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Passos N.148, Maio 2013

TESTEMUNHO - Vitória da Conquista (BA)

Uma vida mais vida

por Isabella Santana Alberto

Com toda a energia da sua juventude, irradiava alegria por amar demais toda a realidade. Ficou fascinada no encontro com o Movimento e, na provação da doença, Jamily continuou cheia de alegria. O testemunho de uma fé que incide na vida

Vitória da Conquista é uma cidade baiana a 503 km da capital do Estado. A comunidade de CL nasceu no final da década de 1980, quando Manuel, professor de história, mudou-se do Rio de Janeiro para lecionar durante certo período na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), e pouco tempo depois a então estudante de teatro, Monica Gedione, que havia feito o encontro com a comunidade de Salvador, regressou à terra natal. Em todos estes anos o Movimento manteve-se presente, mas a comunidade nunca foi numerosa. Atualmente são cerca de dez pessoas que frequentam regularmente a Escola de Comunidade. Mas os números nada representam diante da grandeza humana que uma pessoa pode alcançar quando leva a sério a proposta do carisma de Dom Giussani: uma fé incidente na vida. Estes amigos presenciaram e participaram nos últimos meses do testemunho de uma vida assim. E a maior surpresa é que a jovem tem apenas 24 anos.
Na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, a professora Ivana dedica-se a preparar os alunos para a Crisma. Há quatro anos, neste grupo apareceu Jamily Drieli. Uma moça muito viva, de sorriso fácil e alegria contagiante. Após receber o sacramento, pela bonita amizade que tinham experimentado naqueles meses, Gilberto, que acompanhava a comunidade local de CL na época, sugeriu a Ivana que prosseguisse um caminho com eles e fizesse o convite a participarem do Movimento. Jamily aceitou. Ela manteve-se envolvida em outras atividades na paróquia e muitas vezes acompanhava o namorado Elidelson (conhecido como Del) nos encontros da Renovação Carismática, mas era assídua na Escola de Comunidade, pois logo se fascinou pelo carisma de Dom Giussani.
O tempo passou, Jamily se formou na faculdade e começou a trabalhar como fisioterapeuta. Em 2012, ela e Del decidem-se casar. Tornam-se noivos e em janeiro deste ano, fazendo alguns exames de saúde ela descobre estar com leucemia mielóide aguda. Diante de um diagnóstico tão grave, decidem antecipar o casamento e três dias após a cerimônia ela se transfere para Salvador para se tratar. A mãe e o marido a acompanham e ela vive ali um período de luta, mas totalmente entregue ao bom desígnio.
Os amigos da comunidade de Conquista solicitam a Valter, de Salvador, que procure ficar perto desta família. Ele se lembra que Márcia trabalha justamente no hospital no qual Jamily está internada. Márcia é farmacêutica e ao receber o pedido pensou: “Já tenho tantas coisas para fazer durante o plantão e vou ter que achar tempo para mais essa tarefa, pois um amigo me pede: seja um rosto para ela”. A primeira surpresa de Márcia foi que ao perguntar para a enfermeira responsável quem era Jamily, a resposta foi que ela era uma pessoa ótima e que os técnicos de enfermagem disputavam para ver quem iria cuidar dela. “Já tinha aí algo diferente!”
Durante seu período de internação Jamily não foi uma paciente que se deixou abater. Apesar das dores e da incerteza com relação ao futuro, ela fez amizade com os funcionários que iam atendê-la, sorria sempre, e era grata por cada um que ia encontrá-la. No primeiro dia que Márcia foi vê-la, apresentou-se como membro de CL e nesta ocasião sua primeira preocupação foi contar que naquele setor havia uma estudante de enfermagem católica, chamada Leilane, e que procurava um grupo na Igreja para se inserir. Jamily já havia pego o telefone dela e pediu que Márcia a convidasse para a Escola de Comunidade. Na semana seguinte Leilane participou de sua primeira reunião.
A situação de Jamily era muito grave e ela tinha apenas 5% de chance de sobreviver a um transplante de medula (pois os tratamentos de quimioterapia falharam). “Nesta situação, como ela podia se preocupar com uma estudante de enfermagem que acabara de conhecer? E me lembrei da primeira página do texto dos Exercícios Espirituais do CLU, pois Jamily estava vivendo a espera durante as 24 horas do dia. E não foi uma espera que a tirou da realidade, ao contrário, a fez atenta aos que a cercavam”, conta Márcia.
Durante as três semanas seguintes, Márcia foi visitá-la todos os dias. “Levei o texto dos Exercícios do CLU e ela leu a introdução e pulou logo para a Assembleia, pois queria ler as perguntas e saber as respostas de Carrón. Vi no relacionamento dela com a realidade o que eu conhecia na teoria e achava que praticava. Ela nunca se queixou, nunca fez cara de dor (mesmo quando começou a usar morfina), sempre estava sorrindo e com os olhos bem abertos, sempre positiva. Animava os outros pacientes. Vimos juntas a eleição do Papa Francisco pela TV”.
O irmão de Jamily doou a medula e, mesmo sendo 100% compatível, era uma cirurgia de alto risco. Antes da intervenção padre Ignazio lhe visitou para dar a Unção dos Enfermos. Para ele fez a afirmação: "Sou filha de Dom Giussani". Depois do transplante, Jamily piorou muito. Começou seu Calvário, pois tomou muitos antibióticos e desenvolveu uma inflamação que a impediu de falar e de engolir a própria saliva de tanta dor que sentia. Mesmo assim Jamily permanecia sorrindo, firme, fazendo sinal de positivo com as mãos todas as vezes que alguém ia conversar com ela. Márcia lhe contava sobre a Escola de Comunidade e levava os recados que as pessoas mandavam, pois mesmo sem a conhecer pessoalmente, as pessoas da comunidade de Salvador começaram a rezar por sua saúde. “Todos os dias eu subia até a enfermaria, pois vê-la se tornou uma necessidade para mim. Ela era quem estava me ajudando a viver o carisma do Movimento e esta é a graça que há um ano eu peço, desde o dia que recebi o santinho de Dom Giussani. Estava pedindo a ele a graça de ter pelo menos um amigo que me ajudasse a viver a companhia de fato, a aprender o que significa viver Cristo na realidade, o que é realmente essa companhia guiada ao Destino. Ver Jamily abraçar com essa disposição e liberdade toda a realidade me ajudou como nunca. Depois de 12 anos no Movimento agradeço a Deus pelo sim de Dom Giussani, pelo sim de cada amigo que permaneceu perto de mim. Porque eu persisti em fazer o meu caminho e o meu trabalho, pude entender o que significa dizer que a realidade, em primeiro lugar, é para mim. A realidade de Jamily chegou até mim. Abracei o que me cabia e levei a sério ser o rosto de Cristo para ela no hospital. Com isso enxerguei o próprio Cristo nessa amizade com ela”.
Jamily faleceu no dia 11 de abril. No dia do seu falecimento, sua mãe agradeceu a Márcia pelo que fez por sua filha e lhe revelou que, todas as vezes que ela deixava o quarto, Jamily se sentia mais fortalecida, pois reconhecia nela uma verdadeira companhia. “No momento da liberação do corpo acompanhei o marido dela, Del, que me agradeceu por minha presença e uma amiga deles, Bia, me disse que Jamily sempre a convidava para conhecer o Movimento e ela sempre recusava mas, agora, depois que ela viu tantos amigos que não conheciam Jamily se movimentando para ajudá-la, ela quer ir a Escola de Comunidade. E o que foi que eu fiz? Nada extraordinário, nenhum milagre. Apenas reservei alguns momentos do meu plantão e fui apresentar o meu rosto. Ganhei uma amiga que se tornou o rosto de Cristo para mim!”, afirma Márcia.
Durante a missa de corpo presente, seu marido afirmou diante da Igreja lotada: “Vejo aqui a ressurreição de Cristo”. Com Deus nada se perde e a vida de Jamily já deu seus frutos e certamente muitos outros virão. Como conclui Márcia: “Meu olhar mudou e com ele as minhas atitudes. Eu desejo repetir essa experiência todos os dias quando acordo. Eu quero a realidade com Cristo”.


“Aprendi que o amor chega na hora certa. Que a maturidade vem aos poucos. Que a família é tudo. Que amigos bons e sinceros são poucos. Que dias melhores sempre virão. E principalmente que minha felicidade depende das escolhas que eu faço”
Jamily