É segunda-feira, 19 de agosto. O Papa Francisco marcou encontro para as 10h na Casa de Santa Marta. Eu, no entanto, herdei do meu pai a necessidade de chegar sempre mais cedo. As pessoas que me acolhem instalam-me numa pequena sala. A espera dura pouco, e, depois de uns breves minutos, acompanham-me ao elevador. Nesses dois minutos tive tempo de recordar como em Lisboa, numa reunião de diretores de algumas revistas da Companhia de Jesus, surgiu a proposta de publicar conjuntamente uma entrevista ao Papa. Tinha conversado com os outros diretores, ensaiando algumas perguntas que exprimissem os interesses de todos. Saio do elevador e vejo o Papa já à porta, à minha espera. Na verdade, tive a agradável impressão de não ter atravessado portas.
Entro no seu quarto e o Papa convida-me a sentar numa poltrona. Ele senta-se numa cadeira mais alta e rígida, por causa dos seus problemas de coluna. O ambiente é simples, austero. O espaço de trabalho da escrivaninha é pequeno. Toca-me a essencialidade não apenas dos móveis, mas também das coisas. Veem-se poucos livros, poucos papéis, poucos objetos. Entre estes, um ícone de São Francisco, uma estátua de Nossa Senhora de Luján (padroeira da Argentina), um crucifixo e uma estátua de São José adormecido, muito semelhante àquela que tinha visto no seu quarto de reitor e superior provincial no Colégio Máximo de San Miguel. A espiritualidade de Bergoglio não é feita de «energias harmonizadas», como ele lhe chamaria, mas de rostos humanos: Cristo, São Francisco, São José, Maria.
O Papa acolhe-me com o mesmo sorriso que já deu várias vezes a volta ao mundo e que abre os corações. Começamos a falar de tantas coisas, mas sobretudo da sua viagem ao Brasil. O Papa considera-a uma verdadeira graça. Pergunto-lhe se descansou. Ele diz-me que sim, que está bem, mas, sobretudo, que a Jornada Mundial da Juventude foi para ele um «mistério». Diz-me que nunca foi habituado a falar para tanta gente: «Consigo olhar para as pessoas, uma de cada vez, e entrar em contato de modo pessoal com quem tenho na minha frente. Não estou habituado às massas». Digo-lhe que é verdade e que se vê, e que isto impressiona a todos. Vê-se que quando está no meio das pessoas, os seus olhos, de fato, pousam sobre cada um. Depois as câmaras televisivas difundem as imagens e todos podem vê-lo, mas assim ele pode sentir-se livre para ficar em contato direto, pelo menos visual, com quem tem diante de si. Parece-me contente com isso, por poder ser aquilo que é, por não ter de alterar o seu modo habitual de se comunicar com as pessoas, mesmo quando tem diante de si milhões de pessoas, como aconteceu na praia de Copacabana.
Antes de eu ligar o gravador, falamos de outras coisas. Comentando uma minha publicação, disse-me que os seus dois pensadores franceses contemporâneos prediletos são Henri de Lubac e Michel de Certeau. Digo-lhe ainda algumas coisas mais pessoais. Também ele me fala de si e particularmente da sua eleição pontifícia. Diz-me que quando começou a dar-se conta de que corria o risco de ser eleito, na quarta-feira, dia 13 de março, à hora do almoço, sentiu descer sobre ele uma profunda e inexplicável paz e consolação interior, juntamente com uma escuridão total e uma obscuridade profunda sobre tudo o mais. E estes sentimentos acompanharam-no até à eleição.
Na verdade, teria continuado a falar assim familiarmente ainda por muito tempo, mas pego nas folhas com algumas perguntas que tinha anotado e ligo o gravador. Antes de mais nada, agradeço-lhe em nome de todos os diretores das revistas dos jesuítas que publicarão esta entrevista.
Pouco antes da audiência que concedeu aos jesuítas da Civiltà Cattolica no último dia 14 de junho, o Papa tinha-me falado da sua grande dificuldade em dar entrevistas. Tinha-me dito que prefere pensar, mais do que dar respostas imediatas em entrevistas de momento. Sente que as respostas corretas lhe vêm depois de ter dado a primeira resposta: «Não reconheci a mim mesmo quando no voo de regresso do Rio de Janeiro respondi aos jornalistas que me faziam perguntas», diz-me. Na verdade, nesta entrevista, várias vezes o Papa sentiu-se livre para interromper aquilo que estava a dizer respondendo a uma pergunta, para acrescentar algo sobre a precedente. Falar com o Papa Francisco é, realmente, uma espécie de fluxo vulcânico de ideias que se atam entre si. Mesmo o tomar apontamentos traz a desagradável sensação de interromper um diálogo nascente. É claro que o Papa Francisco está mais habituado a conversas, do que a lições.
> A entrevista completa pode ser lida no site oficial da revista dos jesuítas. Em português, clique aqui.
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