste modo os meus olhos estarão sempre sobre ti e os meus ouvidos estarão atentos às tuas orações e, mesmo antes de me invocares, dir-te-ei: “Eis-me aqui, estou presente!”. O que poderia ser mais doce para nós, caros irmãos, do que esta voz do Senhor que nos convida? Na sua misericórdia o Senhor nos indica o caminho da vida” (cf. RB, Introdução, 14-20).
É importante, antes de tudo, notar que São Bento põe o versículo do Salmo 33 nos lábios de Deus. É o Senhor que se envolve na multidão dos homens perguntando: “Existe um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”. Então, na origem de tudo não está o desejo de vida e de felicidade do nosso coração, mas Deus que deseja a plenitude da nossa vida. Deus se faz mendicante do desejo de felicidade do coração do homem. Deus se coloca no meio da multidão e grita, como um vendedor ambulante, o seu desejo de encontrar um homem que queira a plenitude da vida e que queira ser feliz, um homem que queira viver na alegria. Este homem, Deus o procura como “seu operário”, como alguém para o qual já estabeleceu uma tarefa. Contudo, a condição necessária para responder ao seu chamado, a condição para viver a vocação humana e cada vocação particular, a condição para ser útil a Deus não são atitudes, capacidades ou qualidades mas, simplesmente, o desejo da vida e da felicidade, o desejo da plenitude da vida. A nossa vocação fundamental é o chamado de um Deus que se faz mendicante do nosso desejo de felicidade.
Assim, São Bento traz à luz três elementos fundamentais do mistério do homem diante do mistério de Deus. Estes elementos se expressam na pergunta colocada por Deus: “Existe um homem que quer a vida e deseja ver dias felizes?”; da resposta do homem: “Eu”; e da resposta de Deus à resposta do homem: “Eis-me aqui, estou presente!”.
Ora, o “Eis-me aqui, estou presente!” pronunciado pelo Senhor não é só o prêmio pela disponibilidade do homem, porque o Senhor já pronuncia o seu “Eis-me aqui!” quando se mistura na multidão procurando um homem que deseje a felicidade. O “Eis-me aqui” de Deus é eterno e está na origem do homem, é a Origem. De fato, aludindo a uma expressão do profeta Isaías, São Bento faz o Senhor dizer: “Antes mesmo de me invocares dir-te-ei: “Eis-me aqui, estou presente!”.
É verdade que a nossa consciência percebe o desejo de felicidade como se ele surgisse em nós do nada. Há um afastar-se da imponência do Ser de Deus diante do homem que cria a faculdade misteriosa da nossa liberdade de ser capaz de desejar uma Origem e um Fim que dêem sentido e plenitude à vida. A Origem e o Fim existem e coincidem no Deus que nos diz “Eis-me aqui!” mas não se impõe, a fim de que o homem possa viver o desejo afirmando o “eu”. Para São Bento, dizer “eu” significa afirmar o próprio desejo de plenitude de vida. A identidade do homem é o desejo de felicidade. O lugar do desejo de plenitude da vida é o lugar no qual o homem tem o dom de ser alguém, uma pessoa, a imagem de Deus. “Eu”: parece a coisa mais simples de dizer e de afirmar. E, da mesma forma, parece simples e dedutível que o homem responda “eu” a quem lhe pergunte se quer a vida e a felicidade. No entanto, é exatamente neste “eu”, neste simples dizer “eu” que tudo se torna confuso e é como se Deus fosse encontrado gritando o seu “eis-me, estou aqui para lhe dar a vida e a felicidade!” em um deserto sem almas, sem rostos e sem desejo. A partir do pecado original o homem passou a ter dificuldade de dizer “eu”, porque não se pode dizer “eu” sem se colocar diante de um “Tu”, sem depender ontologicamente de um “Tu”. Quando Deus diz ao homem: “Eis-me aqui, estou presente!”, anuncia-lhe a si mesmo como o “Tu” diante do qual o homem pode dizer “eu”. A felicidade que Deus promete e oferece não é um sentimento: é uma plenitude de vida, a plenitude do nosso ser homens, do nosso “eu” humano.
Por isso, quando o “Eis-me aqui, estou presente!” de Deus, origem de tudo, se faz presença que procura o homem é como se o Criador fosse em busca da realização da sua obra, da criação do homem. Deus quer que o homem seja plenamente si mesmo.
A redenção leva a criação ao cumprimento e o Deus que se coloca em meio à multidão humana é Jesus Cristo, o Emanuel, o Deus-conosco, o Deus que diz ao homem “Eis-me aqui, estou presente!” até na sua carne e até na sua morte. E é Ele que se envolve com a multidão desejando o nosso desejo, sedento por nos matar a sede, o Deus crucificado que, pouco depois de ter gritado “Tenho sede!” (Jo 19,28), se deixa traspassar o coração para se tornar nascente. “Se conhecesses o dom de Deus, disse Jesus à Samaritana, e quem é que te diz: “Dá-me de beber” [que te diz: “Tenho sede!”], certamente lhe pedirias tu mesma, e ele te daria uma água viva” (Jo 4,10).

O temor da morte sem amor pela vida
Mas qual homem encontra, hoje, este Deus que se coloca entre a multidão mendigando o desejo de vida e de felicidade?
Vivemos em uma cultura mergulhada na contradição de temer a morte sem amar a vida. Uma cultura que se debruça sobre os dois pólos extremos do aborto e da eutanásia. É como se a sociedade inteira fosse habitada por pessoas que vivem somente porque ainda não estão mortas, como se a vida não fosse nada mais do que a testemunha da morte, o arauto da morte, de modo que aqueles dois lúgubres pólos extremos, mesmo cuidadosamente censurados, invadem de tal forma o pensamento, a consciência, os relacionamentos, que à vida não resta mais nada além da consciência da morte. A vida não é nada mais que uma suspensão temporária da morte, assim como a felicidade, se existe, não é mais que um relâmpago que passa e desaparece, como o efeito de algo assombroso.
Este medo da morte sem amor pela vida é uma contradição que penetra tudo e se torna cultura, modo de viver e de pensar. Quantos pais e educadores temem neuroticamente a morte de seus filhos, mas não se preocupam absolutamente em transmitir a eles o sentido da vida! Quantos pacifistas lutam contra a guerra mas não lutam contra o aborto! E quantos se iludem tentando enganar o medo da morte com a droga e o prazer efêmero destruindo, assim, suas vidas!
Esta situação é humana e culturalmente um beco sem saída porque o ódio pela vida não é uma alternativa ao medo da morte. É como se a consciência do homem contemporâneo estivesse constantemente fugindo da morte à vida e da vida à morte dentro de um circuito infernal no qual nunca se pode evitar nem a vida nem a morte. Mas, em última instância e inevitavelmente, é a morte que se afirma por si mesma sobre tudo e sobre todos.
São Paulo, escrevendo aos pagãos convertidos de Roma, parece se referir ao homem de hoje: “Quando éreis escravos do pecado, éreis livres a respeito da justiça. Que frutos produzíeis então? Frutos dos quais agora vos envergonhais. O fim deles é a morte” (Rm 6,20-21).
A morte como destino de todas as coisas efêmeras que se faz e se vive na busca pela felicidade. O desejo de vida e de felicidade, restituído pelo desejo de Deus, que se torna pura fuga, sem direção, da morte e da tristeza que lhe cabe, se vê constrangido a suportar, ainda, a morte como destino.
Mas como pode existir espaço para o desejo no coração do homem se o destino da vida é a morte? Na verdade, o desejo do coração humano só é vivo quando tende ao infinito e ao eterno: “Toda a vida pede a eternidade”. Se o destino é a morte, se o horizonte é a morte, o desejo é percebido como falso, como um sonho, como uma alienação da realidade, mesmo quando percebido, no fundo do coração, nos momentos de maravilhamento, de verdade, de comoção, de amizade ou de dor. Nestes momentos é melhor sufocá-lo, drogando-o de imediato com o que é efêmero: “De repente, tudo e, depois, o nada”. Para que serve, de fato, o desejo de infinito e de eternidade se estamos fechados num destino de morte?
Então, que novidade pode nascer diante de uma humanidade que vive dominada pelo destino de morte e que parece ter perdido a capacidade de querer a vida e desejar a felicidade, de dizer “eu” diante da plenitude do próprio destino?

Tudo é possível para Deus
Uma cena evangélica me parece descrever a dificuldade na qual nos encontramos e o ponto de fuga para um horizonte de esperança. É a cena do encontro de Jesus com um jovem rico que, primeiramente, parece sedento de plenitude (“Bom Mestre, o que devo fazer para ter a vida eterna?”), mas que vai embora triste quando Jesus, fitando-o com amor, lhe propõe abandonar toda a sua riqueza para segui-lo (Mc 10,17-22). Este jovem é exatamente a imagem do homem contemporâneo que por instantes deixa-se comover por um desejo de plenitude mas que, diante de uma proposta real de vida, se enfraquece, como se dissesse a si mesmo: “De qualquer forma, a morte é o meu destino!”.
Mas é no instante em que este homem está indo embora, fechado na tristeza do apego às suas riquezas, tendo sufocado no seu coração todo desejo de plenitude de vida e prisioneiro do seu destino mortal, que acontece algo de novo, - por ele e apesar dele - e se reabre um horizonte de esperança.
À primeira vista, Jesus parece querer sublinhar o desespero daquela negação dizendo: “Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os ricos!” (Mc 10,23). Os discípulos se sentem, então, como que julgados pelo distanciar-se do jovem e, amedrontados, colocam uma pergunta desesperada a Jesus: “Quem pode então salvar-se?” (Mc 10,26). E Jesus, como se tivesse Ele mesmo sido tomado por um desânimo instintivo afirma, seguro e decidido: “Aos homens isto é impossível, mas não a Deus; pois a Deus tudo é possível.” (Mc 10,27).
Mas a novidade ainda não está nestas palavras porque até os pagãos poderiam dizê-las, referindo-se à sua divindade. A novidade está no significado que estas palavras têm para Jesus naquele momento e na modalidade com a qual as torna presente naquela circunstância. Exatamente depois deste encontro frustrado com o jovem rico Jesus aperta o passo em direção a Jerusalém, em direção à paixão, cruz e ressurreição, e o faz de modo tão explícito e surpreendente que aterroriza os seus discípulos: “Estavam a caminho de Jerusalém e Jesus ia diante deles. Estavam perturbados e o seguiam com medo. E tomando novamente a si os 12, começou a predizer-lhes as coisas que lhe haveriam de acontecer: “Eis que estamos subindo para Jerusalém e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, aos escribas e eles irão condená-lo à morte e entregá-lo aos gentios. Zombarão dele, cuspirão nele, irão açoitá-lo e hão de matá-lo: mas ao terceiro dia ele ressurgirá.” (Mc 10,32-34).
Esta é a novidade absoluta do cristianismo diante de cada humanidade sufocada no destino da morte. “Tudo é possível a Deus!”, mas enquanto os discípulos talvez começavam a sonhar com uma vitória da onipotência divina sobre a mesquinhez humana, Jesus revela a eles que o que é possível a Deus é sofrer a recusa do homem até a morte na cruz e que, a partir dali, poderá ressurgir.
Apesar da negação da vida e da felicidade por parte do homem, apesar do medo, da incapacidade e da impossibilidade de viver com plenitude e até de desejá-lo, Jesus Cristo sabe que ainda pode criar um lugar, uma impossível possibilidade de plenitude de vida para o homem que já a negou. Como? Correndo para realizar o mistério pascal, fazendo a oferta de si mesmo, doando a sua vida.
Deus não tem poder contra a liberdade do homem que lhe dá as costas; mas nenhuma recusa por parte do homem pode impedir a liberdade de Deus de amá-lo sacrificando-se a si mesmo. O amor de Deus supera a liberdade do homem para oferecer-lhe, apesar da sua negação, o âmbito de uma espera, de uma gratuidade que re-desperta a liberdade humana corrompida pelo pecado, restituindo-lhe um lugar de responsabilidade.
Por isso não podemos mais nos perguntar se há um homem que quer a vida e deseja a felicidade sem olhar, antes, o Homem-Deus que se entrega à morte e à ressurreição pela vida e pela felicidade do homem que lhe voltou as costas. É necessário, em suma, “partir novamente de Cristo”, como não se cansa de nos chamar a atenção João Paulo II neste início do terceiro milênio. É necessário partir novamente do “Eis-me aqui, estou presente!” de Deus em Cristo que chega até a cruz. E isto não somente para sair da armadilha da cultura da morte mas, também, como olhar e juízo sobre o drama humano. De fato, não há juízo mais verdadeiro sobre o homem do que o olhar de Cristo que não vê na multidão “perdida sem pastor” um lugar de desespero e tampouco de condenação, mas um lugar de miséria que chama sobre si a Misericórdia.

Nenhum de seus ossos será quebrado
No final do Salmo 33 dois versículos remetem a Cristo crucificado: “São numerosas as tribulações do justo, mas de todas o livra o Senhor. Ele protege cada um de seus ossos, nem um só deles será quebrado” (vv 20-21).
Esta promessa é uma profecia, mas o salmista não sabe que esta profecia não se realizará em um homem vivo, mas em um Deus morto na cruz. “Vieram os soldados e quebraram as pernas do primeiro e do outro, que com ele foram crucificados. Chegando, porém, a Jesus, como o vissem já morto, não lhe quebraram as pernas, mas um dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água. (...) Assim se cumpriu a Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado” (Jo 19,32-36).
A promessa de vida e de proteção divina que o Salmo 33 exprime, a incolumidade até a medula dos ossos que Deus assegura a quem confia nEle realiza-se, paradoxalmente, em Jesus Cristo “já morto” na cruz.
O fato de os soldados não terem quebrado nenhum dos ossos de Jesus crucificado também confirma a sua identificação com o cordeiro pascal que passou a ser imolado em Israel desde a noite da libertação do Egito (cf. Ex 12,46 e Num 9,12); mas a referência à profecia do Salmo 33 introduz, na incolumidade dos ossos de Cristo crucificado, a dimensão da providência do Pai e, portanto, do seu desígnio. Exatamente depois da morte de Jesus, exatamente depois da sua paixão, na qual a providência do Pai parecia ter abandonado o Filho único e predileto para deixar agir somente as trevas, e os homens com elas, exatamente nesta hora, pareceu que o Pai recomeçasse a agir segundo a sua bondade e onipotência. Era como se somente naquele momento Deus se lembrasse de defender o seu Filho, o seu Servo justo e inocente.
“Os judeus - escreve São João - rogaram a Pilatos que se lhes quebrassem as pernas e fossem retirados” (Jo 19,31). Este seria o último gesto de uma representação dirigida pelos inimigos de Cristo, por homens que temiam a morte sem amar a vida; e eis que o Pai misteriosamente se serve de alguns soldados pagãos a fim de que façam uma escolha que cumpra as Escrituras, quer dizer, a vontade de Deus. “Assim se cumpriu a Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado”.
Mas, enfim, para que serve esta intervenção divina, esta libertação, esta defesa até a medula dos ossos? Por que o Pai intervém somente agora, depois do fim, e ainda não para ressuscitar o Filho mas para impedir a fratura dos ossos de um morto?
Este fato revela, antes de mais nada, que o espaço entre a morte e a ressurreição não está fora do desígnio do Pai. O amor providencial do Pai opera também dentro da morte. E este é um aspecto essencial da esperança cristã. A esperança da libertação do destino de morte do qual a humanidade é prisioneira desde o pecado original não é somente a espera de um “depois”, de um “além” da morte, mas uma confiança possível também, e agora, dentro da condição mortal. A salvação, a libertação, a redenção são acontecimentos que nos salvam do destino de morte invadindo-o com um desígnio divino, com uma providência que transforma subitamente o destino mortal no lugar no qual Deus opera com amor e para uma vida maior, a vida que a ressurreição de Cristo colocará em plena luz. Lá, aonde a morte é definitiva, em todos os sentidos do termo, quer dizer, lá onde a morte delimita todo o horizonte e se impõe como definição da vida humana tornando estéril cada desejo de felicidade, eis que se impõe uma definição nova do destino humano, um sentido novo da vida no qual a morte não é mais limite, mas terreno de ressurreição.
“São numerosas as tribulações do justo, mas de todas o livra o Senhor. Ele protege cada um de seus ossos, nem um só deles será quebrado” (vv 20). Jesus está morto, está desacreditado, está, ainda, pregado na cruz da ignomínia, abandonado pelos seus, desprezado, aniquilado, e é exatamente ali, exatamente assim, naquela carne sem vida, que o Pai afirma querer libertá-lo de todas as suas tribulações e preservá-lo integralmente. Uma pessoa já pode ter sofrido todas as tribulações, chegando a morrer, e Deus ainda pode libertá-lo. Uma pessoa já está morta e Deus ainda pode garantir a sua incolumidade total.

Imediatamente saiu sangue e água
Mas o cumprir-se das Escrituras e da vontade do Pai, no fato de os ossos de Jesus não terem sido quebrados, determina uma ulterior manifestação do mistério, um ulterior horizonte do mistério de Deus na nossa humanidade: o traspasse do lado, do coração de Jesus.
“Chegando, porém, a Jesus, como o vissem já morto, não lhe quebraram as pernas, mas um dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água” (Jo 19,33-34).
Porque não lhe quebraram nenhum osso, lhe traspassaram o coração. Porque o Pai preservou todos os seus ossos, o soldado lhe fere o coração.
Aquele Deus que “não poupou seu próprio Filho, mas que por todos nós o entregou” (Rom 8,32), não só intervém a favor do Filho quando este já está morto, mas de um modo tal a ponto de provocar um ulterior, um extremo sinal de doação do Filho: o coração ferido. Se ainda era possível para Deus intervir depois da morte, esta intervenção não seria para dizer “Chega! É suficiente!”, mas para entregar o dom da vida do Filho até o extremo, até a última gota de sangue e de água que ainda podia jorrar do seu corpo. O ato providencial de Deus abre para além do destino mortal assumido por Cristo, uma fonte de vida nova, um ulterior e definitivo dom da vida do Filho.
O golpe de lança depois da morte de Jesus é como o surgimento simbólico de todo o mistério pascal, antes de todo o drama humano e divino. Na ponta da lança se concentra e sintetiza toda a paixão e a cruz suportadas por Cristo e, portanto, a negação hostil da humanidade diante de Deus, quer dizer, a completa negação humana da plenitude de vida que Deus quer doar ao homem desde a criação de Adão.
Mas - nota João - do lado ferido “imediatamente saiu sangue e água” (Jo 19,34).
Imediatamente! Subitamente! Como imediata reação e imediata resposta ao gesto hostil, ofensivo e cruel. Tão imediatamente que o próprio ato hostil é instrumento da resposta, que a própria ofensa é instrumento do dom, do perdão. Subitamente o coração ferido se transforma em nascente do sangue e da água, quer dizer, da Vida divina que purifica e salva a humanidade inteira. Todo o mistério de Deus se resume e se concentra no coração ferido deste homem que deixa imediatamente jorrar sobre o seu algoz a misericórdia da própria Vida divina. “Olharão para aquele que traspassaram” (Jo 19,37; Zc 12,10). No dom imediato que responde ao golpe, o homem vê diante de si a gratuidade infinita que está na origem da sua existência e que ele já recusou. É como voltar à origem da criação de tudo, porque a origem de tudo é a pura gratuidade da Trindade de desejar e amar o homem. Mas se no início havia somente a pura gratuidade nascente da Trindade, agora esta mesma gratuidade jorra de uma ferida, de um ato hostil, do gesto do pecado que recusa o amor de Deus. E, neste momento, a gratuidade de Deus é toda misericórdia, perdão e redenção.
O soldado romano, que volta o olhar para Aquele a quem traspassou e lhe vê o coração, fonte da graça, se torna como um ícone de Adão que naquele mesmo espaço entre a morte e a ressurreição de Cristo, o Sábado Santo, vê o Senhor descer aos infernos para libertá-lo e restituir-lhe a realização do termo de vida e de felicidade eterna para o qual foi desejado e criado na origem.
No coração ferido, que imediatamente derrama a graça sobre o homem que nega e ofende a Deus, o eterno e o infinito se tornam visíveis na gratuidade do amor de Deus. O homem não é capaz de compreender a eternidade e o infinito, mas pode fazer a experiência deles no impacto com a gratuidade. A gratuidade, na experiência humana, é como o reflexo instantâneo do eterno e do infinito. Voltando os olhos ao coração ferido tornado fonte, o homem vê e toca a gratuidade absoluta de Deus, origem da sua existência. No coração ferido de Cristo o homem vê e toca a sua origem e o seu destino eternos e, assim, pode compreender a si mesmo, compreender quem é. Voltando o olhar para o coração transpassado o homem se vê no pensamento de Deus, no amor de Deus; vê a sua plenitude de vida e a sua verdadeira felicidade. E as vê numa fonte de gratuidade que se derrama não somente sobre os que não merecem mas também sobre os que a negam.

Felizes os que creram
O acontecimento da abertura do coração de Cristo é tão fundamental para o homem que o Ressuscitado o re-proporá à experiência dos discípulos. No Evangelho segundo João, o primeiro gesto do Ressuscitado aparecendo aos apóstolos foi o de mostrar as suas mãos e o seu lado. É como se Jesus ressuscitado quisesse que os apóstolos compreendessem imediatamente que agora a vida e a felicidade do homem jorram do seu coração transpassado, da sua misericórdia. Porque é exatamente naquele momento que os apóstolos são enviados ao mundo como alicerces vivos da Igreja: “Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio” (Jo 20,21).
Devem saber de que fonte, de que ferida, de que abismo jorra a vida da Igreja, de onde jorram os sacramentos, a graça. E os apóstolos fazem imediatamente a experiência desta plenitude para eles mesmos: “Mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos alegraram-se ao ver o Senhor” (Jo 20,20).
Jesus quer que os apóstolos sejam os primeiros homens a compreender a vida e a felicidade à luz do coração transpassado, da misericórdia divina que responde ao mal do homem com uma super abundância de graça.
Jesus, sempre fiel à lógica pascal do amor que responde à negação com um dom maior, vai ao encontro do desejo cheio de dúvida de Tomé e descreve, assim, a todos, os meios e o modo para sempre experimentar novamente nEle a fonte da vida e da felicidade: “Introduz aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos. Põe a tua mão no meu lado. Não sejas incrédulo, mas homem de fé”. Respondeu-lhe Tomé: “Meu Senhor e meu Deus!”. Disse-lhe Jesus: Creste, porque me viste. Felizes aqueles que crêem sem ter visto!” (Jo 20,27-29).
“Felizes aqueles que crêem sem ter visto!”: este é o ponto fundamental. Em quem, em quê Tomé deveria ter acreditado? Em quem, em quê creram aqueles que eram felizes mesmo sem ter visto? Creram nos discípulos que testemunhavam unanimemente que Jesus Cristo ressuscitara e que o tinham visto: “Vimos o Senhor!” (Jo 20,25).
A fé cristã é a crença fundada sobre a experiência e sobre o testemunho da Igreja. A Tomé, deveria ter bastado o testemunho eclesial, apostólico dos discípulos para poder acreditar e ser feliz na fé, quer dizer, certo da ressurreição de Cristo, certo de que Cristo estava vivo e presente. Tomé já poderia ter visto o Ressuscitado e tocar no seu lado aberto, acolhendo o testemunho dos discípulos.
Jesus proclama, no Cenáculo, a alegria da fé eclesial, da crença no testemunho eclesial, apostólico, e a proclama projetando-a a um futuro que chegará até o fim dos tempos.
“Felizes aqueles que creram!”, que creram na comunidade cristã que testemunha: “Vimos o Senhor!”, o Senhor crucificado e ressuscitado, vivo e presente, que mostra as mãos e o lado feridos, que dá a sua paz e envia os discípulos com o sopro do Espírito a oferecer perdão dos pecados a todos aqueles que os acolherem: “Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados” (Jo 20,22-23).
João Paulo II lembrou esta missão a toda a Igreja, consagrando o santuário da Divina Misericórdia de Lagiewniki, no dia 17 de agosto de 2002, com expressões que parecem querer responder à ânsia do homem da qual falamos no início.
O Papa disse: “É necessário transmitir ao mundo este fogo da misericórdia. Na misericórdia de Deus o mundo encontrará a paz e o homem, a felicidade! (...) Sejam testemunhas da misericórdia!”.
“Felizes aqueles que crêem sem ter visto!”. Estas são, originalmente, as últimas palavras de Jesus no Evangelho segundo João, antes que o próprio João ou algum de seus discípulos escrevesse o capítulo 21. E, repentinamente, o próprio João comenta esta última frase de Jesus dizendo que aquilo que escreveu - o seu Evangelho - é o seu testemunho de Cristo, Filho de Deus, a fim de que quem acolher este testemunho creia e crendo tenha a vida em Seu nome (cf. Jo 20,30-31).
O homem reencontra a alegria e a vida na presença do Ressuscitado do coração ferido. A condição da vida e da sua bem-aventurança é, assim, um movimento da liberdade, da razão, do afeto que acolhe a presença do Crucificado-Ressuscitado que se pode olhar, tocar, escutar e amar por meio do testemunho vivo da Igreja.
Madre Teresa de Calcutá dizia: “Jesus é a vida para ser vivida. Jesus é o Amor para ser amado. Jesus é a alegria para ser compartilhada” (Via Crucis, no Jubileu dos Jovens, 1984).

Toda a alegria do mundo nas mãos da Igreja
No dia da Páscoa, Jesus fez uma escolha que há 2.000 anos fez nascer na humanidade a gratidão dos miseráveis e o escândalo dos soberbos: legou a um punhado de homens frágeis e infiéis o acesso à sua presença real, imolada e ressuscitada, o acesso ao fundamento da divino-humanidade que é o seu coração ferido e vivo. E assim, é como se toda a vida do homem e a sua plenitude, a sua felicidade fosse, desde então, ligada ao testemunho dos discípulos de Cristo.
Quando Jesus disse aos discípulos: “Como o Pai me enviou, assim eu vos envio” (Jo 19,21) transmitiu à comunidade cristã a missão para a qual Ele veio ao mundo. Qual missão? “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). A vida e a plenitude da vida, isto é, a felicidade de cada homem, se torna o patrimônio e a missão da Igreja.
Georges Bermanos exprime este paradoxo ao pároco de Torcy, no Diário de um pároco do campo: “A Igreja dispõe da alegria, de toda a porção de alegria reservada a este triste mundo. Aquilo que fizeram contra ela, o fizeram contra a alegria”.
Este é o escândalo que há 2.000 anos arde na consciência do mundo inteiro porque é como se a vida e a felicidade de todos estivesse nas mãos dos mais desprezados entre os homens. Agora não há mais poderosos, não há imperadores, não há sábios deste mundo que possam viver com plenitude sem confiar-se e crer no testemunho daqueles que Cristo escolheu para manifestar-se ressuscitado dos mortos, revelar o coração aberto e confiar a obra de misericórdia do Espírito até o fim dos tempos. Por isso, há 2.000 anos a Igreja é amada e odiada, acolhida e perseguida. O mundo odeia a Igreja porque não a perdoa por ser o cofre aberto e gratuito, mas insubstituível, da plenitude de vida de cada homem.
Em um sermão, por ocasião da festa dos santos Pedro e Paulo, são Bernardo de Chiaravalle descreve este mistério: “O que nos ensinaram e nos ensinam os santos apóstolos? Não a arte da pesca ou da fabricação de tendas, nem algo similar; nem nos ensinam a ler Platão ou a destrinchar as sutilezas de Aristóteles, nem a aprender sem nunca alcançar o conhecimento da verdade. Os apóstolos me ensinaram a viver. Parece-lhe pouca coisa saber viver? Não, é uma grande coisa, antes, a maior de todas. (...) Uma vida boa consiste, a meu ver, em suportar o mal e a fazer o bem perseverando assim até a morte”. (Sermões I,3).
Por isso, a Igreja é, como dizia Paulo VI, “especialista em humanidade” porque a Igreja conhece e transmite a felicidade de cada homem. E a cultura moderna, que fez de tudo para diminuir a Igreja e vendo-se, hoje, diante da evidência da própria falha no enfrentar o humano - a família, o amor, a sexualidade, o trabalho, a educação, a doença, a morte... - a cultura moderna não perdoa a Igreja por saber dar razões sobre o homem, mesmo nos lugares onde esta cultura quase conseguiu eliminar a Igreja. O que faz o mundo enlouquecer é que, eliminando a Igreja do próprio âmbito de influência e de poder, vê partir com ela a vida e a felicidade de todo homem.

O martírio
Todavia, o anúncio cristão é uma fonte que não se governa pelos terrenos áridos que irriga. O terreno pode recusar absorvê-la, mas não pode extinguir a fonte porque o mundo não tem poder sobre a manifestação gratuita aos discípulos do coração ferido do Cristo ressuscitado.
Assim, diante de um mundo hostil à vida e à felicidade verdadeiras, diante de uma humanidade reduzida a odiar a vida por medo da morte, a tarefa essencial é a de testemunhar o “Eis-me aqui, estou presente!” de Cristo segundo a sua natureza pascal, como acontecimento que responde à negação com uma abundância de misericórdia. O método do testemunho cristão eclesiástico é ditado e ilustrado por aquele coração que, ferido, responde imediatamente com o sangue e com a água, com um amor que vai até o fim. Por isso, o paradigma e o cumprimento do testemunho cristão é o martírio. O martírio contradiz a lógica do mundo, porque o martírio responde ao medo da morte que odeia a vida com um amor à vida que não tem medo de morrer por ela, porque a vida do mártir é Cristo ressuscitado, Cristo que venceu a morte e o pecado. O martírio, hoje como sempre, é a maior revolução cultural que se possa fazer.
O mártir, por si mesmo, é uma testemunha eliminada, uma testemunha suprimida. Mas, na lógica da cruz, a eliminação acentua a potência do testemunho e a expressão da caridade. O mártir cristão é exatamente o ícone do coração de Cristo que, odiado e ferido, excede na caridade do perdão, do dom da vida, da misericórdia. O mártir se torna, assim, testemunha não só do amor de Cristo mas do excesso deste amor em uma superabundância de caridade, de gratuidade que define o limite da morte e do ódio.
Um monge cisterciense do século XXII, Guglielmo di Saint-Thierry, sustentava que a vida monástica cristã nasceu depois da paixão do Senhor, enquanto, cito, “ainda ardia nos corações dos fiéis a memória recente do seu sangue derramado” (Lettera d’oro, 13). Não há forma de testemunho cristão, não há martírio, não há virgindade pelo Reino, não há testemunho laico no mundo, não há evangelização e nova evangelização que não nasça da memória viva da paixão, da memória eucarística da Igreja.
É a memória do apóstolo João, aquele que assistiu com Maria a morte de Jesus e viu o coração traspassado. E é uma memória ardente que suspende a vida de São João, como a de todos os apóstolos, entre o acontecimento de Cristo e o mundo inteiro privado de vida e de alegria: “O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos olhos, o que temos contemplado e as nossas mãos têm apalpado no tocante ao Verbo da vida (...), nós vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão conosco (...); para que a vossa alegria seja completa” (I Jo 1,1-4).
A pergunta do Salmo 33, “Há um homem que quer a vida e que deseja dias felizes?”, para não ser uma pergunta cínica e cruel, para não ser uma pergunta sem sentido, deve ser feita por uma testemunha de Cristo. Seria cínico suscitar o desejo de vida e de alegria em um mundo de morte e tristeza, sem propor uma realidade que é vida e alegria do homem, que é vista com os nossos olhos e tocada pelas nossas mãos, porém, excede o limite da nossa existência: o Verbo da vida feito carne até a morte na cruz e ressuscitado dos mortos. Só a testemunha do Ressuscitado é adequada a propor ao homem a esperança de uma vida e de uma felicidade que sustenta o confronto com as trevas do destino de morte que está sobre o mundo.
Sem mártires, sem o martírio, não há anúncio de esperança de vida e de felicidade. A Igreja é “mártir” pela sua natureza, porque foi instituída para ser no mundo sinal e instrumento da vida do Ressuscitado, para ser testemunha dEle, da vida e da alegria que estão em Cristo ressuscitado dos mortos.
O martírio é a vida do cristão, a natureza do cristão, pouco importa se este testemunho é tacitamente expresso na cotidianidade de uma vida de família ou de um mosteiro ou ressoante em meio ao mundo. Pouco importa se explicita-se em gestos cotidianos ou em gestos extraordinários, como o sangue derramado. A natureza do martírio não está na sua modalidade, mas no testemunhar que Cristo é a resposta ao desejo de vida e de felicidade do coração humano, a resposta que vence o destino de morte e de pecado.
O mártir, a testemunha de Cristo, vai até o fundo no desejo de vida e de felicidade que Deus colocou no coração do homem. O mártir é o homem que diz “eu” com uma tal verdade e potência que o diz também para os outros, porque a vida que o mártir quer e acolhe, chegando a morrer por ela, é Jesus Cristo, vida de todos, plenitude de vida de todo homem.
O mártir, o santo, a testemunha pode querer e acolher a vida para um povo inteiro de pessoas áridas, porque a Vida que quer e acolhe é Cristo ressuscitado.
Na liturgia, depois da consagração do pão e do vinho, portanto, na presença do Senhor crucificado e ressuscitado, o padre exclama: “Mistério da fé”, e todos os fiéis respondem: “Anunciamos, Senhor, a vossa morte e proclamamos a vossa ressurreição. Vinde, Senhor Jesus!”. Este é o “martírio” ao qual é chamado todo cristão que vive a sua fé e o seu pertencer à Igreja com maturidade. E é daí que renasce a esperança da salvação do mundo, de uma transformação do mundo para além da sua condição triste e mortal.
A vida da Igreja, há 2.000 anos, se explicita em comunidade, pessoas, lugares, obras e palavras que encarnam este testemunho cheio de amor pelo homem.
A Igreja ama o homem existindo, fazendo-se presente em toda parte que o homem vive e morre; presente com o seu coração eucarístico e com as suas mãos estendidas transmitindo a plenitude da vida que dela escorre. A Igreja pode sair pelo mundo inteiro gritando como Deus: “Há um homem que quer a vida e deseja dias felizes?”, porque a vida e a felicidade de cada homem queimam o seu coração e as suas mãos. E o homem que se deixa tocar pela Igreja experimenta o milagre de renascer na vida e na alegria da caridade de Cristo.

(Este é o texto integral da conferência proferida no Meeting de Rímini de 2003 por padre Mauro Lepori, na época abade do Mosteiro Cisterciense de Hauterive, na Suíça. A vida como vocação, para um destino de felicidade. Foi originalmente publicado na Revista Passos n. 47/ fevereiro de 2004)

 
 

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