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Passos N.79, Fevereiro 2007

DESTAQUE - BENTO XVI NA TURQUIA

Na terra de André

por Camille Eid

Na Turquia pregaram alguns dos Apóstolos e viveram os primeiros Padres da Igreja

A Turquia pode ser considerada, depois da Terra Santa, o segundo berço do cristianismo. Como não lembrar que nela moraram e lá pregaram vários Apóstolos, como Paulo, João, Filipe? Que nela nasceram escritos como o Evangelho e o Apocalipse? Como não lembrar que na Ásia Menor, onde hoje está a Turquia, se desenrolaram os primeiros Concílios da Igreja? Que nela viveram as comunidades cristãs dos efésios, dos gálatas, dos colossenses, a quem foram endereçadas muitas das cartas neotestamentárias? Nomes como Antioquia, Constantinopla, Éfeso, Edessa, Tarso, Nicéia, e depois Capadócia, Lídia e Panfília não evocam todo o esplendor do Orienta cristão, bizantino e siríaco, e as memórias que elas conservam?
De fato, na Capadócia floresceu, na segunda metade do século IV, a primeira geração de Padres da Igreja: Gregório de Nissa, Basílio de Cesaréia, Gregório Nazianzeno, Evágrio do Ponto, e outros. Cesaréia da Capadócia (a atual Kaysari) foi o principal centro de irradiação do cristianismo pelo país, e sua influência se estendeu até a Armênia.
Mas, quanto à organização eclesial, a Igreja da Ásia Menor aos poucos passou para o controle de Bizâncio, cuja autoridade fez eclipsarem os outros centros cristãos. Sacudida pela crise iconoclasta, a Igreja local sofre, no século XI, com as invasões dos turcos selgiuquides, mas até o século XIV ainda mantém a supremacia religiosa, como constata Marco Polo. A situação sob os otomanos testemunha, pelo menos no início, uma boa inserção dos cristãos na sociedade. O Império é bastante forte e por isso não teme a defecção de algum grupo ou minoria.
Só mais tarde começa o declínio. Os cristãos que vivem nas grandes cidades são comerciantes e artesãos, mas não detêm o monopólio de nenhum comércio. Os moradores das zonas rurais são “raya”, sujeitos a pesados impostos e submetidos a numerosas restrições. Muitos jovens cristãos são retirados cruelmente de suas famílias para ir engrossar as fileiras dos janízaros, a guarda pretoriana. Esse era um modo de recrutamento que representará, até a sua abolição, um verdadeiro pesadelo para as comunidades cristãs.
Com o favor das vitórias de Lepanto e de Viena, os Estados europeus obtêm da Sublime Porta rendições com cláusulas de proteção às minorias cristãs. A França reclama direitos de proteção sobre os católicos; a Rússia, sobre os ortodoxos. As comunidades cristãs aparecem, assim, aos olhos das populações muçulmanas, como a vanguarda de interesses estrangeiros. As tragédias não tardam a chegar, com o fim quase total da plurissecular presença cristã. Conservando a memória de capital da Ortodoxia, a população cristã de Istambul escapa, em princípio, dessa sina. Mas, despojada da sua retaguarda, a metrópole assiste a uma diminuição constante dos seus fiéis: 136 mil em 1927; 86 mil em 1965; 70 mil hoje. Longe de tranqüilizar os últimos sobreviventes das minorias, a laicidade do Estado turco termina por acentuar a precariedade da situação delas, forçando os cristãos a se refugiarem em outros países.