Os voluntários, as exposições, a presença do Chefe de Estado, os amigos egípcios... Sete dias repletos de surpresas. Emilia Guarnieri, presidente do evento de Rímini, nos conta o que viu. E por que está descobrindo, agora, uma frase que ouviu muitos anos atrás...
Foram muitos os fatos: a presença de Napolitano, a mensagem do Papa, os encontros sobre o Médio Oriente, as exposições, o encontro com John Elkann, os cinco minutos de aplausos para a lição do filósofo Esposito… Mas se perguntarmos à Emilia Guarnieri, presidente e alma do Meeting de Rímini, o que é que mais a impressionou na 32ª edição, a resposta é clara: “O carisma de Dom Giussani. Todos estes fatos levaram-me a reparar mais no que todos podem encontrar, se o vivemos nós”.
Quando você percebeu isso com mais clareza?
Na relação com os amigos egípcios. Wael Farouq é um milagre que caminha. Sim-plesmente não se explica alguém que afirma com uma certeza cada vez maior que por meio da amizade conosco vive mais a fundo a sua experiência de muçulmano. Ou melhor: só se explica porque encontrou a mesma coisa que nós vivemos, e isso mudou o seu coração. Mas penso também nos outros. Em Abdel-Fattah, o “irmão muçulmano”, que antes de apresentar a sua tradução em árabe de Educar é um Risco pediu “reza por mim”… A força do encontro que fizeram é evidente. E, depois, fico sempre impressionada quando os convidados, desde os “VIPs” às pessoas mais simples, dizem que o Meeting é “uma coisa excepcional”. Pergunto-me: o que veem?
Exatamente: o que veem?
A organização, claro. A beleza, a acolhida, os quatro mil voluntários movidos pelo ideal. Tudo coisas decisivas, porque são o resultado da experiência que vivemos. Mas no fundo de tudo isso há algo mais. Nunca como este ano me veio à cabeça uma frase dita por Dom Giussani há muitos anos: “Os meus amigos não podem não reconhecer no Meeting o fato de que é favorecido por Deus”. Não quer dizer apenas que o Mistério nos ajuda e faz com que corra tudo bem: isso é claro, se não fosse uma obra Sua seria impossível… Mas agora sei que há algo mais. No Meeting volta a acontecer continuamente a experiência do carisma: o acontecimento de Cristo. E volta a acontecer em todo o seu alcance ecumênico, na sua capacidade de encontro com todos. É engraçado, porque se relermos Dom Giussani estas coisas já estão todas lá. Mas só nos damos conta delas à medida que vão acontecendo. E eu nunca tinha me dado conta até que ponto o nosso abraço a quem vem ao Meeting participa do abraço de Cristo ao mundo.
Mas no final desta semana você está mais certa do que antes?
Sim, porque vi acontecerem essas coisas. Em primeiro lugar em mim. A alegria que vivo é uma experiência minha. E torna-me mais certa.
E por quê? O que permitiu a você e aos que fazem o Meeting ficarem assim, mais contentes?
Seguir. Uso ainda o método que aprendi na escola aos 15 anos: se cheguei até aqui e não perdi a fé, quer dizer que funciona… Fora de brincadeiras: agarramos as coisas que o padre Julián Carrón disse sobre o Meeting durante o ano e as usamos como hipótese de trabalho. “É uma ocasião para dar as razões da nossa experiência, para encontrar todos, para ir ao fundo da proposta, para verificar a sua incidência histórica”. Em todas as escolhas procuramos usar estes quatro fatores como critério.
Por quê?
Seguindo o padre Carrón nestes últimos anos continuei a viver a experiência de Dom Giussani com uma intensidade cada vez maior. O Meeting é uma responsabilidade nossa, não é de CL. Mas se o centro do Movimento vê isso no Meeting, nós – pelo que somos e pela responsabilidade que temos – queremos sempre mais que o nosso trabalho corresponda a isso. Que não é a solução dos problemas: não nos diz para fazermos um encontro na sala Neri ou na sala Mimosa, ou se é melhor que o moderador seja fulano ou beltrano. Mas indica um critério. E eu desejo que seja assim. Sei bem que a única coisa interessante na minha vida e no mundo é o acontecimento cristão tal como o encontrei. Estou certa disso. Assim, quero fazer isso, e não outra coisa. Mas a responsabilidade, repito, é nossa. O “dar as razões”, por exemplo, eu tive bem presente quando precisamos decidir o que dizer na apresentação do Presidente da República. Sabia que tinha que dar, a mim, a Napolitano e às outras pessoas presentes na sala, as razões porque estávamos ali, porque daquela forma, porque o tínhamos convidado…
O que, em Rímini, lhe fez perceber melhor “a incidência histórica” da nossa experiência, da qual o próprio padre Carrón tem falado muitas vezes?
A visita do Napolitano foi clamorosa. O Presidente da República veio ao Meeting. Veio visitar um fato que contém o nosso juízo, como a exposição sobre os 150 anos da unidade de Itália. Valorizou-a muito. E fez um discurso de conteúdos importantes: a cultura da verdade, a realidade, a própria subsidiariedade… Disse que somos um recurso para o país. Convidou-nos a seguir o nosso anseio de certeza. Nunca usei a palavra “reconhecimento”, parece-me deslocada. Podemos dar muitas interpretações, mais ou menos políticas. Mas o fato permanece. E tem, indubitavelmente, um alcance histórico. Depois, os encontros com os muçulmanos, com os judeus… Por exemplo, o diálogo entre Joseph Weiler, jurista judeu, e o padre Ignacio Carbajosa, teólogo católico, sobre o Deuteronômio. Confrontaram-se cara a cara. Chega-ram a um ponto onde surgiu com clareza toda a irredutibilidade das respectivas posições, e não poderia ser de outra forma. No entanto, perceberam-se mais unidos e amigos do que antes. Um encontro desse gênero resolve o problema da relação entre o judaísmo e o catolicismo? Claro que não. Contudo, é um fato. Algo que deixa uma marca. E acontece no Meeting, não em outro lugar. Creio que a incidência histórica é isso.
Durante esses anos todos, você nunca pensou que o problema fosse fazer outra coisa? Que o êxito dependesse de estratégias mais inteligentes, mais habilidade nas relações, apoios políticos?
Sinceramente, não. Até porque não seríamos capazes de nos mexer de outra forma. Sempre que houve no Meeting tentações desse gênero, senti um desconforto. Por outro lado, a nossa história foi muito acompanhada. Por Dom Giussani, fisicamente: não vinha fazer o Meeting, mas durante o ano vinha comer na nossa casa… Uma companhia grande, acima de tudo. À qual se juntou, com o tempo, a de Giancarlo Cesana. E depois, a do padre Carrón e pessoas do centro do Movimento. Tivemos sempre o companheiro para quem olhar, era só querer. Claro, devemos sempre convidar o amigo para entrar em sua casa. Mas para dizer a verdade, sempre o fizemos. Dom Giussani, no início, disse-nos uma coisa que, naquela época, não entendi, mas guardei-a: “Façam o que quiserem, mas façam unidos com o centro”. Foram poucas as vezes que nos confundimos com isso, e quando aconteceu sofremos as conse-quências. Mas agora entendo aquela frase cada vez melhor.
A propósito de coisas que se entendem aos poucos: não é que este ano tenham acontecido fatos que nunca tinham acontecido. Por exemplo, o ecumenismo foi sempre um aspecto importante: no ano passado a capa de Passos foi o encontro entre o ortodoxo Filaret com o cardeal Erdö. No entanto, a nossa consciência está diferente. Percebemos mais. Por quê?
Porque o reconhecimento de Cristo está mais próximo. Um dos voluntários contou-nos que tinha chegado ao Meeting com a ideia de trabalhar na sala de imprensa e acabou na entrada do estacionamento. Uma semana longe das exposições, dos encontros, dos pavilhões. Sabe o que ele nos disse? “Fui obrigado a perguntar-me por Quem o faço”. O ponto é que este “Quem” está mais próximo na experiência. No início da semana encontrei-me justamente com os voluntários. Dou-me conta agora de ter dito coisas diferentes do habitual. Não fiz todas as passagens: da fé à gratuidade, ao Meeting. Disse-lhes simplesmente o que é o Meeting. E vejo agora o motivo: é mais imediato em mim o reconhecimento de que é Cristo que acontece no gesto que fazemos. Eu sou simplesmente chamada a fazer bem aquilo que tenho que fazer.
E como é a relação com os que trabalham com você?
Estamos descobrindo cada vez mais que julgar juntos nos liberta muito da nossa pequenez. Num grupo que trabalha em conjunto todos os dias, há de tudo, é normal. Incluindo a dificuldade e mesquinhez. Isso não quer dizer que devamos esforçar-nos para sermos melhores, para nos adequarmos à grandeza do Meeting: é aquilo que estamos fazendo juntos que vence. Cristo já venceu. E, depois, o juízo sobre as coisas é precisamente o instrumento por meio do qual o Mistério irrompe na vida. Nós sempre julgamos tudo. Muitas vezes não pensamos a mesma coisa. Como saímos disto? Sempre que possível, julgamos juntos. Porque assim somos obrigados a dar as razões, e isso ajuda. Mas qualquer que seja o modo como chegamos a um juízo comum, esse torna-se o ponto onde irrompe algo diferente. E naquele momento eu posso seguir. Torna-se verdadeiramente a experiência de outro. Isso foi vencedor entre nós.
Outros momentos decisivos da semana?
A mensagem do Papa, que valorizou o tema dando um ponto de comparação contínuo durante o trabalho da semana. Os encontros das 17h: o professor Costantino Esposito, que com a sua lição nos ajudou a aprofundar o título; e o filósofo francês Fabrice Hadjadj, outro exemplo de alguém que encontrou o carisma de Dom Giussani e que agora lê certas coisas de forma diversa. Depois, o encontro e a exposição sobre Cafarnaum: a historicidade de Cristo, diante do problema da certeza, é um ponto fundamental. Algo diante do qual, como dizia Kierkegaard, você deve tomar posição. Também me surpreendeu encontrar John Elkann, presidente da Fiat: simples e curioso. E o fato de ter vindo porque Sérgio Marchionne, diretor executivo da Fiat, ao voltar do Meeting no ano passado, lhe disse “você tem que ir ver”, parece-me significativo. Mas a lista é longa… Incluiria também o encontro final, sobre o livro da “Equipe”. E o espetáculo sobre o Cavalo Branco de Chesterton: como posição cultural a coragem de abandonar as seguranças à procura do que o coração deseja, é um desafio notável. Mas nas exposições e nos espetáculos, parece-me ter visto esse ano uma novidade importante.
Qual?
Uma consciência mais poderosa em quem ia vê-las, em quem trabalhava nelas e nos voluntários que guiavam. Havia uma consciência maior do valor cultural do Meeting. Houve anos em que havia como que uma separação entre a experiência e os conteúdos. A “experiência” era o que você vivia no Meeting ao estar com os outros, encontrando-os, indo às exposições juntos, comendo, e por aí fora. E, depois, havia os conteúdos culturais, dirigidos sobretudo aos “outros”: aos jornais, ou não sei a quem. Esse ano esta divisão não existiu.
Como você explica isso?
Por um lado, o programa foi mais preciso na sintonia com a experiência desse ano de trabalho. Mas certamente cresceu a consciência. É o desafio lançado pelo padre Carrón tempos atrás. O título do Meeting é um desafio sobretudo para nós. Devemos vivê-lo como uma provocação.
Outro dado notado por muitos: os jovens. Sempre estiveram presentes, obviamente. Mas o peso que têm é cada vez mais forte, quer na construção, quer no acontecimento do Meeting. Estou pensando na exposição sobre a Subsidiariedade, no encontro com o Napolitano, mas não só. Que juízo você faz sobre isso?
Impressionou-me muito. Os universitários, por exemplo, esse ano tinham uma consciência enorme. Não foi algo gerado no Meeting, claro: evidentemente que “cresceram” bem durante o ano… Mas vi que eram mais conscientes culturalmente e menos necessitados de fantasias, de conteúdos feitos à sua medida. Tinham uma consciência elevada das coisas. Parece-me um outro sinal importante de um trabalho em curso durante todo o ano. Uma verificação contínua da fé.
E o título de 2012? “A natureza do homem é relação com o infinito”: é uma citação de O Senso Religioso, da primeira premissa. Por que será um passo adiante neste percurso?
Creio que o ponto seja a palavra “natureza”. Quer dizer que a estrutura do homem é relação com o infinito. É algo a mais, mesmo em relação ao fato que deseja o infinito, como tínhamos já dito em 2010. Não só procura o infinito nas coisas que faz, mas o seu ser é relação com o infinito. É um passo a descobrir. Mas há todo um ano para começarmos a fazer isso.
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