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Passos N.62, Junho 2005

EXPERIÊNCIA / AVSI EM SALVADOR

Caridade e desenvolvimento: o caminho possível

por Riccardo Piol

Uma reunião empresários, dirigentes e ministros e a morte de padre Giussani. Entre estatísticas, programas futuros e infra-estruturas, o reconhecimento da origem de uma obra que proporcionou moradia a milhares de pessoas na favela de Novos Alagados, em Salvador


“Vocês precisam dizer isso oficialmente, pois é evidente que a inspiração de tudo isso vem dele”. O executivo do Banco Mundial estava certo: a reunião começou com o anúncio da morte de padre Giussani a todos os presentes. Políticos do Estado da Bahia, os empresários do sistema da ONU vindos de Washington para o encontro, os dirigentes do Ministério das Relações Exteriores da Itália e os representantes do Banco Mundial precisavam saber deste fato. Estavam reunidos para avaliar os resultados de um empreendimento de anos que conseguiu oferecer uma casa de verdade a 135 mil favelados de Novos Alagados, que antes viviam nas palafitas. Atrás das estatísticas, das estradas, da infra-estrutura e do sucesso daquilo que os técnicos definiram como “programa de desenvolvimento humano” estava um sacerdote italiano falecido exatamente naquela manhã, poucas horas antes do início do encontro. O executivo do Banco Mundial nunca conheceu padre Giussani, mas conhecia bem aquele grupo de responsáveis da Associação de Voluntários para o Serviço Internacional (Avsi), italianos e brasileiros que trabalham em Salvador dos quais já se tornara amigo, autores daquele projeto desenvolvido na grande baía de Ribeira Azul. Vendo a obra que eles realizaram, descobriu um modo novo de enfrentar o problema da fome, da pobreza e da desigualdade social; descobriu que trabalhavam tendo verdadeiramente afeição pelas pessoas, compartilhando a vida dos moradores, colocando juntos todos aqueles que podiam colaborar com a obra, dos habitantes da região aos órgãos públicos e organismos internacionais. E descobriu, ainda, que tinham aprendido este modo de trabalhar com um homem: padre Giussani.



Segundo a lei do coração

“Aquilo que o presidente do Banco Mundial acabara de nos dizer, as palavras que usou para comunicar a todos a morte de padre Giussani – contaram-nos os responsáveis da Avsi presentes à reunião – pesaram como pedra, com uma autoridade que nos fez estremecer.” O anúncio e o minuto de silêncio foi só o início de uma série de fatos inesperados e comoventes. Logo após o silêncio, padre Piazza, um missionário italiano que sempre esteve comprometido com o trabalho com os pobres a ponto de se tornar Ministro do governo estadual pela luta contra a pobreza e desigualdade social, colocou-se diante de todos para dizer que “padre Giussani é um homem que viveu segundo a lei do coração e não segundo a lei do poder e é um dos grandes homens revolucionários do nosso tempo que mudou, está mudando e continuará mudando o mundo”. Depois, os trabalhos tiveram início e, durante a discussão, o presidente da Companhia de Desenvolvimento da Bahia, que visitou o Meeting de Rímini no ano passado, propôs, em nome do Estado, dar o nome de padre Giussani a uma creche construída no âmbito do projeto. Foi uma sucessão de colocações onde cada um, ao seu modo, agradeceu e participou da dor do grupo da Avsi. O encontro termina, mas as surpresas não. No dia seguinte, o grupo de ministros, dirigentes e funcionários encontrou-se com os representantes da comunidade de Ribeira Azul onde moram as 135 mil pessoas para as quais o projeto foi feito. “Aquele também foi um momento de avaliação importante porque a nossa aposta – contou Maria Teresa Gatti, da Avsi – foi a de trabalhar desde o início partindo daquilo já estava sendo feito e também envolvendo os moradores na proposta de novas possibilidades.” Na sala, uma centena de pessoas assistiram a um vídeo sobre o último ano de trabalho da Avsi mostrando o nascimento de cooperativas, as novas construções e a realização de alguns cursos de formação para os jovens. Enfim, mostrava um pedaço da história de cada um deles. E, quando eles tomaram a palavra foi, novamente, um espetáculo inesperado.



Para o desenvolvimento da pessoa

Uma mulher que, do nada, tinha aberto uma creche, uma escola e um pequeno posto de saúde agradeceu ao grupo da Avsi: “Tudo aquilo que aconteceu foi feito para nós e conosco. A nossa luta foi possível porque estamos juntos”. Depois, um professor tomou a palavra e agradeceu, dizendo: “Não ensinarei mais aos meus alunos que a globalização é um mal porque vi que é possível que realidades diferentes, inclusive estrangeiras, se juntem para realmente ajudar o desenvolvimento das pessoas”. As colocações prosseguiram: agradecimentos, congratulações, satisfação, até que no final do encontro um padre de uma paróquia da região pediu ao pessoal da Avsi para que falassem algumas palavras sobre padre Giussani “porque – disse com uma simplicidade desarmante – parece-me que tem a ver com aquilo que está acontecendo hoje”.

Ninguém poderia ter imaginado tudo isso. Quando, em 1992, a Avsi chegou em Salvador a convite do cardeal dom Lucas Moreira Neves, a baía da Ribeira Azul era constituída de incontáveis palafitas onde a comunidade local de Comunhão e Libertação fazia caritativa. Ano após ano pequenas e grandes iniciativas deram forma à grande obra de urbanização que hoje está diante dos olhos de todos – e que enche os moradores de orgulho porque eles também ajudaram a realizá-la – levando o Banco Mundial a pedir à Avsi que expandisse a sua ação para uma área ainda maior, habitada por 500 mil pessoas. Tudo começou do encontro com um homem, padre Giussani, “porque é evidente que a inspiração de tudo isso vem dele”.