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Passos N.122, Dezembro 2010

CULTURA - A SAGRADA FAMÍLIA

Um Amor esculpido no sinal

por Davide Perilo

Um símbolo feito de símbolos. Que se eleva ao céu há mais de um século. Às vésperas de sua consagração pelo Papa Bento XVI, realizada no dia 7 de novembro, fomos visitar a última catedral da Europa e entramos no coração do seu autor, Antoni Gaudí, para ver de perto essa beleza vertiginosa que esconde, em cada centímetro, o segredo de uma vida “sem medidas”. E de uma fé que nasce da pedra

“NAS MÃOS DE DEUS”. Por ocasião do Ano Santo Compostelano, a visita apostólica de Bento XVI à Espanha começou no sábado, 6 de novembro, com a chegada a Santiago. No dia seguinte, o Papa visitou Barcelona, para consagrar o Templo Expiatório da Sagrada Família e proclamá-lo Basílica. Durante a missa, o Papa celebrou o rito de dedicação do altar e recitou a prece de consagração da igreja. No final da missa, saindo pelo Portal da Natividade, o Ângelus no mesmo lugar escolhido por João Paulo II durante sua visita, em 1982. Assim, o templo se tornou Basílica. Foi o próprio Gaudí quem disse: “A Sagrada é uma obra nas mãos de Deus e na vontade do povo”.


O martelo está suspenso no ar. Os olhos, voltados para o balcão de trabalho. O rosto é de uma beleza poderosa, capaz de se impor mesmo ao cone da sombra e aos dez metros de distância. É aí, enquanto fixamos esse Jesus jovem e forte, captado no ato mais banal de uma jornada comum na oficina de José, que nos surpreende um pensamento imprevisto. Ficaríamos a contemplá-lo por horas. Para sempre, talvez. Esperando aquela martelada que jamais acontecerá e, ao mesmo tempo, usufruindo da beleza dessa presença plena, carregada de tensão. Damos um passo atrás, os olhos fixam-se na fachada, nos bordados de pedra, nas torres. No céu. E percebemos que, no fundo, a alma da Sagrada Família é mesmo essa: o eterno. E a expectativa. Alguma coisa que já existe – com toda a imponência do seu esplendor – mas ainda não está aqui. Um fato real, a ser visto e tocado, que carrega dentro de si tudo, mas ainda não é tudo. É como o cristianismo. Ou melhor, é o cristianismo.
Durante a minha visita, a última catedral da Europa aguardava a chegada do Papa. Questão de dias, e Bento XVI estaria consagrando o altar principal dessa obra-prima única e densa de mistério idealizada por Antoni Gaudí e que se tornou o símbolo de Barcelona, que há 128 anos a vê subir, pedra a pedra, e ainda não sabe quando será concluída. O canteiro de obras, agora, está parado. As visitas, não: cerca de nove mil pessoas por dia. Porque “a Sagrada” é mais do que uma igreja. É um sinal. Um símbolo da fé numa Espanha que a está renegando. Algo construído por um povo, no coração de uma Europa que, hoje em dia, só fala de nações ou de indivíduos. Ou, se se preferir, o exemplo mais imponente do que Bento XVI pensa quando incita o homem a redescobrir o próprio coração e o seu desejo de “grandes coisas”.
“É o contrário da medida a que estamos habituados”. Etsuro Sotoo é quem sussurra a frase, num espanhol plano e rico que aprendeu em trinta anos de trabalho aqui. Ele chegou a Barcelona em 1978, vindo do Japão, onde descobriu a sua vocação para trabalhar a pedra, via Paris, onde a arte que encontrou não o convenceu, “porque parecia morta, e eu queria uma coisa viva”. A Sagrada tem essa vivacidade. Quando a viu, decidiu que precisava trabalhar ali. E assim aconteceu. Um concurso depois do outro, uma estátua após outra, e ele se tornou um dos principais escultores do templo catalão. Certamente, o mais próximo do espírito de Gaudí. Entende-se isso de imediato, quando ele começa a explicar a obra e, ao invés de falar de arcos, de arcadas ou modernismo, parte justamente daí: da medida. “A ciência mede. Nós medimos, porque somos criaturas. Queremos saber onde estamos. Queremos saber o que é este mundo, pensando que seja nosso. Mas para medir, antes precisamos olhar e entender do que se trata. E nós não podemos conhecer tudo o que nos foi dado. Portanto, não sabemos que metro usar para medi-lo, e nos enganamos”. Conclusão: “A única maneira adequada de conhecer é a fé. Com ela podemos descobrir sem medir”.

“Volta à origem”.Fé e conhecimento. No fundo, é correto partir daí, de como usamos a razão. É decisivo, frente a esse imenso símbolo feito de símbolos. Não há um centímetro de pedra que não evoque outra coisa. Da tartaruga ali embaixo, no piso, a nos lembrar de que na caminhada da vida avançamos pouco a pouco, até às espigas e à uva lá em cima, nas torres, sinal supremo da Eucaristia, passando pelas estátuas, pelos vitrais, pela decoração... Tudo diz que a própria realidade é um sinal. Evoca algo além, se soubermos lê-la com o coração aberto. “Para explicar certas coisas com palavras, são necessárias dezenas de páginas”, observa Sotoo: “Para Gaudí, basta um símbolo. O símbolo é uma concentração de verdades. Um desenho que une o que não costumamos ver. Nós não podemos fazer como Deus, que desenha de maneira perfeita. Mas Gaudí quer concentrar tudo para que aquele que olha possa ler com facilidade”.
Na Fachada da Natividade, Portal da Caridade, há dezenas de animais, folhas e frutos. É uma apoteose da natureza. Porque é daí que Gaudí tirava todas as suas ideias. Da realidade. “No caso dele, era imaginação, não fantasia”, explica Juan Bassegoda Nonell, durante 32 anos titular da Cátedra Gaudí: “Ele copiava a natureza. Era original, mas no sentido mais vivo da palavra: voltava à origem”. Assim se explicam as fachadas onduladas, as soluções ousadas, as formas à primeira vista extravagantes – para nós, acostumados com retas e ângulos marcados – mas que evocam apenas o que existe na natureza, antes das abstrações geométricas e dos desenhos.

Natureza mestra. “Gaudí sofreu muito”, lembra Sotoo. “Dois irmãos que morreram ainda crianças. Ele próprio adoecia com frequência. Pouco ia à escola. Lutava contra a solidão. E assim aprendeu a observar a natureza. Curtia a natureza. E aprendia. Esse é o seu segredo”. Transmitido também a ele, Sotoo. Basta ouvir sua explicação para as dezenas de folhas que esculpiu sob os frutos que aparecem nas torres do campanário. “O trabalho da Igreja é fazer a alma crescer. Fazê-la amadurecer. Como Gaudí expressa isso? Aprende com a natureza, como sempre. Como a fruta amadurece? Graças às folhas, que absorvem a energia da luz e fazem a planta crescer. As folhas, para ele, são como as palavras. Para nós, japoneses, entre outras coisas, isso é claríssimo: dizemos palavra unindo os termos koto (dizer) e ba (folha). Crescemos por meio da Palavra de Deus. Quem a escuta sempre, amadurece. Mas isso é só o primeiro passo. Na medida em que subimos e chegamos à presença de Deus, as palavras se tornam inúteis. Despontam os frutos”.
Olhamos, repensamos as outras formas do gênio catalão e entendemos um pouco melhor o que sucede quando “a inteligência da fé se torna inteligência da realidade”, como diz o Papa. Literalmente: capacidade de lê-la por dentro. E de respeitá-la, colocando em jogo tudo de si. Até restituí-la ao homem – ao seu companheiro de caminho – rica de um acento novo: o da sua contribuição. Em Gaudí – e Sotoo – é evidente. Toda a tensão do trabalho visa a manter unido o que já o é na origem, visa a não dividir. Só isso permite criar. “Gaudí tinha um critério, claro: estrutura, função e símbolo precisam andar juntos. Sempre”.

Em linha reta com o coração.Há uma coluna diante da Fachada da Natividade. Alta, lançada para cima. Quase não percebemos isso, cativados pela beleza das estátuas. Depois Sotoo nos faz observar os relevos. A serpente com a maçã na boca, lá embaixo. E a rede de ferro trabalhado, que circunda a base. “Foi Gaudí quem a quis. Sabia que as pessoas espontaneamente iriam querer tocar a coluna com a mão. Depois de algum tempo, a pedra estaria desgastada”. Então, protegeu-a. “Mas a rede quer dizer também outra coisa: o homem pensa que é livre, mas está numa prisão. Paga pelo pecado original. É livre apenas quando sobe”. E, de fato, mais lá em cima a rede desaparece. Estrutura, função e símbolo. Nenhum centímetro da Sagrada deixa de mantê-los junto, desde a cabeça do arquiteto. “Hoje buscamos a resposta certa para um problema de cada vez. Difícil. Se tentamos resolver um, outros aparecem. Os problemas se multiplicam. Os especialistas acabam nos fazendo perder tempo. Nós precisamos, mais do que nunca, do pensamento de Gaudí. Porque ele buscava uma síntese. É isso que ele nos ensina, não a análise”.
Gaudí ensina outras coisas. A paciência, por exemplo. A abertura. Ele desenhava pouco. É claro que fazia cálculos e estudava muito, mas quase sempre o resultado era uma maquete, um modelo tridimensional, mais que um projeto superdetalhado. De qualquer modo, uma visão a ser proposta e compartilhada, para se enfrentar juntos os obstáculos. “Mostrava o modelo ao operário e dizia: ‘É lindo, não? Vamos tentar fazê-lo’. Assim, comunicava –, em linha direta com o coração – alguma coisa importante, mas invisível”. Se o interlocutor tivesse o coração aberto, via. “Gaudí nunca obriga. Propõe e diz: sei que para chegar lá você encontrará problemas. Mas se estiver na atitude correta, encontrará a resposta. Se tiver pressa e não respeitar nada, não encontrará nada. Olhem, este é um estudo de como montar a torre de Jesus a 170 metros de altura. Se encontrar problemas a 130 metros, não poderá voltar atrás. Precisará encontrar uma solução. Mas depende de como você se coloca. O problema, se quisermos encarar desse modo, deixará de ser problema e nos levará a mudar o traçado, a fazer uma curva, mas a meta permanece intacta”.

O tempo de Deus.Isso não vale só para a arquitetura. Diante de uma das fachadas da Sagrada há outra construção. Paredes onduladas (“sustentam melhor o peso”), planta com três corações entrelaçados (“é a Trindade”). Não é um edifício de culto. Era a escola para os filhos dos operários. No canteiro de obras havia mais de quatrocentos operários, na época do arquiteto. “Ele partiu de um problema: como evitar os acidentes de trabalho? Fazendo com que os trabalhadores fiquem tranquilos, serenos. E como conseguir isso? Com dinheiro? Impossível. É preciso algo mais. A esperança. E a esperança está sobretudo nos filhos, no fato de poderem ter um futuro melhor do que o deles”. A escola nasceu daí. “E em 128 anos nunca aconteceu um acidente fatal. É um milagre”.
Talvez, mas certamente se trata de algo extraordinário. Como as outras coisas que Sotoo nos mostra. As hipérboles que fecham as torres, difundindo a luz do alto em linha reta. Os vitrais, um espetáculo genial. Ou as colunas das naves: 52, uma por semana do ano, que se alongam e mudam de sulcos na medida em que sobem. Um bosque de pedra. Algo infinitamente diferente da ideia costumeira de espaço e de tempo. “Muitas vezes dizemos: não há tempo”, observa Sotoo. “Não é verdade. Deus nos dá todo o tempo e espaço que queremos. Se nós o pedirmos, Ele nos dará. Nós é que os medimos. Porque medir significa dinheiro”. Aqui tudo é fora de medida. Não no sentido de enorme, mas de algo que rompe a medida. Vai além, até, de certo modo, dar vertigem. Posição difícil de sustentar, se não tivermos presente o objetivo. O Significado.

“Vou encontrar Nossa Senhora”.Não por acaso, discute-se muito isso. E há luta. Há alguns anos, a pressa de caminhar para a conclusão, de fechar este canteiro de obras sem fim – no fundo, de medi-lo uma vez por todas – está gerando escolhas discutíveis. Questões de gosto, como os leds luminosos no alto das colunas da nave ou o vidro mais espesso (mas menos rico de nuances) para as janelas. Mas também de substância, porque aqui nada pode estar desligado do todo. Tome-se a Torre da Virgem, uma das dezoito que subirão quando o templo estiver concluído. Deveria ser a mais alta, perdendo em altura somente para a de Jesus. Problemas surgidos levaram a se pensar em encurtá-la, trazendo-a para o nível das quatro torres dos evangelistas. O que não é a mesma coisa que diminuir alguns andares de um arranha-céu, se fixarmos o objetivo.
“Fazer com pressa leva a desprezar muitas coisas”, diz Sotoo com amargura. Ele próprio, no momento, está sem contrato, como que suspenso no ar. Não polemiza. Nem faz comparações. Apenas acena para o que de fato o preocupa, e que agora entendemos muito bem, depois de passarmos uma manhã inteira seguindo seu olhar. “Muitos dizem que Gaudí já morreu, que é preciso superá-lo. Falso! Estaria morto se ninguém se lembrasse dele ou do que ele fez. Mas não é o caso. O perigo é ele ser assassinado!”.
Há um modo simples de fazê-lo: deixar de olhar. Não para Gaudí, mas para “o que ele olhava”, como diz Sotoo, relatando a descoberta que mudou sua vida para sempre. Não é só uma questão de método. É muito mais do que isso. Foi acontecendo gradualmente, entrar nele, fazer-se um com um homem que, como nos lembra José Manuela Almuzara, presidente da associação pró-beatificação de Gaudí. “Antes de desenhar a Fachada da Paixão, fez quarenta dias de jejum, para se identificar com Cristo. E todo dia fazia dez quilômetros de caminhada, depois do trabalho, até a capela de São Felipe Néri para rezar”. Mas era também alguém “capaz de se levantar da mesa, durante uma conversa, e dizer: vou me encontrar com Nossa Senhora; tenho muitas coisas bonitas para contar a ela. Uma criança!”. Morreu num hospital para pobres, depois de ter sido atropelado por um bonde e de três dias de agonia, dizendo: “Meu Deus!”.
Por isso, “olhar o que ele olhava” é muito mais do que imitar um estilo. É observar Cristo. Contemporâneo, aqui e agora. “Gaudí, fora da fé, é incompreensível”, define Almuzara, que em 1991 foi padrinho de Batismo justamente de Sotoo. A identificação chegou até esse ponto. “Para mim foi como descobrir outro mundo”, diz o escultor. Mas descobrir e revelar, num artista, são a mesma coisa. A contribuição mais poderosa de Sotoo à Sagrada foi a Fachada da Natividade. Dois grupos de estátuas: seis anjos que tocam e nove crianças que cantam. O encantador jogo de olhares. Mas todos levam ao Menino Jesus. “Eu terminei a obra no Natal de 2000. As pessoas dizem que a Sagrada nunca será concluída. Eu quis dar um presente a Gaudí antes do final do milênio”.
De certo modo, é um “obrigado”. Porque, observando Gaudí, Sotoo descobriu um modo de usar a razão. E nós com ele. “O homem luta contra a gravidade. Desde sempre. Porque a gravidade nos puxa para baixo, enquanto que a arquitetura sobe. Mas Gaudí tinha fé. Pensava: a gravidade vem de Deus. Como faço para subir respeitando a vontade de Deus? Se estudo esta pedra, se a observo, assimilo seu caráter; depois de cinco anos, ou cinquenta, esta pedra se tornará algo que sobe. Foi o que aconteceu. Ele encontrou soluções, e por isso a gravidade é que mantém em pé este edifício”. Não é só técnica.
“Nós cometemos um equívoco, por séculos, sobre o que seria a inteligência. Pensávamos que fosse transformar a matéria à força. Ou a gravidade, ou a doença, ou os problemas familiares. Multiplicando leis e obrigações para encontrar soluções. Não é assim que funciona. Com Gaudí podemos aprender a usar a nossa verdadeira inteligência, que é obedecer à realidade. Se a obedecermos, descobriremos uma força que nos permite não só vencer o inimigo, mas convertê-lo em nosso principal amigo. É o máximo. Nenhum deus da antiguidade possuía essa força. Poseidon dominava o mar; Cronos, o tempo; Urano, o céu... Mas nenhum deus dominava o inimigo ao ponto de convertê-lo em amigo. Gaudí nos diz que se obedecermos, poderemos fazê-lo”.

Liberdade vertical.Obediência. E conversão. Partimos da pedra e chegamos ao coração da fé. Ou melhor, à sua soleira. Há ainda um último passo. Impressiona constatar que Gaudí pensou também nisso desde o início. A Sagrada é um templo expiatório. Ajuda a vencer o mal. Como? “O objetivo não é fazer uma coisa que desperte o orgulho da cidade, mas um instrumento para construir o homem. Um instrumento brilha quando é usado. Dando golpes com o martelo, nós impomos sofrimento à pedra e à ferramenta, para que venha à luz uma imagem bela do homem. Assim também o templo. Ele não é o objetivo final, é apenas um instrumento. De qualquer modo, o templo também precisa passar por esse sofrimento”, completa Sotoo. Ele fala do templo, mas dá para compreender que fala de si próprio, da amargura pela situação que está vivendo, das incompreensões. Sofre, e isso é perceptível. “Mas, se por meio desses sofrimentos aprendemos alguma coisa em vista da eternidade, tudo bem”.
Dá vontade de abraçá-lo. A ele e a Gaudí, homens livres até do êxito da sua obra, por mais imponente que ela seja. Porque, chegando ao fim da trajetória, percebemos que tudo se apoia aí, na descoberta de uma liberdade antes impensável. Sotoo chama-a de “vertical”, que nos permite subir, vencendo – ou melhor, usando – a gravidade. Dedicou-lhe inclusive um livro, a ser em breve publicado. Vamos lê-lo. Enquanto isso, como sempre, basta observar. E fixar o olhar numa outra estátua, que Gaudí projetou para o Portal do Rosário e que Sotoo restaurou, depois dos danos provocados pela Guerra Civil espanhola. É São Tiago, o anárquico. Ele observa a Virgem Maria, em cima da porta, enquanto uma serpente está entregando a ele uma bomba. “É uma das grandes tentações: o poder”, explica Sotoo. Aquele jovem nos cativa. Não só porque é o retrato de um anárquico verdadeiro, alguém que em 1893 jogou uma bomba no Teatro Liceu, provocando várias mortes, quase todos da família de Pepeta Moreu, mulher por quem Gaudí estava apaixonado. É a estátua que nos impressiona. Os olhos escancarados. A figura tensa. A mão apoiada na arma, mas ainda está indeciso se a empunha ou não, se dá ou não ouvidos à serpente, que diz: “pegue, é justo, por você e pelos seus companheiros”. Gaudí pensou em suspendê-lo, um pouco antes. O instante da liberdade. Sugere, não impõe. Como sempre. Não sabemos se São Tiago usará aquela bomba, mas percebemos muito bem o desafio que está vivendo dentro de si. É o que acontece conosco, todos os instantes de todos os dias. E entendemos melhor por que “o trabalho mais importante do templo é construir o humano”.
Quando deixamos o templo temos realmente uma sensação de vertigem, como diz uma amiga: “É impressionante a força do homem quando serve a Deus”. Impressionante, de fato. “Mas o nosso trabalho é descobri-la dia a dia”, acrescenta Sotoo. “Nós ainda não descobrimos a verdadeira força da Sagrada”. Talvez entendamos melhor após a visita do Papa. Sotoo se cala. E olha para nós, sério. E acrescenta: “Sim, é isso. O invisível se tornará visível”. Aqui e agora.



ANTONI GAUDÍ - VIDA DE UM GÊNIO

1852 Antoni Gaudí nasce no dia 25 de junho em Reus, Terragona.

1867-1877 Cursa Arquitetura em Barcelona. Para se manter, trabalha no escritório de alguns arquitetos, entre os quais Francisco de Paula de Villar que começará os trabalhos da Sagrada Família.

1878 Faz o trabalho de iluminação pública para a cidade de Barcelona. Forma-se arquiteto.

1883 Por recomendação do arquiteto Joan Martorell, com o qual colabora, Gaudí sucede a Villar na direção dos trabalhos da Sagrada Família.

1894 Um jejum coloca sua vida em risco.

1895-1900 Entre as numerosas obras que realiza nestes anos, começa a construção da igreja de Colônia Güell e do parque Güell.

1906 Morre o pai. Seis anos depois, a jovem sobrinha Rosa Egea.

1914 Depois da morte de Francesc Berenguer i Mestres, seu amigo e colaborador, Gaudí decide dedicar-se exclusivamente à Sagrada.

1926 Dia 7 de junho, saindo da Sagrada, saúda um operário: “Vincent, amanhã chegue cedo, pois faremos coisas muito bonitas”. Pouco depois é atropelado por um bonde. Morrerá dias depois.

2000 É aberta a causa de beatificação.