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Passos N.61, Maio 2005

DESTAQUE / DONOS DA VIDA?

Acompanhar a vida até o fim

por Paolo Perego

Um padre num hospital americano. A possibilidade de os doentes redescobrirem o milagre de serem humanos. A resposta é uma amizade

Capelão de um hospital dos EUA, todo dia ele está em contato com doentes e, freqüentemente, com circunstâncias terríveis. No ano passado, publicou um livro, Nas fronteiras do humano. Um padre entre os doentes (Ed. Rubbenttino, 2004; disponível apenas em italiano; nde), no qual relata sua vida de padre e de “homem em meio aos homens”, como diz no prefácio o padre Massimo Camisasca. Fizemos algumas perguntas a Vincent Nagle, sacerdote da Fraternidade São Carlos Borromeu, fraternidade de padres missionários nascida dentro da experiência de Comunhão e Libertação.

O mundo, nos últimos tempos, parece estar propondo – a partir de acontecimentos relativos à fecundação heteróloga na Itália, ao caso Terri Schiavo nos EUA – uma redução do conceito de vida e de homem. É possível uma resposta diferente? Como?
A única resposta que seria possível, como eu vejo a questão, é a mesma resposta que Cristo nos deu, porque fomos salvos do medo. O medo nos leva a fazer coisas que jamais pensaríamos em fazer, leva ao afastamento da realidade e a tratar tudo como instrumento de poder e não como possibilidade de amor. Por isso, diante da vida humana, nós estamos cheios de medo e a tratamos como instrumento de poder e não como ocasião de amor. Eu diria que a possibilidade real está em pessoas visíveis que não têm medo da caridade, que não têm medo de acompanhar a vida até o fim, mesmo nos seus momentos mais dramáticos, que não têm medo de viver até o fim a aventura da realidade: essa é a única resposta real. Creio que a nossa amizade, uma amizade profundamente humana e que nos salva do medo, é a resposta.

O que significa, para você, estar em contato com dez, vinte, cem pessoas como Terri Schiavo, todo dia?
Antes de tudo, posso me confrontar com o essencial da razão da minha vida, do porquê estar no mundo, daquilo que na vida me permite estar aberto para tudo o que Deus me manda. É uma graça, porque me torna absolutamente consciente, a todo o momento, de que não sou eu a resposta, mas que, ao mesmo tempo, na minha vida uma resposta foi dada e posso compartilhá-la com os outros. Para mim, quer dizer também que não posso nunca parar de rezar. Sei que isso pode parecer algo particular, que vale só para mim, e não um juízo que pode ser comunicado. Creio, porém, que só a partir de um particular já salvo é que se pode encontrar uma resposta para todos.

As pessoas de que você fala são homens, antes de serem “doentes”, mas sem que isso represente uma redução daquilo que são e das circunstâncias que vivem. É possível essa unidade da pessoa? Se sim, em que ela consiste e como nasce?
Sim, a unidade da pessoa é possível. Eu vejo todo dia pessoas que percorrem um caminho junto com uma pessoa como eu – que está feliz porque elas existem, por encontrá-las, que gosta de compartilhar com elas essa experiência – e que recuperam um sentido, voltam a perceber o milagre de serem humanos, de serem elas próprias, ali, com tudo o que são. Por isso, creio que a recuperação do eu, viver o próprio eu, só pode acontecer sob o olhar de alguém que fica feliz com a sua existência, quaisquer que sejam as circunstâncias.

O que significa para você o trabalho que faz? O que significa ser “padre em meio aos doentes”?
O próprio fato de eu vestir o colete eclesiástico, de estar vestido como padre, já desde o momento em que entro nos quartos abre um horizonte totalizante que não pode ser negado. Nada disso, porém, pode cancelar a dramaticidade e evitar a exigência de que tudo seja salvo.