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Passos N.129, Agosto 2011

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A história

Debaixo da chuva

Começo de junho. Um céu cinza chumbo, carregado. Letícia amarra o laço da blusa de Agnes enquanto lhe diz: “Veja só! Monza é igual a Londres!” Hoje o tempo, ali naquela cidadezinha italiana, está parecido com o da capital inglesa. “Então, nada de carrinho. Vai ficar no colo. Vai ver como são simpáticas minhas ex-colegas do hospital. Todas querem muito conhecer você”. A menina sorri e, com a mãozinha, agarra o colar da mãe. “Calma, assim você vai quebrá-lo”. Letícia fica olhando a filha. Ela pensa em outras crianças, que nunca viu, nunca conheceu, e que não existem mais: morreram porque foram esquecidas pelo pai dentro do carro. Os jornais deram a notícia. Lembrou-se também da história daquele homem, vizinho de seus pais, que, mesmo sendo pai há menos de um mês, matou um menino de 11 anos. Fatos gravados em sua mente que continuavam a suscitar perguntas, que não a deixavam tranquila.

Caem as primeiras gotas de chuva. Letícia apressa o passo. “Minha mãe tinha razão. Deveria ter trazido a sombrinha”. A mãe tinha pedido ajuda para o casamento da irmã. Os sogros queriam ficar com a netinha, porque a veem pouco depois que se mudaram para a Inglaterra, também precisava visitar as colegas... Tudo num único dia. Conseguir cumprir tudo parece difícil.
Parada, esperando o semáforo ficar verde, Letícia está distraída, pensando nos seus problemas. Não percebe um senhor que se aproxima. “Com licença, posso?”. Sem esperar resposta, estende a sombrinha para protegê-la da chuva, que está cada vez mais forte. “Obrigada”. Ele responde: “Como a menina se chama?”. “Agnes”. “Minha neta se chama Matilde. Nasceu no dia 22 de maio e tem uma doença rara. Hoje vão operá-la para que ela possa ficar sentada”. O sinal fica verde. Atravessam. O homem se despede e vai embora.

É um instante. As dúvidas, os programas, a preocupação em atender a todos... Tudo desaparece. Ou melhor, tudo muda. É provocada por outras perguntas, que reaparecem: “Qual o tamanho do drama do homem? Qual a desproporção entre o nosso desejo de felicidade e a finitude das coisas?”. “O meu problema era tentar deixar todo mundo contente e, de repente, um desconhecido, em um instante, derruba tudo”. Faz você pensar em Outro. E muda o ponto. “Percebi que estava contente porque tenho cada vez mais claro que só Deus responde a esse drama. De maneira misteriosa, mas responde”.
Letícia também continuou seu caminho: foi visitar as amigas e tomar café com os sogros, rezando uma Ave Maria por aquela menina. “Para pedir um milagre”. E não para ficar tranquila.

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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