Diante da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a união de pessoas do mesmo sexo, é importante conhecer e compreender a posição da Igreja, explicitada na nota elaborada pela última Assembleia Geral da CNBB
Toco um tema de grande relevância na sociedade e na Igreja nesses dias, que é a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a união de pessoas do mesmo sexo. A nossa fé dá um juízo também sobre este fato. Retomo a nota que saiu da última Assembleia Geral da CNBB que afirma: “A diferença sexual é originária e não mero produto de uma opção cultural. O matrimônio natural entre o homem e a mulher bem como a família monogâmica constituem um princípio fundamental do Direito Natural. (...) A família é o âmbito adequado para a plena realização humana, o desenvolvimento das diversas gerações e constitui o maior bem das pessoas”. Esses são os pontos de referência para um juízo correto sobre a questão atualmente debatida. “As pessoas que sentem atração sexual exclusiva ou predominante pelo mesmo sexo são merecedoras de respeito e consideração. Repudiamos todo tipo de discriminação e de violência. (...) [Porém] equiparar as uniões entre pessoas do mesmo sexo à família descaracteriza a sua identidade e ameaça a estabilidade da mesma”. Uma coisa é o respeito, a não discriminação, outra coisa é a riqueza da vida familiar, da identidade sexual que dá origem ao matrimônio, que dá origem à família. A família segundo o plano de Deus que tem o direito de ser protegida pelo Estado. “É atribuição do Congresso Nacional propor e votar leis, cabendo ao governo garanti-las. Preocupa-nos ver os poderes constituídos ultrapassarem os limites de sua competência, como aconteceu com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal. [Isso] compromete a ética na política”, que uma decisão do Supremo Tribunal se substitua àquele que é o trabalho do Legislativo, do Congresso legitimamente eleito pelo povo.
Mas aquilo que nos interessa neste momento é o juízo dado sobre essa decisão do Supremo. A motivação usada pelos juízes nesse caso – daqueles que sustentam a união estável e a reconheceram equiparando-a a uma entidade familiar – é que nós vivemos em uma sociedade fragmentada. Existem tantos fragmentos e um desses fragmentos é a Igreja Católica. O Supremo Tribunal decide quando um fragmento quer prevalecer sobre o outro e intervém para colocar ordem. O Supremo Tribunal tem a presunção de representar o uso da razão quando os direitos de um fragmento são invadidos pelo outro ou não são respeitados. Onze pessoas representam a razão num clima de fragmentação total, de confusão do eu, e aí quem domina é o poder. Não pode ser um grupo de pessoas que decide o que é justo e o que não é justo e o que é segundo a razão. E se não é um grupo de pessoas quem é? È somente algo que está na natureza humana, que a razão reconhece, e que se chama lei natural. Existe uma lei natural que junta todos os fragmentos, todas as pessoas.
A fé católica escuta a voz da razão, e nós somos os primeiros a defender esse laço que une todos os fragmentos da sociedade que sem um fundamento comum seriam incomunicáveis. Diz São Tomás de Aquino: “A lei natural não é outra coisa que a luz da inteligência infundida por Deus em nós. Graças a ela conhecemos o que se deve cumprir e o que se deve evitar. Esta luz e esta lei Deus a concedeu na criação”, (Collationes in decem praeceptis, 1; cit. in: João Paulo II, Veritatis Splendor, 40). Que a sociedade seja fragmentada é um fato, mas que não haja um fundamento comum é toda uma outra questão. Se não tivesse comunicação entre um fragmento e outro não poderia existir encontro entre as pessoas, não poderia existir comunicação, não poderia existir diálogo. O fundamento comum, que é a lei natural, deve ser reconhecido e respeitado. Nesse caso em que onze pessoas têm todo poder de decidir o que é justo e segundo a razão, se manifesta uma prevaricação do poder. Nenhuma lei humana pode-se substituir às leis não escritas que se encontram na natureza humana, como já dizia Sófocles na Antígona. E São Paulo afirma: “A lei está escrita em seus corações” (Rm 2,15). A nossa posição é a defesa da racionalidade, é a defesa da unidade, é a defesa da natureza.
Como afirmou padre Carrón na apresentação de O senso religioso, é o encontro com Jesus que te faz descobrir todo o valor da razão, todo o valor da humanidade. A partir do encontro com Ele nós temos uma experiência humana diferente. O encontro com Ele transforma a nossa vida. E nós damos este juízo não como uma posição contra uma outra, não acanhados porque atacados ou reivindicando espaços para a Igreja. Não é isso. É por uma experiência positiva, que não tem medo dos necessários sacrifícios, iluminada pelo encontro com o Senhor, que podemos afirmar e defender a natureza humana. E somos agradecidos porque Ele abre os nossos olhos. Por isso a nossa batalha não é uma batalha de defesa, uma batalha de pessoas colocadas no escanteio. Podemos perder – Jesus morreu na Cruz –, mas o importante é afirmar a verdade da experiência humana, aquilo que torna o humano grande e vibrante, que torna o humano extraordinário, porque capaz de infinito.
Nós fazemos uma batalha positiva, que nos permite encontrar qualquer pessoa, ter contato com qualquer um, porque dialogamos com a humanidade das pessoas, não de uma forma reduzida, mas com uma atenção profunda. Como fizeram os Apóstolos e os primeiros cristãos. Naquele tempo estas coisas, no mundo da Grécia eram aceitas, mas não era a forma humana mais digna. Pensemos como eram tratadas as mulheres, sem falar dos escravos. O Cristianismo revolucionou tudo isso. E nós, através do testemunho de uma beleza extraordinária encontrada, podemos comunicar como é positivo para todos defender o bem da família, defender o bem da vida, não a partir de uma teoria, mas da experiência. Por isso, agradeçamos ao Senhor porque nos fez encontrar Aquele que é a fonte da nossa humanidade verdadeira, Aquele do qual a nossa alma tem sede, que o nosso coração deseja, e que não ficou distante e que nos encontrou e nos iluminou sobre a verdadeira consistência da nossa humanidade. E esta não é uma teoria, é uma experiência que ficou confirmada na nossa vida, mesmo depois de 20, 30, 40 anos. Hoje é mais bonito do que o primeiro dia do encontro, porque esse encontro é algo que dura, que vence a lei da morte; é um acontecimento de vida para sempre.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón