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Passos N.128, Julho 2011

DESTAQUE - UNIVERSITÁRIOS

O verdadeiro teste

por Paolo Perego

Entre provas e trabalhos de conclusão de curso, mas também em meio a encontros, associações, política universitária... Uma olhada na vida dos universitários de Comunhão e Libertação, para ver o que nasce quando a pessoa leva a sério o desafio de verificar se de fato a fé tem a ver com tudo, em todos os momentos

Primeiro a letra O, depois a Q... até a letra U, e ao ponto de interrogação. A ponta da caneta realça as letras. Uma, duas, três vezes. De um modo pensativo, como se repetisse aquela pergunta: “O que aconteceu?”. É o que se lê de longe no caderninho de anotações da jovem sentada logo ali à frente. É hora do almoço, mas dos 150 lugares da classe, poucos permaneceram vazios. Estamos em Milão, na Universidade Federal. A Escola de Comunidade do grupo de Física começou há pouco, mas entre uma anotação e outra, a caneta continua a hesitar sobre aquelas palavras: “O que aconteceu?”. Stefano, o guia do encontro, lança uma provocação: “Vejamos o que é que tem a força suficiente para vencer a confusão e a estranheza das circunstâncias”. Os resultados do primeiro turno das eleições administrativas de Milão são ainda frescos e decepcionantes para quem participou da campanha eleitoral. “É de fato uma derrota? Ou nestes dias, pensando na experiência de distribuição de panfletos nas ruas, podemos falar de vitória?”, pergunta de novo Stefano. De qual vitória ele está falando? Qual era o jogo? “A possibilidade de viver todas as circunstâncias da vida, inclusive as eleições, como ocasião para verificar a fé.” Traduzindo: se a fé tem a ver mesmo com tudo. Um desafio lançado pelo padre Julián Carrón nos últimos meses, na Escola de Comunidade, nos Exercícios da Fraternidade, e também nos seus diversos encontros com os universitários.
E o que aconteceu? O que significou, nestes últimos meses, levar a sério esse desafio? Após os vestibulares, a acolhida aos calouros, e depois o início do ano letivo com a vida universitária propriamente dita, feita de aulas, de provas, de encontros públicos – como aqueles sobre o Cartaz de Páscoa realizados em várias universidades italianas –, de atuação nos órgãos acadêmicos, de encontros com colegas e professores.
É isso: a primeira resposta está justamente no que aconteceu, e está acontecendo, nas diversas universidades em que o Movimento está presente. E que, de algum modo, foi proposto de novo. Fatos e relatos que falam de uma intensidade de vida excepcional: iniciativas, amizades e encontros que surpreenderam inclusive os que os viveram. Pessoas transformadas no modo de falar, no modo de agir, e até no rosto.

Novo alento. Irene, estudante de Medicina em Milão, fala de uma amiga que distribuía panfletos pelas ruas da cidade italiana durante a campanha das eleições administrativas. A jovem encontra uma senhora, que já de longe mostra desencanto. Ela insiste, consegue fazê-la parar. E a senhora começa a falar de si mesma: é jogadora inveterada de videopôquer. “A minha amiga a escutava, conversava com ela. E no final a senhora lhe diz: você é fantástica; me diga onde, onde posso encontrar gente como você”, conta Irene.
O que salta aos olhos é uma dimensão pública nova, onde esse juízo, esse critério, começa a valer, gerando frutos inesperados. Começando pelas assembleias públicas nas universidades sobre o Cartaz de Páscoa, “cujo tema é difícil, sem dúvida, pois chamamos os alunos e professores para falar de Cristo ressuscitado...”, diz Stefano. E, no entanto, acontecem situações como a de uma jovem que chegou ali com a ideia fixa de brigar com todos, e foi embora com o rosto transformado. “Ela me disse: ‘Não entendo, mas diante do que eu vi não posso deixar de me perguntar o que existe por trás disso e se tem mesmo relação com o fato de Cristo ter ressuscitado’. Era Ele. Ele estava acontecendo naquela classe.” E havia mudado aquela jovem, deslocando sua posição.
Também nas faculdades humanistas a assembleia sobre o Cartaz teve o mesmo teor: “Porque o método era o mesmo: a comprovação da fé como teste instantâneo. Não algo a se fazer depois, quando tudo já terminou”, diz Carlos, estudante de Letras. “A diversidade humana que vem à tona não é mais um slogan, mas carne nos testemunhos de quem se lança no desafio. Aconteceu nas panfletagens nas ruas, quando diante das objeções sobre os programas ou ideias políticas fomos perguntados como era para nós, o que havíamos encontrado de diferente. As eleições, como disse Carrón, são uma ocasião privilegiada para esse teste. Mas o horizonte da vida é mais amplo. E começamos a desejar esse clima em todos os lugares.”
Por isso, para Carlos, é fantástico ler a folha de avisos no final da Escola de Comunidade: uma lista de iniciativas que ajudam a aprofundar o estudo e a viver as dimensões do Movimento: caridade, cultura e missão. Assim, em todos os lugares, surgem iniciativas como a caritativa dos universitários no Rio de Janeiro, em que uma vez por mês os jovens sobem o Morro dos Cabritos, em Copacabana, levando cestas básicas para famílias de baixa renda. Um gesto realizado por gratidão ao encontro que fizeram, como conta Natasha: “Cada vez mais agradeço pelos amigos, que me ajudam a ficar atenta, me sacodem! Ajudam-me a ficar de olhos abertos diante do Mistério da vida. Mistério esse que acontece todos os dias, a todo o momento, seja dando aula, seja tendo aula, ou em provas, ou dançando, cantando, junto com minha família e meus amigos. Seja onde for, seja como for, esse Mistério, que nos faz olhar com os olhos do coração, da verdade, está presente. Ele me faz agora e eu desejo todo o Seu Infinito Amor”. Em Bolonha, na metade de maio, realizaram um evento em praça pública: o Campus by night: “Cada um de nós levou o que pôde: alguns, resumo dos jornais; outros, uma mostra; alguns se meteram a cozinhar...”, conta Giacomo, estudante de Engenharia. E justamente aos “cozinheiros” se dirigiu alguém, que parara ali para se alimentar: “Mas quem são vocês? Por que são assim?”. O mesmo maravilhamento que toca Giovanna de Ribeirão Preto, para quem a certeza de fé gera toda a afeição pela vida, pelos relacionamentos, pelo estudo, pela pesquisa (ver pág. 10).

Uma fé que incide. “Quem são vocês? No trabalho nos órgãos acadêmicos sempre aparece, mais ou menos explícita, essa mesma pergunta”, diz Francesco, que estuda Direito na Federal de Milão. “Uma aluna da minha universidade, depois de algumas comissões para a revisão dos planos de estudo, nos escreveu agradecendo: ‘Vocês mostram uma inteligência nova. Vocês são mais presentes e mais conscientes do que muitos trabalhadores’. E também ocorrem muitos outros fatos que me impressionam, porque embora tentemos projetá-los, na verdade ninguém é capaz de gerá-los.”
Voltando a Bolonha, Giacomo fala do trabalho de modificação do estatuto da Universidade, para adequá-lo à reforma: “Poderíamos nos desinteressar por isso, ou dar nossa pequena contribuição burocraticamente, só porque era obrigatório fazê-lo. No entanto, nós a assumimos como a enésima ocasião de ver se a fé podia incidir também ali”. Começam a encontrar pessoas, professores, especialistas, partindo dessa hipótese. “O resultado desse trabalho foi um encontro com o reitor e com Giorgio Vittadini sobre O que é a universidade, diante de oitocentas pessoas no Salão Nobre lotado de gente”, diz Giacomo. “E não parou aí: havia eleições administrativas também lá, com suas campanhas eleitorais. E aí apareceu o mesmo ímpeto, o mesmo desafio. Porque o que temos nos foi doado. E perderemos esse dom se não o espalharmos. É preciso fazê-lo circular.”
Foi o que também aconteceu na Faculdade de Medicina, trabalhando sobre os testes de admissão à faculdade, deixando admirados os especialistas, pela lucidez dos juízos. Ou na Física, onde funcionava uma comissão para o reordenamento dos cursos em laboratório, mas tudo acabou em nada por falta de recursos financeiros. Alguns dos universitários de CL se metem a trabalhar, estudam a coisa, procuram entender o modo de conseguir dinheiro. E voltam à comissão deixando os professores sem palavras: “Encontramos os recursos; agora, como podemos levar adiante os trabalhos?”
E circulou também na Faculdade de História da Universidade Federal de Aracaju, onde Lucas e alguns amigos começam a julgar os fatos e emitir juízos públicos. Algo incômodo, que levou um dos professores mais amigos a pedir-lhes para parar. Mas como resposta recebeu um convite: “Venha jantar conosco”. Mais uma ocasião para verificar a própria fé.

Instante por instante. “É justamente o ponto sobre o qual Carrón martela sempre”, diz Francesco. “Uma noite, durante um jantar com ele, alguém começou a contar um episódio, até engraçado sob certos aspectos. Todos riam, mas ele chamou nossa atenção, levando a sério o que a pessoa contava. E levando a sério todos nós. Tratou-nos como homens. E eu quero ser homem, e me entusiasma a contínua provocação sobre esse ponto.” No dia 22 de maio, Marco estudante de Letras na Universidade Católica de Milão, estava em Roma por ocasião das comemorações dos 90 anos da universidade, e foi em peregrinação para ver o Papa, junto com outros cinco mil peregrinos. “Estávamos ali porque tínhamos necessidade dele. E quando eu e outros fomos saudá-lo, a Sala Nervi veio abaixo. Não era torcida de estádio de futebol. Eu entendi tudo depois, quando um amigo me disse que ele gostaria que tivesse sido ele a estar lá, mas entendeu que estava lá conosco”. E a verdade desse juízo veio à tona na mesma noite, quando esses jovens desceram do trem na Estação Central de Milão e, embora cansados, muitos se colocaram à disposição para ir às ruas fazer panfletagem na manhã seguinte. “Pelo algo a mais recebido”, continua Marco. “É sério, esse desafio desloca. Vem-me à mente uma amiga, que vejo que está mudada até no modo de escrever o título em um cartaz. E isso não pode acontecer só porque a gente pertence a uma associação. Precisa acontecer algo, inclusive na vida ordinária.”
Como para Cláudia, que estuda em Bari, no sul da Itália, onde no último período não aconteceram eleições, campanhas eleitorais, e nem fizeram grandes iniciativas na universidade. “Eu me perguntava, ouvindo os amigos de Milão: mas que oportunidade eu tenho, aqui e agora? Na semana passada, eu estava me preparando para duas provas, mas entre a tese, as várias atividades nos órgãos acadêmicos e outras mil coisas, era difícil dedicar o tempo adequado ao estudo. Além disso, um amigo não estava passando bem, e tive de acompanhá-lo ao pronto-socorro.” E assim, às nove da noite da véspera da prova, estava ela estudando nos corredores do hospital, o que se prolongou noite adentro. “Eu tinha que dar uma resposta ao que tinha diante de mim: o hospital e a prova no dia seguinte. Tudo era um dom para que eu pudesse dar uma resposta ali, buscar Cristo, momento a momento. Era uma coisa do outro mundo. Pensando bem em como eu sou, não seria capaz. E o resultado é sempre superabundante, como foi o êxito na prova.”
Momento por momento: ou seja, sempre. Mesmo em casa, diante da briga dos pais, “onde nos descobrimos desejando tudo para eles”. Ou diante das imagens daquele padre acusado de pedofilia na TV, pensando no inferno por que está passando esse homem, pois renegou a si mesmo, justo aquele a quem Jesus havia escolhido para se tornar carne e sangue todos os dias. “Eu não poderia olhar assim as coisas se Ele não tivesse ressuscitado. É Alguém que quer nos conquistar em todas as oportunidades. Compreender isso é descobrir melhor a si próprio, isto é, descobrir melhor a Ele.”
“É verdade, nos descobrimos. E começamos a ter como que um detector de metais, que soa quando cruzamos com alguém que tem esse mesmo desejo”, diz Irene. Tudo adquire valor, o silêncio, a oração, a companhia: tudo é sinal d’Ele. “Tratamos as coisas de um modo diferente. Eu cultivo células na universidade, e o ambiente precisa estar esterilizado. Antes eu era desorganizada, mas agora vivo atenta. Não só para não estragar o trabalho dos outros, mas por amor à realidade.”
Pessoas mudadas são como uma pedrinha lançada no leito do lago: gera uma onda que se espalha e movimenta a água em volta. “É uma mudança que gera outras mudanças”, diz Giacomo pensando em seus amigos, e em como passou a ver a mudança naqueles rostos de sempre. “Como para a mulher de André, quando o marido voltou para casa depois do encontro com Jesus: O que você tem, André?”. Justamente, o que há com você, André? O que aconteceu?