“Caros amigos”. Bas-tariam essas duas palavras para voltarmos para casa diferentes. Dois milhões de jovens que desembarcaram em Madri, vindos de 170 países, foram chamados assim por Bento XVI. Stefano, que partiu de Milão depois de terminar os primeiros capítulos de uma tese em Física, estava entre eles. Com 1.200 colegiais e universitários do Movimento, viajou 50 horas de ônibus por uma semana, dormindo cinco noites no chão, para participar dessa XXVI Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Mas valeu a pena: “Ficou ainda mais claro para mim que Cristo está presente”, diz ele. “Eu O vi diante de um homem que nos disse que a nossa necessidade é algo bom. Pelo seu olhar, posso não ter medo do que sou”.
“Rezo por vocês”. Um pai que, tão logo entrou na Plaza de Cibeles, disse aos milhares de jovens que o acolheram: “Eu vos tenho sempre presentes e rezo por vós”. Exortando-os a seguir Cristo, “o verdadeiro Amigo que não nos engana e com o qual queremos compartilhar o caminho da vida”. Uma missão que, por meio dos jovens a quem o Papa se dirigia, chega a todos: “Edificando-a sobre a rocha firme, a vossa vida será não só segura e estável, mas contribuirá também para projetar a luz de Cristo sobre os vossos coetâneos e sobre toda a humanidade, mostrando uma alternativa válida a tantos que se perderam na vida, pois os alicerces da própria existência eram inconsistentes”. Depois a saudação aos reis da Espanha, a via-sacra, a confissão de alguns jovens, a missa com os seminaristas, a visita às jovens religiosas... E não podia faltar o encontro com o mundo da universidade, no qual lembrou: “Os jovens precisam de autênticos mestres, pessoas abertas à verdade total nos diferentes ramos do saber... A juventude é tempo privilegiado para a busca e o encontro da verdade. Como já disse Platão: Busque a verdade enquanto é jovem, porque se não o fizer, depois ela escapará das suas mãos”. Mas, sobretudo, convidou a todos para “conhecerem melhor o Cristo e terem a certeza de que, enraizados n’Ele, o vosso entusiasmo e a vossa alegria, os vossos desejos de ir além, de alcançar o que é mais elevado, até Deus, têm sempre um futuro certo”.
Que desafio ouvir alguém falar de “futuro certo” para jovens que agora experimentam a vertigem de todas as importantes escolhas que precisam fazer: a universidade, o trabalho, a vocação... “Talvez você receba milhares de sinais, mas não sabe para onde ir”, conta Chiara, que nos próximos meses vai ao Brasil para estudar o caso Battisti. “Por isso parti com um desejo: ajuda-me a Te seguir para onde quer que eu vá”. É a demanda de todo homem: “Qual é a minha missão na vida?”, pergunta Lorenzo, que estudará Direito na Católica de Milão. “Sinto cada vez mais a necessidade de dar uma resposta a essa pergunta”.
Indo à raiz, é a pergunta que padre Javier Prades lançou ao encontrar os peregrinos italianos em Madri: “Quem sou eu? O que desejo?”. Porque é inútil fingir que não está ligando: precisamos nos orientar numa “Babel cheia de oportunidades”, como escreveu Julián Carrón por ocasião da JMJ. “Mas Deus nos fez tão bem que não tem medo de arriscar tudo”, conta Luca, que de Módena irá para Milão a fim de estudar Economia: “Por isso eu me sinto seguro, embora precise mudar de cidade e começar uma coisa nova”.
Não faltaram dificuldades, mas, desde as primeiras palavras do Papa, ficou claro qual era o foco: “Levai seriamente em consideração a meta da santidade”. Isso, e a ajuda oferecida pelo padre Luis Miguel Hernández – o missionário da Fraternidade São Carlos que guiou os peregrinos do Movimento –, permitiram a Ilaria “fazer a experiência da plenitude”. Inclusive no desconforto de dormir nos corredores de uma escola, passando calor: “Cristo muda de fato a vida. Bastava ver como se movimentavam os amigos da organização: toda vez que a gente se deslocava, eles se distribuíam ao longo das ruas para nos indicar a direção a seguir, ficando horas sob o sol”. Os jovens espanhóis serviam-lhes as refeições: “Nunca os vi aparentar cansaço. Sempre atentos para que não faltasse água nos copos, ficavam até tarde limpando o local. Eu pensava: quem pode levá-los a agir assim, se não Alguém muito grande?”, conta Alberto. O mesmo zelo que Sergei, russo que viera de São Petersburgo, descobriu nas ruas da cidade: “Quando passávamos, o povo espirrava sobre nós água das varandas das casas, para nos refrescar”.
Debaixo de chuva. Pequenos gestos, talvez, mas, para alguns, isso salvou a peregrinação. Como para Franco, que com doze amigos chegou da Argentina, onde encontrou o Movimento há menos de seis meses: “No primeiro dia em Madri, roubaram minha mala. Então, todos os jovens do ônibus me emprestaram alguma coisa: uma camiseta, um par de meias... Assim fomos nos conhecendo. De onde pode vir esse jeito de nos tratar, se não de Cristo?”.
Mas o verdadeiro centro da JMJ foi a vigília do penúltimo dia, na esplanada do aeroporto Cuatro Ventos. Aí cinco jovens pediram ao Papa uma ajuda para entender “como Cristo responde à expectativa dos homens” (Paul, inglês), “o que significa testemunhá-lo” (Krizia, filipina), “como viver o casamento na santidade” (Robert, espanhol), “o que é preciso para se batizar” (Kathrin, alemã), “de que modo quem sofre pode sentir que Deus está próximo” (Roseline, queniana). Depois, enquanto as nuvens carregadas se aproximavam, foi lido o Evangelho de São João: “Eu sou a videira... Permanecei em mim... Permanecei no meu amor...”. Em seguida, Bento XVI pronunciaria a homilia mais importante da sua viagem. Sobre a vocação, sobre o matrimônio e sobre a vida consagrada. Mas não o fez. O vento e a chuva torrencial o impediram. Sem o solidéu, que voou para longe, ficou dez minutos em silêncio. Com dois milhões de jovens diante dele. Até que disse: “Caros amigos, obrigado pela vossa alegria e pela vossa resistência! A vossa força é maior do que a chuva”. E se ajoelhou para adorar o Santíssimo. “Foi um espetáculo. Um povo que nada seria capaz de dispersar, por causa da presença do Papa. E eu, que não estava bem, estava ali debaixo de uma verdadeira tempestade; estava tão cheio de necessidades e entendi que precisava me entregar a Ele”, conta Stefano. Quinze minutos depois, Bento XVI retomou o microfone: “Como nesta noite, com Cristo podereis enfrentar todas as provações na vida. Não vos esqueçais disso”. Por isso Giusi, que em Bári formou-se em Biologia, imprimiu os discursos do Papa: “Agora eu os carrego na bolsa. Logo que chego a casa, eu os penduro na parede. Como nos disse padre Luis Miguel: desse modo vocês não poderão duvidar do amor de Cristo”.
A minha casa. E a verdade dessas palavras já se pôde ver nos dias seguintes. Por exemplo, para quem conseguiu dar um pulo até o Meeting de Rímini: “Visitei a exposição sobre os apóstolos”, conta Antonio. “O guia explicou que os discípulos eram diferentes um do outro, mas unidos quando se tratava de seguir o Cristo: foi o que vivi em Madri”. Ou para quem pôde aprofundar a própria caminhada, como Maria, de Milão: “Minha família sempre foi do Movimento; eu até agora estava indo por inércia. O maior fruto desses dias é que decidi fazer parte dessa companhia. Aqui é a minha casa”. Mesmo quem viajou sem carregar muitas perguntas, como Francesco, de Roma, que agora pode dizer: “Retorno com muitos porquês. Se antes eu não conseguia me entusiasmar com nada, diante do Papa em adoração, eu não conseguiria me levantar. Vi que ficar de joelhos é o único modo verdadeiro de estar frente a um amigo. Como eu poderia desejar algo diferente?”.
A próxima JMJ está marcada para 2013, no Rio de Janeiro.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón