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Passos N.165, Dezembro 2014

DESTAQUE/ Os 60 anos de CL

A bela estrada

por Paola Bergamini

Há um fio condutor que percorre todas as latitudes: “Pessoas normais, com vidas normais, que mostram as quatro coisas essenciais para viver”. Os autores do vídeo pelo aniversário do Movimento Comunhão e Libertação falam da aventura de um ano de trabalho. E dos “bastidores” das filmagens

A proposta tinha vindo há cerca de um ano de Roberto Fontolan, diretor do Centro Internacional de CL: um documentário sobre os sessenta anos de vida do Movimento. Monica Maggioni, jornalista, com Dario Curatolo, arquiteto, fotógrafo e diretor de arte, tinham realizado documentários importantes, dentre os quais Out of Teheran, sobre os exilados iranianos, e Ward54, história dramática de soldados americanos repatriados da guerra no Iraque. No entanto, não foi só por isso que Fontolan se dirigiu a eles. E esta não era apenas uma simples proposta de trabalho. Monica conta: “Há uma longa amizade que me liga ao Roberto. Nessa época, além disso, conheci diretamente o padre Carrón e outras pessoas do Movimento. Ele nos pediu para fazermos parte de uma aventura: contar, através do nosso olhar – nós que não somos ‘membros’ do Movimento – uma história, uma vida”. O desafio não era pequeno. “Eu me sentia como um alienígena”, explica Dario: “Para mim CL identificava-se com aquilo que os jornais escreviam. E nem sempre eram coisas boas”.
Começa um trabalho de preparação e estudo, com a leitura dos escritos de Dom Giussani, de Carrón e os relatos de Roberto sobre o que se passa nas comunidades de CL na Itália e no exterior. Para Monica aquelas leituras significaram “recuperar o frescor, a verdade de Giussani que eu tinha sempre vivido por intermédio de mil interpretações e juízos”. Para Dario, “aos poucos a curiosidade aumentava. Logo me impressionou o discurso sobre a beleza. Estava se tornando um desafio cada vez mais atraente”.

Da África ao Brasil. Desde o início o volume de trabalho foi realmente grande: assistir aos mais de 600 vídeos provenientes do mundo inteiro. Foi Roberto que teve a ideia do relato na primeira pessoa. Todos os vídeos são vistos do princípio ao fim, mesmo os que chegaram depois do prazo. Transparece sempre a vontade de falarem de si mesmos. De descrever uma vida normal cheia de significado, voltada para o bem. Um dado impressiona os dois autores: a intensidade das pessoas. Monica explica: “Estou habituada a um mundo em correria, em que se fazem grandes raciocínios e ninguém se detém no que realmente importa na existência pessoal. Mas em todos os vídeos que chegaram, há um fio condutor que percorre todas as latitudes: pessoas normais, com vidas normais, que pararam para pensar e puseram em ordem as quatro coisas que são essenciais à vida. E fizeram tudo isso sem ‘estardalhaço’. Simplesmente mostraram isso”.
Um exemplo no documentário é aquele senhor que, ao levar o pacote de alimentos a uma família necessitada, diz: “Não sou nenhum herói. Estou fazendo uma coisa simples. Ocupo uma parte do meu tempo para ajudar outras pessoas. É uma coisa normal”.
A vida cristã é uma vida normal. “E não só”, diz Dario: “Há outro aspecto: os protagonistas são pessoas serenas. Não há a ânsia do drama, mas aflora sempre uma dimensão bela, diria alegre, da existência”.
Vídeo atrás de vídeo, Monica e Dario entram nesta história. Assistem ao vivo nas viagens que fizeram para a Uganda, entre as crianças da escola Luigi Giussani e as mulheres da Rose; em São Paulo com os Sem Terra e Marcos e Cleuza Zerbini. E por fim nos EUA, no New York Encounter. Para ambos é algo que os marca. Para Dario é como se um círculo se fechasse. O que tinha lido de Dom Giussani e de Carrón e as descrições de Roberto ganham carne: a beleza e a alegria. Paradoxalmente em situações difíceis, de pobreza, de mal-estar. Ele conta: “Essa vontade de estar dentro das coisas, de fazer, de resgatar-se foi uma emoção enorme. Eu seria capaz de passar dias falando sobre isso. Mas sobretudo, seja na Uganda como no Brasil, me impressionou o caminho que as pessoas estão fazendo: nada é dado de presente, a mudança é possível através de um conhecimento, diria, de uma consciência da realidade”.

A Grande Maçã. Monica teve a mesma percepção. Ela que está habituada a viajar de uma ponta à outra do mundo pela Rai, o canal de TV italiano para o qual trabalha: “Ter colocado no centro de todas as obras, de todas as escolhas, de todas as ações, a pessoa, que tem uma dignidade própria, que tem o seu significado no mundo, muda totalmente a perspectiva. A dificuldade, as coisas feias do quotidiano não desaparecem como por encanto, regressam todas as manhãs. Contudo, ter a noção de que é uma pessoa dentro de uma história e que está construindo a sua história dá força para enfrentar o dia”. Uganda ficou no coração de Dario, que está procurando uma maneira de levar designers famosos para um mestrado na escola Luigi Giussani. “Para eles é mais um conhecimento. Para mim é a oportunidade de me demorar um pouco por lá”.
No frenesi de Manhattan, o New York Encounter é a última coisa que Dario e Monica, que se sente nova-iorquina por ter morado vários anos na Grande Maçã, esperavam ver. É o evento cultural promovido pela comunidade de CL nos EUA. Eles têm a impressão de ser um momento de folga, mas “depois descobre-se a energia e a tensão desta cidade”. Percebem isso no encontro dos jovens com Carrón, no térreo do hotel onde está ocorrendo o evento. “É uma breve passagem do vídeo. Entretanto, estávamos ali vendo aqueles adolescentes confiando as suas interrogações existenciais na esperança de uma resposta totalizante”.
“No entanto, há algo que, aos poucos, traçou o rumo”, esclarece Monica. “A relação com Carrón, que foi uma descoberta contínua. Eu fui sempre eu mesma: com a minha história, as minhas hesitações, as minhas dúvidas, também sobre a realidade do Movimento. Aquilo que me impressionou nele, e me acompanhou, foi, por um lado, a ausência de juízo no sentido banal do termo, ou seja, preconceito; por outro, um enorme juízo sobre as coisas, que leva a olhar para as pessoas, para os fatos, para as relações jogando toda a sua humanidade, o seu senso crítico, colocando-se sempre numa posição diferente daquela que a mentalidade comum queria. Leva-o a ir até o fim”. “Carrón tornou-se meu amigo”, diz Dario: “Esse fato inesperado ficou guardado dentro de mim ao longo de todo o percurso. E também depois”.
Uma das viagens foi à Espanha para gravar a entrevista com ele. “Quisemos voltar aonde a sua história pessoal se iniciou, para procurar o sentido profundo do seu percurso. E ele foi muito paciente. Sendo uma narrativa cronológica, a primeira luz devia ser a da aurora, não outra. E a última a do pôr do sol”.

O todo e as partes. Meses de trabalho até a montagem final. No fim de agosto, na Assembleia de Responsáveis em La Thuile, após a projeção prévia aos participantes do encontro, Carrón disse: “É um vídeo lindo, mas para mim foi a possibilidade de uma amizade muito além daquilo a que uma simples colaboração poderia levar. Por isso lhes agradeço, porque não sabemos o que irá acontecer com o filme, mas aquilo de que tenho certeza é que a amizade que começou permanece”. “Isso valeu por tudo”, diz Dario. Monica acrescenta: “Foi uma aventura em que empregamos toda a nossa competência, mas foi sobretudo uma viagem de descoberta pela qual fui atravessada e por causa da qual nada é como um ano atrás. O título, A bela estrada, refere-se a esta história, mas também à estrada pela qual caminhamos. Realmente o tudo é mais do que a soma das suas partes. Isso também se aplica a nós”.


COMO NASCEU O VÍDEO

OS IRMÃOS SCOTT E O INÍCIO DA NOSSA VIAGEM

por Roberto Fontolan

Confesso que copiei. Há tempos o meu filho, um daqueles que está “sempre ligado”, tinha me falado de Life in a Day, noventa minutos produzidos pelos irmãos Scott (de Blade Runner e Black Hawk Down, não sei se me explico) baseados em milhares de contribuições de vídeos enviados do mundo inteiro. Um maravilhoso documentário, um convite a apreciar o espetáculo prodigioso do humano (um humano “puro”) apresentado na sua unicidade e irrepetibilidade: quando coze ovos e quando se casa, quando chora uma morte e quando se afadiga, quando rejubila e quando se interroga, como a moça que aparece no final: “Estive à altura da espera que tinha para este dia?”. A vida num dia conquistou-me por causa da poesia e da imediatez que jamais teriam sido alcançadas com o tradicional estilo do documentário de autor.

Tempos depois, falando com Monica Maggioni e Dario Curatolo do documentário sobre o Movimento, nos perguntamos sobre a forma de reproduzir certos momentos, como “fazer viver” a Escola de Comunidade ou a caritativa. Gostamos da ideia dos irmãos Scott (“falem vocês!”) e nos colocamos humildemente a seguir as suas pegadas. Eu tinha gostado de alguns documentários “cinematográficos” da Monica e do Dario: não apenas a reportagem jornalística da atualidade, mas a dimensão de narração “tipo filme”, de construção arquitetônica de histórias e personagens em combinação com inusitadas soluções de filmagem e montagem. Foi assim que pensei neles. Queria que a narração do Movimento hoje brotasse daquele olhar.
Já conheço a Monica há muito tempo: o primeiro trabalho dela de que me recordo é uma reportagem para a Tv7 a bordo de um ônibus desengonçado que conduzia imigrantes de Marrocos para Milão; do Dario, depois de termos falado longamente sobre as aventuras de Dom Giussani iniciadas no Berchet, descobri os múltiplos talentos: arquiteto, designer, fotógrafo. O melhor é que, com a Monica e o Dario, “você ganha” também valor adjunto dos seus colaboradores-amigos: operadores de câmera e de montagem, pessoas com uma sensibilidade e um toque realmente raros. E assim, com esse grupo de trabalho, a estrada se tornou bela.

Recebemos 603 filmes de 43 países. Apesar das nossas recomendações (modalidade, temas e duração), chegou de tudo! Mas foi melhor assim, a experiência resultou bem e nos veio em mente outras ideias. Há muitas histórias fantásticas de que só pudemos usar fragmentos, mas merecem ser conhecidas em toda a sua amplitude. E isso é válido também para dezenas e dezenas de testemunhos e obras. Veremos se vamos conseguir pôr em andamento um novo projeto.
Depois viajamos de um lado para outro: para rodar as histórias e a entrevista com Julián Carrón, acrescentando intervenções de alguns grandes amigos (o professor Weiler e companhia). Dario deixou o coração em Kampala, na Luigi Giussani High School, e os olhos em São Paulo, à força de fotografar ruas, rostos e favelas. Aqui notamos que um dos elementos mais característicos da arquitetura espontânea nos terrenos da Associação de Zerbini são os balaústres de varandas e terraços. Em centenas e centenas de casas não há duas iguais – uma clara demonstração do poder da imaginação humana. Em Nova York gostei especialmente do coro (no filme há alguns vestígios). Monica defendeu com determinação a opção pela Espanha para realizar os diálogos com Carrón: queria um determinado céu e determinadas cores e os conseguiu.
Simplicidade, humanidade, universalidade: eram as características narrativas que desejava para este filme. Uma estética da vida do Movimento, toda ela drama e beleza.

Responsável do Centro Internacional de CL.