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Passos N.141, Setembro 2012

RUBRICAS

Cartas

UM OLHAR QUE SALVA
Tenho feito Escola de Comunidade no meu trabalho e isso tem mudado a minha vida. O que mais me encanta no Movimento é esse “olhar” para o desejo do coração, olhá-lo verdadeiramente e ir a fundo nos dramas que a realidade nos expõe. O que me fascina é essa coisa de respeitar a nossa humanidade, de respeitar o “eu” de cada pessoa, de olhar o indivíduo... De saber que sou falha, mas que sou fruto de um amor enorme, olhar a minha realidade como sendo de outro, encará-la como experiência e aprendizado muda absolutamente tudo. Conheci algumas pessoas que me fizeram olhar o mundo com outros olhos, olhar as minhas limitações com outros olhos. Aquele olhar terno e apaixonado por mim mesma, o olhar que Cristo teve até mesmo com os que o traíram. Não é arrumar uma justificativa para os meus limites e sim ir a fundo neles. Para mim o início desse trabalho foi muito difícil, pois sou de criação evangélica e por isso, acreditar, seguir e confiar nas palavras ditas por um padre, passadas por duas católicas praticantes foi o grande impasse. Imaginem só como as coisas ficaram confusas na minha cabeça. Aquele sentimento de não estar fazendo o certo estava presente a cada Escola de Comunidade em que eu participava. Foi quando aprendi a me perguntar frente a tudo se aquilo me correspondia, se aquilo preenchia meu coração e se aquilo ia de encontro com o que eu buscava para minha vida. Então foi paixão “à primeira vista”. Eu me encantei, eu me encontrei. Foi uma felicidade enorme, foi realmente um encontro, porque não tinha problema eu ser inquieta, não tinha problema eu ser questionadora, não tinha problema nenhum eu ter um coração tão afoito por respostas. Foi este o coração que Deus me deu, foram esses desejos que Ele plantou nele. Percebi então que eu poderia ir a fundo, que eu poderia ficar correspondida e mais feliz a cada experiência e a cada resposta encontrada... É esse sentimento que me faz vir aqui todas as sextas-feiras, o desejo de saber a próxima parte, de contar como foi a semana e de aprender um pouco mais ou de lembrar o caminho que eu devo seguir. Parece óbvio, mas olhar para o desejo do coração, entender que nascemos para sermos felizes aqui mesmo na terra, entender que somos desejo de infinito e perceber o quanto somos desejosos disso não é fácil, é uma sensação de que nada é e nem ninguém será o bastante. A Escola de Comunidade, o Movimento, é sim para todos os aspectos da minha vida, é para as coisas mais bobas assim como para os dramas, nada mais passa despercebido. Perceber que a realidade está cheia de sinais, perceber o quanto sou cuidada é muito fascinante. Assim como todo aprendizado não é fácil, é uma lição diária, nem sempre a realidade é como gostaríamos, mas aprender a ver a beleza até mesmo na dor é muito bonito. É incrível ver a experiência de outras pessoas e não tem como não querer viver como eles, não tem como não desejar a mesma felicidade, a mesma leveza e as mesmas certezas. Uma frase que eu ouvi e que me marcou muito é esta: “Até mesmo a dor com Cristo é melhor do que a alegria sem Ele”. Reconheço que Cristo é vivo na minha vida hoje, reconheço que minha fé cresce a cada dia, reconheço o quanto sou amada e o quanto a companhia de vocês acrescenta na minha vida. Agradeço demais a oportunidade de participar da Escola de Comunidade, agradeço a amizade e a possibilidade de conhecer esse caminho e poder trilhá-lo com vocês.
Nicole, São Paulo (SP)

“VOCÊ QUE SER FELIZ AGORA OU AMANHÃ?”
Caro Julián, trabalho como educadora das Irmãs da Assunção com uma menina, filha de tóxico dependentes. Hoje fui pegar a minha menina e depois de uma bela tarde juntas, sua mãe chegou em casa e desabafou, como sempre, falado sobre tudo o que não está bem, o trabalho, a crise... A um certo ponto, olhou para mim e disse: “Eu sei que quando a crise terminar, todos os políticos corruptos forem mandados embora, e quando minha filha estiver no ensino médio, eu poderei ser realmente feliz”. Não aguentei mais, e respondi: “Mas o que você deseja? Ser feliz agora ou daqui um ano, seis meses, um dia?”. No início, ela me olhou torto, porque eu nunca tinha respondido a ela de maneira tão incisiva. Começou a me fazer mil perguntas: como você faz para estar contente agora? Eu respondi: “Você acha que se essas pessoas não existissem mais, você seria realmente feliz? Quando você acorda de manhã, o que espera? Qual foi a última vez em que se sentiu feliz?”. Ela disse: “Quantas perguntas! De manhã faço as coisas automaticamente, levanto cedo e meu marido continua dormindo porque sabe-se lá o que fez na noite anterior... E a última vez que fui realmente feliz, não a felicidade dos sonhos, que depois desaparece, mas a felicidade do coração, foi quando vi minha filha e meu marido no churrasco de Páscoa. Estavam comigo e estavam contentes... parecia que todos os problemas tinham desaparecido”. Eu respondi: “Então todas as vezes que sua filha irrita você ou seu marido apronta alguma coisa, você poderia maldizer o fato de eles existirem?”. E ela: “Claro que não!”. “É assim para todo mundo. Seu coração é exatamente como o meu. É feito não para que as coisas andem bem ou para que tudo se resolva. Tanto é que, não acontece, muitas vezes, você estar triste apesar de aparentemente tudo estar bem? O seu coração é feito para o infinito. Você pode ser feliz agora. Muitas vezes, temos problemas, mas você mesma me disse: é preciso reconhecer aquilo que existe. Sua filha, seu trabalho, sua casa, seu amor pelas coisas bonitas, são todos sinais de que você deseja ser feliz agora. Por isso, não importa quais sejam as condições em que você se encontra, basta olhar aquilo que existe”. Ela tinha dúvidas, mas estava contente, e me perguntou se poderíamos nos ver outra vez. Eu a abracei e a agradeci porque, falando com ela, percebi que graça é a minha experiência.
Benedetta

REVISTA, FERRAMENTA DE VIDA EM ABUNDÂNCIA
Encontrei o Movimento a mais de 20 anos atrás e sempre achei que seguia, contribuía, agregava para outros e, na verdade, hoje me dou conta do tamanho da responsabilidade que era e é para mim, carregar esse ouro dentro de vaso de barro que sou eu, frágil e por mim mesmo, sem vida, mas de uma forma diferente e inteligente por parte do Mistério, vivo uma outra realidade. Porém num certo momento, momento de Deus, Regilene, minha esposa, me aparece em casa com uma história que gostaria de se empenhar mais com a revista e, claro, eu fiquei meio entusiasmado e ao mesmo tempo, zangado pois eu estava nesse momento, junto com alguns amigos daqui de Salvador, conduzindo um grupo importante, muito importante para mim e para todos nós – padre Ignazio, Núbia, Roberta, Rodrigo, Sônia e outros colaboradores, inclusive a minha esposa – era o grupo dos pré adolescentes. O fato é que nessa época a Telma, pessoa que estava responsável pela revista, estava assoberbada. Além do seu trabalho que lhe cobrava muito, também tinha a maternidade e outras coisas e por isso ela solicitou a Regilene que a ajudasse nessa questão da revista. Ela não se opôs, mas só me comunicou depois de ter aceitado o pedido da Telma. Fiquei zangado porque não confrontou nada comigo. Ela me disse: “confrontei sim, conversei muito com Gilberto”. Ora, depois dessa, calei-me. É como o jacaré que voa. Fiz essa premissa para dizer que mesmo sendo chamado e conhecendo essa imensa ferramenta, ainda assim somos capazes de negar o Mistério. Porém para a minha surpresa, acabei aderindo ao processo de ajudar a minha esposa, mais uma vez errado, ajudei na verdade a obra de Deus. Foi a partir daí que comecei a ter um olhar mais verdadeiro e mais correto para a revista, passei a ler as matérias com mais atenção e isso me ajudou e tem me ajudado, a cada momento. Provocado por essa atenção que passei a ter com os textos e também o silêncio da comunidade em relação a essa riqueza de Deus, fui tomado por um ímpeto de comunicar a beleza desses textos e ao mesmo tempo convidar os amigos para nos reunirmos, informalmente, em nossas casas para discutirmos e nos aprofundarmos sobre eles e nossas vidas. Houve alguns momentos que chamo de mágicos porque alguns textos eu não conseguia entender direito, e por isso, logo telefonava para Gilberto e confrontava com ele. Nesses momentos percebermos que tudo isso é dado a nós para utilizarmos da melhor forma possível. E é nesses momentos que realmente nos demos conta que a nossa amizade crescia e percebi que eu, até ali, não utilizava a revista da melhor forma possível. Sempre dei revistas de presente e também fiz assinaturas, sobretudo para pessoas que de alguma forma se sentiam no mínimo curiosas. Chequei até mesmo a dar aquelas revistas que costumamos riscar, grifar, destacar frases, orações ou passagens de testemunhos dos nossos amigos, da Bíblia, pois os milagres não estão distantes de nós. O fato é que hoje percebo que em primeira instância, esses textos precisam ser bons e significativos para mim e entendendo-os, consigo, através da minha vida, das minhas ações, demonstrar que Cristo tem um rosto tangível, eu o alcanço, mesmo distante dos meus amigos, que me fazem lembrar do rosto bom do Mistério. A revista tem todas as ferramentas necessárias para me ajudar no meu dia, nos meus segundos, na minha hora – como nos disse D. Giuss: “começar sempre a cada instante, recomeçar a cada instante”. Num outro texto chamado “Café em Companhia” Dom Giussani nos diz: “a companhia não nos salva, mas nos ajuda...” Diante dessas evidências não pude deixar de ler a revista com desejo de saber cada vez mais o que nos é indicado. Os testemunhos, os textos de Bento XVI, a Página Um, tudo na revista me deixa cada vez mais impressionado, principalmente quando vejo alguém dizer: “Nossa, Jeferson, você leu tal matéria, como ela está falando da minha experiência, da minha vida, era isso que eu precisava”, e etc. Fico impressionado, pois isso não é só para um, é para todos, precisamos comunicar essa boa nova, porque somos escolhidos por Ele, Ele nos confia essa obra, então quero ser Seu servo para poder dar continuidade a esse anúncio que é de 2000 anos, mas é tão novo, tão recente, tão contemporâneo, não tem nada diferente, eu é que muitas vezes não quero aderir por algum capricho ou desejo mais bestial. Então para mim, estar diante da revista é viver em comunhão com a presença de Cristo, com a Igreja Mãe, através dessa ferramenta que carrega consigo vida, e vida em abundância, vida que me faz viver com mais atenção à realidade, com mais ímpeto pela vida e com mais desejo de comunicar que Aquele que me fez e continua me mantendo. Não sou eu, e sim um Eu investido do Espírito Santo, é o próprio Cristo que me faz. Posso nesse momento parafrasear São Paulo, guardando as devidas proporções, quando ele diz: “Não sou eu que vivo, mas Cristo que vive em mim”. Com todas as minhas limitações, todos os meus erros, todos os meus defeitos, vi que através dessa ferramenta, do seguir com atenção, também sou resgatado e o melhor de tudo, é que além de ser resgatado me dou conta que há em mim uma ferida que só pode ser fechada pelas mãos de Cristo. Toda essa lembrança, não é viver de nostalgia, mais é viver de algo que me preenche de alegria, que faz sentir uma vida a mais dentro de mim, vida com mais vida, de forma que não há lugar para titubear. E se porventura as minhas pernas afundam um pouco no mar da dúvida, recorro a essa ferramenta de infinita ajuda e que posso levar para qualquer lugar junto comigo. Sinto-me muito seguro por ter reconhecido essa ferramenta como uma obra sagrada de Cristo e que faz de mim um servo, errante, mais disponível para dar continuidade a obra iniciada por Ele. Quando rezo o Ângelus penso no sim de Maria e o tomo para mim, pois para mim, esse sim é algo que, de fato, é um sim que cada um tem que dar de forma pessoal e intransferível. Sou grato, sempre, a Deus por tudo que tem me dado e depois a Telma que solicitou essa ajuda à minha esposa. Fico grato também à minha esposa que tanto me ajuda a reconhecer o Mistério dentro das circunstâncias difíceis e a toda a equipe da Passos e Tracce. Obrigado a Dom Giuss e a Carrón.
Jéferson, Salvador (BA)

A HIPÓTESE DO “BELO DIA” MUDA O MUNDO
Caro padre Julián, voltei dos Exercícios com a sensação de que é a hora da decisão. Participo do Movimento desde a faculdade com o grupo dos universitários e sempre o segui como o útero materno, como uma possibilidade de significado para as coisas dramáticas que me acontecem e para as coisas belíssimas que o Senhor me deu: uma mulher, uma bela família, um trabalho que me satisfaz. Pertencer ao Movimento também me fez entrever uma possibilidade de beleza na política, com a qual me envolvi. Mas sinto presente a dúvida corrosiva em relação à consistência da vida que se traduz em um desbotamento de tudo aquilo que vivi e vivo. Está se insinuando a dúvida se vale a pena me empenhar, se o que faço serve para alguma coisa, como se o significado estivesse em um futuro que chegará cedo ou tarde e que, portanto, inevitavelmente ligo a uma infeliz conquista. O que você disse nos Exercícios tem um alcance de outra ordem de grandeza em relação à minha adesão ao Movimento. O Movimento é uma autoconsciência nova. Minha mulher me disse: quero pertencer ao Movimento. Quero verificar se aquilo de que Carrón fala é uma revolução, como eu intuo. Então, o que fazer? A hipótese do “belo dia” de Dom Giussani, do qual você nos falou - que o desejo potente do meu coração pode sobreviver íntegro e não reduzido - é de uma potência que muda o mundo. Muda o modo de viver. De fato, voltei dos Exercícios e percebo muitas coisas (no trabalho, em casa) que antes eu não via. “Espero que vocês realizem os sonhos de sua juventude!”, escreveu Dom Giussani. Essa é a possibilidade que vi em Rímini e que vejo possível nos meus dias. E há também o modo: seguir alguém que já O segue, sem medida, e com o coração desejoso de conhecê-Lo: minha mulher, os meus amigos, a Escola de Comunidade, você.
Giovanni, Milão (Itália)


O CORAÇÃO DESEJA O INFINITO
Neste ano pude participar das férias do Movimento com alguns amigos do Brasil e fiquei marcado por vários aspectos. Certamente maravilhoso ambiente natural, as iniciativas e a companhia, mas sobretudo me marcou o fato de que a modalidade com a qual se estava juntos é a mesma que eu vivi com o Movimento nestes anos na Itália. E a proposta de trabalho era a mesma: o caminho que Carrón nos propõe. Pode parecer óbvio, pois fazemos parte do mesmo Movimento, mas para mim não é e isso testemunha um único fato: não é que somos todos bons membros de CL, pois respeitamos as palavras de Carrón, mas aquilo que nos une e nos permite viver uma experiência de unidade e seguimento seja a mesma, porque a fonte é a mesma, ou seja, Cristo. O coração do homem anseia pelo infinito, como nos mostrava Bracco falando do Ícaro de Matisse, e isso significa que o coração do homem de qualquer parte do mundo deseja a mesma coisa, tem sede da mesma água, que vem da única fonte: Cristo e a companhia terrena da Igreja. Por isso me marcaram os jogos, as iniciativas, os encontros, a festa final, porque o ímpeto, o olhar, estava voltado para o mesmo fato, a contemporaneidade de Cristo, que não tem limites sobre a Terra! Obrigado por esta experiência.
Giacomo Del Corso, Bolonha (Itália)